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terça-feira, 14 de janeiro de 2020

Vertigem - Nas entrelinhas:

Houve intenso trabalho de projeção da imagem de Lula no plano internacional, seguido da construção de uma narrativa própria a destituição de Dilma, comparando-a ao golpe de 1964”


Indicado para o Oscar de melhor documentário, Democracia em vertigem, de Petra Costa, é um bom filme, tanto que está selecionado. Isso não significa que o conteúdo do filme seja neutro em relação aos fatos narrados nem que discordar ou concordar politicamente com a narrativa da diretora seja o ponto de referência para sua avaliação como produto cinematográfico pela Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood. O filme tem uma excelente fotografia, cenas inéditas do impeachment de Dilma Rousseff e proporciona um olhar retrospectivo sobre a política brasileira, que anda muito conturbada.

O filme mostra o dia a dia da presidente Dilma Rousseff, que foi apeada do poder por causa dos seus erros e não em razão de uma suposta conspiração imperialista. Não tivesse lançado o país numa recessão profunda e se relacionado tão mal com o Congresso, o impeachment não teria ocorrido. O filme não esconde seu olhar particular sobre a política brasileira: a protagonista cresceu numa família de esquerda, que sofreu as consequências de sua opção política e ideológica durante a ditadura militar. Quando se torna adulta, a jovem acompanha o processo político da transição à democracia ao governo Lula, um ex-líder operário que chega ao poder.

Petra Costa é crítica em relação a Lula, que somente teria chegado à Presidência depois de ajustar seu discurso aos interesses das elites econômicas do país. Mostra o envolvimento do PT com a corrupção, a pretexto de se manter no poder e garantir maioria no Congresso. Com a chegada da crise econômica internacional ao Brasil, porém, o pacto perverso do PT para conciliar o apoio popular com os interesses das elites acaba se rompendo. Lula se sustentava num tripé: banqueiros e rentistas, a elite política protegida pelos grandes empresários fornecedores do Estado, e projetos sociais de natureza populista.

A partir desse diagnóstico, o filme construiu a narrativa da derrubada de Dilma Rousseff. Petra Costa injeta no documentário a paixão política que tece a trama histórica. De certa forma, entre discursos inflamados, humaniza o processo político ao se colocar como testemunha ocular da história: “Eu e a democracia brasileira temos quase a mesma idade. Eu achava que, nos nossos trinta e poucos anos, estaríamos pisando em terra firme”. O filme é muito contestado porque toma partido de Dilma Rousseff e trata seu impeachment como um golpe de Estado, o que não é verdade. Os setores que foram às ruas pedir o afastamento da petista criticam o filme desde o lançamento, com o argumento de que se trata de uma obra de ficção.

Cenário favorável
Isso é chorar o leite derramado. Nos governos petistas, houve um intenso trabalho de projeção da imagem de Lula no plano internacional, seguido da construção de uma narrativa própria sobre a destituição de Dilma, comparando-a ao golpe de 1964, que implantou o regime militar, e não ao afastamento do ex-presidente Collor de Melo, do qual o PT foi protagonista, o que inclui Lula e a própria Dilma, o que seria historicamente mais correto. Essa narrativa é hegemônica na opinião pública internacional, embora não o seja em nível diplomático. Qualquer pessoa razoavelmente informada sabe que o governo de Michel Temer respeitou o Congresso, a liberdade de imprensa, o direito de opinião e as minorias. Foi um governo democrático.


Ocorre que o cenário de escolha dos filmes do Oscar, no caso específico de Democracia em vertigem, tem por parâmetros a situação política dos Estados Unidos e a imagem do governo Bolsonaro no exterior, que não é em nada positiva, principalmente na ótica dos direitos humanos, das minorias, do meio ambiente e da paz. O contexto influencia as escolhas da Academia. Democracia em vertigem foi selecionado ao lado dos documentários American Factory, The cave, For Sama e Honeyland. O fato de ser uma produção da Netflix, lançado em 2019, também pesou na balança, porque foi distribuído para mais de 150 países e teve campanha publicitária nos Estados Unidos.

