Análise Política
Todo governo enfrenta oposição, pois sempre haverá alguém excluído do
poder. Mesmo quando a oposição é garroteada na superestrutura, o vetor
oposicionista encontra caminhos alternativos para infiltrar-se no
edifício institucional. Mais: quando os espaços oposicionistas estão
bloqueados, ou quase, na esfera formal, a tendência é o oposicionismo
surgir de dentro do bloco do poder, ainda que aparente ser um
oposicionismo oficialista, melhorista.
A equação de governabilidade de Luiz Inácio Lula da Silva anda bem
desenhada e já transita do papel para a vida material.
O presidente
reconcentra poder num duplo movimento:
1) o presidencialismo de coalizão
com o Judiciário; e
2) um acordo operacional com a Câmara dos Deputados
por meio da execução orçamentária.
Nesse segundo pilar, os arrufos
recentes devem ser entendidos apenas como o que são: parte da dança do
acasalamento.
Mas o Congresso Nacional é majoritariamente de direita, especialmente a
Câmara, e o governo Lula precisa satisfazer a sua base progressista com
alguma mercadoria da agenda social-liberal, entendido esse “liberal” na
acepção norte-americana da palavra.
O caminho natural é dividir a
operação política em dois:
1) uma maioria congressual para evitar
sobressaltos e aprovar a pauta econômica; e
2) passar a boiada da agenda
progressista por meio do STF.
No primeiro item, a dupla Lula-Fernando Haddad encontra uma avenida
aberta, pois o consenso entre os assim chamados formadores de opinião
aproxima-se do visto no Plano Real e nas duas administrações de Fernando
Henrique Cardoso, quando, aliás, a esquerda reclamava da interdição de
qualquer debate.
Um sintoma agora foi a resistência virulenta contra a
nomeação do presidente do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística.
Algum desavisado que notasse a temperatura da refrega poderia imaginar
que se estava decidindo quem seria o ministro da Fazenda ou o presidente
do Banco Central.
A perturbação desta semana apareceu no segundo vetor. A ideia é o
governo surfar no legisferante Supremo Tribunal Federal e esperar que
seja aprovado ali o que seria surpresa se encontrasse guarida no
Legislativo conservador.
Mas nesta semana algo pareceu não ter sido
combinado com os russos, pois o presidente do Senado chiou contra o
início da deliberação do STF sobre a descriminalização do porte de
drogas para consumo.
Alguma hora algum graúdo no Congresso chiaria mesmo, também porque ali
os eventuais candidatos a presidir a instituição dependem do voto dos
pares.
Não há uma linha de sucessão natural, como no Supremo.
No
passado, havia o acordo tácito de a maior bancada indicar o presidente
da Casa, mas na Câmara isso acabou definitivamente quando Severino
Cavalcanti se elegeu em 2005.
No Senado, quando Davi Alcolumbre faturou a
parada em 2019.
Com Jair Bolsonaro na mira de Alexandre de Moraes e a chapa esquentando
sob os pés do grupo político do ex-presidente e de alguns proeminentes
na sua base social, a oposição está um tanto neutralizada, ao menos
momentaneamente.
Vamos observar para ver como navega o agora
transatlântico lotado da base institucional do governo.
Há espaço,
portanto, para o governo protagonizar os próximos capítulos.
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