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terça-feira, 5 de dezembro de 2017

É indevido a PF fechar acordos de delação



Subordinadas ao Executivo, polícias não podem ser responsáveis por acertos sobre colaboração premiada, pelo risco de influência política

As corporações se movem pela lógica do interesse próprio, sem qualquer outra preocupação. Exemplo atual são as pressões de castas da burocracia estatal para que a reforma da Previdência não reduza privilégios que as tornaram segmentos incluídos nas faixas de renda mais elevada da população. Costuma haver, também, entre corporações que atuam no Estado, choques na defesa de espaços de poder.

Mas, embora pareça à primeira vista, não é o que acontece na disputa entre o Ministério Público e a Polícia Federal sobre a atuação nos acordos de colaboração premiada, instrumento-chave no combate em curso aos esquemas de corrupção montados por políticos e empreiteiros para desviar dinheiro público por meio de contratos superfaturados assinados principalmente com estatais. É este o caso do petrolão de PT, PMDB, PP e aliados, um escândalo de centenas de milhões de dólares, de repercussão mundial.

A desavença se baseia em duas delações firmadas pela PF: com o marqueteiro do PT Duda Mendonça e Marcos Valério, responsável por usar em benefício do partido a tecnologia de lavagem de dinheiro que desenvolvera para o PSDB mineiro, na campanha frustrada de reeleição de Eduardo Azeredo. Serviu de ensaio para o mensalão do PT.

Em abril do ano passado, o ainda procurador-geral Rodrigo Janot entrou no STF com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) contra parágrafos do artigo 4º da lei de 2.013, das organizações criminosas — que trata das delações —, pelos quais a Polícia Federal se considera em condições de fechar acordos de delação. A Procuradoria-Geral da República considera inconstitucional o desejo da PF.

Faz sentido a argumentação do Ministério Público, como ficou claro em artigo publicado domingo no GLOBO pelo procurador Carlos Fernando dos Santos Lima, da força-tarefa da Lava-Jato, em Curitiba.  Além de citar o artigo 129, da Constituição, Carlos Fernando trata da questão central de a polícia — pois não só a PF teria este poder — estar subordinada ao poder político. Não é difícil prever o que acontecerá em cidades menores, de baixa visibilidade nacional, na negociação de acertos de colaboração premiada.

De fato, a subordinação das polícias ao Executivo não aconselha que elas tenham esta prerrogativa. Mesmo que fosse apenas a PF. Cabe lembrar os interesses que envolveram a escolha de Fernando Segovia para substituir Leandro Daiello na direção-geral da Polícia Federal. A gestão de Daiello foi importante para avanços da Lava-Jato.
Outra lembrança oportuna é a do grampo em que o senador Aécio Neves (PSDB-MG) dá dicas de como se manipular inquéritos na Federal, pela escolha de delegados confiáveis na distribuição dos casos.

A relatoria da ADI é do ministro Marco Aurélio Mello, que já informou à presidente da Corte, Cármen Lúcia, que ela pode agendar o julgamento. Será mais uma decisão da Corte de extrema relevância para o equilíbrio e independência entre poderes. Neste caso, a fim de que se mantenham condições mínimas institucionais para o Estado poder enfrentar com eficácia a criminalidade, e não apenas a de colarinho branco.

Editorial - O Globo

 

domingo, 19 de novembro de 2017

O que se espera do novo diretor-geral da PF

O noticiário sobre padrinhos de Segóvia não é animador, mas, se cumpridas promessas feitas em entrevistas, o necessário combate à corrupção será preservado

Sem nunca ter sido um cargo menor na alta burocracia estatal, a direção da Polícia Federal ganhou mais importância à medida que organismos públicos receberam musculatura e passaram a flexioná-la no enfrentamento à corrupção nas elites políticas e empresariais.  Foi dessa forma que o Ministério Público, fortalecido institucionalmente pelos constituintes da Carta de 88, entrou no radar das preocupações dessas elites. 

Assim como a PF, parceira do MP em ações que, em especial, desde março de 2014, com a ida às ruas da Lava-Jato, passaram a tentar virar o jogo neste enfrentamento, em que nunca o princípio republicano da lei valer para todos valia de fato. Ocorrera antes o histórico desbaratamento do mensalão petista, quando o Supremo, contra as expectativas, condenou poderosos a sentenças de reclusão. Mas a Lava-Jato tem sido o marco mais visível desta mudança.

