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segunda-feira, 25 de setembro de 2017

Única alternativa


Combalida, a Eletrobras não consegue arcar com os investimentos em energia de que o país precisa

O sufoco fiscal em que se encontra o governo o déficit primário continua acima dos 2% do PIB, desde a saída de Dilma Rousseff, responsável pela crise é forte mola propulsora para levá-lo a programar a privatização da Eletrobras, bem como acelerar a licitação de concessões (estradas, aeroportos, por exemplo), entre outras medidas.

A questão é que não se trata apenas de uma oportunidade de o Tesouro obter, estima-se, algo entre R$ 20 bilhões e R$ 30 bilhões. Para efeito de comparação, a meta para este ano e o que vem é de déficits de R$ 159 bilhões. Uma ajuda nada desprezível. Até mais do que isso, privatizar a Eletrobras é essencial para preservar o setor elétrico e garantir os investimentos necessários a fim de garantir o fornecimento de energia que sustente o crescimento da economia, sem risco de apagões.

Também é fato que a barbeiragem cometida pela ainda presidente Dilma Rousseff, tida como competente conhecedora do sistema elétrico brasileiro, desestabilizou de tal forma a estatal que, por ironia, ajudou a inviabilizá-la de vez como estatal.Ao baixar a Medida Provisória 579, em 2012, para reduzir na base do voluntarismo a tarifa de luz em 20% — com evidente objetivo político-eleitoral —, o equilíbrio do sistema foi rompido. Com ideia fixa na “modicidade” tarifária — fez o mesmo no pedágio em estradas licitadas, e obras não foram feitas —, o governo Dilma, por aquela MP, estabeleceu regras para antecipar a renovação de concessões ainda a vencer. O princípio era que usinas amortizadas poderiam cobrar tarifas mais baixas.

A filosofia intervencionista, porém, nunca consegue manejar com todas as variáveis. E assim, elétricas públicas de estados (Cesp, de São Paulo; Cemig, de Minas; Copel, do Paraná) não aceitaram as condições da MP, enquanto as estatais federais foram obrigadas a aderir ao novo regime. O autoritarismo é intrínseco ao dirigismo. Veio um longo período de seca, e desmontou de vez o sistema de Dilma.

Nem toda a energia passou a ser produzida sob a regras que queria o governo, que enquadrou as usinas incluídas nas novas regras num sistema de cotas, em que a energia era vendida a preços baixos. Sem considerar variações de custos das hidrelétricas, por exemplo. Um modelo típico do planeamento centralizado.  O longo período de seca na hidrologia desmontou o castelo de cartas, montado bem no estilo lulopetista

O parque de termelétricas, principalmente a gás e óleo, de custo mais elevado, foi acionado e pulverizou a “modicidade”. Dilma continuou tentando, e o Tesouro foi convocado a subsidiar parte do aumento de custo. No fim, restou um tarifaço, para equilibrar o sistema no lado financeiro. Sem considerar rombos em empresas, com a volta dos “esqueletos”. Os estragos do dirigismo deixaram heranças, uma delas, a impossibilidade de uma Eletrobras combalida arcar com os investimentos em energia de que o país necessita. 

Vendê-la é a única alternativa sensata. Também para melhorar a gestão do setor e livrá-lo de delírios de poderosos de turno. Como aconteceu no lulopetismo.

Fonte: Editorial - O Globo


quinta-feira, 23 de fevereiro de 2017

Sociedade paga a conta do dirigismo de Lula e Dilma


A  intervenção no setor elétrico deixou uma fatura adicional de dezenas de bilhões a ser paga pelo consumidor; mas a pior herança é a recessão, com seus efeitos

Orastro de ruínas deixadas pelo experimentalismo da política econômica heterodoxa do lulopetismo é extenso. Com a dramática particularidade de que, ao contrário dos tornados, os danos persistem e crescem durante muito tempo. A parte principal da conta remetida ao povo brasileiro pela política dirigista do “novo marco macroeconômico” — cujas estacas foram fincadas no segundo governo Lula, com Dilma Rousseff na Casa Civil — levará muito tempo para ser resgatada. A desastrosa obra foi concluída pela própria Dilma no Planalto, e lhe custou o mandato no início do segundo governo.

Foi o pior ciclo de crise econômica da História da República, instaurado na estagnação de 2014, estendendo-se ao biênio seguinte de recessões acima dos 3% ao ano, responsáveis pela demissão de mais de 12 milhões de pessoas no mercado formal de trabalho, com todos os dramas pessoais decorrentes de uma tragédia social dessa envergadura.  Soube-se na terça-feira, pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), que aquela filosofia de gestão econômica aplicada por Dilma neste setor produziu uma fatura de R$ 62,2 bilhões ainda a ser paga pelos consumidores.

É no que deu a ideia dirigista, aplicada para, a partir de 2012, cortar em 20% as contas de luz. Dois anos depois, a presidente se reelegeria. Mas aumentos de custos em geradoras e distribuidoras, escamoteados por meio de subsídios do Tesouro para tudo resistir até as urnas, vieram à tona, e não houve alternativa a não ser um tarifaço — alertado sucessivamente na imprensa profissional.

Vendida ao eleitorado como exímia gestora, com lastro na experiência acumulada na área elétrica, Dilma Rousseff interveio no setor, por meio de medida provisória, para, numa acrobacia regulatória, exigir de concessionários a redução nas tarifas em troca da renovação de contratos. 


