Blog Prontidão Total NO TWITTER

Blog Prontidão Total NO  TWITTER
SIGA-NOS NO TWITTER
Mostrando postagens com marcador Vicente Feola. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Vicente Feola. Mostrar todas as postagens

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2023

Falta combinar com os americanos - Alon Feuerwerker

Análise Política

O título faz evidentemente referência ao célebre diálogo entre Garrincha e o treinador Vicente Feola antes do jogo contra a URSS na Copa de 1958. O técnico explicava, em detalhes, como seria o jogo, e daí o Mané (com maiúscula) disse que o roteiro era muito bom, mas questionou se Feola já tinha combinado com os russos.

A diplomacia brasileira parece empenhada num jogo aparentemente inteligente: aproximar-se dos Estados Unidos no delicado tema da guerra da Ucrânia para, em troca, manter o essencial da liberdade de movimentos entre o Brasil e seu principal parceiro econômico, a China.

Isso implica algum sofrimento nas relações com a Rússia, mas Luiz Inácio Lula da Silva e o Itamaraty parecem ter avaliado como positiva a relação custo-benefício. Não se faz mesmo omelete sem quebrar ovos.

Entretanto, quando a esperteza é muita sempre pode virar bicho e comer o dono, e daí a malícia brasileira correr o risco de esbarrar num obstáculo: o alinhamento dos EUA e seus aliados do Norte global contra a Rússia é apenas estação intermediária na projeção da guerra principal deles contra a China.

Guerra que por enquanto se dá principalmente no campo econômico, com todo tipo de sanções, mas ensaia transbordar para outras esferas.   A aproximação entre Brasil e Estados Unidos anda facilitada pela semelhança da agenda sócio-comportamental-ambiental dos dois governos e pelo apoio, informal mas consistente, da administração Joe Biden a Luiz Inácio Lula da Silva na eleição do ano passado.

O ambiente amistoso e o amplo consenso programático na visita do brasileiro à Casa Branca não deixaram dúvidas.
Vivemos agora tempos muito diferentes de quando a então presidente Dilma Rousseff soube que tinha sido espionada pela administração Barack Obama, de quem Biden era vice. 
Disputando a reeleição, Dilma houve por bem cancelar uma prestigiosa “visita de estado” aos americanos.



[Foto que mostra o quanto foi amistoso e aconchegante o clima da viagem presidencial aos Estados Unidos.]

 Eram também tempos em que a digital estadunidense apareceu na Operação Lava-Jato. O que acirrou, compreensivelmente, o antiamericanismo dentro do Partido dos Trabalhadores. Mas nada resiste à passagem do tempo e aos interesses. E agora o cenário mudou. O problema para o Brasil é o buraco estar mais embaixo
A disputa entre a unipolaridade e a multipolaridade não leva jeito de atenuar.
Será interessante acompanhar a evolução desse desfile, para ver como a nova linha se encaixa no enquadramento brasileiro aos Brics.  
Que aliás estão em fase de ampliação. Na composição atual, o Brasil é o único do grupo a mostrar simpatia pela tríade EUA-OTAN-UE no tema ucraniano.

O Itamaraty desencadeou uma de suas habituais operações “votamos nisso na ONU, mas não era bem nisso que queríamos votar”. Esforça-se para justificar um certo neo-atlantismo pelo viés da tradicional busca brasileira por soluções pacíficas e negociadas para os conflitos. Os fatos, sempre teimosos, trarão o resultado.

E há sempre a possibilidade de os diversos interlocutores chegarem à conclusão de que o Brasil tem relevância apenas relativa em escala planetária, que a movimentação brasileira se deve a um apetite de protagonismo não sustentado materialmente. E que, portanto, talvez não valha a pena arrumar confusão conosco.

Quem sabe seja uma solução.

