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quarta-feira, 2 de novembro de 2022

"Futuro em jogo"

Alexandre Garcia

Eleição decidida. Próximos quatro anos com um presidente petista. Como serão? Será preciso perguntar à bola de cristal? Ou apenas projetar nesses próximos quatro os 14 já passados e conhecidos? Para 60 milhões de eleitores, os 14 anos já não contam — ou sequer lembram ou não querem lembrar. Na época, eram crianças ou adolescentes, 21 milhões de eleitores de hoje. Muitos outros ainda só recebem notícia de uma única fonte — a fonte que lhes mostra a sua versão dos fatos.

Assim decidimos os próximos quatro anos. Aparentemente, não serão fáceis para o presidente eleito. A Câmara dos Deputados está com 73% de centro-direita e o Senado, com 67%. Além disso, a maior parte dos governadores foi eleita pelo grupo que apoia o presidente que sai.

O presidente que entra vai receber um raro legado, longe da "herança maldita" de outros tempos. Inflação e desemprego em queda, PIB, arrecadação federal e investimentos em alta, balança comercial superavitária, endividamento público em baixa, otimismo entre empreendedores, credibilidade do governo, impostos em baixa, obras de infraestrutura por toda a parte, inclusive água para o Nordeste e ministérios e estatais imunizados de partidos políticos — uma grande oportunidade para o novo chefe do governo, se estiver de bem com a maioria centro-direita do Congresso. [será que o legado resiste aos primeiros seis meses da nova administração? o eleito tem planos para destruir tudo que hoje existe = tudo que vai receber.]

O Senado ainda precisa empurrar o Supremo Tribunal Federal (STF) de volta ao segundo artigo da Constituição, para que o tribunal deixe de ser também legislador e constituinte. Não vai adiantar simplesmente tirar ministro, a menos que o novo presidente indique realmente juízes e não advogados com causa.

A judicialização da política, lamentada no discurso de posse de Luiz Fux, mostra que o tribunal ficou entre dois fogos, por não se manter acima da fogueira das vaidades. Primeiro, é acusado de contribuir para tirar o PT do poder; hoje, é acusado de contribuir para tirar Bolsonaro do poder. Ativismo não é próprio de juízes. Juízes são isentos por natureza, já a natureza de advogados é defender causas. Fazer o STF abandonar o ativismo é um desafio para os poderes com mandato popular. [será? um único exemplo: o 'piso nacional de enfermagem' aprovado pelo voto de senadores e deputados, que somados representam mais de 100.000.000 de eleitores e sancionado pelo presidente da República - quase 60.000.000 de votos - foi suspenso (suspensão que não tem prazo para ser revista e enquanto não for revista,  tem validade total)  por decisão monocrática do ministro Barroso, STF, que não recebeu um único voto para representar o povo.]

Numa eleição de 124 milhões de votos, decidida por pouco mais de 2 milhões de eleitores, mostra duas metades e destaca o quanto o não votar pode ser decisivo. 32 milhões de brasileiros deixaram que os outros decidissem. Não há como não lembrar de Pilatos, que lavou as mãos enquanto o povo optava por quem seria libertado ou crucificado.

Belo discurso
O eleito leu um belo discurso após o resultado. Bonitas palavras, como discursos do século passado — ser um presidente de todos, por exemplo. Nada encontrei sobre a intenção de prevenir a corrupção, nenhuma disposição sobre o teto de gastos, a conquista do equilíbrio fiscal aprovada no período Temer. 
Das palavras ditas, resgatei a afirmação de que o crescimento econômico será repartido entre toda a população. Anunciou a volta das "conferências nacionais" da esquerda e avisou que vai refazer tudo: "É preciso reconstruir este país na política, na economia, na gestão pública, nas relações internacionais" — um indicador da volta daqueles 14 anos de PT.[a certeza é que o futuro governo do eleito, vai conseguir trazer de volta, apena os dois últimos anos do governo Dilma.]

Acentuou que ninguém está acima da Constituiçãoparece recado ao Supremo. Chegou a falar no "orgulho que sempre tivemos do verde e amarelo da bandeira"… mas uma parte sincera do discurso foi a afirmação de que a eleição "colocou frente a frente dois projetos opostos de país". Agora, um projeto vai se opor ao outro. Se o Congresso permitir.

