Não
temos tradição de enfrentar o Estado. Pelo contrário
O projeto criminoso de poder foi ferido de morte. Se a crise econômica e a Lava
Jato tiveram importante papel neste processo, foram as ruas que decidiram a
parada. As quatro manifestações de massa de 2015
sinalizaram que não havia mais meios de uma conciliação pelo alto. De
uma saída à la brasileira, dentro da velha tradição nacional. O ponto final foi
o dia 13 de março, quando milhões saíram às ruas e apontaram que o impeachment
era a única solução para a mais grave crise política do Brasil.
No
Senado — já são favas contadas — o julgamento
vai condenar o governo petista por crime de responsabilidade. A pena (política)
de Dilma é amena: será inabilitada,
por oito anos, para o exercício de função pública. Mas
o PT foi destroçado. Saiu do governo com a
pecha de corrupto. Pior ainda:
de ter organizado o maior desvio de recursos públicos da história.
Diferentemente de 1992, a condenação não será individualizada. Não.
A condenação foi do partido — e de seus asseclas, como PC do B, PSOL e
parte da Rede — e de um projeto que construiu, no interior
do Estado, o que o ministro Celso de Mello chamou, em um dos votos da AP-470, de
“macrodelinquência governamental.”
Conseguir reabilitação política a curto prazo é impossível. O PT vai se fragmentar em pequenos
partidos, sem força eleitoral expressiva. E o projeto de poder que
sustentou parte da esquerda brasileira morreu.
O que chama a atenção foi como
tudo ruiu tão rapidamente, no sentido político, claro, pois a crise econômica tinha sido gestada
no segundo governo Lula e já dava sinais de agravamento desde 2012. Ter devassado os “marginais
do poder”, expressão também de Celso de Mello, deu à Lava Jato um
importante papel. Porém, o governo ainda
apresentava condições de conviver com o escândalo, tentando
diminuir seus efeitos políticos, mantendo sob seu jugo a base da pirâmide
social — os mais pobres —,
o andar de cima, via bolsa BNDES e o
colchão de amortecimento representado por intelectuais, artistas, docentes
universitários e movimentos sociais que funcionavam como os tonton-macoute do
petismo em troca de generosos apoios
às suas ações.
Este bloco parecia invencível. E
o Brasil condenado a sustentá-los ad eternum. Coube à sociedade civil desatar o nó górdio do
projeto criminoso de poder. Não temos tradição de enfrentar o Estado. Pelo
contrário. O Estado é fonte de tudo. Mas desta vez a sociedade deixou de ser
invertebrada. Foi um processo maturado nas redes sociais e nos movimentos
autônomos que foram surgindo nos últimos anos. A
espontaneidade foi a marca deste momento. Quem imaginaria o sucesso da
manifestação de 15 de março de 2015?
Os velhos
formadores de opinião ficaram olhando para o passado.
Foram aliados — alguns entusiásticos
— do projeto criminoso de poder. Acharam que tinham um poder de
influência fantástico. Coitados. Ficaram falando sozinhos. Ninguém mais os lia ou os ouvia. Seus gritos foram recebidos com risos.
Falavam de golpe
quando se estava cumprindo o que era determinado pela Constituição. Perderam feio. Quiseram até acionar o Papa. Patético!
Fonte: Marco Antonio Villa – O Globo
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