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quarta-feira, 9 de fevereiro de 2022

Controle social descabido - Rodrigo Constantino

Inspiradas pelas manifestações no Canadá, centenas de pessoas protestam contra a vacinação obrigatória e as rígidas medidas restritivas impostas para conter a pandemia do coronavírus, em frente ao parlamento da Nova Zelândia, na cidade de Wellington. Os manifestantes, que se dizem membros do “comboio da liberdade”, se reuniram antes do primeiro discurso do ano da primeira-ministra Jacinda Ardern.

Segundo a imprensa internacional, os participantes do protesto seguravam cartazes pedindo liberdade e prometeram acampar do lado de fora do prédio do parlamento, chamado de Colmeia, até que os lockdowns sejam suspensos. A primeira-ministra não se encontrou com os manifestantes e afirmou aos jornalistas que eles “não representam a opinião da maioria”.

Na contramão do que se vem ouvindo na Europa, a governante afirmou que a pandemia não terminará com a variante Ômicron e que a Nova Zelândia terá que se preparar para mais variantes do vírus. Nos últimos dois anos, o governo de Ardern impôs algumas das mais duras e longas restrições.

Essa pandemia mostrou que governantes com inclinação autoritária perderam a mão e o juízo. Mesmo após estudo da prestigiada John Hopkins mostrando a ineficácia do lockdown, algumas autoridades insistem nessas restrições absurdas, que impõem enorme custo econômico e retiram liberdades básicas do povo.

Muita gente vem tentando interditar o debate, rotulando o outro de "negacionista" ou mesmo questionando sua empatia pelo próximo. Mas debater é fundamental, principalmente quando tantas reações foram sem precedentes numa pandemia. Nos Estados Unidos, estados que utilizaram medidas mais restritivas não tiveram resultados melhores do que estados que permitiram mais liberdade. A linha vermelha do gráfico abaixo representa a evolução de casos de covid para cada 100 mil habitantes nos estados americanos que exigem o uso de máscaras, por exemplo. A linha preta, os estados que não exigem.

Não obstante, a mídia continua tratando governadores autoritários como aqueles mais preocupados com as vidas, enquanto acusam de "negacionistas" os que abandonaram a pretensão ilusória de conter o vírus, em especial na variante mais transmissível atual.



Um amigo meu, executivo de uma grande empresa de tecnologia, está em Nova York para um seminário, e estão dando um aparelho para cada um testar, todos os dias, se está ou não com covid. O aparelho gera um QR code e apenas com este código indicando que a pessoa está sem covid ela pode entrar na sala. O fundador da empresa é um bilionário ligado a causas "progressistas" das mais radicais.

Notem que até no setor privado a paranoia chegou com tudo. É muita histeria coletiva, e muita necessidade de controle também. Assim que os primeiros especialistas, ainda na África, detectaram o grau de transmissibilidade da Ômicron, constatei que era simplesmente inútil tentar impedir o vírus de contaminar as pessoas. Se com as primeiras variantes, bem menos transmissíveis, isso já se mostrou ilusório, imagina com uma variante 140 vezes mais transmissível.

Nada disso importa. Todos estão sendo contaminados, pessoas que usam máscara até sozinhas no carro, pessoas com três doses de vacina, pessoas que vivem em locais repletos de restrições impostas por governantes. 
Diante dessa realidade, alguns podem questionar: então o certo é não fazer nada? 
Bem, se você é alguém que só se importa com a sensação de controle, então pode aplaudir todas as medidas draconianas que só serviram para retirar nossas liberdades e destruir as economias. 
Mas se você é mais afeito à ciência, então cabe constatar, com realismo, que esses são apenas os fatos, e os fatos não ligam para seus sentimentos.
 
Rodrigo Constantino - Gazeta do Povo 

quinta-feira, 6 de fevereiro de 2020

Tolerância - Nas entrelinhas

”A xenofobia, a misoginia, a homofobia, a justiça pelas próprias mãos e o desrespeito aos direitos e às garantias individuais são ameaças à democracia, ainda que aparentemente sejam isolados os casos

O consagrado ator José de Abreu anunciou no Instagram que embarca hoje para a Nova Zelândia, onde pretende morar. Depois de muita malcriação nas redes sociais — para dizer o mínimo —, resolveu dar um tempo e curtir a namorada Carol Junger, com quem recentemente fez um périplo de 75 dias, por 11 países. Radical aliado do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, cai fora do rodamoinho em que entrou depois das grosserias que fez com a também consagrada atriz Regina Duarte, que aceitou o convite para ser secretária de Cultura do governo Bolsonaro.

