A face tucana do PT
Para tirar o País da recessão e disciplinar as contas públicas, a presidente Dilma adota o receituário do PSDB, que tanto criticou na campanha, e anuncia uma composição ministerial com jeito de oposição
Se os símbolos dos partidos políticos retratassem as posições das legendas e dos seus principais representantes, a estrela do PT no segundo mandato de Dilma Rousseff poderia ganhar um bico tucano, símbolo maior do PSDB. Mesmo sob os protestos do seu partido e de aliados fisiológicos, Dilma dá aos primeiros contornos do seu próximo governo uma aparência semelhante ao que seus opositores defenderam durante a eleição.
CARTILHA COM PENA E BICO
Joaquim Levy, anunciado como novo ministro da Fazenda, é ligado
aos tucanos e um dos defensores do controle fiscal
e do arrocho das contas públicas
Joaquim Levy, anunciado como novo ministro da Fazenda, é ligado
aos tucanos e um dos defensores do controle fiscal
e do arrocho das contas públicas
A explicação para a mudança de rumo é simples: a presidente precisa tirar o País do atoleiro em que se encontra. E o sucesso do próximo mandato depende diretamente da retomada do crescimento e do controle dos gastos públicos, que andam desgovernados. Para fazer isso, foi preciso assumir, mesmo que a contragosto, que ela e sua equipe econômica erraram muito nos últimos anos. Ao reconhecer que algumas das propostas defendidas pelo adversário Aécio Neves (PSDB) durante a campanha eram mesmo vitais para a correção de rota, ficou difícil para Dilma fugir de uma composição ministerial com jeito de oposição e se livrar da acusação de ter cometido estelionato eleitoral.
Na última quinta-feira 27, a presidente
confirmou as expectativas que rondavam o mercado há algumas semanas e
oficializou sua nova equipe econômica. Em uma tentativa de reconstruir
suas relações com investidores e grandes empresários, escolheu o
economista Joaquim Levy para o Ministério da Fazenda. O novo ministro é
ligado aos tucanos e participou do governo de Fernando Henrique Cardoso
(PSDB). Ele defende, sem subterfúgios, rigor no controle fiscal e
arrocho das contas públicas, propostas que Dilma demonizou durante a
campanha.
TENSÃO NO CAMPO PETISTA - KÁTIA ABREU, rainha do agronegócio = desmoralização para o Stédile e corja do MST
Ao convidar Kátia Abreu, um símbolo do ruralismo e dos grandes latifúndios,
para comandar o Ministério da Agricultura, Dilma bate de frente com o PT
Ao convidar Kátia Abreu, um símbolo do ruralismo e dos grandes latifúndios,
para comandar o Ministério da Agricultura, Dilma bate de frente com o PT
As ironias que envolvem a escolha não param
por aí. Levy mantém relações próximas com Aécio Neves e segue a mesma
linha do amigo Armínio Fraga, o economista que montou o plano de governo
da área para o PSDB na última eleição. Durante a campanha, Dilma
atribuiu a Fraga uma futura culpa pela recessão ou pela falta de comida e
emprego para os brasileiros de baixa renda, em um eventual governo
tucano. A opção por um ministro alinhado com o grupo do seu maior
adversário causou estranheza. “É uma decisão da presidente. É um quadro
qualificado, com quem tenho uma relação pessoal. Mas fico com uma
expressão usada hoje pelo ministro Armínio Fraga: a indicação de Joaquim
Levy é comparável a um grande quadro da CIA ser convidado para comandar
a KGB.”
A inclinação de Dilma em direção às ideias
da oposição, que ela combateu durante a campanha, ficou evidente também
em relação aos juros. A presidente repetiu diversas vezes que as
propostas econômicas do PSDB, e a promessa de perseguir o controle da
inflação, iriam causar o aumento dos juros e provocar recessão e
desemprego. Seus programas e seus discursos demonstravam que essas
propostas estavam distantes dos planos do PT. No dia seguinte ao
resultado do segundo turno da eleição, no entanto, ela anunciou o
reajuste dos combustíveis. Dois dias depois, o Banco Central aumentou as
taxas de juros para 11,25%, o maior patamar em três anos. A decisão
pegou o mercado de surpresa e evidenciou quão pouco valiam as promessas
eleitorais da presidente.
Embora a repercussão da escolha do novo
ministro da Fazenda alinhado com as metas fiscais e o controle das
contas desperte certo otimismo, ainda há um clima de desconfiança em
relação à postura de Dilma, que sempre tentou comandar a política
econômica ditando as regras pessoalmente. Agora, Levy assume com a
promessa de independência e carta-branca para tomar o rumo de uma
sonhada – e ainda improvável – guinada na economia. Em sua primeira
aparição pública depois da confirmação de seu nome, Levy, acompanhado do
escolhido para o Planejamento, Nelson Barbosa, e de Alexandre Tombini,
que fica no Banco Central, deixou claro que é ortodoxo e que vai
trabalhar para restabelecer o superávit primário nas contas públicas e
atingir uma economia de 1,2% do PIB em 2015. “Alcançar essas metas será
fundamental para um aumento da confiança e criará bases para a retomada
do crescimento da economia e da evolução dos avanços sociais”, disse
Levy.
Em muitos aspectos manifestados depois do
resultado das urnas, a presidente reeleita parece outra pessoa. Antes,
ela se armava com números – muitas vezes equivocados – sobre a economia,
adotava um discurso repetitivo de que não havia descontrole de gastos e
que a inflação a 6,5% estava controlada. Agora, sua nova equipe
econômica vai promover cortes, trabalhar para puxar a inflação para a
meta de 4,5% e adotar as medidas impopulares que a então candidata
tantas vezes, em tom de ameaça de quem previa o caos, disse que seus
adversários adotariam. Ao escalar seu time, Dilma mostrou que ficou
impossível continuar atuando como a personagem que tem o controle de um
País próspero, à imagem e semelhança do que era mostrado nos programas
eleitorais elaborados pelo marqueteiro de campanha, João Santana.
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