Com 96% de aprovação entre os críticos mais influentes, o filme é aclamado desde a estreia no Festival de Sundance, em janeiro de 2019. Chamou a atenção da crítica e da imprensa especializada pelo circuito de festivais em que foi exibido. Isso significa que o troféu está garantido? Longe disso, há fortes concorrentes, entre os quais American Factory, produzido pelo casal Barack e Michele Obama. Além disso, outro filme brasileiro concorre ao Oscar em outras duas categorias, melhor ator e melhor roteiro adaptado: Dois Papas, de Fernando Meirelles, também produzido pela Netflix.

Nas Entrelinhas - Luiz Carlos Azedo - Correi Braziliense

 

domingo, 21 de julho de 2019

Nas entrelinhas - Política, sexo e religião - Luiz Carlos Azedo

Correio Braziliense

“Não há força no mundo capaz de mudar a realidade das famílias policêntricas e multiétnicas, nem a complexidade das identidades de gênero no estilo de vida contemporâneo”


Clássico da sociologia brasileira, Casa-Grande & Senzala, de Gilberto Freyre, é uma obra polêmica desde sua primeira edição, em 1933, pois desnudou aspectos da formação da sociedade que a elite da época se recusava a considerar. Teve mais ou menos o mesmo impacto de Os Sertões, de Euclides da Cunha, lançado em 1902, a maior e mais importante reportagem já escrita no Brasil. Seu autor descreveu com riqueza de detalhes as características do sertão nordestino e de seus habitantes, além de narrar, como testemunha ocular, a Guerra de Canudos, no interior da Bahia, uma tragédia nacional.

Nas palavras de Antônio Cândido, o lançamento de Casa-Grande & Senzala “foi um verdadeiro terremoto”. À época, houve mais críticas à direita do que à esquerda; com o passar do tempo, porém, Freyre passou a ser atacado por seu conservadorismo. Essa é uma interpretação errônea da obra, por desconsiderar o papel radical que desempenhou para desmistificar preconceitos e ultrapassar valores desconectados da nossa realidade: “É uma obra surpreendente e esclarecedora sobre a formação do povo brasileiro — com todas as qualidades e seus vícios”, avalia Cândido. Consagrou “a importância do indígena — e principalmente do negro — no desenvolvimento racial e cultural do Brasil, que é um dos mais complexos do mundo.”

O presidente Jair Bolsonaro talvez tenha lido Os Sertões, de Euclides da Cunha, porque a Guerra de Canudos faz parte dos currículos das academias militares. Esse foi o livro de cabeceira dos jovens oficiais que protagonizaram o movimento tenentista, servindo de referência para toda a movimentação tática da Coluna Prestes (1924-1927), que percorreu 25 mil quilômetros pelo interior do país. Certamente, porém, não leu Gilberto Freyre, obra seminal sobre a formação da cultura brasileira, traduzida em diversos países. Se o fizesse, talvez conhecesse melhor e respeitasse mais os “paraíbas”, como são chamados os nordestinos por aquela parcela dos cariocas que se acha melhor do que os outros. Ser paraibano é naturalidade, não é pejorativo.

Mas voltemos ao leito antropológico do sociólogo pernambucano. A ideia de que o livro defende a existência de uma “democracia racial” no Brasil, disseminada pelos críticos de Freyre, é reducionista. Casa-Grande & Senzala exalta a formação de nosso povo, mas não esconde as mazelas de uma sociedade patriarcal, ignorante e violenta. A origem dessa crítica é o fato de que o autor destaca a especificidade de nossa escravidão, menos segregacionista do que a espanhola e a inglesa. O colonizador português não era um fanático religioso católico como o espanhol nem um racista puritano como os protestantes ingleses.