Os ataques de José de Abreu a Regina Duarte deixaram perplexos até mesmo os seus aliados: “Fascista não tem sexo. Vagina não transforma uma mulher em um ser humano. Eu não vou parar, eu sou radical mesmo e estou em um caminho sem volta”, declarou ele, em áudio enviado para a colunista Mônica Bergamo, da Folha de S. Paulo, depois de várias postagens nas redes sociais atacando a atriz.
Saiu de cena como quem resolveu curtir a vida sem maiores compromissos: “Amanhã, começaremos uma nova fase de nossa vida em comum, vamos morar na Nova Zelândia. No começo, em Auckland. Se gostarmos, ficamos. Se não, Wellington ou Christchurch. Opções não faltam: país lindo, padrão de vida comparado aos países escandinavos, mas sem o ônus do frio. Pequeno, povo bacana, natureza… Que Deus nos ilumine e proteja #newzealand #newzealandlife #auckland #expatlife #novazelandia #vidamaluca”, escreveu.

Um radical que bate em retirada por livre e espontânea vontade da cena política brasileira deve ser motivo de comemoração, seja ele de esquerda, seja de direita. Às vésperas do Oscar, a cineasta Petra Costa, cujo filme Democracia em vertigem está entre os finalistas da categoria documentário, também sofre uma campanha intensa na internet por causa de sua abordagem sobre o impeachment da presidente Dilma Rousseff. De forma inédita, a secretaria de Comunicação do governo classificou a cineasta como uma “ativista anti-Brasil”.

Mas quem acabou indo para o pelourinho foi o jornalista Pedro Bial, que fez duras críticas ao filme e à cineasta, que narrou o filme. Segundo ele, Petra protagonizou uma “miada” insuportável. Em sua crítica, Bial disse que a cineasta ficou choramingando o filme inteiro, o que mobilizou uma cadeia de solidariedade à diretora, liderada pela ex-presidente Dilma Rousseff, personagem central do documentário. Bial está sendo atacado até mesmo por ex-colegas da TV Globo.
Estabeleceu-se uma polêmica sobre o filme que mistura alhos com bugalhos. O simples fato de ter sido selecionado como finalista do Oscar já garante à diretora Petra Costa o reconhecimento pela qualidade de sua obra, o que não tem nada a ver com concordar com a sua interpretação dos fatos, ainda mais quando sabemos que os documentários norte-americanos nunca primaram pela isenção política e ideológica. Onde está a intolerância? Nos ataques pessoais à diretora, não nas críticas ao filme, que podem ser consideradas justas ou injustas, dependendo do interlocutor.

Os limites
A tolerância requer aceitar as pessoas e consentir com suas práticas mesmo quando as desaprovamos fortemente, não é uma atitude intermediária entre a absoluta aceitação e a oposição imoderada. Um assassinato, por exemplo, não é tolerável. Nossos sentimentos de contrariedade ou desaprovação são intoleráveis quando movidos por preconceito racial ou étnico, por exemplo. Não se trata de tolerar aqueles que execramos, mas de não execrar as pessoas só porque parecem diferentes ou provêm de uma origem diferente.

Conflitos e desentendimentos políticos e ideológicos são totalmente compatíveis com o pleno respeito por aqueles de quem discordamos. A democracia, a rigor, existe para que isso ocorra num ambiente de coexistência, no qual o direito ao dissenso seja respeitado pela maioria. A tolerância religiosa, por exemplo, é o legado histórico das guerras religiosas europeias, ainda que muito sangue ainda seja derramado em alguns lugares do mundo, em nome do Criador. No Brasil, hoje, essa questão está vivíssima, porque a radicalização política e a intolerância estão instrumentalizando valores religiosos de uma forma que nunca deu bons resultados.

A tolerância exige valores e tem seus riscos, mesmo numa ordem democrática consolidada. A xenofobia, a misoginia, a homofobia, a justiça pelas próprias mãos e o desrespeito aos direitos e às garantias individuais são ameaças à democracia, ainda que aparentemente sejam isolados os casos. Ou seja, o limite da tolerância é o respeito à Constituição de 1988.

Nas Entrelinhas - Luiz Carlos Azedo - Correio Braziliense