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quarta-feira, 27 de abril de 2022

Percepção de parcialidade do STF legitimou decreto de graça de Bolsonaro - Gazeta do Povo

André Uilano

Ministros do STF que condenaram Daniel Silveira foram ao mesmo tempo os "ofendidos" e os julgadores. Conforme amplamente noticiado, no último dia 20 de abril, “o Supremo Tribunal Federal (STF) condenou o deputado Daniel Silveira (PTB-RJ) a 8 anos e 9 meses de prisão no regime fechado, pagamento de multa de R$ 192,5 mil, além da perda do mandato parlamentar”.

Como foi também extensamente veiculado, essa sanção foi perdoada pelo Presidente da República por meio de indulto individual (também chamado de graça), determinado em decreto publicado no dia seguinte ao do julgamento. Nosso intuito é fazer um exame jurídico da graça concedida, até mesmo porque após sua edição grupos de oposição tentaram produzir uma artificial querela acerca de sua validade. [não temos competência nem experiência para previsões políticas, mas tudo indica que o STF pode levar uma traulitada da Câmara dos Deputados. 
Talvez seja um coincidência, ou um recado, mas a Câmara elegeu Daniel Silveira para cinco comissões permanentes, entre elas a vice-presidência da CCJ -  talvez seja um indicativo de que aquela Casa Legislativa não pretende referendar a cassação do mandato do parlamentar fluminense.]


Todavia, creio que a análise do respectivo decreto demanda o exame das circunstâncias que circundaram e permearam o processo e julgamento do parlamentar. Com efeito, tenho que o que legitimou e viabilizou politicamente a atitude do Presidente da República foi a forte percepção de parcialidade que o STF tem passado há algum tempo. Aliás, essa também foi a compreensão das lideranças políticas, conforme levantamento da Gazeta do Povo.

Por isso, revisitar essas sinalizações da Suprema Corte, as quais vêm erodindo sua autoridade, é fundamental para examinar o decreto em si.

Esse contexto relevante me parece composto, precipuamente, por dois fatores: primeiro, a atuação que o STF adotou contra grupos de direita desde o início do atual governo federal (aliás, já antes disso, o que, no entanto, não abordaremos pois isso tornaria o texto muito longo); em segundo lugar, pela própria conduta do Tribunal durante o caso Daniel Silveira, conduta esta que muitos acreditam ter sido marcada pela parcialidade, a qual estaria refletida na seletividade (pessoas de esquerda que cometeram condutas semelhantes não responderam penalmente), no açodamento (processo tramitou muito mais rápido do que o normal), na prática constante de ilegalidades processuais e na desproporcionalidade da pena aplicada.

Nossa abordagem ocorrerá do seguinte modo: no presente texto, trataremos apenas dos indícios de parcialidade (e, segundo alguns, até de perseguição) do STF contra grupos políticos de direita. No próximo texto, apontaremos as ilegalidades que acreditamos terem ocorrido durante a prisão, as investigações, o processamento e a condenação do parlamentar Daniel Silveira. Por último, faremos um texto à parte cuidando apenas dos aspectos jurídicos do decreto.

Atuação do STF em relação a grupos políticos de direita
O processo e a condenação de Daniel Silveira ocorreram num cenário descrito por muitos como de sistemática perseguição do STF a grupos e pessoas de direita. Essa percepção é bastante difundida e consolidada em amplos grupos sociais. A atuação do Tribunal já levou inclusive o jurista Ives Gandra da Silva Martins a afirmar: “O Supremo se transformou no maior partido de oposição”.

O próprio ministro da Suprema Corte Marco Aurélio, quando ainda em exercício, reconheceu que o STF se tornou um tribunal de boicote ao Presidente eleito Jair Bolsonaro. Disse ele: “o STF está sendo utilizado pelos partidos de oposição para fustigar o governo. Isso não é sadio. Não sei qual será o limite”.

Vale lembrar que a própria composição da Corte, por si só, naturalmente causaria desconforto e ceticismo. Isso porque ela é composta por ampla maioria indicada por grupos políticos de oposição. Se adotarmos a potencial chapa "Lula-Alckmin" como parâmetro de oposição, 9 dos 11 ministros são próximos a esses setores da política. Dois por proximidade com a velha guarda do PSDB e outros sete por afinidade com o PT (ou até militância explícita) . Mas os indícios de atuação parcial não param por aí. Longe disso.

