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quarta-feira, 20 de setembro de 2017

S. Excia, a grana

Michel Temer, Eduardo Cunha e Henrique Alves foram identificados como beneficiários de propinas de US$ 8,2 milhões (R$ 26,2 milhões) pagas pela Odebrecht fora do Brasil

Sua Excelência, o fato: o presidente da República, Michel Temer, e os ex-presidentes da Câmara Eduardo Cunha e Henrique Eduardo Alves foram identificados como beneficiários de pagamentos de US$ 8,2 milhões (ou R$ 26,2 milhões) realizados pelo grupo Odebrecht fora do Brasil. Os ex-deputados Cunha e Alves estão presos. 

O dinheiro para os “pagamentos a Eduardo Cunha, Michel Temer e Henrique Eduardo Alves”, como definem o Ministério Público e a Polícia Federal, saiu das contas (nº 244006, 244001, 244035, 244003) no Meinl Bank Antigua, no Caribe, mantidas pelas empresas Klienfeld, Trident, Innovation e Magna. 

Esse quarteto empresarial foi criado pela empreiteira no Panamá. O Meinl Bank Antigua era administrado pelos executivos do departamento de propinas da Odebrecht. Eles compraram o controle em 2010 por US$ 3,9 milhões (R$ 12,4 milhões). Estima-se que nesse banco a empreiteira tenha movimentado US$ 1,6 bilhão (R$ 5,1 bilhões) até 2015, quando foi preso o presidente do grupo, Marcelo Odebrecht. 

Cópias de alguns dos extratos bancários estão anexados na denúncia contra o “PMDB da Câmara”, por associação criminosa, apresentada pela Procuradoria-Geral da República ao Supremo Tribunal Federal na semana passada.  Foram obtidos a partir de informações disponíveis no sistema eletrônico usado pela Odebrecht no controle de propinas. Extraíram-se um milhão de arquivos de computadores em Estocolmo, na Suécia — comprovantes, planilhas e e-mails, entre outros registros. 

O pagamento de US$ 8,2 milhões a Temer, Cunha e Alves foi realizado no período de 1º de junho a 25 de novembro de 2011. Do Meinl Bank, o dinheiro seguiu em nove remessas para contas bancárias da GVTEL Corp., no número 22 da Rua Río Umia, na espanhola Pontevedra. Zona portuária no sul da Galícia, Pontevedra foi onde Cristóvão Colombo contratou a nau capitânia Santa Maria, a “Galega”, que o trouxe à América num outubro de 525 anos atrás (a embarcação naufragou no Haiti). 

A GVTEL possuía uma subsidiária, Vivosant, no outro lado da cidade, no prédio 15 da Rua Manuel Quiroga. Nos arquivos de Pontevedra, a matriz prestava serviços de telecomunicações e a controlada atuava no tratamento de lixo. Na vida real, eram empresas de papel.   O pagamento a Temer, Cunha e Alves foi transferido para a conta de uma outra empresa laranja da Odebrecht, a Grand Flourish, mantida no banco Pictet & Cie, em Cingapura, no Oceano Índico, a sete mil quilômetros de distância da costa galega. 

O Supremo foi informado de que o volume de propinas é bem maior: a Odebrecht pagou pelo menos US$ 20,8 milhões (R$ 66,5 milhões) a políticos do “PMDB da Câmara dos Deputados”, no período de 2010 a 2012, pelas mesmas empresas-laranjas do Panamá que usou “para pagamentos a Eduardo Cunha, Michel Temer e Henrique Eduardo Alves”.
A lavagem incluiu a GVTEL e a Grand Flourish, em transações por Antígua, Cidade do Panamá, Nova York, Madri, Berna e Cingapura. Começou com 18 etapas — quatro remessas para a Grand Flourish e 14 para a GVTEL. 

Houve um tempo em que na política brasileira predominava Sua Excelência, o fato. Na denúncia ao Supremo, os fatos sugerem que o PMDB de Temer, Cunha e Alves concedeu primazia a Sua Excelência, a grana.

