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quinta-feira, 16 de novembro de 2023

Um código para os supremos - O Globo

Bernardo Mello Franco

Um olhar sobre a política e o poder no Brasil


Depois de 234 anos, a Suprema Corte dos EUA editou seu primeiro código de conduta.
 A medida é uma reação a escândalos revelados pela imprensa
Um juiz viajou o mundo às custas de um magnata do Texas, e outro foi a um resort pago por um mecenas do Partido Republicano.

Ao divulgar o texto, a Corte informou que seus justices já seguiam normas éticas não escritas. Mesmo assim, eles teriam redigido o código para eliminar um “mal-entendido”: a percepção de que não precisariam se submeter a regra alguma.

No Brasil, o Supremo Tribunal Federal já registrou em acórdão que o Conselho Nacional de Justiça “não tem nenhuma competência sobre o STF e seus ministros”. Resta a Lei Orgânica da Magistratura, que só costuma ser lembrada em polêmicas com juízes de primeira instância.

Como nossos supremos são melhores que os outros, não há por que pedir um código de conduta para a Corte.  
O decálogo a seguir é um mero exercício de imaginação, baseado em deslizes e conflitos de interesse que nunca ocorreriam por aqui:

Art. 1º: Os ministros não aceitarão convites para palestrar em eventos patrocinados por empresários ou banqueiros. A regra se estende a eventos no exterior, com debates em língua nacional e cachês em moeda estrangeira. Não haverá exceção quando os empresários ou banqueiros já tiverem sido presos. O fato de estarem soltos não significa que não possam voltar à cadeia na próxima operação da PF.

Art. 2º: Os ministros não aceitarão presentes caros, hospedagens de luxo ou caronas em aviões particulares. 
Por receberem os salários mais altos do serviço público, poderão custear suas férias com recursos próprios. 
 
Art. 3º: Os ministros não aceitarão convites para apadrinhar casamentos de filhas de empresários que mantenham negócios com o poder público. Se aceitarem, não poderão conceder habeas corpus para tirar o pai da noiva da cadeia. 
Se concederam o habeas corpus, não poderão repetir a dose no caso de o compadre retornar ao xadrez. 
 
Art. 4º: Os ministros não aceitarão convites para tomar tubaína com o presidente da República. 
Eventuais visitas ao palácio só ocorrerão em horário de trabalho e com registro na agenda oficial.

Art. 5º: Os ministros não serão sócios de faculdades privadas. Se forem, jamais poderão usá-las para receber verba pública sem licitação.

Art. 6º: Os ministros não chamarão nenhum colega de “pessoa horrível”, ainda que estejam convencidos disso. Também estão impedidos de acusar outro ministro de “destruir a credibilidade do Judiciário brasileiro”, mesmo que tenham razão.

Art. 7º: Os ministros não ensaiarão frases de efeito para brilhar nos telejornais noturnos. Suas falas em plenário serão orientadas pela Constituição, e não pela busca por curtidas e compartilhamentos. Ficam proibidos os votos instagramáveis, com citações pop para viralizar nas redes.

Art. 8º: Os ministros não usarão a imprensa para antecipar decisões ou revelar intimidades da vida privada. 
Juiz não é celebridade, e o Diário da Justiça não é a revista Caras.

Art. 9º: Os ministros não processarão acadêmicos ou jornalistas que fizerem reparos à sua atuação. Como democratas, saberão que agentes públicos devem tolerar críticas, ainda que prefiram elogios.

Art. 10: Os nove juízes da Suprema Corte dos EUA assinaram o código de conduta, mas não se desculparam por falhas passadas. Nossos 11 supremos não precisam assinar nada, mas se comprometem a tomar juízo.


sexta-feira, 2 de junho de 2023

O impacto da chegada ao STF de Cristiano Zanin, advogado de Lula

 Os bastidores da escolha do presidente da República para a vaga de Ricardo Lewandowski

O advogado Cristiano Zanin Martins estava discretamente em Brasília desde terça-feira 30, quando, por volta das 17 horas do dia seguinte, recebeu uma ligação. Do outro lado da linha falava um assessor do Planalto que trabalha diretamente com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, pedindo que ele se preparasse para ir à sede do governo. Lula, que Zanin reabilitou politicamente ao defendê-lo com sucesso na Operação Lava-Jato, queria conversar. Nos dias anteriores, após um churrasco no Alvorada na noite da sexta 26, a já muito provável indicação do defensor paulista à vaga de Ricardo Lewandowski no Supremo Tribunal Federal se tornara apenas questão de tempo. Aos convivas do evento na residência oficial do presidente, entre os quais Lewandowski e os ministros Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes, do STF, Lula deixou nítida a escolha por Zanin, nome de sua estrita confiança.

