Governo defende que Supremo se concentre em assuntos econômicos e observa com preocupação o avanço no Senado de propostas que limitam poderes da Corte
Ao entrar em temas que dividem a sociedade, o governo entende que o STF não contribui para a pacificação do país, porque vê a base bolsonarista se mobilizar para se contrapor às decisões tomadas pela Corte.
A entrada desse assunto na pauta desagrada o governo pela repercussão especialmente em setores da sociedade dos quais Lula tenta se aproximar, como os evangélicos. Historicamente, o tema é usado para atacar a esquerda e foi evitado pelo petista na campanha, quando ele mirava eleitores de centro e centro-direita para vencer Bolsonaro.
Outra questão vista com potencial de degaste é o julgamento da descriminalização do porte de maconha para consumo próprio. Cinco ministros votaram a favor e um contra, mas a análise foi interrompida após pedido de vista de André Mendonça.
Exemplos de temas que o governo gostaria de ver na Corte são a correção do FGTS e o pagamento dos precatórios — despesas decorrentes de sentenças judiciais. Sobre o FGTS, o Supremo já vem demonstrando disposição de discutir com o Planalto. A ação estava prevista para esta semana, mas foi retirada de pauta após uma reunião entre Barroso e os ministros Jorge Messias, Fernando Haddad (Fazenda), Jader Filho (Cidades) e Luiz Marinho (Trabalho). O processo preocupa o governo porque, segundo os cálculos da Fazenda, a União pode ter um custo extra de R$ 17 bilhões por ano caso o fundo passe a ter uma remuneração mais alta.
Em nota divulgada após o encontro, o presidente do STF disse que o adiamento serviria para que o governo apresente novos cálculos “em busca de uma solução que compatibilize os interesses em jogo”.
A respeito dos precatórios, o governo teme que o caso vire uma bomba fiscal em 2027, quando o eleitor não lembrará mais que esse movimento foi feito durante o governo Jair Bolsonaro e debite o prejuízo aos cofres públicos como um descuido do governo Lula.
Em setembro, a AGU enviou ao STF um parecer defendendo que a Corte considere inconstitucionais regras aprovadas no governo Bolsonaro para o novo regime de pagamentos de precatórios. Uma decisão favorável no STF faria com que a União quitasse o estoque de precatórios não pagos e retiraria cerca de R$ 95 bilhões em 2024 do limite estabelecido pelo arcabouço fiscal. Além de Messias, interlocutores apontam que têm bom trânsito no STF o ministro da Justiça, Flávio Dino, e o líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA).
Um outro projeto, fixando mandatos para os magistrados, também será analisado. O presidente da CCJ, senador Davi Alcolumbre (União-AP), ainda não definiu o relator, mas pediu sugestão de nome para o autor da proposta, o senador Plínio Valério (PSDB-AM), que ainda vai se reunir com Pacheco para decidir quem vai assumir a tarefa.
Ontem, deputados de oposição anunciaram que vão parar de obstruir a pauta da Câmara em função de um acordo firmado com Pacheco prevendo que as pautas anti-STF tenham andamento célere no Senado. A aproximação do presidente da Casa com opositores de Lula é vista também como um gesto para cacifar a candidatura de Alcolumbre para o comando da Casa, em 2025, desidratando potenciais nomes mais à direita.
Na terça-feira, em plenário, Pacheco recebeu uma série de elogios de nomes como Flávio Bolsonaro (PL-RJ), Jorge Seif (PL-SC) e Marcos Pontes (PL-SP) — os dois últimos ocuparam cargos na gestão Bolsonaro. O grupo parabenizou o presidente da Casa por um discurso em que criticou a atuação do Supremo.
No sábado, Pacheco havia afirmado que “não há a mínima possibilidade de se permitir ao STF que formate as regras e as leis do país, porque isso cabe legitimamente ao Poder Legislativo”. (Colaborou Gabriel Sabóia)
Política - O Globo
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