Análise Política
A tonificação da base parlamentar vem num momento bastante conveniente
para o governo, e não apenas pela necessidade política de finalmente
aprovar projetos relativos à economia que se arrastam pela tramitação
legislativa. A consolidação da base acontece quando a popularidade
governamental, apesar de ainda no azul, começa a dar algum sinal de
sofrimento.
Lula em seu terceiro mandato decidiu apostar no caráter indutor do
investimento estatal. Tem lógica, mas o espírito animal do capitalista
tem vida própria. Chama a atenção uma diferença entre este Lula e os
anteriores: não se nota a ambição de seduzir a classe, não se veem
iniciativas de aproximação, de articulação, de sinergia. Nenhum regalo.
Nada.
Num ponto, os fatos, sempre teimosos, estão com Lula: o mercado já
precificou faz tempo algum déficit primário, e não faz sentido o governo
continuar correndo atrás da meta zero. Mas um detalhe é inescapável:
quem definiu esse alvo foi o próprio governo. Dano auto-infligido. Mais
um exemplo do cuidado que se deve ter ao definir metas. É como criar
jacaré na piscina de casa.
No começo é bonitinho, só alegria, só se ouvem os aplausos. Depois…
Como dito, as nuvens cinzentas na economia encontram o governo num
momento político bastante confortável. O presidencialismo de coalizão
com o Judiciário segue firme, e a maioria da maioria de direita no
Congresso Nacional já se acomoda nos últimos vagões da composição
presidencial do governo de esquerda.
Não chega a ser uma primeira classe, mas é melhor do que ser deixado na estação.
Mais: se a boa vontade do eleitor não lulista sofre, a boa vontade dos
mecanismos de formação de opinião parece razoavelmente intocada. Haverá
algum muxoxo a respeito da política fiscal, porém nada que seriamente
atrapalhe a coesão da frente ampla. Lula sabe que é baixíssimo, no curto
prazo, o custo informacional de “confrontar o mercado”.
Pois os companheiros de viagem “de centro” não têm no momento
alternativa. Claro que tudo muda se a economia enveredar por
dificuldades maiores, mas por enquanto a situação parece controlada. E,
se o peronista renovador não-kirchnerista Sergio Massa ganhar a eleição
argentina, estará reforçado que não é só “a economia, estúpido".
Outro aspecto que ajuda Lula é o Brasil finalmente deixar a presidência
do Conselho de Segurança da ONU. Oportunidade de voltar o foco da
comunicação para o mercado político interno.
Leia a análise da semana passada: "O impasse não está no Conselho de Segurança"
Alon Feuerwerker, jornalista e analista político
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