Família unicelular
Tanto que Casa-Grande & Senzala escandalizou o país por causa dos capítulos sobre a sexualidade do brasileiro. Entretanto, não foram os indígenas nem os negros africanos que criaram a fama de promíscuo sexual do brasileiro. Foi o sistema escravocrata e patriarcal da colonização portuguesa, que serviu para criar um ambiente de precocidade e permissividade sexuais. Tanto os índios quanto os negros eram povos que viam o sexo com naturalidade, sem a malícia sensual dos europeus.
Freyre lutou como um gigante contra o racismo “científico”, que atribuía aos indígenas e ao africano as origens de nossas mazelas sociais. Há muito mais o que dizer sobre a sua obra, mas o que a torna mais atual é a agenda de costumes do presidente Jair Bolsonaro, que reproduz, em muitos aspectos, características atrasadas e perversas do patriarcado brasileiro, que estão na raiz da violência, da ignorância e do preconceito contra os índios, os negros e as mulheres.

Bolsonaro estabeleceu com eixo de sua atuação a defesa da fé, da ordem e da família. Há um forte ingrediente eleitoral nessa estratégia, mas não é somente isso. Há convicções de natureza “terrivelmente” religiosas e ideológicas, que não têm correspondência com o modo de vida e o imaginário da maioria da sociedade brasileira, com os nossos costumes e tradições, pautados pelo sincretismo e pela miscigenação. No Brasil, tudo é mitigado e misturado, não existe pureza absoluta. Além disso, não se pode fazer a roda da História andar para trás. A família unicelular patriarcal, por exemplo, é minoritária, nem o clã presidencial manteve esse padrão; não há força no mundo capaz de mudar a realidade das famílias policêntricas e multiétnicas, nem a complexidade das identidades de gênero no estilo de vida contemporâneo.

Um dos equívocos de Bolsonaro é acreditar que pode aprisionar a cultura nacional no âmbito dos seus dogmas. Quando investe contra o cinema nacional, a pretexto de que obras como Bruna Sufistinha, um blockbuster da nossa indústria cinematográfica, são mera pornografia e não um retrato da prostituição no Brasil, sua motivação é mais política do que religiosa. Na verdade, deve estar mais incomodado com filmes como Marighella e Democracia em vertigem, que glamoriza a luta armada e enaltece o ex-presidente Luiz Inácio Lula das Silva, respectivamente. [dois lixos: um enaltece um terrorista, um assassino frio, sanguinário e covarde; o outro enaltece um ex-presidente ladrão e atualmente presidiário cumprindo uma sentença e outra na espera para ter iniciado o seu cumprimento.

Felizmente, as duas imundícies terão o mesmo destino de uma outra, elogiando o ladrão = 'Lula, o filho do Brasil', qye foi um sucesso desde que seja como critério o elevado nível de fracasso que alcançou.]  Uma coisa é a crítica à obra cinematográfica, outra é o dirigismo oficial à produção cinematográfica, numa ótica que lembra o cinema produzido durante a II Guerra Mundial.

Pura perda de tempo. Com “uma câmera na mão e uma ideia na cabeça”, o Cinema Novo emergiu como resposta à falta de recursos técnicos e financeiros. O que temos hoje no cinema brasileiro resulta da centralidade dada por Glauber Rocha, Nelson Pereira dos Santos e outros cineastas à discussão dos problemas e questões ligadas à “realidade nacional” e a uma linguagem inspirada na nossa própria cultura. “Domesticar” a cultura popular é uma tarefa tão inglória como foi a censura à música popular no regime militar, tanto quanto obrigar os jovens a manter a virgindade até o 
casamento e mandar os gays de volta para dentro dos armários.

Nas Entrelinhas - Luiz Carlos Azedo - CB 


domingo, 23 de junho de 2019

Uma viagem com Moro e Petra Costa

Não se deve cobrar imparcialidade a uma cineasta. Imparcial seria o juiz Moro. Era?

O ministro da Justiça não cabe no papel do juiz exibido em documentário

No mesmo dia (19/6) em que o ministro Sergio Moro atravessava sua maratona de nove horas no Senado, estreava na Netflix o filme “Democracia em Vertigem”, de Petra Costa. A cineasta de 35 anos acompanhou as multidões que foram para a rua a partir de 2013, o impedimento de Dilma Rousseff em 2016, a prisão de Lula em abril de 2018 e a eleição de Jair Bolsonaro em outubro.  Filmou o ex-presidente arrumando a mala a caminho da carceragem de Curitiba e a cena em que mediram sua pressão arterial (146x90).