Na verdade, as razões que embasam as alegações de parcialidade e partidarização do órgão são muitas. Como dito acima, mesmo antes do início do atual mandato presidencial, vários grupos já apontavam indícios de captura do tribunal: o próprio perfil dos ministros, alguns com histórico de militância pessoal em favor de partidos de esquerda; as "prioridades" das ações da Lava Jato que corriam perante o STF, parecendo mirar particularmente na oposição ao PT e mais tarde provocando enorme instabilidade após a queda de Dilma Rousseff; a interferência indevida nas regras de tramitação do impeachment; a ações juridicamente questionáveis contra o próprio Bolsonaro enquanto parlamentar, exatamente quando começava a angaria maior relevância etc.

Mas foi realmente depois da eleição de Bolsonaro que os traços de cooptação partidária ficaram mais evidentes. Em primeiro lugar, os ministros desde o princípio fizeram questão de manifestar hostilidade pessoal ao Presidente. Vejamos alguns casos de muitos outros que poderiam ser mencionados. Ainda em 2018, logo após o pleito eleitoral, a ministra Carmen Lúcia falou em mudança "perigosamente conservadora" na política. A mesma ministra mais recentemente, segundo matéria da Gazeta do Povo, assinou "carta pró-aborto com nomes da esquerda". Houve também quem visse "recados" e indiretas de Rosa Weber a Bolsonaro no dia de sua diplomação.

Logo, começou a haver também o uso de votos para ofender o Presidente. Em agosto de 2019, o Min. Celso de Mello usou um voto para proferir críticas pessoais e totalmente desproporcionais ao mandatário. Disse ele: "Parece ainda haver, na intimidade do poder, um resíduo de indisfarçável autoritarismo, despojado sob tal aspecto quando transgride a autoridade da Constituição." No caso, Bolsonaro havia repetido um dispositivo em duas medidas provisórias diferentes, o que o Tribunal entendeu que colidia com o § 10 do art. 62 da Constituição, o qual tem a seguinte redação: " É vedada a reedição, na mesma sessão legislativa, de medida provisória que tenha sido rejeitada". A assessoria da presidência, no entanto, acreditava que não haveria inconstitucionalidade em repetir um único dispositivo. Ainda que o Ministro discordasse, a reação teve nítidos contornos de agressão verbal politicamente motivada, uma vez que a questão jurídica era trivial e não envolvia qualquer indicativo de autoritarismo. [não pode ser olvidado que o ministro citado chegou ao ponto de autorizar a condução debaixo de vara para oficiais generais,  membros do governo Bolsonaro,  que não comparecessem a um depoimento - por sorte, do ministro, por razões diversas a forma de condução sugerida não foi usada, sequer cogitada de forma séria.]

A partir de 2020, logo após o início da pandemia, num momento em que razões humanitárias sugeriam a preservação da estabilidade, para que o país pudesse fazer frente à pandemia, o STF aproveitou para intensificar as medidas tomadas no bojo do Inquérito do Fim do Mundo, uma aberração que viola todos os corolários do devido processo legal, eivado de inúmeras inconstitucionalidades e ilegalidades. Com base nessa investigação, o STF passou a direcionar várias medidas fortemente invasivas e persecutórias sempre e exclusivamente a apoiadores do Presidente.

Em sua manifestação sobre uma das operações deflagradas no curso desse infame procedimento, o próprio PGR falou no "risco de indesejável fishing expedition", isto é, de “pescaria probatória”, um instituto ilegítimo e ilícito. Na época, Alexandre de Moraes chegou a determinar a quebra de sigilo de dados em período muito anterior ao dos fatos, regredindo as investigações para 2018, período das eleições. A medida, estranhíssima e que não parece fazer sentido sob o ponto de vista jurídico, foi lida como uma tentativa de "pescar" alguma irregularidade na campanha de Bolsonaro a fim de tentar a “virada de mesa”. O TSE mais tarde, de fato, veio a requerer acesso às provas para usá-las em procedimento que visava cassar a chapa eleita em 2018.

Em entrevista concedida no final de 2020, o Ministro Paulo Guedes falou que realmente houve a orquestração de um golpe para derrubar o Presidente no primeiro semestre daquele ano, valendo-se da instabilidade ocasionada pela pandemia. A funesta e antidemocrática iniciativa, no entanto, falhara.

Ainda mais recentemente, o TSE, em decisão com fundamentação insuficiente, utilizou procedimentos eleitorais para sufocar financeiramente a atuação de jornalistas e influenciadores de direita, confiscando integralmente seus ganhos.

