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domingo, 20 de fevereiro de 2022

O TSE fala demais - Folha de S. Paulo - O Globo

Elio Gaspari

Fachin fará uma gestão estelar no tribunal se impuser a ele e a alguns colegas um sistema de cotas para as próprias falas 

Tribunal se mete onde não deve e acaba constrangido

O ministro Edson Fachin assumirá a presidência do Tribunal Superior Eleitoral depois de uma entrevista bombástica. Ele fica na cadeira até agosto. Fará uma gestão estelar se impuser a Edson Fachin e a alguns colegas um sistema de cotas para as próprias falas. 
Cada um e todos só deverão ir aos holofotes de forma que apareçam mais por seus votos e despachos do que por seus discursos. 
Em bom português, trabalhar mais e falar menos. Seria muito pedir que sigam a discrição da ministra Rosa Weber, do STF, mas algum limite precisa ser colocado. A ministra diz a quem quiser ouvir que não vai a eventos e não dá entrevistas. Não é arroz de festa. [PARABÉNS ao ilustre articulista pela sugestão e indicação; 
pedimos vênia para dois ministros para imposição de cota: ministro Barroso - pela sua eloquência exagerada - e o ministro Moraes - de modo a torná-lo menos loquaz e evitar, entre outras coisas, que declare como irá agir se algo que o desagrade acontecer - quando as chances do algo acontecer são mínimas, meras conjeturas.

O Tribunal meteu-se a trazer militares para a discussão das urnas eletrônicas e colocou o general da reserva Fernando de Azevedo e Silva na sua diretoria. Foi a carga da cavalaria ligeira dos ingleses na Batalha de Balaclava, um lindo desastre para um filme, uma celebração para a literatura. O general foi embora, e a mistura do Exército com a eficácia das urnas foi transformada por Jair Bolsonaro em mais um de seus espetáculos semanais. A vivandagem, com o Tribunal indo aos granadeiros, resultou apenas num constrangimento.

Nos últimos anos, o Judiciário brasileiro deu-se bem em dois episódios marcantes.  
- Joaquim Barbosa presidiu o STF no caso do mensalão falando nos autos e nas sessões. 
-Anos depois, o próprio TSE atravessou o processo de cassação da chapa Dilma Rousseff-Michel Temer sem espetáculos além do próprio julgamento.
 
As campanhas eleitorais têm de tudo, e o que todo candidato quer é um antagonista que lhe garanta quinze minutos (ou quinze horas) de fama. Os ministros não precisam entrar nessa várzea, até porque o que dizem fora dos tribunais tem pouca serventia. 
Delinquentes não temem a oratória de magistrados, mas apenas suas decisões. Um tribunal falando a torto e direito torna-se um laboratório que vende remédios onde há só a marca e a bula.[falação em excesso é indicativo seguro que o orador não tem o poder que pensa ter - costuma ser constrangedor quando ele decide honrar um dos seus discursos e torna público que não pode o tanto que pensava.
Outra situação constrangedora é quando o orador dana a falar,  esquecendo que está falando o contrário do que o colega que substitui vive a falar. ]

Nos Estados Unidos, há um ex-presidente insistindo que lhe roubaram a eleição. Da Corte Suprema saíram decisões e alguns parágrafos de falas do juiz John Roberts. [uma coisa é certa: o ex-presidente pode até estar errado ao dizer que foi roubado, mas  tendo ocorrido ou não o roubo um resultado prejudica muito o povo americano = seu sucessor, acaba de colocar os Estados Unidos em uma enrascada,um poço sem fundo.]

Lord Ismay e a Otan
Hastings Lionel Ismay foi um tremendo sujeito. Nasceu na Índia e morreu na Inglaterra em 1965, aos 78 anos, com o título de Barão Ismay. Em 1940, Winston Churchill nomeou-o seu assistente militar, e Ismay acompanhou-o dos dias em que a tropa inglesa estava encurralada em Dunquerque até sua entrada na Alemanha vencida, em 1945. Churchill nunca escondeu quanto lhe devia.

