Testemunhas de acusação em processo contra ex-presidente foram unânimes em apontar a existência de um azeitado esquema criminoso;
Delcídio reiterou a onisciência de Lula, mas todas disseram ignorar se ele é mesmo o dono do tríplex do Guarujá
Como é sabido, uma das perguntas que as
pessoas mais se fazem, antipetistas ou petistas, é esta: “Quando Lula
será preso?”. Um grupo torce para que seja logo; outro, para que seja
nunca. Ser o chefão do PT preso preventivamente ou não depende só da
ação do Ministério Público Federal e dos juízes Sergio Moro, da 13ª Vara
Federal de Curitiba, e Wallisney Oliveira, da 10ª Vara Federal de
Brasília, onde o ex-presidente é réu duas vezes. Se e quando o MP
entender que há motivos, creio que apresentará a solicitação a uma das
duas varas, e um dos dois juízes vai alegrar um grupo e frustrar o
outro. E por que o MPF não pediu até agora? Em vez de exercícios divinatórios, que tal a gente tentar ler e ouvir o que anda na Justiça?
Vem muito
debate-boca por aí… Aliás, ele já começou a ressoar nesta segunda, no
primeiro dia de depoimento das testemunhas de acusação na ação de que
Lula é réu em Curitiba: é aquela que apura se ele foi beneficiado por
vantagens indevidas no tal tríplex de Guarujá. Segundo denúncia do
Ministério Público Federal, aceita por Moro, o petista teria recebido R$
3,7 milhões da empreiteira OAS na forma da aquisição do apartamento, na
sua reforma e decoração e no armazenamento de parte de seu acervo
pessoal. O ex-presidente é acusado de corrupção passiva e lavagem de
dinheiro.
Os advogados
de defesa e Moro chegaram a trocar palavras ríspidas. Falaram como
testemunhas da acusação, nesta segunda, o ex-senador Delcídio do Amaral;
Eduardo Leite e Dalton Avancini, ex-diretores da Camargo Corrêa, e
Augusto Mendonça, do grupo Setal.
Todos eles são delatores. Ruim para o
PT: todos foram unânimes em apontar a existência de um azeitado e
gigantesco esquema de propina, que tinha partidos e políticos como
beneficiários — e, obviamente, no centro do teatro de operações, estava o
PT, de que Lula sempre foi o chefe máximo. Delcídio foi o mais
eloquente em afirmar que o ex-presidente sempre soube de tudo.
Bom para
Lula: todos também foram unânimes em afirmar que desconheciam se o tal
tríplex foi adquirido por ele ou foi reformado com dinheiro de propina.
Para lembrar: o apartamento de Guarujá está em nome da OAS. O MPF diz
que o conjunto de circunstâncias aponta que o imóvel pertence a Lula e
que o fato de a empreiteira aparecer como dona é uma evidência
justamente da lavagem de ativos. Os ouvidos também disseram jamais ter
tratado pessoalmente de propina com Lula.
Os advogados
do ex-presidente aproveitaram o fato de que as testemunhas disseram
nada saber do apartamento e emitiram uma nota em que se lê: “Como era esperado, os quatro delatores
arrolados pelo Ministério Público Federal para depor em audiência
realizada nesta data (21/11) na 13ª Vara Federal Criminal de Curitiba
não apresentaram qualquer elemento que confirme a tese acusatória
relativa à propriedade de um apartamento tríplex, no Guarujá, pelo
ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva e sua esposa, Marisa Letícia.
Tampouco afirmaram a participação do ex-Presidente em qualquer ilícito
na Petrobrás. O ex-senador Delcídio do Amaral, um dos delatores ouvidos,
disse nada saber sobre essa acusação do tríplex, limitando-se a repetir
suas já conhecidas afirmações vagas e sem provas. Há muito Delcídio vem
falando que Lula desta vez “não escapa”. Essa obsessão por incriminar o
ex-Presidente, mesmo sabendo de sua inocência, foi hoje mais uma vez
comprovada. Delcídio foi incapaz de apontar um fato ou conversa concreta
em relação a Lula.”