Ainda em 2020, o ministro Alexandre de Moraes direcionou um inquérito sobre atos (supostamente) antidemocráticos contra parlamentares apoiadores do Presidente, realizando uma série de quebras de sigilo. Na verdade, ao que se pode extrair a partir do que foi divulgado, houve atos populares multitudinários, com esparsas e raras manifestações de cunho antidemocrático, que foram generalizados por opositores para estigmatizar a manifestação. 
O direcionamento contra os parlamentares parece ter-se dado simplesmente por sua participação no ato, o que é totalmente infundado.

Mais tarde, efetivamente o vice-PGR veio a promover o arquivamento do inquérito por falta de provas. No curso da investigação, o jornalista Oswaldo Eustáquio foi preso e ficou paraplégico dentro da prisão. Ele diz ter sido torturado.

No seio de algum desses inquéritos, Alexandre de Moraes pediu também a prisão do jornalista Allan dos Santos, o qual, segundo muitos, estaria sofrendo a mais cruel caçada judicial contra um profissional de imprensa desde o fim da ditadura. As medidas que vem sendo adotadas nitidamente tem como efeito submeter o jornalista - pai de vários filhos inclusive, segundo ele, uma menina com problemas médicos que exige tratamentos caros e especiais - a um total estado de penúria.

Quanto ao pleito de sua prisão, ele foi rotundamente ignorado pela Interpol. Ao que tudo indica, a diligência não foi efetivada porque um setor da entidade especializado em identificar casos de perseguição política barrou o procedimento. Frise-se que se trata de instituição cuja seriedade e histórico de cooperação com a justiça brasileira é absolutamente inquestionável. Nenhum outro órgão do Judiciário brasileiro passou por tamanho vexame perante aquele órgão. Na verdade, reações desse tipo por parte da Interpol ocorreram apenas em face de ordens de prisão de tiranias como a Venezuela e a Bolívia. Isso demonstra o tamanho do constrangimento protagonizado pelo STF no episódio.

Um pedido de extradição foi apresentado no mesmo contexto aos Estados Unidos. Mesmo em se tratando de uma democracia consolidada e amiga, o requerimento foi igualmente ignorado. Esses fatos tornam muito difícil sustentar que a perseguição ao jornalista seja juridicamente justificada.

Por casos desse tipo, o Supremo Tribunal Federal já coleciona contra si denúncias perante o sistema da Corte Interamericana da Direitos Humanos e a Organização de Estados Americanos, por alegadas violações a direitos humanos sempre contra pessoas e grupos de direita.

A militância com forte viés político dos ministros também já ocorreu fora da atuação jurisdicional. Em troca de mensagens privadas, o ministro Celso de Mello comparou Bolsonaro com Hitler. Eventos oficiais, palestras e entrevistas também passaram a ser utilizadas para atacar o Presidente da República.

Esses, basicamente, foram alguns dos principais fatos que delinearam o contexto mais amplo em que ocorreu o processamento e a condenação do deputado Daniel Silveira, conhecido apoiador do Presidente da República. No próximo texto, iremos abordar as ilegalidades ocorridos no processo específico do parlamentar e que acreditamos que também foram cruciais para legitimar o decreto de graça. Num terceiro texto, analisaremos juridicamente o indulto em si.

André Uilano, colunista - Gazeta do Povo - VOZES


quarta-feira, 25 de março de 2020

Reflexões sobre a epidemia - Nas entrelinhas

Na cabeça do presidente, não existe guerra sem defuntos: as taxas de letalidade da epidemia são baixas demais para justificar uma recessão econômica”

Quando as ideias liberais clássicas de Adam Smith pareciam consagradas no Ocidente, em meio à corrida mundial para reinventar o Estado, a epidemia de coronavírus virou tudo de pernas para o ar. O revisionismo reformista de Lord John Maynard Keynes parece renascer das cinzas, com sua Teoria Geral do Emprego, do Juro e do Dinheiro. Para conter a epidemia, o mundo está mergulhando numa recessão geral, fruto da globalização tanto quanto a propagação do novo coronavírus, que começou na China, tomou de assalto a Europa, se instala nos Estados Unidos e se expande na periferia, na qual países como a Índia e o Brasil se preparam para a uma tragédia anunciada.

