O PT, atônito, joga para a arquibancada. Quer usar as reservas, propõe a criação de novas faixas para o Imposto de Renda
Em 1958,
véspera do jogo Brasil e Rússia, o técnico chamou Garrincha e lhe disse:
“Vamos ganhar com uma jogada sua. Pegue a bola e drible o seu marcador.
Quando vier o outro zagueiro, você o dribla também. Depois, vá à linha
de fundo e cruze para o Vavá fazer o gol”. Garrincha, que ouvira a
“estratégia” calado, indagou: “Mas, professor, você já combinou isso com
os russos?”
A história é oportuna quando ministros e políticos
governistas estão repetindo, como papagaios, o mantra “crescimento
econômico”. A ladainha começou quando o ex-presidente Lula vociferou:
“Dilma, você precisa liberar o crédito, fazer a roda da economia girar e
dar boas notícias”. O problema do “mais créditos” é que o endividamento
das famílias brasileiras já é o maior dos últimos dez anos. Para quase
40% dos brasileiros, a meta principal em 2016 é pagar dívidas, antes da
casa própria, de trocar o carro ou encontrar um grande amor.
Difícil,
também, é rodar a economia e dar boas notícias. Em 2015, o PIB pode ter
encolhido até 4%, o desequilíbrio fiscal ficou próximo de R$ 120
bilhões, e o país foi rebaixado por duas agências de risco. A inflação
anual foi de 10,67%, o desemprego chegou a 9%, e o dólar beira os R$ 4.
Compõem o cenário a grave crise política e a popularidade da presidente
em frangalhos. Sem falar dos processos de impeachment, no Congresso, e
das contas de sua campanha no Tribunal Superior Eleitoral.
O atual
ministro da Fazenda é Nelson Barbosa, o mentor da malfadada “nova
matriz econômica” que — associada ao vale-tudo eleitoral — levou a
economia brasileira a esse desastre. Para complicar, Barbosa está
envolvido no caso das “pedaladas” e pode ser condenado no TCU.
Tão
ou mais enrolada está a cúpula do Legislativo. O presidente da Câmara,
Eduardo Cunha, tenta livrar-se da cassação, enquanto o do Senado, Renan
Calheiros, responde a vários processos no STF e teve o sigilo bancário
quebrado no fim de 2015. O presidente do TCU, Aroldo Cedraz, é também
investigado na Lava-Jato.
Qual a credibilidade que oferece um país
em que ninguém sabe dizer exatamente quanto tempo o ministro da
Fazenda, a presidente da República e os titulares da Câmara, do Senado e
do TCU permanecerão nos seus cargos? Os fatos e as expectativas —
que afetam o comportamento da economia — são totalmente desfavoráveis.
Para completar, em 2016 teremos eleições municipais, o que torna ainda
mais difícil a contenção de despesas e a aprovação pelo Congresso de
medidas impopulares. Neste cenário de incertezas, só um louco irá
investir no Brasil. E, se o fizer, o preço será alto.
O PT,
atônito, joga para a arquibancada. Quer usar as reservas, propõe a
criação de novas faixas para o Imposto de Renda, impostos sobre lucros e
dividendos, a elevação da tributação sobre heranças e doações, a volta
da CPMF e a criação de impostos sobre grandes fortunas, jatinhos,
helicópteros etc. Não vai ganhar o jogo, mas o discurso agrada à
torcida. Como dizia Antônio Ermírio de Moraes, “a arte do PT é pedir
dinheiro aos ricos, pedir voto aos pobres e mentir para ambos”. Certa ou
errada a frase, o partido volta a propor medidas que alardeia desde a
fundação, mas que, curiosamente, jamais implementou nos 13 anos em que
está no poder.
Para agradar aos empresários, o PT sugere ao
governo reativar o Conselho de Desenvolvimento Econômico, “vender” aos
bancos de parte do que a União tem a receber, salvar as empresas
corruptas envolvidas na Lava-Jato da inidoneidade (por meio de uma
vergonhosa medida provisória), permitir a repatriação de recursos,
legalizar os jogos de azar e obter empréstimos na China para lançar um
“novo PACo”, ainda que deva bilhões da versão anterior.
Contrariando
o PT e toda a sua base de apoio, Dilma promete manter o ajuste fiscal, o
combate à inflação, os cortes nas despesas obrigatórias e a fixação de
idade mínima para a Previdência. Mas será que a presidente irá bater de
frente com PT, CUT, UNE e MST, a tropa chapa-branca já convocada para ir
às ruas contra o impeachment? Só o tempo dirá, pois o que Dilma fala
não se escreve.
A verdade é que, neste momento, falar em
crescimento econômico é como a família de um enfermo, há um ano na UTI,
cogitar a sua participação como atleta na próxima Olimpíada. Nem
combinando com os russos.
No futebol, em 1958, o Brasil venceu a
Rússia por 2 a 0. Garrincha deu um show, e Vavá fez os dois gols. A
diferença é que naquela época tínhamos um time de craques. Hoje, na
política e na administração pública, são muitos os “pernas de pau”. Ou
seriam “caras de pau”? [o ilustre articulista esqueceu de mencionar que hoje também no futebol, com raras exceções que em sua maior parte se venderam ao exterior, só temos pernas de pau.]
Transcrito de: O Globo - Gil Castello Branco é economista e fundador da organização não governamental Associação Contas Abertas
gil@contasabertas.org.br