Negócios em família
Como empresários e lobistas montaram uma rede de proteção em torno dos filhos de Lula e passaram a bancá-los, em troca de benesses no governo. O envolvimento dos familiares arrasta ainda mais o ex-presidente petista para o epicentro dos escândalos
No início do mês de outubro, uma movimentação atípica chamou a atenção no edifício nº 450 da Rua Padre João Manuel, nos Jardins, endereço nobre em São Paulo. A vizinhança notou que pessoas retiravam papéis e outros objetos da LFT Marketing Esportivo, de propriedade de Luís Cláudio Lula da Silva. Naquela ocasião, já era de conhecimento público que a empresa do filho do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva entrara no radar das autoridades responsáveis pela Operação Zelotes, investigação que desbaratou uma quadrilha acusada de fraudar o Carf, o conselho que julga recursos contra multas aplicadas pela Receita. Os condôminos do conjunto comercial ouvidos por ISTOÉ ficaram com a impressão de que os responsáveis pelo escritório estavam de mudança. Não se tratava disso. Tudo ficaria mais claro três semanas depois: na segunda-feira 26, a Polícia Federal promoveu uma devassa no escritório. Vasculhou o local atrás de informações para tentar elucidar as relações de Luís Cláudio com um grupo de lobistas acusados de comprar medidas provisórias editadas pelo governo federal.
Se, ao que tudo leva a crer, o filho do
ex-presidente tinha algo a esconder, ao se antecipar à ação da PF e
fazer uma limpa no imóvel, só o aprofundamento das investigações poderá
dizer com mais precisão. A PF, no entanto, já reúne indícios suficientes
para concluir que em torno dos filhos de Lula foi montada uma espécie
de rede de proteção sustentada por empresários que, com a ascensão do
petista ao poder, tinham interesses em estreitar laços com o governo e
turbinar seus negócios. Com o beneplácito do próprio Lula.
Os dois filhos de Lula - investigações sobre os negócios suspeitos dos pupilos foram encaminhadas pelo ministro Teori Zavascki ao juiz Sérgio Moro, o que torna quase certo que em breve os dois garotos estejam com unidos por algemas presas ao braço direito de cada um. Método eficiente e prático para neutralizar presos que possam oferecer alguma reação ou empreender fuga
Servir de elo com os familiares de Lula é
uma especialidade do pecuarista, na avaliação dos investigadores da PF.
Segundo apurou ISTOÉ, ele teria contribuído para aproximar o empresário
Natalino Bertin, proprietário do Grupo Bertin, do clã Lula em meio às
negociações para venda de uma fatia do frigorífico. A proximidade
resultou em favores aos filhos de Lula. A pedido de Bumlai, Bertin
disponibilizou um jatinho para os filhos de Lula em São Paulo entre 2010
e 2011. De acordo com um piloto da cidade de Lins (SP), onde a aeronave
chegou a ficar estacionada, os Lulinhas usaram e abusaram do mimo. “O
jato foi utilizado com freqüência. Principalmente aos fins de semana,
quando a família ia para praias do Nordeste”, afirmou.
Outro empresário destacado para bancar os
filhos do ex-presidente é Jonas Suassuna. Dono de um poderoso grupo de
mídia e TI, o executivo virou sócio de Fábio Luis Lula da Silva, o
Lulinha, e Kalil Bittar, filho do político Jacó Bittar, na Gamecorp,
produtora com capital de R$ 100 mil que vendeu parte de suas ações à
Telemar por R$ 5,2 milhões. Antes de firmar sociedade com Suassuna,
Lulinha ganhava R$ 800 como monitor de jardim zoológico. A aproximação
com o empresário lhe rendeu outros benefícios. Ex-morador de São
Bernardo do Campo, Lulinha mudou-se para os Jardins, área nobre de São
Paulo, e depois para um apartamento em Moema, de 300 metros quadrados de
área, terraço gourmet, piscina e academia, cujo aluguel é estimado em
R$ 35 mil por mês. Os dois imóveis pertencem ao empresário. O caçula do
ex-presidente também mora de favor em um apartamento que pertence a
amigos de seu pai. Ele e a mulher, Fátima Cassaro, vivem há três anos em
um imóvel de 158m2 na alameda Jaú, nos Jardins. O apartamento pertence a
Mito Participações LTDA, empresa cujos cotistas são a esposa e as
filhas do advogado Roberto Teixeira, íntimo de Lula, e padrinho de
batismo de Luis Cláudio.
