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terça-feira, 6 de setembro de 2022

Quem são os católicos ultraconservadores que vão às ruas por Bolsonaro

Monarquistas, anti comunistas e radicais, eles são pouco numerosos, mas mobilizam um eleitorado fiel ao presidente da República 

 católicos conservadores

Conservadorismo em alta: apoio a Bolsonaro e contra a pauta progressista Evandro Éboli/VEJA

O radicalismo religioso segue como uma anomalia que resiste aos ventos modernizantes do século XXI, freando as liberdades individuais onde germina e revelando seu lado mais sombrio quando desemboca na política. Ele se pronuncia em diversos pontos do globo com as nuances de cada cenário. No Brasil, grupos radicais de variadas vertentes religiosas, que andavam num segundo plano desde os anos de 1980, pós-ditadura militar, despertaram com renovada capacidade de articulação quando o então candidato à presidência Jair Bolsonaro surgiu no cenário, abraçando a pauta conservadora posta à mesa por essas lideranças. Aglutinadas dentro e fora da igreja neste caso, em torno de organizações e institutos -, elas são adversárias da agenda progressista, rechaçando educação sexual nas escolas e direito ao aborto, entre outros tópicos.

Bolsonaro elegeu-se impulsionado por esta mescla de política e religião, tendo aí os evangélicos proeminência incomparável e ascendente. Mas outra força menos vistosa vem avançando a passos largos, ganhando ousadia e é essencial para embalar Bolsonaro nas eleições de 2022: são os chamados católicos fundamentalistas (terminologia adotada na academia). “Esse estrato do catolicismo tem enorme capacidade para orientar e fidelizar o voto, e o presidente o quer por perto”, avalia o especialista Victor Gama, da PUC-MG. Neste sete de setembro, eles estão nas ruas organizando atos públicos, como rezas, e gritando palavras de ordem contra o progressismo que consideram “marxismo cultural”.

VEJA identificou 43 desses grupos, alguns constituídos antes, outros bem recentemente, durante a era Bolsonaro – todos fora das igrejas, embora com laços umbilicais com elas e contando com a crescente inclusão de quadros religiosos que recrutam nos seminários. No passado nem tão distante assim, funcionava cada um por si, mas agora formam uma rede que extrapola até as fronteiras nacionais, dão cursos aos montes e tem canais no YouTube com milhões de seguidores e visualizações, onde disparam com verve raivosa sua visão ultra conservadora e francamente bolsonarista, com direito a pitadas de fake news.

Os vídeos, de linguagem didática, se manifestam a favor do voto impresso e disseminam a inaceitável balela antivacina, engrossando as milícias digitais do bolsonarismo, com as quais mantêm proximidade. Um dos porta-vozes desta corrente que exerce maior magnetismo é o padre Paulo Ricardo, da paróquia Cristo Rei, no Mato Grosso: ele é a favor de armar a população e já posou empunhando um fuzil ao lado de Olavo de Carvalho (astrólogo e guru do bolsonarismo a quem outros da turma são chegados). Eles começaram a aparecer na internet depois dos protestos de 2013, mas foi no atual governo que ganharam envergadura”, diz o historiador Rodrigo Coppe.

O alvo dos ataques são sempre figuras avessas ao seu ideário, parte delas egressa de hostes mais progressistas da própria igreja católica. Após recomendar a seus fieis o livro Teologia e os LGBT+, do jesuíta Luís Oliveira Lima, o padre Júlio Lancelotti conheceu a fúria fundamentalista em uma enxurrada de mensagens que o classificavam de comunista, herege e clamavam por sua expulsão da igreja. [Respeitosamente, recomendamos ao padre Julio Lancelotti a leitura da Carta de São Paulo aos Romanos, (cf. 1, 24-32), (cf. 1, 26-28), 1Cor 5, 11.13),  (1Cor 6, 9-10),  e de   (Mt 5, 28) (Mt 25, 11-13;25, 27-29;  25, 41-46) ( Mt 15, 19-20 Mc 17, 21-22;), (Lc 18, 11), e fechando com CHAVE DE OURO esta Catequese, por favor leiam: Estes seis pecados ficaram “fora de moda”...]

Há pouco mais de um mês, representantes desses grupos escalaram um novo e perigoso degrau, fora das redes. Descontentes com a pregação de um padre de Fortaleza, Lino Allegri, que durante a missa cutucou a gestão bolsonarista da pandemia, decidiram comparecer à paróquia de camiseta da Seleção Brasileira, interrompendo a homília aos gritos de “comunista!”. “Eles são incapazes de conviver com a diversidade de pensamento”, lamenta o padre Lino. em seguida, policiais militares foram convocados para garantir a segurança na porta da igreja.

