Edição do Alerta Total
O que acontece
quando poderes e poderosos sem controle, sem limites delimitados pela
sociedade, resolvem guerrear entre si, sem parar? Acontece exatamente o que
estamos vendo hoje no Brasil: uma guerra de todos contra todos os poderes. O
resultado é a mais grave crise institucional nunca antes vista na História
deste País. Quem reclama já perdeu... Todo mundo briga, e pouco importa quem
tem razão. A próxima vítima pode ser qualquer um... Os
poderosos só não querem, ou fingem não admitir, que tamanha crise é a conseqüência
maléfica da péssima Constituição Federal de 1988 – que esgotou-se e tem de ser
substituída por outra – que a sociedade brasileira comete o pecado mortal de
não debater. Nesta omissão ou incompetência cidadã mora o perigo. A maior
desgraça do Brasil é a insegurança do Direito. Não temos Democracia de verdade.
O Crime Institucionalizado impõe sua ditadura com respaldo constitucional.
As fraturas
institucionais ficaram expostas com o episódio criminoso no qual hackers, com
clara motivação e patrocínio político, invadiram smartphones de “autoridades”
de todos os poderes da República de Bruzundanga. A quantidade de “vítimas” da hackeagem
causou pavor generalizado. Imagina se vem a público parte ou todo de algumas
conversas e informações obtidas ilegalmente? A inconfidência teria potencial de
assassinar a reputação de muita gente nos três poderes e na extrema-imprensa
que também entra na dança. A briga de
maior potencial destrutivo foi magistralmente descrita em uma entrevista
rapidinha do gênio genioso Gilmar Mendes: “Esta é a maior crise que se abateu
sobre o aparato judicial do Brasil desde a redemocratização. É a maior crise
com o envolvimento de dois eixos chaves: a Justiça Federal, que está com seu
prestígio muito abalado, e a PGR, que, na sua inteireza, está com o prestígio
muito abalado. Ninguém quer saudar hackeamentos e iniciativas desse tipo, mas
as revelações são extremamente graves”.
O
constitucionalista Gilmar descreveu, direitinho, o caos. Fora de controle, os
aparelhos repressivos do Estado-Ladrão tupiniquim estão se comendo vivos. As críticas
dos envolvidos nas pancadarias ajudam a entender o cerne do problema. O Sindifisco
nacional repudiou a decisão “arbitrária e inédita” do ministro Alexandre de
Moraes de suspender todos os procedimentos investigatórios que atinjam
autoridades (no caso, os supremos magistrados Gilmar Mendes, José Dias Toffoli
e as esposas de ambos). O Sindifisco reclamou que Moraes “ocupa ilegalmente a
dupla função de Ministério Público e de magistrado e que se trata de um verdadeiro
tribunal de exceção, com objetivo claro de transformar poderosas autoridades
públicas em contribuintes intocáveis”.
Especificamente
sobre a “hackeagem” sofrida pelo coordenador da Força Tarefa da Lava Jato,
Deltan Dallagnol, e outros membros do Ministério Público Federal, a Associação
Nacional dos Procuradores da República também protestou que as decisões
judiciais adotadas pelo ministro Moraes com base no inquérito número 4.781
colocam em xeque a isenção e a imparcialidade do Poder Judiciário e produzirão
elementos nulos em qualquer processo. A entidade também advertiu que o Supremo
Tribunal Federal não poderia requerer mensagens cujos “respectivos dados foram
obtidos de forma criminosa, por meio de captação ilícita, violando os
postulados do estado democrático de direito”. O fogo
contra fogo entre STF e PGR escancara o problema estrutural: quem controla
quem? Ministros do Supremo não podem
ser investigados por procuradores da primeira instância federal, como Dallagnol
e os demais integrantes da força-tarefa. Só podem ser investigados com
autorização do próprio Supremo e pelo procurador-geral da República (aquele
cargo que o Presidente Jair Bolsonaro não tem o direito de errar na escolha,
porque seu ocupante tem o poder de ser o “processador” ou o “engavetador” de
investigações, inquéritos e processos contra os superpoderosos).
