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sábado, 14 de julho de 2018

Agenda do próximo governo fica mais difícil



A aprovação no Congresso de mais despesas piora as expectativas para 2019 e aumenta o desafio ao próximo presidente, algo que o eleitor precisa considerar

Pré-candidatos concentram a atenção nas conversas para montar alianças com vistas ao tempo de campanha eleitoral na mídia eletrônica e à captura de votos pelo país, mas deveriam também começar a se preocupar com o que os espera a partir de 1º de janeiro.

A perspectiva vista do início deste ano não era animadora, mas também não apontava para o agravamento do cenário. A economia se recuperava, mesmo que lentamente, e as contas públicas continuariam em déficit (sem considerar juros da dívida pública, algo como R$ 150 bilhões). Já a inflação permaneceria em rédeas curtas.


Passou-se do meio do ano, porém, e o tempo começou a mudar. O crescimento abandonou as rotas de projeção de 3% e veio em voo planado para baixo, chegando, hoje, ao patamar de 1,5% e 1%. A greve dos caminhoneiros foi um tranco e tanto no sistema produtivo — provocou, em maio, em relação a abril, uma queda de 10,9% na produção industrial, segundo o IBGE. O sistema de transporte voltou a funcionar, a produção começou a se recuperar, mas o fraco governo Temer cedera, como tem sido seu costume, e em pontos estratégicos. Para atender os caminhoneiros, permitiu a volta do congelamento (do diesel) e do tabelamento (do frete). Um retorno aos tempos pré-Real.

Se o horizonte, em ano eleitoral, já não estimula empresas a investir, as novas incertezas as mantêm em estado de observação. A economia perde velocidade, o desemprego continua elevado, as vendas no comércio não reagem, e os agentes econômicos se fecham mais ainda na retranca, à espera das urnas de outubro.


Pairam, também, sobre o país efeitos do agravamento da guerra comercial deflagrada por Trump contra a China. Tudo está ainda no início, mas o mundo já aprendeu que não se pode ser otimista diante do presidente americano. Se o pior acontecer, o mundo entra em recessão — escasseiam divisas, o dólar sobe mais ainda, e acaba o ciclo de inflação brasileira sob controle. Juros subirão, e virá a retração econômica. Para arrematar, há os contrabandos feitos no Congresso, na votação da Lei de Diretrizes Orçamentárias para 2019, sempre na contramão da necessidade de uma política fiscal austera. Estima-se que as pautas-bomba de deputados e senadores gerem mais de R$ 100 bilhões em novas despesas. Para medida de comparação: projeta-se para o ano que vem um déficit de R$ 123 bilhões. Os gastos a mais quase duplicariam o rombo.



Temer pode vetar desvarios, mas não se aposta em sua capacidade política de fazê-lo; e, se o fizer, não se duvida que o Congresso derrube os vetos presidenciais. Piora a herança do próximo presidente, o que deveria preocupar não apenas os pré-candidatos, mas o eleitor. O agravamento de problemas, principalmente no campo das finanças públicas, precisa ser levado em conta nas urnas.

Uma escolha errada causará um grande retrocesso, com a volta de crises já vividas. Mesmo que Trump e Xi Jinping se entendam, a vida ficará mais difícil para os brasileiros.






sexta-feira, 8 de junho de 2018

Tabelamentos: ai, ai , ai - A sedução do controle de preços

O governo já viu que garantir um desconto de R$ 0,46 por litro de óleo diesel produz um punhado de distorções

Épocas de crise produzem coceira populista. Se a crise coincidir com período eleitoral, como agora, a coceira fica maior ainda. Uma dessas coceiras é a que pressiona por tabelamentos de preços. Qualquer tabelamento sempre sai supostamente para beneficiar um lado do preço, em prejuízo de quem está do outro lado. E isso complica tudo. O governo já viu que garantir um desconto de R$ 0,46 por litro de óleo diesel produz um punhado de distorções. Uma delas é a de que não dá para exigir que os postos repassem esse desconto ao consumidor, porque, afinal, os preços estão liberados.

