Todas as manobras, no limite da legalidade,
utilizadas pelo presidente do Senado Renan Calheiros têm, tudo indica, a
finalidade de ganhar tempo para encontrar uma saída que prolongue a
permanência da presidente Dilma à frente do governo. Uma tarefa quase
impossível a essa altura, pois já existe um grupo de 47 senadores
declarados a favor do seu afastamento, seis a mais do que o mínimo
necessário.
O senador Renan Calheiros tenta vender uma imagem de
imparcialidade neste momento, mas qualquer movimento da direção do
Senado que alargue os prazos regimentais, mesmo sob a alegação de que
está preservando o respeito às normas regimentais para evitar acusação
de nulidade no Supremo, beneficia o governo que está sendo processado.
Além
do mais, adiando uma definição o Senado está colaborando para ampliar a
paralisia no país, pois ninguém se decide a investir sem saber quem
estará à frente do governo nos próximos meses e anos. Mas o
julgamento de hoje do Supremo Tribunal Federal pode dar um fôlego a esse
grupo que tenta se manter no poder a qualquer custo. Se o ex-presidente
Lula for autorizado pelo STF a assumir a Chefia do Gabinete Civil, uma
nova onda de negociações será aberta imediatamente, agora com Lula
ocupando o gabinete mais importante do Palácio do Planalto.
Como
naquela célebre frase do então Primeiro-Ministro Tancredo Neves, que
recusou a cabeceira da mesa de reuniões oferecida a ele por um ministro
afirmando que “a cabeceira é onde estou sentado”, também o gabinete mais
importante do Planalto passará a ser o de Lula, para onde todas as
expectativas se voltarão. O ex-presidente sabe que se o Senado
aprovar a admissibilidade do processo de impeachment, dificilmente ao
fim do julgamento deixará de condenar a presidente Dilma. Um novo
governo estará em exercício pleno, e a realidade se encarregará de
tornar fato consumado o afastamento da presidente.
Portanto, Lula
terá cerca de 20 dias para tentar reverter os votos no Senado, para que o
processo contra Dilma não vá a julgamento. Tudo dependerá também da
situação em que Lula chegará ao Gabinete Civil. Se prevalecer a
proposta de permitir-lhe assumir como ministro, mas sem a blindagem do
foro privilegiado, o ex-presidente estará exposto a um processo do Juiz
Sérgio Moro mesmo no exercício do cargo ministerial, o que lhe tiraria o
peso político nas negociações.
Se, no revés total, o Supremo não
permitir que assuma uma posição no ministério da presidente Dilma, o
jogo estará simbolicamente encerrado. Há também outra razão por trás
da procrastinação da decisão, que o senador Renan poderia impor
legalmente, indicando ontem mesmo os membros da comissão que os partidos
não se dispusessem a nomear: a tentativa de criar um ambiente para a
discussão da proposta de emenda constitucional que convoca eleições
gerais para este ano.
Os senadores João Capiberibe, do PSB, e Walter
Pinheiro, sem partido, alguns dos autores da proposta, discursaram
sobre o tema ontem e receberam o apoio de Renan. Essa mudança
constitucional sim pode ser classificada de golpista, pois para que ela
seja minimamente viável pelo menos o vice-presidente Michel Temer teria
que aceitar renunciar, sem falar no resto da cadeia sucessória.
Também
o senador Eunício de Oliveira colaborou com o adiamento da decisão,
pois não indicou os membros do PMDB na comissão, agindo em conjunto com o
PT, que liderou a tentativa bem sucedida de atrasar a formação da
comissão. Conseguiram, no entanto, ganhar apenas menos de uma semana
nesse processo, e nada indica que nesse curto período haverá alguma
modificação na tendência majoritária do Senado.
Fonte: Merval Pereira - O Globo
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