 Alon Feuerwerker, jornalista e analista político

 

sexta-feira, 25 de janeiro de 2019

Falta combinar com os russos

“O folclore futebolístico tem tudo a ver com a situação da Venezuela. A ofensiva de Trump e  Bolsonaro esbarrou na aliança de Maduro com o presidente russo Vladimir Putin


Na Copa do Mundo de 1958, na Suécia, o técnico Vicente Feola, em preleção antológica, explicou, na prancheta, a tática para derrotar a seleção da antiga União Soviética: 
 Nilton Santos lançaria a bola da esquerda do meio de campo para a direita do ataque, nos pés de Garrincha, que driblaria três adversários e cruzaria para Mazola cabecear na grande área. Com ingenuidade ou ironia, não se sabe, o anjo das pernas tortas perguntou: “Seu Feola, o senhor combinou com os russos?”

O folclore futebolístico tem tudo a ver com a situação atual da Venezuela. A ofensiva diplomática protagonizada pelo presidente norte-americano Donald Trump e pelo presidente Jair Bolsonaro contra Nicolás Maduro, que denunciou a autoproclamação do líder do Legislativo, Juan Guaidó, como presidente interino do país, como um “golpe de Estado”, esbarrou na resistência do ministro da Defesa venezuelano, Vladimir Padrino, ao lado da cúpula militar das Forças Armadas do seu país. Mas também na aliança de Maduro com o presidente russo Vladimir Putin, liderando uma coalizão de oito países, o que transformou a Venezuela no epicentro de uma disputa semelhante àquela que ocorre entre potências mundiais no Oriente Médio.

Além da Rússia, Cuba, México, Bolívia, Nicarágua, Turquia, China e Irã apoiam o regime chavista, enquanto Guaidó é reconhecido como presidente interino pelos seguintes países: Estados Unidos, Brasil, Argentina, Canadá, Chile, Colômbia, Costa Rica, Equador, Guatemala, Honduras, Panamá, Paraguai, Peru e Reino Unido. A União Europeia assumiu uma posição intermediária: a defesa da realização de eleições livres na Venezuela. A crise prossegue sob muita tensão, a qualquer momento pode haver emprego da força por parte dos militares contra a oposição, com o fechamento da Assembleia Nacional e prisão de Guaidó, além de outros líderes oposicionistas. Fala-se em divisão nas Forças Armadas, mas o pronunciamento sinaliza apoio da cúpula militar ao regime. [existe cúpula com tropas e cúpula apenas com o cargo e título e o comando de uma mesa.]

O presidente Nicolás Maduro, na verdade, é um fantoche da cúpula militar, que controla a maior parte do governo e praticamente todas as empresas estatais. Como o regime não tem mais nenhuma sustentação política da sociedade e a Assembleia Nacional tem mais respaldo popular do que o governo, vive-se uma situação de dualidade de poderes, que pode ter desdobramento trágico, porque o governo perdeu controle da economia, mas não o poder de coerção sobre a sociedade. A repressão política na Venezuela é muito violenta, protagonizada pela Guarda Nacional e pela milícia bolivariana armada, a tropa de choque de Maduro.

Intervenção
Os Estados Unidos solicitaram uma reunião do Conselho de Segurança da ONU para tratar do assunto, logo após o presidente Donald Trump falar que examina todas as possibilidades de intervenção na crise venezuelana, inclusive militar. Maduro ontem mandou fechar a embaixada dos EUA em Caracas e vai expulsar os diplomatas, o que aumenta a escalada de tensão. Não foi à toa que o presidente em exercício Hamilton Mourão, ontem, descartou a participação do Brasil em qualquer intervenção militar. O envolvimento do Brasil na crise venezuelana é uma ruptura com a tradição do Itamaraty, que costuma operar nos bastidores para saídas negociadas durante as crises nos países vizinhos. Ontem, porém, o Itamaraty anunciou que somente o chanceler Ernesto Araujo falará sobre o tema. O ministro defende o alinhamento automático com Trump e outros falcões da política internacional.