Fonte: José Casado - O Globo

terça-feira, 21 de junho de 2016

Força-tarefa binacional

Procuradores decidiram criar uma força-tarefa binacional para investigar origem de R$ 2,9 bilhões em 800 contas suspeitas, mantidas em quatro dezenas de bancos da Suíça

Suíça e Brasil decidiram criar uma força-tarefa para investigar mais de 300 relacionamentos financeiros classificados como suspeitos em 800 contas de quatro dezenas de bancos suíços. O acordo, em fase de conclusão, está na mesa dos chefes do Ministério Público da Suíça, Michael Lauber, e do Brasil, Rodrigo Janot. 

Lauber confirma as negociações, em relatório interno, “para formação de uma equipe de investigação conjunta”. Seu objetivo é “acelerar os processos suíços”.  A Suíça já bloqueou o equivalente a R$ 2,9 bilhões, por considerar sua origem suspeita, derivados principalmente de corrupção em contratos com a Petrobras. É um volume de dinheiro dez vezes maior do que a soma de recursos congelados em contas de dirigentes da Fifa processados por negócios ilícitos.

Até agora, porém, os suíços só conseguiram “limpar” 15% do volume interditado. Querem mapear o trânsito em todo o sistema financeiro mundial, identificar integralmente titulares e beneficiários finais das contas, e por fim, via acordos judiciais, devolver a dinheirama ao Brasil. Em abril de 2014, a Procuradoria suíça começou a trabalhar no caso Petrobras, no rastro das evidências sobre corrupção na estatal coletadas na prisão do ex-diretor de Abastecimento Paulo Roberto Costa. Desde então, devolveu ao Brasil o equivalente a R$ 444 milhões. É pouco.

Lauber acha que pode ir muito além, porque “o caso criminal brasileiro envolve numerosas empresas, assim como várias centenas de pessoas” — registra em relatório.  Foi o aumento da vigilância nos bancos suíços que levou executivos da Odebrecht a comprar 51% do Meinl Bank Antigua numa ilha caribenha. Pelo Meinl, aparentemente, transitaram R$ 5,9 bilhões nos últimos cinco anos o dobro do volume de dinheiro já bloqueado na Suíça. Boa parte teve origem em negócios suspeitos, realizados por pessoas camufladas por codinomes, como “Waterloo”, a partir de um sistema de comunicações secretas que funcionava dentro da empreiteira. “Os políticos são os beneficiários efetivos”, ressalta o procurador-geral suíço. Um deles se destaca como “RR.2015.275/ RP.2015.61” em processo no Tribunal Penal Federal de Berna. Trata-se Eduardo Cosentino da Cunha, presidente afastado da Câmara. Cunha e familiares foram delatados pelo banco Julius Baer ao Departamento de Lavagem de Dinheiro. Ano passado, a Suíça suspendeu e transferiu o caso “RR.2015.275/ RP.2015.61” à jurisdição brasileira.

O caso de Cunha se tornou um marco na “limpeza” de ativos suspeitos em curso nos bancos suíços. Eles consideram que pessoas politicamente expostas, em geral, apresentam um risco de reputação excessivo.  A mesma avaliação começou a ser feita na Câmara, onde a cassação do mandato de Cunha é considerada como certa. Entre a procura da saída da crise econômica e o desfecho do impeachment de Dilma Rousseff, ele acabou virando um detalhe no Legislativo.

Mesmo entre os seus mais fiéis aliados, já não há quem acredite na sobrevivência política do deputado fluminense. Mais difícil é encontrar alguém disposto a apostar nas chances do indiciado suíço “RR.2015.275/ RP.2015.61” livrar-se de uma condenação à prisão por ao menos uma década.