Estatais sob controle de governos de oposição (São Paulo e Minas) não aceitaram a prestidigitação, e, para agravar tudo, veio a seca. Com isso, as termelétricas, de custo operacional mais elevado, tiveram de funcionar durante muito tempo. Mais custos ficaram reprimidos, mas nem assim houve recuo. Nem o tarifaço foi suficiente. Ativos das empresas não foram remunerados como deveriam. 

Assim, sobraram ainda estes bilhões a serem distribuídos pelas contas de luz até 2025. É o exemplar irretocável de um “esqueleto” fiscal, como aqueles deixados nos armários da contabilidade pública pela ditadura militar, mantidos no início da redemocratização e só descobertos no Plano Cruzado. Pois eles voltaram a ser criados na fase populista do lulopetismo — excluindo quase todo o primeiro mandato de Lula. 

O PT, infelizmente, voltou a ser PT em política econômica, e o resultado é que a sociedade mais uma vez terá de arcar com despesas ocultas deixadas nesses armários por salvacionistas.

Fonte: Editorial - O Globo
 
 

quarta-feira, 11 de maio de 2016

Os quatro equívocos fatais da economia brasileira



Há um erro de base, que pode ser simbolizado numa frase: ‘gasto de custeio é vida’
Imaginem a situação de um médico legista diante de um corpo crivado de balas e que é questionado pelo promotor: “Qual foi o tiro fatal?”

É a mesma situação quando se pergunta: qual foi o erro fatal da presidente Dilma Rousseff? A economia brasileira foi atingida de tantas maneiras que se chegou a um quadro inédito: recessão com inflação; preços subindo mesmo com juros elevados; e contas públicas exauridas.

Não se chegaria a isto sem uma sequência de equívocos. Mas há um erro de base, que pode ser simbolizado numa frase: “gasto de custeio é vida”. Foi o que disse Dilma, ainda ministra do governo Lula, quando ajudou a enterrar um plano de longo prazo de controle das contas públicas.

Como o governo vinha realizando superávits desde o final dos anos 1990, havia espaço para acelerar o gasto. Mas a presidente conseguiu em apenas três anos sair de um superávit primário (receita menos despesa antes do pagamento de juros) de R$ 129 bilhões para um déficit de R$ 32 bi.

Desse erro básico resultaram as pedaladas. A um determinado momento, o dinheiro arrecadado com impostos já não era suficiente. A presidente partiu então para tomar empréstimos, primeiro legalmente, depois se financiando nos bancos públicos, violando regras sagradas da Responsabilidade Fiscal.

O quadro se completou com as desonerações de impostos concedidos a determinados setores, escolhidos entre os amigos da casa. Em vez de reduzir impostos para toda a atividade econômica, o movimento foi elevar para todos e aliviar para alguns. Havia uma suposta lógica: com carga tributária menor, aqueles setores investiriam mais. Ocorre que não fizeram as contas e o resultado foi queda de receita, sem investimentos.

Fechou-se o grande erro: mais gasto, menos receita, déficit anual, crescimento da dívida e da conta de juros. Só o déficit primário chegou a R$ 142 bilhões em 12 meses acumulados até março último.

O segundo erro fatal foi a redução dos juros, em 2012, quando o Banco Central fixou a taxa básica em 7,25% ao ano — a mais baixa da história recente. E isso quando a inflação rodava no teto da margem de tolerância em torno dos 6,5% ao ano. O governo fez exatamente o contrário do que determinava o regime de metas.

De novo, foi um erro conceitual. Baseava-se na falsa ideia de que os juros eram altos porque os banqueiros queriam — como aliás a presidente alardeou na sua campanha de 2014. Os juros eram altos, como são, porque tem inflação e muito déficit público. Tentou-se combater a inflação do modo mais equivocado: mantendo o dólar baratinho, barateando importados e dificultando a vida da indústria local.  Em meio a essas intervenções em pontos chaves da macroeconomia — juros e câmbio —, o governo Dilma aplicou controles sobre dois preços básicos: gasolina/diesel e energia elétrica.

A Petrobras foi obrigada, durante anos, a importar combustível caro e vender barato aqui dentro. Só nos quatro anos do primeiro governo Dilma, estima-se que a estatal acumulou um prejuízo de R$ 55 bilhões. Nesse mesmo período, a companhia foi jogada num plano de investimentos megalomaníaco: quatro refinarias, dezenas de navios, plataformas e sondas, negócios em setores fora de sua área.

Sem caixa, a Petrobras endividou-se, até chegar ao ponto atual: sem fôlego, cancela investimentos e negócios, arrasta a indústria de óleo e gás, tem que vender ativos em um momento ruim. E isso sem contar a corrupção.  Ainda em 2012, ano da plena aplicação da “nova matriz econômica”, a presidente Dilma impôs uma redução de 12% na tarifa de energia elétrica. Isso num momento em que o custo da energia estava em alta, já sob ameaça da seca.

No mesmo momento, a presidente aplicou uma reestruturação do setor — o que veio a quebrar a Eletrobrás e impor prejuízos generalizados para geradoras e distribuidoras.  De início, o governo tentou salvar o setor arranjando empréstimos. Depois, dado o tamanho do prejuízo, e uma vez tendo passado as eleições, veio o tarifaço. No primeiro semestre de 2015, as tarifas subiram em média 50%. Em algumas regiões, quase dobraram.

Por trás de tudo, a concepção clássica de uma esquerda latino-americana. O governo faz tudo: gasta diretamente ou por meio das estatais; seleciona os setores privados que terão financiamento subsidiado; controla os preços básicos; manipula as variáveis macro, juros e câmbio.

Eis os quatro erros fatais.

A produção caiu, os brasileiros ficaram mais pobres.

Fonte: Carlos Alberto Sardenberg – O Globo