Faróis do conservadorismo católico, o Centro Dom Bosco (CDB), baseado no Rio de Janeiro, e o Instituto Plinio Correia de Oliveira, a antiga TFP, em São Paulo, formam gente e lançam livros para divulgar seu pensamento país afora. No Dia da Consciência Negra, o Dom Bosco mobilizou sua tropa para encerrar uma missa de tradições africanas em uma paróquia do Rio. “Por definição, não existe catolicismo moderno ou progressista, ele é sempre conservador. Essas vertentes atuais não passam de falsificações”, desfia sua filosofia o presidente do CDB, Pedro Affonseca.

Monarquistas, os católicos radicais vêm se enfronhando nos gabinetes. Apoiaram com sucesso a eleição de dois deputados do PSL fluminense (Márcio Gualberto, estadual, e Chris Tonietto, federal) e se fazem ouvir por meio da Frente Parlamentar Católica Apostólica Romana, que costuma conduzir padres ao Planalto para benzer o presidente da República. A maioria se opõe ao Concílio Vaticano II, instituído na década de 60 com o objetivo de atualizar e aproximar a Igreja Católica de um mundo em transformação. Para os radicais, a cátedra de Pedro está vazia desde Pio XII, o último dos papas antes do Concílio, e não é bem representada por Francisco.

O recrutamento de novos adeptos tem se profissionalizado nos últimos tempos, com alto poder de atração sobretudo entre jovens seminaristas. “Eles atuam como uma espécie de escola subterrânea”, define Dom Joaquim Mol, da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil. “Os seminaristas se submetem ao processo formativo normal, enquanto deixam-se moldar por esse pessoal para, depois de ordenados, aplicarem o tradicionalismo e o fundamentalismo”. Esses grupos em geral orbitam em torno de uma mesma organização conservadora internacional, a Leadership Internacional, nos Estados Unidos, e têm laços com Steve Bannon, o enrolado ex-estrategista chefe da Casa Branca de Donald Trump que transformou um mosteiro fincado em uma gigantesca propriedade em Trisulti, perto de Roma, em quartel-general e escola de formação da extrema direita católica.

Acolhe ali ordens conservadoras como a de Malta e a do Santo Sepulcro. Dia desses, Bannon, que apelidou o presidente brasileiro de “Trump dos trópicos”, encontrou, em uma conferência conservadora no Texas, o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL), seu fã de carteirinha, aproveitando a oportunidade para desancar as urnas eletrônicas. No pleito perdido por Trump, aliás, católicos integrantes do grupo católico se plantaram em frente à embaixada americana em Brasília para rezar por sua reeleição, que não vingou. Religião e política, tudo junto e perigosamente misturado.

Política - Revista VEJA


domingo, 12 de dezembro de 2021

A briga inútil do capitão com o almirante da Anvisa - Elio Gaspari

Folha de S. Paulo - O Globo

Agência tem razões para se orgulhar de sua conduta durante a pandemia. Barra Torres preservou a credibilidade da instituição, e evitou bate-bocas e provocações

Bolsonaro pintou-se para uma nova guerra: “Estamos trabalhando agora com a Anvisa, que quer fechar o espaço aéreo. De novo, porra? De novo vai começar esse negócio?”

A Anvisa nunca sugeriu que se fechasse o espaço aéreo mas, diante do surgimento de uma nova variante do vírus, o presidente anteviu uma nova batalha. Ele não gosta da vacinação, preferia cloroquina e prefere viver no mundo da negação, supondo que com isso defende a economia. Há um ano, Bolsonaro dizia que a vacina CoronaVac não seria comprada. Comprou-a. Condenava o isolamento social e teve que aceitá-lo.

De fato, pode ser que comece tudo de novo, porque o governador João Doria anunciou que instituirá o passaporte de imunização em São Paulo. Ele comprou a vacina chinesa e em janeiro começou a aplicá-la. [o 'joãozinho', segundo Bolsonaro o 'calcinha apertada' faz qualquer coisa para chamar atenção e o método mais eficiente para ter êxito é ser contra Bolsonaro.]