Fonte: José Casado - O Globo


terça-feira, 23 de fevereiro de 2016

Na memória do telefone



O MPF anunciou a cooperação judiciária do Departamento de Justiça dos Estados Unidos na investigação sobre José Casado, O Globo em que a Odebrecht é personagem central 

A prisão de “Vaca” o deixou inquieto. Àquela altura de abril de 2015, porém, mais preocupante era a situação de “RA”, um de seus principais assessores. Sempre dissera ao próprio e às famílias — inclusive à sua — que se algum dia pegasse alguém dele, iria “lá” para proteger. Assim fez no outono. Achou que “RA” seria preso, levou-o para casa. 

 Aumentava o perigo, agora precisava pensar num Plano B. Na madrugada de uma quinta-feira da primavera passada, pegou seu iPhone preto de bordas cinzas, abriu a pasta “Calendário” e começou — era um homem que anotava:
“Delação/fallback (RA)” — escreveu. O registro “fallback” era para não esquecer: alternativa extrema em cenário de prisão de “RA”, esgotados todos os recursos para livrá-lo.  

 Acrescentou: “— Livrar todos e soh eu.” Ou seja, nessa hipótese, “RA” aceitaria o acordo de delação, mas em bastes restritas: livraria todos, deixando-o exposto, sozinho, diante do juiz, procuradores e policiais federais.

Mostraria o plano a “RA”, e, com ele, passaria a todos a mensagem devida: no limite, era com ele — e, como até as crianças em casa sabiam, não entregava ninguém. Continuou desenhando um roteiro sobre o que “RA” diria num acordo. Por exemplo, sobre “Vaca”:  “— Era amigo e orientado por eles pagou-se Feira de cta que eles mandaram. ODB pagava campanha a priori, mas eh certo que aceitava indicações a título de bom relacionamento.”

A organização (“ODB”) adotara a prática de adiantar financiamentos de campanha, mas só das principais. Aceitava sugestões, eventuais.  Seguiu, pensando na voz de “RA” em depoimento: “Campanha incluindo caixa 2 se houver era soh com MO, que não aceitava vinculacao.”

Outra vez, ele posto no alvo. E se, nessa altura, o inquiridor argumentasse sobre “PRC”, o diretor da estatal, primeiro preso e delator premiado do caso? Então, “RA” poderia retrucar: “PRC soh se foi rebate de cx2”.

Agora anotava em espasmos: “Nosso risco eh a prisão” ...Acordo Leniência CGU?” — sim, era preciso cogitar. E ver com advogados: “Risco Swiss? E EUA?” Porém, ainda mais urgente, era a conversa com o mineiro, governador, com quem previa logo se encontrar. Registrou:
“FP: — Ela cai eu caio; — Dar a dimensao”.

Essas notas na memória de um telefone celular são de Marcelo Odebrecht (“MO”), ex-presidente da empreiteira homônima, e orientam a investigação judicial. Ele está preso há oito meses. “Vaca” é João Vaccari Neto, ex-tesoureiro do PT, preso em 15 de abril do ano passado. “RA” e “MF” são Rogério Araújo e Marcio Faria, ex-assessores de Marcelo na Odebrecht e seus companheiros de cela por quatro meses — foram soltos em outubro. “FP” é Fernando Pimentel, governador de Minas Gerais, segundo a polícia. “Ela” não teve a identidade sugerida no inquérito.

Os riscos sobre as contas na Suíça, temidos por ele, se tornaram fatos nas cortes de Curitiba, Brasília e Berna.  Ontem surgiu uma novidade: o Ministério Público Federal anunciou a ativa cooperação judiciária do Departamento de Justiça dos Estados Unidos na investigação sobre lavagem de dinheiro em que a Odebrecht é personagem central, com transferências a partir de bancos em Nova York. Na prática, significa a abertura de processo contra a empresa nos EUA, onde a Petrobras já se defende em tribunais. 

