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quarta-feira, 22 de março de 2023

"Congresso encolhido"

O juiz do Supremo que é julgado pelo Senado é o mesmo que julga o senador ou o deputado. Desse empate, é impossível gerar os pesos e contra pesos idealizados por Montesquieu

O Poder Legislativo é o primeiro dos poderes, como mostra a ordem em que se encontra, no segundo artigo da Constituição. 
É por meio dele que o povo exerce o poder, como diz o parágrafo anterior ao artigo segundo. Decisivo, portanto, para a democracia.

No entanto, o Legislativo, por vontade própria, se diminui, se encolhe, parece assustado ante os outros dois poderes. Agora mesmo, um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, suprimiu um trecho da Lei das Estatais, que havia sido aprovado pela maioria da Câmara e do Senado em 2016 — a proibição de ministros e secretários estaduais ou municipais de serem guindados ao conselho ou direção de estatais. Um único ministro do Supremo se mostra mais poderoso do que centenas de congressistas. [lembrando que milhões de eleitores = portanto, o POVO, o DONO DO PODER = são representados pelos congressistas, além do mais a Lei das Estatais foi sancionada pelo Presidente da República (no caso, Michel Temer) - que ocupava o cargo pelo voto de milhões de cidadãos, eleitores.]

A Lei das Estatais foi um dos grandes avanços pela moralização das empresas públicas, e veio motivada pelos escândalos apurados na Operação Lava-Jato, que atingiram a Petrobras, a Caixa Econômica Federal, entre outras. Agora, é essa lei moralizadora que está sendo vítima de cirurgias castrando sua proteção contra a apropriação das estatais.

Para que o ex-integrante da campanha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Aloísio Mercadante, fosse presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), e o senador Jean Paul Prates presidisse a Petrobras, reduziram a quarentena de três anos para 30 dias. Agora, o PCdoB obteve a liminar de Lewandowski para que o ex-governador de Pernambuco, Paulo Câmara, possa ser nomeado presidente do Banco do Nordeste.

Lembro-me do tempo em que os jornais fiscalizavam essas coisas e nós, jornalistas, adjetivávamos isso como casuísmo. 
E também lembro de que a oposição fiscalizava, pressionando as decisões de Plenário e as mesas da Câmara e do Senado. 
Eram tempos em que assuntos políticos se decidiam nos plenários do legislativo federal, onde os representantes do povo exerciam seu poder de tomar decisões.

Hoje, ao menor indício de que pelo voto não vão decidir, ou a maioria vai ganhar, correm ao Supremo, como um menino ameaçado na escola corre para saia da mãe. E o STF atende. Em outros tempos, respondia que era assunto interno do Legislativo, usando uma expressão latina: interna corporis.

A senadora Soraya Thronicke (União Brasil-MS) recorre ao Supremo por sua CPI do 8 de janeiro, agora só com 15 assinaturas confirmadas, sugerindo mais uma interferência do STF, como aconteceu com a CPI da Covid. O senador Alessandro Vieira (PSDB-SE) também está no Supremo pedindo para o Judiciário decidir uma questão interna do Legislativo, sobre tramitação de medida provisória, num embate entre Câmara e Senado.

Advertência
O ministro Luís Fux, quando assumiu a presidência do STF, advertiu que entrar em assuntos políticos que devam ser resolvidos nos plenários políticos do Congresso é desgastar o Supremo. Mas quem mais se desgasta é o Legislativo, à mercê do Executivo por liberações de emendas, e à mercê do Supremo, porque é o tribunal que julga deputados e senadores. Parece uma "operação casada": o juiz do Supremo que é julgado pelo Senado é o mesmo que julga o senador ou o deputado. Desse empate, é impossível gerar os pesos e contrapesos idealizados por Montesquieu.

Se deputados e senadores fossem julgados pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), como governadores e desembargadores, talvez se desatasse o nó. O que assistimos é o Legislativo se encolhendo como o último dos poderes. Isso põe em perigo a democracia, porque não consegue representar a origem do poder, que é o povo.

Brasil - Correio Braziliense


quinta-feira, 25 de junho de 2015

Habeas corpus? O que é isso?



É quase cômico o desconhecimento geral a respeito do habeas corpus.
O senador Ronaldo Caiado, por exemplo, apressadamente afirmou no Twitter que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva teria apresentado habeas corpus preventivo, sem notar que ele apenas constava como “paciente” da ação, ou seja, como beneficiário, mas não como autor.

Por outro lado, o secretário de comunicação do PT, José Américo Dias, classificou como “falsificação” o pedido de habeas corpus preventivo protocolado em nome do ex-presidente do Luiz Inácio Lula da Silva nos autos da Operação Lava-Jato, pois “Lula não autorizou”.

Ora, ninguém precisa de autorização para ingressar com um habeas corpus em favor de quem quer que seja. Qualquer pessoa, repito, qualquer pessoa, pode ajuizar um habeas corpus para solicitar a liberação de uma pessoa presa injustamente ou para prevenir uma prisão injusta.

Não é preciso ser advogado, nem mesmo apresentar uma procuração ou autorização do preso. A forma da petição também pouco importa, mas sim a demonstração da ilegalidade cometida, podendo ser redigido até mesmo à mão.

OBS: "Que tenhas o teu corpo" é o significado da expressão latina habeas corpus, uma ação bastante peculiar, não só por estar garantida pela própria Constituição federal, como também por ser uma garantia do direito fundamental à liberdade. Por isso mesmo essa liberdade para o seu protocolo, que por vezes resulta em verdadeiras aventuras jurídicas. 

Blog: Traduzindo o Juridiquês