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segunda-feira, 9 de agosto de 2021

Ameaças - Bolsonaro é a pedra no caminho - O Globo

In Blog 

Ameaças - Bolsonaro é a pedra no caminho - É ilusório supor que o país volte à calma sem neutralizar Bolsonaro

À medida que o carro avança, os nomes dos lugares me fascinam: Divinópolis, Doresópolis. Qualquer dia, paro para dar um balanço desses nomes em Minas. Ou então para documentar as configurações e nuances do céu. Hemingway descrevia certas nuvens como camadas de sorvete. No crepúsculo em Minas, róseo e dourado, sinto como se o universo fosse uma capela com o teto pintado pelo Mestre Ataíde. Com um país tão interessante, não consigo ainda explicar por que tanta confusão converge para sua capital, Brasília.

Essa história da vacina da Davati, por exemplo, é um roteiro de chanchada. Um dirigente de empresa que recebe auxílio emergencial e um cabo da PM que não consegue pagar o aluguel resolvem oferecer 400 milhões de inexistentes vacinas AstraZeneca. Usam um reverendo para se aproximar do governo. O reverendo é amigo de um homem que se diz super-homem. Sua entidade religiosa falsifica logotipos da ONU, e ele se diz embaixador da paz. Ungido por quem? Por outro reverendo, o famoso Moon. [quando muitos reverendos entram em uma mesma história, nos lembramos de um outro: Jim Jones, Templo dos Povos, Jonestown, Guiana. Vale destacar que só os inimigos do Brasil = inimigos do presidente Bolsonaro, são capazes de acreditar nessa balela de prevaricação por compra que não houve, por vacinas que não foram compradas, por contrato que não foi assinado, por pagamento que não foi efetuado. Íamos esquecendo: o Circo da CPI Covidão, também acreditou - o que se explica por ser o objetivo real daquele Circo derrubar Bolsonaro = operação que está se revelando um fracasso total = nada encontraram nem encontrarão contra Bolsonaro. Nos estertores da desmoralização eles agora acreditam nos reverendos, nos irmãos Miranda, na mulher de branco, etc, etc.] Sua grande missão diplomática foi ir a Israel para unir judeus e árabes, tarefa que, como todos sabemos, alcançou um perene êxito.

Às vezes, o enredo que passa pela CPI ganha um tom de pornochanchada com a contribuição do senador Heinze, que descobriu pesquisas contra a cloroquina financiadas por uma ex-atriz pornô chamada Mia Khalifa, que, agora, empolgada com sua inclusão no roteiro, quer visitar o Brasil para ajudar no combate à pandemia. É tudo inacreditável, mas gira em torno de um governo que manda uma comissão a Israel para monitorar um spray contra a Covid-19, repleta de parlamentares que, certamente, levaram bomba nas aulas de ciência.

Num desvario como este, o próprio Bolsonaro se dedica agora a reproduzir, no âmbito tropical, a derrotada trajetória de Donald Trump. Primeiro passo: questionar previamente as eleições. Segundo passo, perdê-las e entupir a Justiça com recursos unanimemente rejeitados. Terceiro passo: tentar o golpe invadindo o Capitólio e, finalmente, sobreviver na planície como um presidente injustamente vencido pelas “fraudes eleitorais”.

Tudo isso poderia ser tão patético quanto o plano do grupo que queria vender vacinas inexistentes. No entanto não é, porque nem todas as forças que reagiram nos EUA podem ter a mesma ênfase no Brasil. Nos EUA, as Forças Armadas se colocaram de forma inequívoca contra qualquer tipo de golpe. As brasileiras não parecem tão enfáticas. Não é impossível que Bolsonaro tente realizar suas ameaças. O que parece realmente impossível é qualquer êxito, no médio e longo prazos. Teria de suprimir a internet com grandes repercussões econômicas, sentiria o peso do isolamento internacional e a rejeição de uma ampla maioria do povo.

Claro que Bolsonaro não se importa com essas variáveis. Mas potenciais aliados deveriam contar com elas. Nos primeiros dias, tocam o Hino Nacional, escrevem-se pequenas biografias dos vencedores ocasionais, e o país se enche de árvores pintadas de branco e oportunistas com bandeirinhas. Mas o curso da história é terrível para quem se aventura a negá-lo e reinaugurar a Idade das Trevas. Por isso, é importante que a Justiça puna ameaças, para dissuadir os impulsos golpistas de Bolsonaro. Mas tudo indica que ele não se deterá até a fase três de seu delírio tropical. Nesse caso, será preciso derrotá-lo de vez, profundamente.

Todos os lances de seu projeto autoritário estão claramente delineados. O preço de considerá-lo apenas um fanfarrão seria muito alto: ele estimulou a compra de armas, mobilizou-se para negar a pandemia e apontou, cuidadosamente, inimigos para que não faltassem alvos para o ódio acumulado. Serão necessários muito cuidado e habilidade, mas é ilusório supor que o país volte à calma sem neutralizar Bolsonaro, assim como são risíveis as constantes promessas de que um dia, finalmente, ele vai adotar a moderação.
 
Blog do Gabeira - Fernando Gabeira, jornalista

Artigo publicado no jornal O Globo em 09/08/2021


sábado, 11 de abril de 2015

O crepúsculo do lulismo

Os escândalos de corrupção envolvendo o PT e a inoperância do governo Dilma abalam a força política do ex-presidente e colocam em risco o projeto eleitoral de Lula para 2018

Forjado no carisma pessoal e no amplo apoio popular ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o lulismo vive o seu crepúsculo. Se, num passado recente, Lula encarnava a figura política em quem nada de ruim colava, hoje o petista absorve o descrédito do governo e os sucessivos escândalos de corrupção protagonizados pelo PT. Para a população que ocupa as principais avenidas do País para protestar contra o governo, Lula é o parceiro fundamental do fracasso político-administrativo do projeto de poder que levou Dilma Rousseff à Presidência. É a face mais visível e seu principal fiador. Em 2005, no auge do escândalo do mensalão, o então presidente se livrou de um processo de impeachment porque a oposição temia enfrentar as massas em prováveis protestos em defesa do seu mandato. Hoje, a capacidade de mobilização de Lula encontra-se em xeque. 