Fonte: José Casado – O Globo


terça-feira, 21 de julho de 2015

Fogo de palha - para destituir Cunha tem que provar a materialidade e autoria do crime e que o STF aceite a denúncia

À beira do abismo

Deputados já debatem cenário da destituição do acuado Eduardo Cunha. Trama-se até uma inédita rebelião no Legislativo: a obstrução da Câmara contra o seu presidente [quem vai organizar, liderar a obstrução? o Zé Guimarães, mais conhecido como 'capitão cueca'?

ou será que vai pedir ajuda do líder do governo no Senado? o senador Delcidio aquele que liderou uma votação na qual Dilma perdeu de 62 a 0. Detalhe: o Delcidio votou.

Pergunta que não quer calar: o que faz com que qualquer denúncia feita contra um adversário do desgoverno seja considerada como verdadeira?]

É uruguaia a primeira instituição financeira fechada por participação na rede de lavagem de dinheiro da corrupção na Petrobras. Na noite de sexta-feira, o Banco Central do Uruguai decretou intervenção na corretora Interbaltic, de Montevidéu. O motivo, segundo o comunicado oficial: “lavagem de ativos". 

Controlada pelo corretor Jorge Davies Cellini, a Interbaltic foi nos últimos oito anos um dos vértices das triangulações financeiras internacionais para pagamento de propinas a políticos brasileiros. Um de seus clientes era Julio Camargo, intermediário de fornecedoras da Petrobras como as japonesas Mitsui e Toyo e a coreana Samsung. Em juízo, ele confirmou repasses de US$ 14 milhões a Fernando Soares Falcão, conhecido como Fernando Baiano, identificado nos autos como operador do PMDB.

Vinte e quatro horas antes do fechamento da Interbaltic, Camargo depôs na Justiça Federal, em Curitiba, como testemunha no processo de Fernando Baiano. Contou ao juiz Sérgio Moro que em 2011 sentiu-se extorquido pelo deputado fluminense Eduardo Cunha (PMDB), atual presidente da Câmara , a quem pagou propina de US$ 5 milhões. Cunha nega, com a ênfase peculiar dos olhos arregalados. Parte do dinheiro que Camargo diz ter transferido da sua Piamonte Investiment Corp., no Uruguai, para contas das empresas de Baiano na Suíça, como a Three Lions Energy Inc., transitou pela Interbaltic, em Montevidéu. Essa corretora uruguaia também foi usada para repasses de subornos a dois diretores da Petrobras, Nestor Cerveró e Paulo Roberto Costa.

A Interbaltic “se destacou com transações suspeitas em outras investigações penais realizadas pela Procuradoria Pública da Suíça em relação à Petrobras" — escreveu Stefan Lenz, procurador federal em Berna, numa carta enviada em 26 de maio à Justiça brasileira. No texto, ele qualifica como “doleiros” os corretores Jorge Cellini, dono da Interbaltic, seu irmão Raúl Fernando e Eduardo Wincour. Acrescenta: “São conhecidos da Procuradoria (da Suíça) de outros processos". 

Em Brasília, por ordem do Supremo Tribunal Federal, investigam-se as suspeitas de pagamento de suborno a Eduardo Cunha não apenas a partir dos documentos apresentados por intermediários como Julio Camargo e Alberto Youssef, mas também pelo rastreamento das finanças dos seus mais fiéis patrocinadores, cujos interesses abrangem desde negócios na Petrobras aos segmentos de bancos de investimento, seguros, energia, portos, concessões de estradas e bebidas. 

O cenário da destituição do acuado presidente da Câmara, terceiro na linha de sucessão republicana, já é debatido pelos deputados. Não é simples: será necessário demonstrar materialidade e autoria do crime e, em seguida, que o juiz Teori Zavascki, do STF, aceite a eventual denúncia da Procuradoria. 

A decisão do procurador-geral Rodrigo Janot está prevista para o início de agosto. Caso Cunha seja processado, deputados devem denunciá-lo ao Conselho de Ética (que ele controla), propondo-lhe alternativas de afastamento por licença ou renúncia. Como se prevê uma recusa, já se trama uma inédita rebelião no Legislativo: a obstrução da Câmara contra o seu presidente. Até a queda.

Fonte: José Casado é jornalista

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