Ao longo de todo o filme, o juiz Sergio Moro e a Operação Lava Jato aparecem como o que foram, um instrumento eficaz de combate à corrupção. No dia de sua estreia, outro Moro, ministro de Bolsonaro, respondia aos senadores que o acusavam de ajeitar a bola com a mão em conversas impróprias com o Ministério Público. Entre o que aconteceu e o que está acontecendo, fechou-se um círculo. Ou quase, porque Petra Costa expõe momentos de corrupção explícita que foram varridos para baixo do tapete da política nacional depois do impedimento de Dilma. Além disso, não se sabe onde está o Queiroz.

Há no filme, narrado por Petra, um tom de lamento da vertigem em que entrou o processo político nacional. A proximidade da câmera com o comissariado petista mostra sua onipotência, a autossuficiência doutoral de Dilma Rousseff e o messianismo de Lula. Numa cena do comício que antecedeu sua ida para a prisão, do alto de um caminhão, ele disse: “Os poderosos podem matar uma, duas, ou cem rosas, mas jamais conseguirão deter a chegada da primavera”. Talvez ele acreditasse que elegeria um novo poste.

Da eleição, com 57,8 milhões de votos, resultou Jair Bolsonaro, o capitão primaveril daqueles que aplaudiam a condenação de Lula.  Tinha razão Nelson Cavaquinho: “Tira o seu sorriso do caminho (...)/ Eu na sua vida já fui uma flor/ Hoje sou espinho em seu amor”.  Depondo no Senado, Sergio Moro evitou discutir o conteúdo de suas conversas com o procurador Deltan Dallagnol, fortificando-se na denúncia da forma ilegal como elas foram coletadas pelo site The Intercept Brasil. Esse novo personagem não cabe no roteiro da vertigem mostrada por Petra Costa. Faz parte de outra história, na qual flores e espinhos crescem juntos.

Petra Costa é cineasta, e Moro era juiz. O documentário tem um explícito viés simpático a Lula, mas
não se deve cobrar imparcialidade a uma cineasta. Imparcial seria o juiz Moro. Era?

GLENN GREENWALD ABUSA DO CONTA-GOTAS
Num ponto o ministro Sergio Moro tem alguma razão: o site The Intercept Brasil deveria divulgar todo o acervo de grampos que amealhou. A divulgação parcial e seletiva, acompanhada por insinuações ameaçadoras do repórter Glenn Greenwald, é um feitiço que pode se virar contra o feiticeiro.

Antes da internet era comum que revelações jornalísticas fossem expostas em séries, mas Greenwald vem fazendo bem outra coisa. Promete isso ou aquilo, às vezes em tom de vaga ameaça. A divulgação de denúncias num regime de conta-gotas foi uma das piores táticas dos procuradores da Lava Jato.  Em 1971, quando o New York Times e o Washington Post publicaram os documentos do Pentágono, submeteram seus critérios editoriais ao juízo do público. Conhecido todo o papelório, viu-se que trabalharam direito.

Mesmo assim, William Buckley Jr., um brilhante jornalista conservador, fez uma das suas. Enquanto o país vivia o choque dos documentos do Times, ele publicou 14 páginas com telegramas e memorandos, chamando-os de “os documentos secretos que eles não publicam”. Num, o chefe do Estado-maior conjunto propunha “o lançamento de uma bomba atômica para efeito de demonstração” contra o Vietnã do Norte.

Tanto o Times como o Post noticiaram as revelações de Buckley. Dean Rusk, o secretário de Estado à época da sugestão, informou: “Não posso dizer que não escrevi isso. É possível que tenha escrito”. Três outros signatários de papéis foram pelo mesmo caminho.  Era tudo invenção de Buckley. Ele usou o truque para mostrar que “documentos forjados serão aceitos como genuínos desde que seu conteúdo seja plausível”.

Hoje se sabe que os hierarcas não desmentiram porque os papéis de Buckley podiam ser falsos, mas a ideia de jogar uma bomba atômica no Vietnã do Norte era verdadeira. Ela passou pela cabeça do governo americano em 1954, para ajudar os franceses, e em 1968, para responder a uma ofensiva dos comunistas.