Alexandre Garcia
O presidente que entra vai receber um raro legado,
longe da "herança maldita" de outros tempos. Inflação e desemprego em
queda, PIB, arrecadação federal e investimentos em alta, balança
comercial superavitária, endividamento público em baixa, otimismo entre
empreendedores, credibilidade do governo, impostos em baixa, obras de
infraestrutura por toda a parte, inclusive água para o Nordeste e
ministérios e estatais imunizados de partidos políticos — uma grande
oportunidade para o novo chefe do governo, se estiver de bem com a
maioria centro-direita do Congresso. [será que o legado resiste aos primeiros seis meses da nova administração? o eleito tem planos para destruir tudo que hoje existe = tudo que vai receber.]
O Senado ainda precisa empurrar o Supremo Tribunal Federal (STF) de volta ao segundo artigo da Constituição, para que o tribunal deixe de ser também legislador e constituinte. Não vai adiantar simplesmente tirar ministro, a menos que o novo presidente indique realmente juízes e não advogados com causa.
A judicialização da política, lamentada no discurso de posse de Luiz Fux, mostra que o tribunal ficou entre dois fogos, por não se manter acima da fogueira das vaidades. Primeiro, é acusado de contribuir para tirar o PT do poder; hoje, é acusado de contribuir para tirar Bolsonaro do poder. Ativismo não é próprio de juízes. Juízes são isentos por natureza, já a natureza de advogados é defender causas. Fazer o STF abandonar o ativismo é um desafio para os poderes com mandato popular. [será? um único exemplo: o 'piso nacional de enfermagem' aprovado pelo voto de senadores e deputados, que somados representam mais de 100.000.000 de eleitores e sancionado pelo presidente da República - quase 60.000.000 de votos - foi suspenso (suspensão que não tem prazo para ser revista e enquanto não for revista, tem validade total) por decisão monocrática do ministro Barroso, STF, que não recebeu um único voto para representar o povo.]
Numa eleição de 124 milhões de votos, decidida por pouco mais de 2
milhões de eleitores, mostra duas metades e destaca o quanto o não votar
pode ser decisivo. 32 milhões de brasileiros deixaram que os outros
decidissem. Não há como não lembrar de Pilatos, que lavou as mãos
enquanto o povo optava por quem seria libertado ou crucificado.
O eleito leu um belo discurso após o resultado. Bonitas palavras, como discursos do século passado — ser um presidente de todos, por exemplo. Nada encontrei sobre a intenção de prevenir a corrupção, nenhuma disposição sobre o teto de gastos, a conquista do equilíbrio fiscal aprovada no período Temer.
Acentuou que ninguém está acima da Constituição — parece recado ao Supremo. Chegou a falar no "orgulho que sempre tivemos do verde e amarelo da bandeira"… mas uma parte sincera do discurso foi a afirmação de que a eleição "colocou frente a frente dois projetos opostos de país". Agora, um projeto vai se opor ao outro. Se o Congresso permitir.
Alexandre Garcia, colunista - Correio Braziliense
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