O Estado de S.Paulo
A pressão externa sobre a Receita Federal colocou em evidência a
segurança do armazenamento dos dados dos contribuintes pelos servidores
do órgão. O Fisco tem hoje 600 sistemas de informações dos contribuintes empresas e
pessoas físicas. Garantir sua inviolabilidade é função primordial de um
País com economia do tamanho da brasileira. Essa proteção ganhou ainda mais importância no momento atual, em que o
órgão é alvo de críticas de ministros do STF, do presidente Jair
Bolsonaro e de outras autoridades que foram investigadas por auditores
fiscais da elite da Receita. Informações sigilosas sobre os negócios e a
vida privada dos contribuintes e de seus familiares é munição certeira
para uso político, independentemente do espectro ideológico em que ele
esteja. A punição da corregedoria do órgão para esse tipo de prática tem
que ser exemplar.
É por meio das informações de “log” de consultas que o Fisco consegue
identificar que servidor fez o acesso, horário, modificação de conteúdo,
tempo de permanência, quantidade de cópias impressas de dados e tudo
que possa apontar depois,se houve acesso imotivado para fins não
republicanos. Funciona como uma espécie de impressão digital do usuário
do sistema. Os “logs” de acesso, a depender das suas características, ficam
armazenados por um período de 8 a 16 anos. A Receita paga por esse
serviço ao Serpro e ao Dataprev, empresas de processamento de dados do
governo federal.
Todo cuidado é pouco com esse tema tão delicado para que não haja motivo
também de ataques aos procedimentos de fiscalização do órgão. Muita
coisa está em jogo nesse momento, inclusive o trabalho de anos de
fortalecimento das investigações. Uma vez perdida, a confiança no sigilo
fiscal, muito tempo se leva para recuperá-la. A pressão por mudanças na Receita teve como origem o vazamento de
investigações realizadas por auditores envolvendo autoridades do STF e
reclamações de Bolsonaro sobre investidas do órgão contra seus
familiares. A crítica é de atuação política de auditores do órgão. A
crise ganhou força após a recomendação, por pessoas ligadas a Bolsonaro,
para a demissão de José Alex Nóbrega de Oliveira, titular da Delegacia
da Aduana de Porto de Itaguaí.
À coluna, a Receita informou que não há intenção de reduzir o tempo de
retenção dos “logs”. Pelo contrário: o órgão diz que avalia aumentar
ainda mais o controle sobre as consultas realizadas pelos auditores
fiscais. O sistema responsável pelos relatórios dos “logs” de acesso é o DW-LEL,
mas ele não é único. Há outros mecanismos de consulta aos “logs” de
sistemas. A alegação de que a auditoria dos “logs” seria inviável não
merece prosperar, diz a Receita. Mas é inegável também que precisa
reforçar os controles. O assunto ganha mais importância nesse momento em que o governo incluiu o
Serpro e a Dataprev na lista das estatais que serão privatizadas. Como o
governo vai garantir a segurança dos dados sigilosos é uma resposta a
ser dada rapidamente.
Prioridades
O projeto de orçamento de 2020 chegou no Congresso e deve tirar boa
parte do tempo de negociação da agenda de medidas da área econômica no
segundo semestre. O patamar de despesas com investimentos e custeio – aquelas não
obrigatórias – foi fixado em apenas R$ 89 bilhões – mais baixo do o
valor previsto para esse ano (R$ 102 bilhões). Não dá para a máquina sobreviver. Ou o governo negocia medidas para
abrir espaço no teto de gasto do ano que vem, ou esse instrumento de
política fiscal de controle do crescimento das despesas corre sério
risco de ser descumprido. Esse risco estava no radar. O governo demorou para começar a discutir as
medidas que poderão ser adotadas para dar folga ao teto de gasto.
Agora, terá que lidar com essa pauta nos próximos meses.
Mesmo script de governos passados. As prioridades também continuam distorcidas. Os militares serão os únicos servidores contempladas com reajustes
salariais na proposta orçamentária. O custo? R$ 4,73 bilhões. Gasto que
responde por um terço do aumento de R$ 12,03 bilhões das despesas de
pessoal. Dinheiro que poderia ser drenado para outras áreas mais
prioritárias, como os investimentos que vão para o chão no ano que vem:
R$ 19,3 bilhões. É nada.
Adriana Fernandes - O Estado de S. Paulo
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