Vozes - Gazeta do Povo
A demissão do comentarista Tiago Pavinatto da rádio Jovem Pan é mais uma vergonha na história de vergonhas que a grande maioria dos donos de veículos de comunicação, dia após dia, está construindo no Brasil dos nossos dias.
É, ao mesmo tempo, uma demonstração a mais de que o grosso da mídia brasileira realmente não precisa de censura, de regulamentação ou de “controle social”, como exigem o tempo todo o STF e o governo Lula. Para quê? Os próprios veículos são os maiores censores em ação neste país – talvez estejam fazendo até mais do que gostariam de fazer as polícias do pensamento operadas pelo Sistema Lula-STF.
O comentarista dirigiu, no ar, palavras muito duras contra um desembargador de São Paulo; e a emissora quis que ele fizesse um pedido público de desculpas, e como Tiago se recusou a fazer, foi mandado embora.
Não se trata tanto, no caso, de saber o que Tiago disse, mas o que o desembargador fez. Foi o seguinte: Sua Excelência absolveu um pedófilo que estuprou uma menina de 13 anos, com o argumento de que a vítima era “prostituta” e “bêbada”.
Um juiz que faz uma coisa dessas não pode esperar comentários ponderados, respeitosos e suaves a respeito da sua decisão; ela é pública e, portanto, está sujeita à apreciação pública.
O comentarista, que também é um advogado de excelente reputação profissional, julgou que a sentença foi indecente, tanto quanto o juiz. Sua avaliação é sólida.
O crime de estupro, pelo texto do Código Penal, não isenta o autor de responsabilidade nos casos em que a violência é cometida contra bêbadas, prostitutas, ou seja lá o diabo que for. Estuprou? Então é crime.
Dizer que não houve estupro, porque a menina aceitou, é pior ainda. Toda e qualquer relação sexual com menores de 14 anos é estupro; não faz a menor diferença o consentimento da vítima.
Um juiz que faz uma coisa dessas não pode esperar comentários ponderados, respeitosos e suaves a respeito da sua decisão; ela é pública e, portanto, está sujeita à apreciação pública
A Jovem Pan considerou que o culpado dessa história é Tiago Pavinatto – e que a parte ofendida é o juiz que inocentou o pedófilo e condenou a criança. O desembargador se sentiu insultado? Perfeito: é só entrar com um processo contra o comentarista por crime de injúria; não é por falta de advogado que sua causa deixará de ser apreciada pela justiça.
Mas a Jovem Pan se antecipou ao próprio juiz e, antes de qualquer decisão legal sobre o caso, decidiu que o seu colaborador tinha de pedir desculpas. Ele achou que não havia a menor razão para fazer isso – pedir desculpas a um cidadão que absolve um estuprador de crianças e acusa a vítima? Não senhor, muito obrigado. É esse, justamente, o grande problema de Tiago Pavinatto.
Ele é um comunicador independente e tem a coragem de dizer o que pensa, coisas intoleráveis para o consórcio das redações onde se pratica o jornalismo brasileiro de hoje – uma mistura grossa de propaganda do governo com militância mal resolvida no “campo democrático”.
Para piorar, é ao mesmo tempo inteligente e conservador.
No Brasil de hoje isso é crime inafiançável.
J. R. Guzzo, colunista - Gazeta do Povo - VOZES
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