Mariana Muniz e Geralda Doca
Parte da Corte recebeu mal a solicitação feita pela duas Casas e avalia a norma redigida pelo Legislativo como descumprimento de decisão judicial, uma vez que a ministra foi expressa ao pedir a transparência para as emendas de 2020 e 2021. Na avaliação desses ministros, aceitar a demanda do Congresso tal qual foi apresentada seria concordar com a existência de um orçamento secreto, ainda que anteriormente. O governo Bolsonaro tem usado o mecanismo para angariar apoio no Congresso.
Nos bastidores do STF, uma outra ala avalia já ser possível liberar a execução das emendas, uma vez que as medidas de transparência informadas na petição atenderiam, segundo esses ministros, ao que foi determinado por Rosa Weber. Para esse grupo, embora a questão da retroatividade — classificada pelo Congresso como “inexequível” — ainda precise ser definida, o que foi apresentado já seria o mínimo suficiente para liberar as emendas que foram suspensas.
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Na prática, Rosa pode decidir sozinha na petição apresentada na quinta-feira, deferindo ou negando o pedido de suspensão do bloqueio das emendas. [convenhamos que uma decisão monocrática negando um pedido, devidamente fundamentado, apresentado pelos presidentes das duas Casas do Congresso Nacional, jamais será considerado um gesto de pacificação.] A ministra também poderá levar o pleito do Congresso direto ao plenário, fazendo com que os demais ministros se manifestem de maneira conjunta. Neste caso, a relatora terá que liberar o processo para julgamento, cuja data seria posteriormente definida pelo presidente do Supremo, ministro Luiz Fux.Quando concedeu a decisão liminar, no início do mês, Rosa escreveu que “o regramento pertinente às emendas do relator (RP 9) se distancia desses ideais [???] republicanos, tornando imperscrutável a identificação dos parlamentares requerentes e destinatários finais das despesas nelas previstas, em relação aos quais, por meio do identificador RP 9, recai o signo do mistério”.
Além de não haver transparência sobre os padrinhos dos repasses de recursos do Orçamento da União nas emendas de relator, essa verba não é dividida igualmente entre todos os parlamentares. Levada a julgamento para que fosse confirmada ou derrubada, a liminar da ministra acabou ganhando o apoio massivo do restante da Corte. Em seu voto, a ministra Cármen Lúcia classificou o orçamento secreto como uma forma de cooptar apoio político, o que colocaria em risco o sistema democrático.“Esse comportamento compromete a representação legítima, escorreita e digna, desvirtua os processos e os fins da escolha democrática dos eleitos, afasta do público o interesse buscado e cega ao olhar escrutinador do povo o gasto dos recursos que deveriam ser dirigidos ao atendimento das carências e aspirações legítimas da nação”, afirmou Cármen. “Os princípios constitucionais da publicidade e da transparência devem ser observados em todas as fases do ciclo orçamentário e não apenas na fase de execução”, afirmou Gilmar.
Parte do que se convencionou chamar de orçamento secreto, as emendas de relator são um artifício pelo qual o deputado ou senador escolhido para elaborar o parecer sobre o Orçamento daquele ano tem o poder de encaminhar diretamente aos ministérios sugestões de aplicação de recursos da União indicadas por outros parlamentares. Os registros dessas indicações não são abertos, e o sistema dificulta a fiscalização.
Ofensiva do Congresso
Na tentativa de convencer o Supremo a voltar atrás e autorizar a execução das chamadas emendas de relator, o senador Davi Alcolumbre (DEM-AP) tratou do assunto com ministros da Corte na semana passada. Ele entrou em campo com apoio do presidente do Senado, que também se reuniu com Fux, na semana passada, e com Rosa Weber, na quinta. [o que não pode, não deve, ficar imperscrutável são as rachadinhas do Alcolumbre. Não apurá-las, ou arquivá-las, além de representar conivência com prática criminosa, representam violação dos princípios constitucionais da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.]
Segundo interlocutores ouvidos pelo GLOBO, um dos argumentos usados pelos parlamentares é que a decisão do STF paralisou o Orçamento e, se nada for feito, vários serviços serão prejudicados, inclusive na área da saúde.
Relator de um projeto de resolução para mudar as regras das emendas de relator, o senador Marcelo Castro (MDB-PI) disse que pretende “dar transparência total” para convencer o Supremo a rever sua decisão. Mas a indicação dos donos das emendas seria apenas para os recursos não executados em 2021 e a partir de 2022. — É praticamente impossível fazer uma demonstração cabal de todas as emendas no país inteiro no Orçamento de 2020, que já findou. Do de 2021, o prazo é muito apertado para fazer esse levantamento — disse Castro.
Segundo ele, metade do montante de R$ 16,5 bilhões de emendas de relator (R$ 11 bilhões para deputados e R$ 5,5 bilhões para senadores) ainda não foi empenhada.
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