O apoio aberto da Rússia ao regime de Maduro, com quem tem intensa cooperação militar, não deve ser subestimado, embora a situação geopolítica da Venezuela seja completamente diferente da situação, por exemplo, da Síria, onde Putin conseguiu garantir a sobrevivência do regime de Bashar al-Assad, o ditador sírio que se recusou a deixar o poder e os ex-presidente Bush e Obama tentaram derrubar. Hoje, os Estados Unidos estão se retirando da Síria e os russos continua por lá, com sua base naval. Na Venezuela, não existe base militar da Rússia, apenas blindados e aviões de caça de fabricação russa.

Em termos militares, o Brasil tem as Forças Armadas mais numerosas da região, contando com 366 mil militares da Força Aérea, Marinha e Exército. A Venezuela fica um pouco atrás, com 365 mil efetivos. [o que conta é o efetivo realmente operacional e na Venezuela não alcança sequer 150.000 militares. A situação de extrema penúria da Venezuela, com repercussão na capacidade militar, faz com que suas forças armadas apesar de dotadas de bom armamento tem pouca capacidade para ações que exijam apoio logístico, o que reduz em muito sua capacidade ofensiva, tornando-as praticamente só defensivas e mesmo assim para combates de curta duração.] O México (267 mil) e a Colômbia (265 mil) seguem de perto; depois, vêm Argentina (79 mil), Peru (78 mil), Chile (67 mil), República Dominicana (58 mil), Equador (41 mil), Bolívia (34 mil), El Salvador (24 mil), Uruguai (22 mil), Guatemala (18 mil), Paraguai (16 mil) e Honduras (15 mil militares).

 Proporcionalmente, porém, a Venezuela fica no primeiro lugar da lista, com 118 militares por 100 mil habitantes. O Uruguai, fica em segundo, com 65. O Brasil tem apenas 18 militares por cada 100 mil habitantes. Trocando em miúdos, ninguém com juízo apostaria numa guerra com a Venezuela, nem Maduro está em condições de uma iniciativa dessa ordem, mesmo em relação à Guiana. Aí, sim, daria pretexto para uma intervenção militar dos Estados Unidos.

Nas Entrelinhas - Luiz Carlos Azedo - CB


 

segunda-feira, 12 de dezembro de 2016

Combinar com os russos


Diz a lenda que, pouco antes do jogo Brasil x URSS pela Copa do Mundo de 1958, na Suécia, Vicente Feola, o treinador brasileiro, reuniu seus jogadores no vestiário e traçou a estratégia que, com a bola de pé em pé pelo nosso ataque no meio da defesa russa, levaria ao primeiro gol do Brasil. Não tinha erro — a jogada era mortal. De repente, Garrincha perguntou a Feola: "Mas o senhor já combinou com os russos?".

Desde então, estabeleceu-se que, antes de qualquer decisão importante, não importa o assunto, é bom primeiro combinar com os russos. Mesmo assim, é raro o dia em que alguém por aqui não se dê mal justamente por isto – por não ter combinado com os russos.

O ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal, decidiu pelo afastamento do senador Renan Calheiros da presidência do Senado e, horas depois, teve o desprazer de ver sua medida derrubada pelo plenário do STF. Ele não combinou com os russos — digo, seus colegas. 


Na sequência, o presidente Michel Temer nomeou o tucano Antonio Imbassahy para a Secretaria de Governo, no lugar do solerte Geddel Vieira Lima, e teve de recuar os alfes ao ver sua decisão mal recebida pelo grupo político que o apoia. Não foi surpresa – Temer nunca se lembra de combinar com os russos.

A expressão é boa, mas a história de Garrincha não aconteceu e ele nunca disse a frase. Para meu livro "Estrela Solitária", sobre a vida do jogador, conversei com quatro pessoas presentes naquele vestiário em 1958: o preparador físico Paulo Amaral e os jogadores Bellini, Didi e Nilton Santos. Todos me disseram que Garrincha sequer foi chamado a ouvir a preleção — porque não adiantava, só fazia o que lhe dava na cabeça.

O que não quer dizer que, na vida real, não se deva combinar com os russos. A menos, claro, que você seja o Garrincha.


Por:  Ruy Castro - Folha de S. Paulo