A ligação do Planalto na quarta foi uma convocação ao desfecho que todos sabiam, mas faltava ser dito com todas as letras. No palácio, o advogado foi recebido por Lula, pelos ministros Rui Costa (Casa Civil) e Flávio Dino (Justiça) e pelo advogado-geral da União, Jorge Messias, e informado que a sua indicação ao Senado seria feita no dia seguinte. Depois do encontro, Zanin foi a um jantar na casa do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-­MG), do qual participaram Gilmar, Moraes e o senador Davi Alcolumbre (União-AP), presidente da Comissão de Constituição e Justiça e responsável por pautar a sabatina. Ouviu que o processo não teria obstáculos. Se aprovado, Zanin fica até 2050 no STF.

A escolha pelo advogado encerrou uma das mais acirradas corridas à Suprema Corte dos últimos tempos. Além de Zanin, estavam no páreo nomes que agradavam a gostos e interesses diversos. O advogado Manoel Carlos de Almeida Neto, ex-assessor de Lewandowski, era o preferido do ex-ministro, que dizia a interlocutores ser o mais indicado para manter o seu perfil garantista, tão louvado por Lula e o PT. Manoel Carlos ainda acabou se tornando o nome preferido de parte do Grupo Prerrogativas, que reúne juristas apoiadores de Lula e também tinha integrantes supremáveis, como os advogados Pedro Serrano e Lenio Streck. Entre a classe política, a preferência recaía pelo presidente do Tribunal de Contas da União, Bruno Dantas, conhecido pela competência e proximidade com nomes como o senador Renan Calheiros (MDB-AL). Correndo por fora, com a simpatia de nomes como Alexandre de Moraes, vinha o ministro do Superior Tribunal de Justiça Luis Felipe Salomão. A partir do momento em que se consolidou na dianteira e virou favorito ao posto, Zanin passou a ser alvo de críticas nos bastidores e de “fogo amigo”. Agora certamente seguirá na mira, mas da oposição, por sua proximidade com Lula.

Ao mesmo tempo em que a relação com o presidente foi essencial — Lula deixara claro que não abriria mão da confiança irrestrita no escolhido —, a indicação de Zanin e sua atuação como ministro serão sempre escrutinadas à luz do necessário equilíbrio dele em relação a assuntos envolvendo o petista e seu governo. A política, afinal, anda judicializada como nunca, e muitas medidas do Planalto acabam questionadas na Corte. Esse certamente será um dos pontos sobre os quais o advogado será exaustivamente questionado na CCJ, em uma sessão que, a contar pelos últimos sabatinados, pode chegar a dez horas de duração (ainda não há data marcada). A respeito de questionamentos sobre se sua proximidade com o presidente interferirá em seus julgamentos, Zanin já disse a interlocutores que, a princípio, só se declarará impedido em casos nos quais tenha atuado como advogado, conforme manda a lei.

 

De forma a aplainar o terreno para essa sabatina, interlocutores do indicado já vinham discretamente sondando humores dos senadores e ouviram que não haveria resistências. Zanin, agora, entrará em campo para o tradicional corpo a corpo com os parlamentares e não descarta procurar até os mais ativos integrantes da oposição. O líder do governo, Jaques Wagner (PT-BA), vai ajudá-lo no mapeamento da Casa e Zanin não descarta bater à porta até de Sergio Moro em meio a esse périplo, em visita classificada por ele como de caráter institucional. Se esse encontro ocorrer, os dois vão vivenciar uma inversão de papéis. Como advogado de Lula, Zanin trombou de frente nas audiências com Moro, o juiz da Lava-Jato, que sempre sonhou em chegar ao Supremo. Hoje senador pelo União Brasil-PR, Moro lamentou a escolha de Lula para o STF, dizendo que ela “fere o espírito republicano”.


O histórico mostra ser extremamente improvável que Zanin venha a ter dissabores maiores que, é claro, perguntas duras e eventuais provocações na sessão na CCJ. Desde que o STF foi criado, em 1890, ano seguinte à Proclamação da República, houve somente cinco vetos. Todos se deram em 1894, no governo do marechal Floriano Peixoto, que vivia às turras com a Corte. Nos últimos 130 anos, portanto, nenhum escolhido deixou de se tornar ministro, mesmo os que tinham relação próxima com presidentes, como os ex-advogados-gerais da União Gilmar Mendes (FHC), Dias Toffoli (Lula) e André Mendonça (Jair Bolsonaro).

(...)