[Ruim para Lula: o depoimento de testemunhas - que no velho e bom direito é também chamada de a prostituta das provas - é apenas um dos elementos que pode inocentar ou condenar um réu.
No caso de Lula existe vários outros meios válidos como prova e que certamente provarão que Lula neste processo é culpado de: corrupção passiva e lavagem de
dinheiro.]
Nesta quarta
e na sexta, estão previstos os depoimentos de três outros delatores —
os ex-diretores da Petrobras Paulo Roberto Costa e Nestor Cerveró e o
ex-deputado Pedro Corrêa — e do pecuarista e amigo de Lula José Carlos
Bumlai.
Irritação
Moro acabou se irritando com o que considerou excesso de questões de ordem propostas pela defesa, que tentou impedir a linha de argumentação do MPF segundo a qual Lula só poderia ser beneficiário dos escândalos da Petrobras uma vez que a ele cabia, em última instância, decidir quem seria e quem não seria nomeado para a estatal. Moro chegou a pedir ao MPF que corrigisse algumas questões, mas acabou acusando os defensores do ex-presidente de “tumultuar a audiência”. Segundo o juiz, tal linha de argumentação servia para dar o contexto do caso. O advogado Juarez Cirino reagiu: “Mas qual é o contexto? Só existe na cabeça de vossa excelência. O contexto, para nós, é a denúncia”.
Moro acabou se irritando com o que considerou excesso de questões de ordem propostas pela defesa, que tentou impedir a linha de argumentação do MPF segundo a qual Lula só poderia ser beneficiário dos escândalos da Petrobras uma vez que a ele cabia, em última instância, decidir quem seria e quem não seria nomeado para a estatal. Moro chegou a pedir ao MPF que corrigisse algumas questões, mas acabou acusando os defensores do ex-presidente de “tumultuar a audiência”. Segundo o juiz, tal linha de argumentação servia para dar o contexto do caso. O advogado Juarez Cirino reagiu: “Mas qual é o contexto? Só existe na cabeça de vossa excelência. O contexto, para nós, é a denúncia”.
Entenda o embate jurídico
Notem: assim como os que depuseram nesta segunda, também as outras testemunhas arroladas pelo MPF dirão que nada sabem sobre Lula ser ou não dono do tríplex — até porque, reitere-se, o apartamento não está em seu nome. Podem apostar nisso. Qual é a lógica da acusação? Arrolar testemunhas que indiquem que o petista sempre esteve no controle de tudo. Se isso é verdade e se sobram evidências da proximidade de Lula e sua família com o apartamento, então se provaria, pelo conjunto da obra, que o imóvel, a reforma e a transferência do acervo fizeram parte das vantagens indevidas recebidas pelo ex-presidente.
Notem: assim como os que depuseram nesta segunda, também as outras testemunhas arroladas pelo MPF dirão que nada sabem sobre Lula ser ou não dono do tríplex — até porque, reitere-se, o apartamento não está em seu nome. Podem apostar nisso. Qual é a lógica da acusação? Arrolar testemunhas que indiquem que o petista sempre esteve no controle de tudo. Se isso é verdade e se sobram evidências da proximidade de Lula e sua família com o apartamento, então se provaria, pelo conjunto da obra, que o imóvel, a reforma e a transferência do acervo fizeram parte das vantagens indevidas recebidas pelo ex-presidente.
Quem vai
tomar a decisão? Sergio Moro. Importante: os testemunhos são apenas um
dos elementos do processo. Há outros dados que ele pode considerar
probatórios. Se achar que o conjunto prova a acusação do MPF, vai
condenar Lula. “Aí ele vai preso, né?” Depende da sentença. E caberá
recurso. Segundo decisão recente do Supremo, o cumprimento da pena de
prisão já pode se dar a partir da condenação na segunda instância, não
na primeira. “Mas será
que existe a chance de Moro absolver Lula, Reinaldo?” Bem, chance sempre
existe. Afinal, ele é um juiz. Não um juiz de condenação. Isso não
existe. Mas nem o mais otimista dos petistas acredita nisso.
Fonte: VEJA - Blog do Reinaldo Azevedo
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