Para o keynesianismo, os níveis de consumo, de investimentos público e privados e aplicações dos cidadãos são determinantes da política econômica. Quando eles se retraem, a crise vem a galope. A velha fórmula de Keynes para enfrentar essa situação está sendo exumada por ninguém menos do que o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, que pretende injetar mais de US$ 1 trilhão na economia norte-americana para aliviar o sufoco gerado pela paralisação da economia. A Casa Branca foi o centro da resistência à política de distanciamento social preconizada pela Organização Mundial de Saúde (OMS), mas capitulou, diante da tomada de Nova York pela epidemia. Da cidade mais rica do mundo, a epidemia se espalha por todos os estados da União.

Como na Grande Depressão de 1929, só o Estado pode conter o atual desequilíbrio da economia. Aquela crise teve outras causas: foi consequência da grande expansão de crédito por meio de oferta monetária (emissão de dinheiro e títulos), que precisou ser freada. O governo parou, começou a enxugar o mercado e a operar uma política de restrição de empréstimos. Temendo a desvalorização da moeda, muitas pessoas e empresas retiraram suas reservas dos bancos, dando início a um processo de recessão.

A solução para esse problema seria controlar a recessão, permitindo a liberdade de preços e salários, até que o mercado se adequasse à nova situação. No entanto, ao contrário disso, o governo passou a exercer arrochado controle sobre os preços e os salários, além de promover aumento de impostos. Isso agravou a recessão e, em cinco dias, a Bolsa quebrou, levando à falência empresas e bancos e, ao desemprego, 12 milhões de pessoas nos Estados Unidos, uma recessão que se alastrou por todo o mundo.

A fórmula de Keynes era os governos aplicarem grandes remessas de capital na realização de investimentos que aquecessem a economia de modo geral, além de linhas de crédito a baixo custo para garantir a realização de investimentos do setor privado e a elevação dos níveis de emprego. Mas isso era uma ofensa ao “livre mercado”. Coube ao presidente Franklin Delano Roosevelt, um homem paraplégico por causa da poliomielite, enfrentar a recessão.

Governador de Nova York desde 1928, disputou e ganhou a Presidência dos Estados Unidos em 1932, prometendo um novo e ousado plano de ação para resgatar a nação dos efeitos da grande depressão. Convenceu os americanos de que não havia mais nada a temer. Empossado em março de 1933, em apenas 100 dias, Roosevelt conseguiu aprovar no Congresso seu plano baseado nas ideias keynesianas. O New Deal (Nova Ordem) garantiu US$ 3,3 bilhões para investir na criação de empregos e na recuperação industrial. Nascia o Estado de bem-estar social.

Errático
Roosevelt propôs programas inovadores, que geraram milhões de empregos, e criou a Lei de Seguridade Social, um plano de aposentadoria com abrangência nacional, a grande herança de seu governo. Reeleito três vezes (1936, 1940 e 1944), morreu pouco antes do fim da II Guerra Mundial, na qual foi um dos Três Grandes, ao lado de Winston Churchill, o primeiro-ministro britânico, e Youssef Stálin, o líder da antiga União Soviética, que comandaram as forças aliadas contra o nazifascismo.


Aqui no Brasil, diante da epidemia de coronavírus, a política econômica ultraliberal do ministro da Economia, Paulo Guedes, entrou em colapso. Tornou-se insustentável diante da redução da atividade econômica. Na verdade, seus resultados já eram pífios antes da epidemia. Economistas como Armínio Fraga, Monica de Bolle e André Lara Rezende já vinham questionando o ministro. O mercado já está com saudades do ex-ministro Henrique Meirelles, hoje secretário da Fazenda de São Paulo.

É esse debate que está por trás do embate entre o presidente Jair Bolsonaro e os governadores em relação às medidas de quarentena adotadas nos estados e municípios. Na cabeça do presidente, não existe guerra sem defuntos: as taxas de letalidade da epidemia são baixas demais para justificar uma recessão econômica. O remédio é deixar morrer. Ontem, foi à tevê, em cadeia nacional, para atacar a imprensa, os governadores e os prefeitos e criticar as medidas de distanciamento social adotadas para conter a epidemia, que continua chamando de gripezinha. Quando parecia ter entrado em entendimento com os demais governantes, recrudesceu. Temos um presidente errático em relação à crise que o país enfrenta. [os governadores nada somam no combate à crise.
Melhor dizendo, somam sim = as quantias que a União tem que repassar aos Estados, para domesticar os governadores - em sua maioria, se procurando com atenção se encontra uma ou outra exceção.]