Na política, se não forem estabelecidos
limites, necessários à liturgia do cargo, a família tem grande potencial
para gerar constrangimentos. Eventuais privilégios desfrutados por
filhos dizem mais sobre os pais do que os próprios herdeiros. No Brasil,
um País de oportunidades desiguais, regalias a parentes de políticos
chamam muita atenção e, em geral, são consideradas inaceitáveis e
despertam indignação e sensação de injustiça na população.
Com Lula tudo
isso ganha uma dimensão maior. Como explicar, a não ser pelo raciocínio
óbvio de que o caminho para uma vida de luxos, apartamentos caros e
jatinhos foi pavimentado pelo pai poderoso, que filhos do ex-metalúrgico
dono de um indefectível discurso ético acumularam dinheiro e posses,
depois dele ascender à Presidência? Como sustentar o discurso de vítima
de perseguição das elites se parte dessa mesma elite passou a bancar
despesas pessoais de sua família? Por isso, o envolvimento de Luís
Claudio arrasta ainda mais o ex-presidente para o epicentro dos
escândalos investigados pela PF. E ele tem conhecimento disso. Não foi
por outro motivo que o petista intensificou os petardos contra o
ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo.
O ex-presidente resolveu aumentar o tom
após acertar a estratégia com o ex-chefe de gabinete e uma espécie de
faz-tudo de Lula, Gilberto Carvalho, que também entrou na mira da PF
semana passada. Os investigadores suspeitam que Carvalho seja peça
fundamental para desvendar a conexão de Luís Cláudio com lobistas
interessados em prorrogar a desoneração fiscal para montadoras de
veículos por meio de medidas provisórias editadas pelo Executivo. Há
indícios de que Carvalho tenha sido o contato do lobby dentro do Palácio
do Planalto. Mensagens interceptadas pela polícia revelaram o grau de
intimidade do ex-chefe de gabinete de Lula com Mauro Marcondes Machado,
dono do Marcondes e Mautoni, um dos escritórios do lobby.
Ao analisarem os sigilos bancário e fiscal
da Marcondes e Mautoni, auditores da Receita se depararam com a LFT
Marketing Esportivo, empresa de Luís Cláudio. Apenas em 2014, a LFT
recebeu da Marcondes R$ 1,5 milhão - a segunda maior quantia na relação
de credores da empresa. No total, a LFT recebeu do lobista R$ 2,4
milhões. A constatação acendeu o alerta no Fisco. Há indícios de que a
empresa do filho do ex-presidente Lula sequer tenha atuado naquele
período.
De acordo com a Rais (Relação Anual de Informações Sociais),
cadastro do Ministério do Trabalho, a LTF não teve qualquer vínculo
empregatício em 2014, ano dos pagamentos realizados pela Marcondes e
Mautoni. “É muito suspeito que uma empresa de marketing esportivo (a
LFT) receba valor tão expressivo de uma empresa especializada em manter
contatos com a administração pública (Marcondes e Mautoni)”, afirmaram
os procuradores da República que pediriam à Justiça Federal as buscas
nos endereços de Luís Cláudio. De fato, não faz sentido. Em troca, as
montadores representadas pelo lobista Mauro Marcondes Machado
conseguiram prorrogar benefícios fiscais que somavam R$ 1,3 bilhão, após
a edição de uma medida provisória pelo então presidente Lula.
A PF também estranhou que o e-mail
informado no ministério do Trabalho pela empresa de Luís Cláudio é
vinculado à Bilmaker 600 Serviços em Importação e Exportação Ltda. A
empresa pertence a Glauco Costamarques, primo de Bumlai. Anos atrás,
Luís Cláudio e Fábio Luís Lula da Silva chegaram a abrir uma empresa, a
LLCS Participações, no mesmo endereço da Bilmaker.
Fonte: IstoÉ - Marcelo Rocha e Raul Montenegro
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