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quinta-feira, 12 de maio de 2016

Por que o plenário do Senado fez silêncio para ouvir o discurso de Collor



Os bastidores de uma sessão histórica onde os parlamentares só fizeram silêncio total para escutar o primeiro presidente do Brasil afastado por impeachment 




Senador Fernando Collor discursa na sessão que votou a abertura do processo de impeachment de Dilma. Ele tem conhecimento de causa (Foto: Sergio Lima/ Época)


Não há pompa e importância histórica que resistam a uma longa sessão do parlamento. O presidente do Senado, Renan Calheiros, começou os trabalhos com uma hora de atraso, às 10h. Dispostos, os senadores mais afeiçoados à defesa do governo Dilma, Gleisi Hoffmann, Lindbergh Farias (PT) e Vanessa Grazziotin (PC do B), apresentaram questões de ordem, recursos regimentais, para impedir a sessão. Todas foram rejeitadas por Renan. Assim, o roteiro começou a andar. A combinada pausa para o almoço ocorreu com 50 minutos de atraso.

>> Tudo sobre o impeachment

No início da tarde, pragmáticos, vários senadores deixaram o plenário para descansar. De um modo diverso dos deputados, mais discretos como manda a tradição do Senado, os inscritos aproveitaram a exposição proporcionada pela votação para direcionar discursos a seus estados. Não houve odes a filhos ou a Deus, mas menções a obras e ao povo local. Cada qual faz sua pequena campanha, de acordo com a tradição da casa em que atua: se a Câmara é mais informal, onde 513 se manifestam, o Senado de apenas 81 é mais formal e sério.

Com uma lista de 70 inscritos para falar, o desejo de todos era abreviar a sessão. Havia um  desejo geral de uma solução para que os 70 discursos fossem evitados. O senador Romero Jucá encarregou-se de espalhar a versão de que um acordo poderia reduzir os oradores e o tempo da sessão. Quase todos concordavam com isso, à exceção dos senadores de PT, PC do B e poucos aliados. Logo pela manhã, Renan mencionou a possibilidade de abreviar a sessão, a partir de uma solução de consenso. O senador Paulo Paim protestou com veemência. A ideia foi guardada. 

Às 16h50, em um movimento ensaiado, o senador Valdir Raupp, aliado de Renan, sugeriu que o tempo máximo dos discursos fosse reduzido de 15 para 10 minutos. Era um balão de ensaio. Rapidamente, os senadores Humberto Costa, Gleisi, Vanessa, Fátima Bezerra e Randolfe Rodrigues se revoltaram. Costa saiu do fundo do plenário, tentou um microfone, que não funcionou e, afobado, conseguiu um segundo. Protestou e rejeitou a ideia. Depois, os quatro perfilaram-se na frente da mesa e gritaram. Renan recuou e anunciou que a ideia só seria acatada se fosse consenso. Como consenso não havia, a sessão se arrastaria pela noite adentro.

Transformada em uma sucessão de discursos, a sessão do Senado correu como todas as outras usuais: caiu na dispersão. Enquanto o orador falava, senadores, deputados presentes e a audiência ao redor batiam papo animadamente, trocavam cumprimentos, faziam selfies, entre outros passatempos. O presidente do Senado, Renan Calheiros, perdeu a paciência. 


Exasperado, pediu silêncio. “Os deputados são muito bem-vindos aqui, mas precisamos guardar silêncio, estamos em uma sessão histórica”, disse. Nada. Poucos minutos depois, após reclamação do senador Randolfe Rodrigues sobre o barulho, Renan pegou mais pesado. “Não vamos repetir aqui o espetáculo triste da Câmara”, disse. “Não podemos transformar o Senado em uma feira do passarinho”. Provocou risos. Não obteve a quietude desejada. O silêncio exigido por Renan só se fez muito mais tarde, às 22h58, quando o senador Fernando Collor subiu à tribuna. Por uma dessas oportunidades que só a política brasileira proporciona à história, Collor, removido da Presidência da República por um impeachment, votou no impeachment de sua quarta sucessora. Collor não aparecera no Senado o dia todo. Empertigado como sempre, ele foi o único a começar com um formal “Excelentíssimo senhor presidente do Senado, Renan Calheiros”. Foi o único orador realmente respeitado por seus pares e pela audiência. Fez-se silêncio no plenário para ouvir Collor. Apenas o deputado Pauderney Avelino, líder do DEM, permaneceu falando ao telefone ao lado do senador Ronaldo Caiado.

Collor foi ouvido com aquele tipo de respeito que só se concede no parlamento a pessoas em episódios dramáticos. Foi um respeito impessoal, pois Collor não é amigo dos outros senadores: ganhou essa deferência por falar ali como protagonista de um episódio triste. Citou Rui Barbosa, o mesmo trecho que foi citado em seu impeachment. Comparou os dois processos e passou a criticar Dilma, ao citar inclusive os avisos que disse ter dado à presidente sobre sua resistência a lidar com o Congresso e os problemas na economia. “A autossuficiência se sobrepujava à razão”, disse. Ao descer da tribuna, apesar das fortes críticas a Dilma, Collor foi cumprimentado primeiro pelas senadoras Gleisi e Vanessa Grazziotin.

Se a votação da Câmara proporcionou a emoção das traições, a do Senado foi modorrenta. Em abril, poucos tiveram a paciência de assistir aos discursos dos deputados durante mais de 30 horas. A emoção ficou para o espetáculo dos deputados indo ao microfone discursar por dez segundos e votar. Havia a expectativa das traições ao governo (muitas) e à oposição (poucas). Havia os votos computados um a um, com os parlamentares fazendo contas no fundo do parlamento. Nada disso houve no Senado. Governo e oposição entraram na votação com a certeza de que o impeachment seria admitido. O resultado estava dado. A votação eletrônica tirou qualquer emoção do momento. No plenário, senadores nem se abalavam com as notícias de que, do outro lado da rua, funcionários saíam com sacos de lixo e caixas do Palácio do Planalto.

Renan ainda passou a palavra ao senador tucano Antonio Anastasia, relator do processo na casa, por 15 minutos; e ao advogado-geral da União, José Eduardo Cardozo, pelo mesmo tempo. Às 6h20, Renan fez um breve pronunciamento para abrir a votação dos 77 senadores presentes, dizendo que a "história é aberta a várias interpretações". Às 6h32, a votação foi feita no painel eletrônico. O resultado: 55 votos pela admissibilidade do processo; 22, contra. A presidente Dilma Rousseff foi, portanto, afastada do cargo por até 180 dias.

Fonte: Revista Época



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