Arrumou um ministro da Saúde capaz de dizer que prefere perder a vida à liberdade, como se esse dilema estivesse na mesa. Depois de ter fritado dois ministros que tomaram o partido da ciência e de ter amparado um general desastroso, o capitão sente-se confortável com o médico Marcelo Queiroga. É seu estilo, mas não precisava chamar a Agência de Vigilância Sanitária para a briga. Primeiro, porque a Anvisa é um órgão independente. Além disso, porque está atirando em um quadro de sua tropa, o médico e almirante Antonio Barra Torres, cujo pecado seria ter traçado uma linha no chão, além da qual não pisaria.
O Brasil está chegando perto da marca de 300 milhões de doses aplicadas, com cerca de 65% da população imunizada. Apesar disso, Bolsonaro prefere procurar uma nova briga.

Barra Torres pode ser visto como um exemplo do oficial que atendeu ao chamado do capitão. Militar e cavaleiro da Ordem de Malta, foi colocado na direção da Anvisa e em março de 2020, quando os mortos pela Covid eram cinco, acompanhou Bolsonaro numa manifestação que desafiava a pandemia e o Supremo Tribunal Federal. Ele não se entendia com o ministro Luiz Henrique Mandetta e tinha tudo para virar um daqueles aloprados que o general Pazuello levaria logo depois para o Ministério da Saúde.

Recusou-se a patrocinar as virtudes da cloroquina e disse coisas desagradáveis, tais como: “Estamos trabalhando no mundo real, que é o mundo científico”, ou “Vamos deixar de bobagem e vamos vacinar”.

Quando foi pressionado, o almirante deu um recado críptico: “Meu limite está muito longe ainda. Tenho 32 anos de treinamento militar”. Como tem mandato e dirige uma agência independente, não cabia na frigideira em que foi jogado o general Santos Cruz. O almirante preservou a credibilidade da Anvisa, evitou bate-bocas e provocações. Não se colocou como um ativo contraponto à disseminação de superstições.

(...)

Destruição criadora
A financeira digital Nubank tornou-se o banco privado mais valioso da América Latina, superando as grandes casas brasileiras. Seu valor de mercado chegou a US$ 47,6 bilhões. Conseguiu isso em apenas oito anos de operações.
Oito anos parecem ser um tempo mágico para a destruição criadora do capitalismo no mercado financeiro de Pindorama. Fundado em 1943, o Bradesco tornou-se o maior banco privado do país em 1951. Como?

Amador Aguiar, seu patriarca, percebeu que os grão-senhores da banca não gostavam de gente com poucos sobrenomes e sapatos sujos. Diante disso, decidiu que as mesas dos gerentes ficariam na entrada das agências e os funcionários deveriam ajudar os clientes a preencher cheques. Em algumas cidades do Paraná, as agências do Bradesco chegavam antes da luz elétrica.

O Nubank e seus similares fazem coisa parecida no mundo digital de hoje, correndo atrás de uma fatia de consumidores deixada de lado pela grande banca. Facilitam os contatos com a clientela e abrem mão de taxas lucrativas, porém antipáticas.

Destruição destruidora
A gigantesca United Health, dona da operadora brasileira Amil, livrou-se de sua carteira de planos de saúde individuais, com 370 mil clientes. Pagou R$ 3 bilhões a uma financeira para que ela ficasse com os contratos e suas obrigações.
Para a empresa, foi um bom negócio, porque a operação dava prejuízo. Só o tempo dirá o que acontecerá com os clientes.

Na melhor das hipóteses, fica tudo igual.
Na pior, os clientes vendidos, quando desatendidos, deverão recorrer à Justiça.

No século XIX, a Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro pôs um anúncio nos jornais pedindo aos donos de pessoas escravizadas que parassem de depositar negros doentes em seus cemitérios.

A Covid de Trump
Mark Meadows, chefe de gabinete de Donald Trump, revelou que o presidente-machão que desafiava o coronavírus foi ao debate com Joe Biden em outubro do ano passado tendo testado positivo para a Covid. Dias depois, levaram-no para o hospital com a taxa de oxigenação do sangue em 86%, indicando perigo para um homem de sua idade.

Melhorou a marca do tempo que se passa para que se conheça o estado de saúde de um presidente americano. 
A patranha segundo a qual estava tudo bem levou pouco mais de um ano para prevalecer.
Em 1963, depois de levar um tiro na cabeça, o presidente John Kennedy chegou morto ao hospital, mas esse detalhe levou tempo para ser aceito.

Em 1981, o presidente Ronald Reagan tomou um tiro no peito e sua turma espalhou que ele entrou no hospital fazendo piadas. Era mentira. Com um pulmão perfurado, tiraram-no do bico do urubu.