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quarta-feira, 27 de julho de 2022

Quando morre o senso de justiça - Percival Puggina

História número 1

Na primeira aula para a turma de calouros de uma faculdade de Direito, o professor, logo após a chamada, encarou o aluno visivelmente mais idoso da classe e disse, em tom agressivo: “O senhor aí, retire-se da minha sala de aula!”. Após alguns instantes de tensão, tendo o aluno saído, perguntou à turma: “O que houve? Porque vocês estão assim, com cara de quem viu lobisomem?”. Longo silêncio até que um dos estudantes, com visível insegurança, explicou que a expulsão do colega parecia não ter razão de ser. “Cometi uma injustiça? É isso? Então, vai lá fora e chama-o de volta”. Ao retornar, a surpresa: o aluno expulso ocupou o lugar do “professor” e este, encerrada sua representação, sentou-se entre os colegas. A partir daí, o verdadeiro docente da turma passou a lecionar o grupo sobre o dever moral, mormente entre advogados, de não silenciar perante uma injustiça.

História número 2

A aula daquela matéria toda vez mudava de local. Perdia-se um tempo procurando, subindo e descendo escadas. Naquela manhã, o professor já começara a falar quando uma aluna, retardatária, ensaiou entrar na sala. O homem com giz na mão olhou-a de modo rude e lhe disse, em tom mais rude ainda, que não podia entrar, pois a aula já começara. 
Enquanto a mocinha, humildemente, se retirava, um aluno levantou-se e explicou ao professor que sua cadeira sempre envolvia aquela dificuldade de localização, dando causa a tais atrasos. E completou: “Se a colega não pode entrar, eu saio”. E saiu da sala, seguido pelos demais.

A primeira história circula nas redes sociais há algum tempo. Não sei se realmente aconteceu. A segunda, esta última, deu-se na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da UFRGS, na minha turma, por volta de 1966 e fui eu o aluno que reagiu à conduta do professor.

Quando o silêncio de alguns faz a história de todos

Injustiças me incomodam. Por isso, observo com indignação as ocorrências nacionais e o silêncio de tantos que devendo reagir, não o fazem. Penso na omissão perante casos como os de Allan dos Santos, de Barbara Destefani (Te atualizei), de Bernardo Kuster, de Camila Abdo e outros que tiveram cortadas suas fontes de renda e enfrentam as dificuldades disso decorrentes sem ter acesso aos seus processos. O que fazem com eles não cabe no mundo das boas leis. Não conheço a todos, mas os que mencionei são pessoas que, de bom grado, receberia em casa para jantar com minha família. A seus detratores, não.

Outro dia, assisti Bárbara dizer à Jovem Pan que, há 10 meses, foi desprovida de seu sustento e não recebeu até agora sequer um e-mail que lhe indicasse os motivos disso. Logo após, li Bernardo afirmando estar na mesma situação dois anos depois de ter sido vítima de igual arbitrariedade.

A defesa da liberdade

Eles tinham milhões de seguidores. São pessoas que comungam do amor à liberdade e da aversão ao arbítrio. Censurados, podem sair à convivência das ruas enquanto seus censores viajam ao exterior para poder tomar sol.

Nada espero da OAB, nem dos advogados banqueteiros e festeiros da confraria Prerrogativas (Prerrô, para os íntimos). Tampouco espero algo das associações ditas “Pela democracia”, organizadas por pessoas que passaram por cursos de Direito e nada aprenderam sobre o valor Justiça.

Minha singular e tênue esperança está em que a sociedade não deixe morrer  a repugnância à injustiça. E perceba, em tempo, o quanto ainda pode ir além, perigosa e arrogantemente, o poder que tudo pode. 

Percival Puggina (77), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.

 

quarta-feira, 29 de setembro de 2021

Há uma bomba-relógio no TSE - Elio Gaspari - Cassar chapa com atraso é tapetão

 O Globo

Cassação da chapa Bolsonaro-Mourão pelo TSE é o sonho do presidente

Há uma bomba-relógio no TSE 

[caso clássico de tapetão?]  

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) revelou que nas próximas semanas julgará o processo de cassação da chapa de Jair Bolsonaro e Hamilton Mourão. Parece falta de assunto, mas é bom que se diga: trata-se de uma iniciativa retardatária e inoportuna, caso clássico de tapetão.

É retardatária porque não faz sentido cassar uma chapa três anos depois da campanha durante a qual teriam ocorrido flagrantes transgressões da lei. Tudo indica que as ilegalidades ocorreram, mas, se o Judiciário levou três anos para decidir julgar o caso, deveria reconhecer que sua morosidade causou danos ao bem público semelhantes aos das malfeitorias cometidas. Se o caso envolvesse uma autoridade conduzida a um cargo vitalício, tudo bem, mas cassar uma chapa a um ano do fim do mandato é uma excentricidade.

É inoportuna, porque o país ainda não se livrou da tensão institucional manipulada por Bolsonaro nos seus confrontos verbais com o Judiciário. Uma nova encrenca nesse quintal é coisa desnecessária.

É um caso de tapetão porque, anulando o resultado de um pleito mais de três anos depois de sua realização, leva água para o moinho do condenado. Ele fica com o argumento de que foi eleito por 57 milhões de pessoas e cassado três anos depois pela maioria de um colegiado de sete sábios. Para Bolsonaro, esse seria um cenário de sonho.

A esta altura, Jair Bolsonaro pode ser afastado da Presidência pelo Congresso, por meio de um processo de impedimento. Se faltam apoios para isso, paciência. Resta a alternativa lisa e límpida da eleição do ano que vem.  
O TSE já passou por experiência semelhante em 2017, quando julgou o processo de cassação da chapa Dilma Rousseff-Michel Temer. 
A senhora já havia sido deposta pelo Congresso, o vice ocupava-lhe a cadeira, e o tribunal rejeitou o pedido. Viveu-se uma tensão desnecessária.
Todas as encrencas que Bolsonaro alimentou com o Judiciário partem da premissa de que ele tenta invadir as competências do Executivo. A cassação da chapa seria uma cereja para esse bolo. 
Fica a pergunta do que seria possível fazer para desarmar a bomba-relógio. Isso só os ministros do TSE poderão saber. No caso da cassação da chapa Dilma-Temer, seguiram um caminho que resultou na piada segundo a qual a dupla foi inocentada por excesso de provas.

Um dos pilares das denúncias contra Bolsonaro está na exposição do uso abundante de notícias falsas durante a campanha de 2018. Nesse sentido, agora o próprio TSE armou-se para impedir que essa praga contamine a eleição do ano que vem. Há três anos, as notícias falsas eram uma produção nacional. Pelo andar da carruagem, percebe-se que a receita promete ser repetida no ano que vem, com o agravante da internacionalização. Quando Steve Bannon, o guru de Donald Trump, disse que Lula “é o esquerdista mais perigoso do mundo”, sinalizava o que pode vir por aí.

Elio Gaspari, colunista - O Globo - MATÉRIA COMPLETA