Alexandre Garcia, colunista - Correio Braziliense


domingo, 19 de novembro de 2017

Detrás das grades

 O dispositivo que atribui poder ao Legislativo de autorizar ou não a prisão de seus integrantes está na Constituição de 1988 para preservar o mandato popular


A Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, por 39 votos a 19, decidiu revogar as prisões dos deputados Jorge Picciani, presidente da Casa; Paulo Melo, ex-presidente; e o líder do governo, Edson Albertassi, os três do PMDB. Foi uma demonstração de força de Picciani, o principal cacique político do estado, que tem um governador combalido pela crise econômica, ética e política, Luiz Fernando Pezão; o ex-governador Sérgio Cabral na cadeia e o ex-prefeito Eduardo Paes com o filme queimado. As prisões haviam sido determinadas pelo Tribunal Regional Federal da 2ª Região (Rio de Janeiro e Espírito Santo), por unanimidade.

É uma decisão para entrar na longa história da política fluminense, porque Picciani, Melo e Albernassi comandaram a operação por detrás das grades, pois estavam presos em Benfica. Provaram, assim, que são mesmo os mandachuvas da política fluminense e que têm nas mãos o controle sobre a maioria dos colegas. A revogação fez valer o princípio constitucional de que cabe ao Legislativo autorizar ou não a prisão de seus integrantes. Essa prerrogativa está em linha com recente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) e já vinha sendo exercida em outros estados e municípios, nenhum dos quais com a mesma repercussão.

Há também todo um debate sobre o “transitado em julgado” nas prisões preventivas da Operação Lava-Jato, consideradas longas demais por alguns ministros do STF, como Gilmar Mendes, por exemplo. Não era esse o caso dos três parlamentares, que estavam há menos de 24 horas no xadrez. O dispositivo constitucional que atribui poder ao Legislativo de autorizar ou não a prisão de seus integrantes está na Constituição de 1988 para preservar o mandato popular contra ações arbitrárias do Executivo ou do Judiciário. A Constituição só autoriza a prisão de parlamentar em flagrante delito, por crime inafiançável.

Foi uma resposta dos constituintes às cassações ocorridas durante o regime militar, desde 31 de março de 1964. A motivação foi essencialmente política, ou seja, preservar o direito ao dissenso e à representação política das minorias que se opuserem a quem está no poder contra eventuais retaliações do Executivo ou do Judiciário, o que é muito comum nos estados e municípios. Essa é a essência do dispositivo, que não foi criado para blindar políticos notoriamente corruptos. Mas é isso o que está acontecendo.

Imunidades
Até que haja uma decisão em contrário do Supremo, o que não está descartado quando o caso dos políticos fluminenses chegar à Corte — dependendo do ministro a ser sorteado para relatar, é claro —, não se discute a constitucionalidade da decisão. O que se questiona é o aspecto ético, pois não está escrito na Constituição que parlamentares condenados em matéria penal devam ter as prisões revogadas, necessariamente, em razão da soberania do mandato popular. Ninguém foi eleito para malbaratar os recursos públicos. [lembrando sempre que por mais fartas que sejam as 'provas' apresentadas pelo MP ou Polícia, a condenação só é válida quando por ato do Poder Judiciário e com o devido trânsito em julgado.
Não defendemos corruptos, criminosos, ladrões e corja similar, mas, defendemos que sendo o Brasil um 'estado democrático de direito' as leis tem que ser cumpridas. Criticas podem ser feitas, contestações podem/devem ser apresentadas ao Poder Judiciário, mas, jamais se recomendar o descumprimento de uma lei vigente.
Ou então se acaba com o papo de ser o Brasil um 'estado democrático de direito', se declara que passa a valer o DIREITO DA FORÇA - muitas vezes mais eficiente e até mesmo justo que a FORÇA DO DIREITO. ]

Na verdade, há uma grande demanda político-institucional no país, que precisa repactuar a relação entre o Estado e a sociedade. Os políticos têm a responsabilidade de gerir e teoricamente precisam da sociedade para se legitimarem. Ocorre que a reprodução de seus mandatos depende muito mais do controle que exercem dos recursos públicos do que dos laços que mantêm com a sociedade. Este é o drama: em tese, as eleições são o meio legítimo para o país trocar de elite política, mas é muito difícil isso acontecer. A reforma política foi feita para manter os grandes partidos e seus caciques no poder. O patrimonialismo, o clientelismo e o fisiologismo estão no mesmo pacote

Por: Luiz Carlos Azedo

 

quarta-feira, 18 de outubro de 2017

Luiz Carlos Azedo: Escrito nas estrelas

A vitória de Aécio consolidou a aliança da ala tucana ligada ao presidente Michel Temer, que trabalhou intensamente para que a bancada do PMDB votasse em peso a favor do senador mineiro

O Senado rejeitou por 44 votos a 26 a decisão da primeira turma do Supremo Tribunal Federal (STF) que havia determinado o afastamento do mandato do senador Aécio Neves (MG), presidente licenciado do PSDB, além de obrigá-lo ao recolhimento noturno. Foi uma sessão rápida (durou menos de três horas), mas precedida de muitas reuniões e negociações, além das duas sessões do Senado que foram abortadas para esperar a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que reconheceu a prerrogativa constitucional de os senadores decidirem sobre a aceitação ou não das “medidas cautelares”.