Além disso, cada Estado tem sua alíquota de ICMS e muitos deles se dedicam à guerra fiscal na cobrança de IPVA. E tem o biodiesel, produzido de óleo de soja, que vai misturado à proporção de 10% ao óleo diesel.  Entre as razões pelas quais os caminhoneiros batalharam pela redução dos preços do óleo diesel está a esticada nos preços do petróleo que, em apenas 12 meses foi dos US$ 48,8 por barril para os atuais US$ 75. Os analistas avisam que, em 2019, grande número de poços de óleo de xisto entrará em produção nos Estados Unidos, fator que tende a derrubar os preços. Se os preços do petróleo desabarem, preços tabelados tendem a se manter lá em cima, para prejuízo dos caminhoneiros e dos outros consumidores.

Mas agora prevalece a coceira: obrigue-se o posto de combustível a expor o preço cobrado e, então, bastaria acionar os antigos fiscais do Sarney que se prontificariam a fazer denúncias, sabe-se lá para que autoridade que, por sua vez, acionará uma polícia ainda a ser criada, para obrigar o posto de combustível a obedecer, baseado obviamente em decretos que precisariam ser assinados e tal. O  caminhoneiro, no entanto, não quer apenas que os descontos cheguem aos postos. Quer frete da sua conveniência. Aí vêm os luminares de Brasília dispostos a determinar também o tabelamento do frete Brasil afora. Os primeiros levantamentos indicam que a fixação por preços mínimos pela medida provisória já em vigor aumentará os fretes em alguma coisa entre 30% e 80%. Como o frete está bem mais abaixo, não por falta de tabelamento, mas por existir mais caminhão do que carga a transportar, é mais do que óbvio que esses preços artificiais não têm razão técnica para serem respeitados. Assim, caso se mantenham os fretes artificiais, fica inevitável a prática de concessão de descontos, a serem concedidos aos contratadores do transporte. Ficaria assim instituído o frete paralelo? A Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) avisou que não tem condições de fiscalizar a observância de qualquer tabela. Convoquem-se, portanto, as Forças Armadas para fiscalizar postos de combustível?

Tabelamento assim, com casca e tudo, teria de levar em conta inúmeras variáveis impossíveis de controlar, algumas já contempladas no Anexo II da medida provisória, como condições da estrada, número de eixos, quilometragem rodada, tipo de carga transportada ou pedágio cobrado. Assim, a observância do tabelamento ficará ainda mais inadministrável do que os problemas que levaram a ele.  Mais uma distorção. Se o óleo diesel tem de ser subsidiado, como acaba de ser determinado, por que esse subsídio deve favorecer também os proprietários de caminhonetes, de vans, furgões e de SUVs a diesel, veículos nem sempre de trabalho, mas de exibição de gente endinheirada? Aí aparecem outras soluções de ocasião. Por que não, por exemplo, distribuir cupons para os caminhoneiros – e só para eles para que o benefício público não seja estendido a quem não precisa dele?

Mas, se fosse por aí, quantos cupons e com que critérios distribuir por caminhoneiro? Como impedir falsificações? Como evitar os repasses para terceiros, tanto de cupons como de óleo diesel subsidiado assim obtido? Os proprietários de peruas escolares também teriam direito aos cupons? Ou seja, novos artifícios tendem a produzir mais artificialidades.

Enfim, tabelamentos e controles de preços produzem distorções. Os produzidos pelo presidente Sarney naqueles desastrosos planos econômicos da segunda metade dos anos 80 não foram os últimos. A administração Dilma derrubou os juros na marra, tabelou os preços do quilowatt-hora, promoveu a redução das tarifas da condução urbana, atrasou inúmeros preços e tarifas, inclusive os dos combustíveis, situação que, por sua vez, provocou atrasos dramáticos nos reajustes dos tais preços administrados. A correção dessas monstruosidades custa caro, como já se sabe.  Será que em tempo de eleições vale tudo? Vale acionar todas as coceiras?


