Um presidente extremamente impopular como Michel
Temer, cujo apoio está abaixo de 10% nas pesquisas mais recentes,
conseguir montar uma base de sustentação no Congresso tão fiel a ponto
de ter tido, segundo pesquisa do Estadão Dados publicada ontem, um
índice de aprovação de 88% de suas iniciativas, é o paradoxo que rege
nossa política atual, desafia os estudiosos, mas, sobretudo, inquieta os
oposicionistas.
O paradoxo da presidência Temer é esse, um
presidente congressualmente forte e politicamente fraco. Ao contrário do
que ele mesmo disse, numa tentativa frustrada de demonstrar
despreocupação com sua taxa ínfima de popularidade, um presidente que se
dispusesse a fazer reformas como o controle de gastos e da Previdência
precisaria ser muito popular para poder perder gordura e aprovar essas
reformas.
No entanto, não tendo esse prestígio popular, ele é capaz
de levar o Congresso a aprovar medidas dificílimas, embora necessárias,
um Congresso tão desmoralizado e impopular que busca se afirmar
justamente atuando na contramão do populismo, embora em alguns casos,
como na negociação da dívida dos Estados, namore com a leniência para
agradar as corporações.
A revelação de que ele colocou como meta ser
reconhecido pela História como o presidente que realizou as reformas
estruturantes de que o país necessita dá uma dimensão maior ao seu
mandato. Dois cientistas políticos da Fundação Getulio Vargas do Rio,
Octavio Amorim Neto e Carlos Pereira, este em ano sabático em Berlim,
têm visões semelhantes desse fenômeno: a última possibilidade que a
atual classe política tem de não ir para a lata do lixo da História é
aprovar as reformas estruturais.
Para Octavio Amorim Neto, o fato de
Temer não ter sido eleito diretamente é um problema num regime
presidencialista como o nosso, embora na sua visão ele tenha chegado à
presidência de maneira legítima. Mas esse não é um problema insanável,
diz ele. Temer substituiu Dilma num processo traumático, muito
polarizado e contestado numa certa elite política, mas a maioria da
população não gostava da Dilma e apoiou sua destituição.
A grande
aposta do Palácio do Planalto hoje, diante dessa crise estrutural da
política brasileira, e dessa crise de credibilidade que ameaça Temer, é
ser o único que se dispõe a fazer uma duríssima reforma econômica, no
que é seguido pelo Congresso. Mas Octavio Amorim Neto acha que, já que o
estilo de Temer é a disposição de negociar e conceder, ele terá
dificuldades para fazer uma reforma que aponte para uma nova trajetória,
e enfrentar as corporações que estão derrotando os esforços de reajuste
fiscal nos Estados como o Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul.
A
condição fundamental para a retomada do crescimento econômico, para
mudar as expectativas de empresários com relação à dívida pública e da
política fiscal é a reforma da Previdência, mas Octavio Amorim Neto tem
dúvidas sobre se o governo Temer, fraco do ponto de vista de sua relação
com a opinião pública e com a sociedade, pode fazer uma boa reforma da
Previdência.
Carlos Pereira acha que as chances de o Congresso
aprovar reformas estruturais polêmicas como a da Previdência são
enormes. Ele chega a imaginar que talvez o governo Temer se transforme
no mais reformista da história recente do Brasil. Pereira considera
que havia uma ideia equivocada da esquerda brasileira de que a crise
política teria continuidade no governo Temer, mas ele ressalta que a
crise atual é completamente diferente da que levou ao impeachment da
ex-presidente Dilma. Na sua análise, o Executivo sob Dilma tratou mal
sua base parlamentar, montou uma gerência de coalizão completamente
ineficiente, muito heterogênea, que não compartilhou nem poder nem
recursos de forma proporcional com os aliados.
O governo Temer, ao
contrário, é extremamente eficiente.Temer montou uma coalizão muito
representativa do Congresso, e isso é raro, diz ele. A coalizão atual,
que teve um índice de eficiência na aprovação das medidas apresentadas
de 88%, é mais eficaz do que a de Fernando Henrique Cardoso que, na
análise de Carlos Pereira, havia sido a mais eficaz até o momento.
Fonte: Merval Pereira - O Globo
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