É pelo fato de este avanço de instituições que vigiam a aplicação de princípios republicanos inscritos na Constituição ainda não estar consolidado que a transferência do cargo de diretor-geral da PF de Leandro Daiello para Fernando Segovia, previsto para amanhã em Brasília, se constitui em bem mais que um ato protocolar.  Segovia, já empossado, aterrissa em um cenário inóspito para ele. Isso, devido às diversas manobras para emparedar a Lava-Jato ou qualquer outra operação do tipo que avance contra esquemas de corrupção que se cristalizaram no país com a participação de políticos, parlamentares ou não, e grande fornecedores de bens e serviços ao Estado.

As pressões contra a repressão à corrupção deixaram de ocorrer no varejo e passaram a se dar no Congresso e em outros ambientes acarpetados da burocracia estatal. Não apenas no Legislativo. Idêntico ao que aconteceu na Itália das Mãos-Limpas, operação semelhante à Lava-Jato, estrangulada afinal por movimentos como os que estão em curso em Brasília. A escolha de Segovia é parte deste enredo, pelas especulações que a envolvem. É desaconselhável adjetivar-se uma gestão que mal começa. Mas pairam sobre ela preocupações. Segovia e auxiliares dão declarações positivas nas primeiras entrevistas — acelerar inquéritos na instância do Supremo, não proteger políticos, apoiar a Lava-Jato, etc. É mesmo o que se espera deles.

Em contrapartida, há o noticiário sobre o apoio ao novo diretor da PF por parte do ministro Eliseu Padilha, alvo da Lava-Jato, e de Sarney, símbolo do núcleo do PMDB que trabalha para, por ações legislativas, conter organismos de vigilância do Estado na defesa do dinheiro do contribuinte. O prejulgamento é um erro. O antecessor de Segovia, Leandro Daiello, assumiu com Lula, trabalhou no governo Dilma e, assim, demonstrou que é possível exercer com seriedade funções de Estado tendo sido nomeado por um governo. Confirmar isso é o que se espera de Segovia.

Editorial - O Globo

 

quarta-feira, 8 de novembro de 2017

Novo chefe da Polícia Federal agrada a políticos e teve apoio de Padilha e assessor de Temer



O novo chefe da Polícia Federal escolhido pelo presidente Michel Temer, Fernando Segóvia, era o candidato defendido por políticos para ocupar o posto de Leandro Daiello, que está no cargo desde 2011, o primeiro ano de governo de Dilma Rousseff.  Entre os políticos que fizeram campanha para Segóvia estão o ministro-chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, e o subchefe de assuntos jurídicos da pasta e um dos principais conselheiros do presidente, Gustavo Rocha.
O delegado Fernando Segóvia será o novo diretor-geral da Polícia Federal - Zeca Ribeiro / Agência Câmara 20/08/2013

O candidato apoiado por Daiello era é diretor-executivo da corporação Rogério Galloro. O nome dele chegou até a mesa do presidente Temer, mas enfrentou forte resistência da classe política que apoiava Segóvia.  Na avaliação da atual cúpula da PF, Temer não faria nenhuma troca de chefia antes que a segunda denúncia contra ele fosse votada na Câmara dos Deputados. O presidente anuncia a escolha de Segóvia menos de um mês após a votação que enterrou a denúncia oferecida pela Procuradoria-Geral da República.



Não é só o grupo de Daiello que vê a nomeação de Segóvia como um ato de grande influência política. Nos bastidores, a Associação dos Delegados da Polícia Federal (ADPF) tem a mesma avaliação.  A associação não apoiava Daiello e chegou a fazer uma lista com nomes de delegados para ocupar o cargo de diretor-chefe da PF. No entanto, passou a apoiar que ele permanecesse à frente da corporação até o fim do governo Temer depois que tomou conhecimento da mobilização dos políticos para nomear Segóvia. Segóvia foi superintendente da Polícia Federal no Maranhão e tem proximidade com políticos locais como o ex-presidente José Sarney.

 Transcrito de O Globo