No meio do quebra-pau com a PGR, alguns no Supremo ainda aproveitam para guerrear
contra o Presidente Jair Bolsonaro. O ministro Celso de Mello aproveitou a
vacilada na edição de uma mesma medida provisória sobre assunto idêntico na
mesma legislatura (no caso da demarcação de reservas indígenas) para detonar:
“O comportamento
do atual senhor presidente da República, revelado na reedição de medida
provisória, clara e expressamente rejeitada pelo Congresso Nacional no curso da
mesma sessão legislativa, traduz uma inaceitável transgressão à autoridade
suprema da Constituição Federal, e representa uma inadmissível e perigosa
transgressão ao princípio fundamental da separação de poderes, consagrada, como
sabemos, no artigo 2º da lei fundamental da República. É sempre preciso
advertir, senhor presidente, que o regime de governo e as liberdades da
sociedade civil muitas vezes expõem-se a um processo de quase imperceptível
erosão, destruindo-se lenta e progressivamente pela ação ousada e atrevida,
quando não usurpadora, dos poderes estatais".
Felizmente, no meio da pancadaria, aparece uma voz de lucidez. Aproveitando
uma palestra pública no interior de São Paulo, o ministro Luís Roberto Barroso
produziu a crítica mais sensata sobre a “hackeagem” em meio à guerra de todos
contra todos e no combate da sociedade brasileira contra a corrupção sistêmica
e o Crime Institucionalizado:
“É preciso
estar atento porque parte da agenda brasileira hoje foi sequestrada por
criminosos. É muito impressionante a quantidade de gente que está eufórica com
os hackeadores, celebrando o crime e, na minha percepção, há mais fofocas do
que fatos relevantes, apesar do esforço de se maximizarem esses fatos. Com um
detalhe - e se tiver coisa errada, o que é certo é certo, o que errado é errado
- porém, há um detalhe importante aqui. É que, apesar de todo estardalhaço que
está sendo feito, nada encobre o fato de que a Petrobras foi devastada pela
corrupção. Não importa o que saia nas gravações. A Petrobras precisou fazer um
acordo de US$ 3 bilhões em Nova York com investidores estrangeiros, ou então o
Judiciário americano faz parte da conspiração. Teve que fazer um acordo de mais
de US$ 800 bilhões com o Departamento de Justiça americano, que certamente não
fará parte de nenhuma conspiração. Portanto, nada encobre a corrupção
sistêmica, estrutural e institucionalizada que houve no Brasil. É difícil
entender a euforia que tomou muitos setores da sociedade diante dessa fofocada
produzida por criminosos”.
Resumindo a
salada de declarações polêmicas: a guerra de todos contra todos vai longe...
Toda pancadaria é o resultado direto de uma Constituição Federal que precisa
ser mais “interpretada” do que efetivamente “cumprida”. Esta Constituição Vilã
não deixa claro quais são os limites investigatórios dos aparelhos repressivos
estatais. Os abusos de autoridade acontecem e se repetem porque a Carta Magna
permite que os poderosos controlem a sociedade, mas não o contrário: que a
sociedade tenha controle direto sobre os poderes e seus agentes. Enquanto
tal debate não for efetivamente realizado, a guerra de todos contra todos só
vai aumentar, produzindo mais vítimas, de forma justa ou injusta. Os cidadão
precisam ter a capacidade, prevista constitucionalmente, de fiscalizar e
controlar, diretamente, todos os poderes da República. Sem o Controle Social
Preventivo, nossas variadas “gestapos” estatais continuarão hegemônicas,
promovendo “rigor seletivo” ou “impunidade conveniente” (duas facetas da falta
de efetiva Democracia).
Quem sabe
as coisas não começam a mudar mais depressa, agora que o Supremo Tribunal
Federal também constatou que seus “deuses” também são alvos fáceis da falta de Democracia? Resumindo,
novamente: Ou discutimos e desenhamos um Projeto Estratégico de Nação, com uma
Constituição fácil de ser cumprida objetivamente, sem tantas interpretações
supremas, ou seguiremos na guerra de todos contra tolos, sob domínio do Crime
Institucionalizado...
Por Jorge Serrão - transcrito Edição do Alerta Total
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