Hoje ainda, Aécio poderá voltar ao plenário do Senado. Foi o grande vitorioso na queda de braço com os ministros Luís Barroso, Luiz Fux e Rosa Weber, que decidiram pelo afastamento na primeira turma do STF, contra os votos do relator do caso, Marco Aurélio Mello, e Alexandre de Moraes. A decisão chegou a colocar em rota de colisão os poderes da República, mas seu desfecho terá consequências que extrapolam o caso Aécio Neves. 

A primeira delas foi reposicionar o próprio Supremo em relação ao Executivo e ao Legislativo, pois blindou os políticos com mandato popular contra o próprio STF. Doravante, as punições a parlamentares — senadores, deputados federais, estaduais e distritais e vereadores — terão que ser submetidas às casas legislativas, em todos os níveis.

A segunda, uma espécie de “alto lá” aos protagonistas da Operação Lava-Jato, tanto no Ministério Público Federal quanto na própria magistratura, que terão menos apoio no próprio Supremo. Estava escrito nas estrelas. Riu por último o relator do caso na primeira turma, ministro Marco Aurélio Mello, que insistiu em pautar o caso mesmo advertido pelo ministro Alexandre de Moraes de que seriam derrotados no colegiado. 

Segundo mais antigo na Corte, Mello sabia a comoção política que a decisão poderia causar e antevia o que aconteceu. Além dos dois derrotados na primeira turma, votaram contra as medidas cautelares Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski e Dias Toffoli. Na defesa de Aécio, ontem, o senador Jader Barbalho (PMDB-PA) várias vezes enfatizou que acompanhava os votos dos cinco ministros que se opuseram à adoção das medidas cautelares.

Apesar de ausente na votação, Aécio trabalhou muito nos bastidores. Depois da votação, disse que “recebeu com serenidade a decisão do plenário que lhe permite retomar o exercício do mandato conferido pelo voto de mais de 7 milhões de mineiros”. Segundo ele, “a decisão restabeleceu princípios essenciais de um Estado democrático, garantindo tanto a plenitude da representação popular, como o devido processo legal, assegurando ao senador a oportunidade de apresentar a defesa e comprovar cabalmente na Justiça a inocência em relação às falsas acusações das quais foi alvo”. Aécio foi acusado de obstrução da Justiça e de participar de organização criminosa pelo ex-procurador-geral Rodrigo Janot, mas ainda não foi julgado.

Temer
A vitória no Senado consolidou a aliança entre a ala tucana ligada ao senador Aécio Neves e o presidente Michel Temer, que trabalhou intensamente para que a bancada do PMDB votasse em peso pela rejeição das medidas cautelares. A contrapartida é o apoio dos deputados do PSDB sob influência de Aécio à rejeição do pedido de investigação de Temer pela Câmara. O relator do pedido em discussão na Comissão de Constituição e Justiça, deputado Bonifácio de Andrada (PSDB-MG), homem ligado a Aécio, recomendou a rejeição da medida e desqualificou as acusações feitas por Rodrigo Janot contra o presidente Michel Temer.


A propósito, ontem, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), minimizou os atritos recentes com o advogado de Temer, Eduardo Carnelós, que chamou de criminosa a divulgação dos vídeos da delação premiada do doleiro Lúcio Funaro contra o peemedebista. Disse ainda que reagiu às declarações do advogado de Temer para garantir “uma relação de respeito”. Maia chamou Carnelós de “irresponsável” e “incompetente” no domingo, mas ontem fez questão de dizer que o bate-boca não teve nada a ver com Temer: “Confundem a defesa da Câmara com qualquer conflito com o presidente Michel Temer. O meu partido faz parte da base do presidente. Mas eu sou presidente da Câmara. Tenho que reagir em nome da instituição. Nada disso afeta minha relação com o presidente. Nós trabalhamos com total harmonia”.
Fonte: Blog Luiz Carlos Azedo - CB