 Lula, o traste

Desde o final de 2014, quando fora proclamada a vitória da presidente Dilma Rousseff, depois de uma eleição vencida por uma margem apertadíssima, o “nós contra eles” não funciona como em outrora. Antes considerados imbatíveis, Lula e o PT perderam a primazia das manifestações e o “eles” abafou o “nós” na retórica e nas ruas. O que aconteceu na última semana é emblemático. Convocado por Lula com o intuito de se contrapor a mais uma manifestação contra o governo programada para o dia 12 de abril, o protesto organizado pelas centrais sindicais e movimentos sociais em defesa de Dilma produziu um fiasco. Em São Paulo, reuniu pouco mais de 200 pessoas. No Nordeste, onde Lula já registrou seus maiores índices de popularidade, houve Estados, como a Bahia, que não conseguiu mobilizar nem uma centena de militantes. Na desesperada tentativa de engrossar o coro dos esvaziados movimentos em favor do PT, a CUT numa manobra vergonhosa para seu histórico chegou ao despautério de alugar militantes. Para fazer número na manifestação de terça 7 em Brasília, a central pagou cachê de R$ 45, além de oferecer lanche, boné e camiseta para a pessoas pobres da periferia do DF. Na região do Sol Nascente, a maior favela do DF, foram recrutadas 30 pessoas. [o que complicou a CUT, PT e toda a gang petralha é que na manifestação anterior eles prometeram que o lanche seria pão com mortadela e forneceram pão com margarina.]

(...) 

A decepção do eleitor com o lulopetismo fica ainda mais clara na sondagem da CNI/Ibope divulgada no dia 1º registrou que a maioria dos eleitores de Dilma mostra-se arrependida. Em dezembro, 20% dos eleitores da presidente afirmaram que escolheram a petista, mas tinham ressalvas sobre sua maneira de governar. Três meses depois o índice de eleitores arrependidos de terem votado na sucessora de Lula subiu para 66%. Outra pesquisa, desta vez do Instituto Paraná, mostra que o risco de uma derrota eleitoral do PT e de Lula em 2018 é real. Projeção de um segundo turno entre o ex-presidente e Aécio dá ao tucano uma vitória de 51,5% contra 27,2% de Lula – cenário impensável até dois anos atrás. 


Numa última tentativa de preservar o seu legado e, com isso, não arder na mesma fogueira de Dilma até 2018, Lula aproxima-se da esquerda petista, dos sindicatos e movimentos sociais. Ou seja, ao mesmo tempo em que recomenda a presidente a partilha do poder com o PMDB, nas bases partidárias Lula joga em outra direção, revelando o caráter personalista do seu projeto. Líderes de movimentos sociais até então esquecidos ou que tiveram quadros burocráticos cooptados pela estrutura do governo estão sendo, um a um, chamados para conversas e reuniões com o líder petista. O ex-presidente também retomou o Governança Metropolitana, nome de um projeto do Instituto Lula destinado a debater as cidades brasileiras. Deste modo, Lula pretende ouvir reclamações, antecipar o pleito das ruas. 

O ex-presidente ainda articula o resgate da boa convivência do Movimento dos Sem Teto. Na terça-feira 7, um dia após o líder do MTST, o filósofo Guilherme Boulos, afirmar em entrevista que “o lulismo não funciona mais”, o ex-presidente recebeu em seu Instituto representantes dos movimentos nacionais de moradia. Os militantes estavam indóceis com o cancelamento da terceira fase do programa Minha Casa, Minha Vida.

Muitos anos de omissão do PT com a juventude petista também estão no radar de preocupações do ex-presidente. Aos 69 anos, Lula ainda fala melhor com os jovens correligionários do que os dirigentes do partido responsável pela interlocução. Em pesquisas internas, o PT identificou a perda de força entre esses militantes. No caderno de teses que o partido apresentará no congresso da legenda, em junho, está registrado o reconhecimento da rejeição dos jovens à sigla. “É preciso organizar a atuação e a influência de massas do petismo entre os jovens que supere seu profundo processo de dispersão e desorganização em um dos momentos em que o PT é mais desafiado a dialogar com as novas gerações”, afirma o documento. Pesquisa da CNI/Ibope vai na mesma direção ao mostrar que o maior percentual da queda de popularidade do governo concentrou-se entre os mais jovens. Entre os entrevistados de 25 a 34 anos, 92% reprovam a administração petista. Na faixa de 16 a 24 anos, a rejeição é de 86%. A falta de oxigenação do PT expõe uma falha da estratégia lulista. Ao cooptar a União Nacional dos Estudantes (UNE) e se aproximar institucionalmente dos líderes da entidade, o PT imaginou que ganharia o apoio dos jovens. O método não funcionou. O mesmo ocorreu com as centrais sindicais. Os burocratas das organizações trabalhistas ganharam assento no governo, mas os trabalhadores não se sentem mais representados pelos sindicatos.

Continuar lendo.......................... Isto É 

Josie Jeronimo (josie@istoe.com.br)

Colaborou Alan Rodrigues

 
Fotos: Gel Lima/Frame/Ag. o Globo; Marcos Alves/Ag. o Globo, Beto Barata e Eduardo Knapp/Folhapress; Pedro Ladeira/Folhapress; Ricardo Stuckert/Instituto Lula