Nas Entrelinhas - Luiz Carlos Azedo - Correio Braziliense


quinta-feira, 28 de março de 2019

A confissão de Battisti

O ato reverencia as instituições policiais e judiciárias da Itália e envergonha todos os que se lançaram na defesa de um condenado por crimes de sangue

“Quando matei, para mim foi uma guerra justa. Eu tinha 22 anos e me parecia a escolha certa”. A declaração foi dada pelo terrorista italiano Cesare Battisti ao procurador Alberto Nobili, do Ministério Público de Milão, e divulgada à imprensa pelo procurador-geral daquela província italiana, Francesco Greco. Pela primeira vez em 40 anos, Cesare Battisti admitiu ser culpado pelos assassinatos de Antonio Santoro, em 1978, e Pierluigi Torregiani, Lino Sabbadin e Andrea Campagna, em 1979. Além de ter matado os quatro, Battisti feriu gravemente outras três pessoas, uma delas o filho de Pierluigi, Alberto Torregiani, que ficou paraplégico.

A um só tempo, a confissão tardia de Cesare Battisti presta reverência às instituições policiais e judiciárias da Itália e envergonha todos os que, por cálculo político ou fervor ideológico, se lançaram na defesa de um réu condenado à prisão perpétua por crimes de sangue após processos nos quais lhe foram garantidos os meios de defesa.

Após fugir da prisão, em 1981, Battisti iniciou um périplo de fuga que passou pelo México e pela França antes de chegar ao Brasil, em 2004. Três anos depois, foi preso no Rio de Janeiro. Em 2009, o Supremo Tribunal Federal tomou a decisão de dar a palavra final sobre sua extradição ao então presidente Lula da Silva, que rejeitou mandá-lo de volta à Itália. Como se não fossem poucos os males que infligiu ao País, Lula ainda nos causou mais esse embaraço ao orientar uma decisão de Estado por mera afinidade ideológica.

Não foram raras as vezes em que a Itália foi tratada como uma republiqueta de bananas, enxovalhada por todos os que desqualificaram o Judiciário daquele país como única forma de defender o indefensável. Dizer que Cesare Battisti era um “perseguido político”, como o fizeram Lula, Tarso Genro e outros próceres petistas, significa dizer que a Itália não é um Estado Democrático de Direito, um país que sentencia seus réus após processos em que a culpabilidade é comprovada por evidências.

O desrespeito a uma nação soberana e democrática, como é a Itália, não ficou restrito ao Poder Executivo brasileiro. Houve membros do Judiciário que também deram sua cota de vexame na defesa pública que fizeram do assassino do grupo Proletários Armados pelo Comunismo (PAC).  A dignidade do Brasil, neste caso particular, só veio a ser resgatada pelo ex-presidente Michel Temer. Foi ele quem, em 14 de dezembro passado, assinou o decreto de extradição do italiano. Após a decisão de Temer, Battisti fugiu para a Bolívia, onde foi preso e, enfim, extraditado para seu país, onde cumpre sua pena.

O presidente Jair Bolsonaro usou o Twitter para comentar a confissão do italiano. “Por anos denunciei a proteção dada ao terrorista, aqui tratado como exilado político. Nas eleições, firmei o compromisso de mandá-lo de volta à Itália para que pagasse por seus crimes. A nova posição do Brasil é um recado ao mundo: não seremos mais o paraíso de bandidos”, escreveu o presidente.

De fato, a extradição de Cesare Battisti foi uma das promessas de campanha de Bolsonaro. Mas seria de justiça esperar do atual presidente que, além de celebrar a sua “promessa”, reconhecesse que sua materialização deve ser creditada ao antecessor e ao presidente da Bolívia, Evo Morales. A extradição assinada por Michel Temer foi, antes de tudo, uma decisão do Estado brasileiro. Tal reconhecimento por Jair Bolsonaro seria um gesto republicano.

Battisti disse ter “noção do mal que causou” e se dirigiu às famílias das vítimas para lhes pedir desculpas. O procurador Alberto Nobili disse ter tido a sensação de testemunhar “um rito de libertação” do prisioneiro, uma forma de aliviar sua consciência, por meio da confissão, para ter alguma paz de espírito no cumprimento de sua longa pena. É ingênuo supor que a mesma contrição será feita por líderes políticos e ativistas que até hoje sustentaram sua inocência. No que nos concerne, o que se espera é que o episódio tenha servido para o amadurecimento de nossas instituições de Estado.

Editorial - O Estado de S. Paulo