Embora críticos de Zanin digam não se saber exatamente o que ele pensa a respeito de temas sensíveis, é inegável que ele se tornou um ícone da derrocada da Lava-Jato. Sua nomeação é a cereja do bolo no ocaso da operação. O advogado era ridicularizado no auge da operação e suas teses viviam sob bombardeio até de alas do petismo. Poucos acreditavam no sucesso da estratégia baseada em pedidos de suspeição de Moro e alegações de que os casos não deveriam tramitar na 13ª Vara do Paraná, argumentos depois amplamente aceitos no Supremo. Lula manteve a confiança em Zanin e rejeitou apelos para que contratasse algum criminalista de grife. Fora da seara penal, Zanin é um advogado bem-sucedido na área empresarial e mantém um escritório em São Paulo em sociedade com a mulher, Valeska Teixeira Zanin Martins, filha de Roberto Teixeira, compadre de Lula, com quem o casal está rompido. Até as relações com o sogro, diga-se, foram exploradas por adversários para tentar desgastar Zanin. Ele resistiu ao bombardeio e, agora, se vê a um passo da suprema vitória.

Publicado em VEJA,  edição nº 2844 de 7 de junho de 2023

AQUI, MATÉRIA COMPLETA

 

quarta-feira, 14 de fevereiro de 2018

Quem aceita ser compadre de qualquer um, pode se ferrar

Compadre de Lula quer ser excluído de ação sobre o sítio de Atibaia

[Lula começa a receber o tratamento dos criminosos condenados: todos querem distância, igual faziam com os leprosos nos tempos bíblicos. Até os cúmplices o abandonam.

Imagine quando novas condenações forem proferidas.

Não adiante espernear Lula, você morreu politicamente.] 

O advogado Roberto Teixeira pediu ao Tribunal Regional Federal da 4.ª Federal (TRF-4) para ser excluído de ação penal da Operação Lava Jato. O compadre do ex-presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva é acusado pelo crime de lavagem de dinheiro nas reformas do sítio de Atibaia.

Neste processo, o petista foi denunciado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro pelo Ministério Público Federal, no Paraná. Além de Lula e de Roberto Teixeira, outros 11 investigados são réus. A defesa do compadre do ex-presidente recorreu à Corte de apelação da Lava Jato no dia 6 de fevereiro.

“Um advogado honrado, sério, está sendo vítima de grave constrangimento ilegal representado pelo recebimento da denúncia inepta, que não narra fato atípico”, afirmam os advogados Antônio Cláudio Mariz de Oliveira e Sérgio Eduardo Mendonça de Alvarenga em habeas corpus. “Requer-se a concessão da ordem, para o fim de excluir o paciente do polo passivo da ação penal.”

Este é o segundo processo em que Roberto Teixeira é acusado formalmente pela Lava Jato, no Paraná. O advogado também é réu em outra ação penal por envolvimento em suposta propina de R$ 12,5 milhões da Odebrecht a Lula, por meio de um terreno que abrigaria o Instituto que leva o nome do ex-presidente – R$ 12 milhões – e uma cobertura vizinha à residência do petista em São Bernardo de R$ 504 mil. De acordo com o Ministério Público Federal, Roberto Teixeira teria intermediado a compra dos imóveis.

O documento entregue pela defesa de Roberto Teixeira ao TRF-4, Corte responsável por julgar as decisões do juiz federal Sérgio Moro, tem 14 páginas. Os advogados afirmam que o compadre de Lula “está sofrendo constrangimento ilegal” do magistrado da 1.ª instância.
“A denúncia é inepta no que tange ao paciente. Não descreve satisfatoriamente sua participação nos fatos; não narra nenhuma conduta típica; impedindo o exercício da ampla defesa”, alegam os defensores.

A força-tarefa da Lava Jato aponta que a negociação para a compra do sítio “teve participação ativa de Roberto Teixeira”. Os procuradores afirmam que o advogado indicou o “quinhão” de cada comprador da propriedade rural, os empresários Jonas Suassuna e Fernando Bittar.  Segundo o engenheiro da Odebrecht e delator da Lava Jato, Emyr Costa, para ocultar a participação da Odebrecht nas obras do sítio, Roberto Teixeira lhe pediu que celebrasse um contrato e fizesse notas fiscais em nome de Fernando Bittar. O delator apontou aos investigadores que notas fiscais apreendidas pela operação na casa de Lula, em São Bernardo do Campo, são as mesmas que ele entregou ao compadre do ex-presidente.
Os defensores de Roberto Teixeira afirmam que o processo do sítio de Atibaia imputa ao advogado “apenas e exclusivamente, condutas praticadas no regular exercício profissional da advocacia”.
“A defesa tem plena consciência de que há desvios. Existem profissionais que extrapolam as fronteiras do exercício profissional para a efetiva prática de ilícitos criminais. Mas nessas hipóteses, não se está a tratar de um advogado, mas sim de um criminoso. Categoricamente, não é essa a hipótese em questão”, argumentam os criminalistas. “No caso em tela, mais uma vez, o advogado Roberto Teixeira não aderiu a qualquer maquinação criminosa. Não atravessou fronteiras proibidas. Ainda que enredo delituoso apresentado na denúncia seja verdadeiro, a ele não se filiou o paciente.”

IstoÉ