Celso Ming - O Estadão


A sedução do controle de preços

Entusiastas do controle de preços não lidam com a realidade e sim com o devaneio de que basta querer para que os preços se ajustem a seus desejos

A despeito dos muitos exemplos da história recente do Brasil de que o controle de preços é invariavelmente danoso para a economia, esse expediente voltou a ser considerado válido pelo governo e por parte significativa da sociedade, agora para atender aos reclamos dos caminhoneiros que fizeram greve para obrigar a queda do preço do diesel. Houve até ministro que prometeu usar “todo o poder de polícia” para garantir que a redução do preço desse combustível acertada com os caminhoneiros chegasse aos postos – como se os preços na bomba não fossem livres.
Se controle de preços funcionasse, o Plano Cruzado teria sido um retumbante sucesso. Como se sabe, mas volta e meia se esquece, o Cruzado, lançado em fevereiro de 1986 pelo então presidente José Sarney, congelou preços na expectativa de finalmente conter uma inflação que àquela altura era típica de país conflagrado. “Iniciamos hoje uma guerra de vida ou morte contra a inflação”, anunciou Sarney na TV. O Brasil foi fragorosamente derrotado nesse combate porque, em resumo, não se pode revogar as leis básicas da economia.

Se a inflação desorganiza o mercado, porque se perde a noção de valor do dinheiro e dos produtos, o congelamento de preços igualmente afronta as relações econômicas. Preços têm a função de refletir a disponibilidade daquilo que é precificado. Uma vez tabelado, o preço deixa de cumprir essa função básica, desorientando os agentes econômicos e levando ao desabastecimento – afinal, não há porque produzir mercadorias se o preço destas, por estar congelado, não puder refletir os custos da produção, que sobem livremente.  Essa lição elementar foi ignorada em 2013 pela então presidente Dilma Rousseff, quando a petista anunciou a redução das tarifas de energia elétrica, à custa do caixa da Eletrobrás, e manteve, para os leilões do setor, sua obsessão pela modicidade tarifária, que naturalmente afugentou os investidores.

Dilma cometeu o mesmo erro na Petrobrás, ao obrigar a estatal a subsidiar o preço dos combustíveis, artificialmente reprimidos na vã tentativa de conter a inflação. Levará ainda muitos anos até que todo esse passivo deixado pelo voluntarismo dilmista seja eliminado. É evidente que, por ser administrado, o preço dos combustíveis sempre sofrerá alguma forma de controle, ainda mais considerando-se que a Petrobrás detém praticamente o monopólio do refino no Brasil. Ainda assim, a estatal não pode ignorar as variações internacionais dos preços, pois, se o fizer, estará onerando a empresa, gerando um prejuízo que recairá sobre o conjunto da sociedade sem que esta possa opinar a respeito.

A ruína da Petrobrás nos anos lulopetistas só foi revertida porque a empresa, sob a direção de Pedro Parente, realinhou seus preços aos do mercado internacional. Mas as forças do atraso demonstraram seu vigor com a greve dos caminhoneiros e com a reação oportunista de líderes políticos diante da crise. Como resultado, Parente deixou a Petrobrás e a empresa agora será levada a refrear seus reajustes. Até a Agência Nacional do Petróleo (ANP), que se ausentou durante toda a crise dos caminhoneiros, reapareceu apenas para anunciar que haverá “regulamentação” da periodicidade dos aumentos de preços.

Esse tipo de interferência, todos deviam saber, não costuma acabar bem
. Tome-se como exemplo a imposição do preço mínimo do frete, outra exigência dos caminhoneiros atendida pelo governo. Como esse preço agora não pode ser livremente negociado, os custos sofrerão aumento significativo – no setor de grãos, por exemplo, calcula-se uma alta de até 95%, que provavelmente não poderá ser compensada no preço final, uma vez que esse preço é definido pelo mercado internacional. Não à toa, vários setores da indústria e do agronegócio interromperam seus negócios e temem grandes prejuízos, além de perda de competitividade.  Nada disso foi levado em conta pelos entusiastas do controle de preços, pois eles não lidam com a realidade, e sim com o devaneio de que basta querer para que os preços se ajustem a seus desejos. Sem trocadilho, o preço a pagar por esse amadorismo será imenso.


Editorial - O Estado de S. Paulo