O juiz do Supremo que é julgado pelo Senado é o mesmo que julga o senador ou o deputado. Desse empate, é impossível gerar os pesos e contra pesos idealizados por Montesquieu
No entanto, o Legislativo,
por vontade própria, se diminui, se encolhe, parece assustado ante os
outros dois poderes. Agora mesmo, um ministro do Supremo Tribunal
Federal (STF), Ricardo Lewandowski, suprimiu um trecho da Lei das
Estatais, que havia sido aprovado pela maioria da Câmara e do Senado em
2016 — a proibição de ministros e secretários estaduais ou municipais de
serem guindados ao conselho ou direção de estatais. Um único ministro
do Supremo se mostra mais poderoso do que centenas de congressistas. [lembrando que milhões de eleitores = portanto, o POVO, o DONO DO PODER = são representados pelos congressistas, além do mais a Lei das Estatais foi sancionada pelo Presidente da República (no caso, Michel Temer) - que ocupava o cargo pelo voto de milhões de cidadãos, eleitores.]
A Lei das Estatais foi um dos grandes avanços pela moralização das empresas públicas, e veio motivada pelos escândalos apurados na Operação Lava-Jato, que atingiram a Petrobras, a Caixa Econômica Federal, entre outras. Agora, é essa lei moralizadora que está sendo vítima de cirurgias castrando sua proteção contra a apropriação das estatais.
Para que o ex-integrante da campanha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Aloísio Mercadante, fosse presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), e o senador Jean Paul Prates presidisse a Petrobras, reduziram a quarentena de três anos para 30 dias. Agora, o PCdoB obteve a liminar de Lewandowski para que o ex-governador de Pernambuco, Paulo Câmara, possa ser nomeado presidente do Banco do Nordeste.
Hoje, ao menor indício de que pelo voto não vão decidir, ou a maioria vai ganhar, correm ao Supremo, como um menino ameaçado na escola corre para saia da mãe. E o STF atende. Em outros tempos, respondia que era assunto interno do Legislativo, usando uma expressão latina: interna corporis.
A senadora Soraya Thronicke (União Brasil-MS) recorre ao Supremo por sua CPI do 8 de janeiro, agora só com 15 assinaturas confirmadas, sugerindo mais uma interferência do STF, como aconteceu com a CPI da Covid. O senador Alessandro Vieira (PSDB-SE) também está no Supremo pedindo para o Judiciário decidir uma questão interna do Legislativo, sobre tramitação de medida provisória, num embate entre Câmara e Senado.
AdvertênciaO ministro Luís Fux, quando assumiu a presidência do STF, advertiu que entrar em assuntos políticos que devam ser resolvidos nos plenários políticos do Congresso é desgastar o Supremo. Mas quem mais se desgasta é o Legislativo, à mercê do Executivo por liberações de emendas, e à mercê do Supremo, porque é o tribunal que julga deputados e senadores. Parece uma "operação casada": o juiz do Supremo que é julgado pelo Senado é o mesmo que julga o senador ou o deputado. Desse empate, é impossível gerar os pesos e contrapesos idealizados por Montesquieu.
Se deputados e senadores fossem julgados pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), como governadores e desembargadores, talvez se desatasse o nó. O que assistimos é o Legislativo se encolhendo como o último dos poderes. Isso põe em perigo a democracia, porque não consegue representar a origem do poder, que é o povo.
Brasil - Correio Braziliense