Ismay viu de tudo e em 1947 tornou-se o primeiro secretário-geral da Organização do Tratado do Atlântico Norte, a Otan. Foi dele a mais curta e precisa definição dos objetivos daquela aliança militar:“Manter os americanos dentro, os russos fora e a Alemanha embaixo.”

Passaram-se 73 anos, a Alemanha sacudiu a poeira e deu a volta por cima, a União Soviética se acabou, e os Estados Unidos deixaram de ser na Europa a potência que eram nos anos seguintes à Segunda Guerra. Como Lord Ismay já se foi, não se pode saber qual serventia ele atribuiria à Otan de hoje.
Se é para conter uma secular expansão russa, colocando bases militares dentro de um território que foi seu, falta combinar com o resto do mundo.

(...)


Memória da igreja
Com a morte de Candido Mendes de Almeida, foi-se uma parte preciosa da história política da igreja católica brasileira. Irmão de um bispo, neto de conde, bisneto de senador e trineto do Marquês de Paraná, conhecia o Brasil com os pés no andar de cima e a cabeça no de baixo.

Tinha uma memória prodigiosa e gosto pelos detalhes. Por exemplo: Paraná, o grande ministro do Império e arquiteto da Conciliação, morreu em 1856 numa das epidemias do Rio. Velado na velha catedral, a família aproveitou a madrugada para descansar em casa. Quando voltaram, o marquês estava sem o fardão de senador e as condecorações nele espetadas.

Candido ouvia e costurava tanto que caiu no grampo do Serviço Nacional de Informações e do Centro de Informações da Aeronáutica em pelo menos quatro ocasiões. Sempre batalhando por presos.

Tomara que tenha deixado registros.

Folha de S.Paulo - Jornal O Globo  - MATÉRIA COMPLETA - Elio Gaspari, jornalista

 

 

sábado, 1 de janeiro de 2022

O confisco da liberdade - Revista Oeste

 Augusto Nunes Branca Nunes

Os chefes do combate à pandemia instalaram na UTI direitos que a civilização ocidental levou séculos para consolidar

É impossível imaginar Winston Churchill isolado num gabinete, o rosto coberto pela máscara negra customizada, comandando a guerra contra um vírus chinês com a imposição de lockdowns e o rebaixamento a inimigo da pátria de qualquer súdito de Sua Majestade que ousasse dar as caras na rua. A hipótese é tão inverossímil quanto enxergar João Doria no cargo de primeiro-ministro britânico ao longo de 1940, liderando com palavras e ações a resistência solitária ao avanço das forças armadas de Adolf Hitler. Churchill foi o maior dos estadistas. Doria é apenas um dos governadores promovidos a tiranetes provincianos pelo Supremo Tribunal Federal, com poderes de sobra para, em parceria com os prefeitos, fazer o diabo no combate à pandemia de covid-19 até que a última esquadrilha de coronavírus voe de volta ao país natal.

O deserto de homens e ideias vislumbrado nos anos 1940 pelo chanceler Oswaldo Aranha restringia-se ao Brasil. A paisagem planetária era bem menos agreste. Em maio de 1941, com a ostensiva entrada dos Estados Unidos na Segunda Guerra Mundial, Franklin Roosevelt, único a vencer quatro eleições presidenciais consecutivas, interrompeu a solidão de Churchill. 
O mais longevo inquilino da Casa Branca puxou a fila que incluiria líderes nacionais brilhantes, militares audaciosos e diplomatas de fina linhagem.
A contemplação do elenco confirma que a vitória dos Aliados foi marcada pela coragem. E ninguém foi mais audaz que Churchill. Depois da retirada de Dunquerque, por exemplo, ele primeiro louvou a épica mobilização que resgatou das praias francesas mais de 300 mil soldados britânicos sitiados pelo Exército nazista. Em seguida, fez a advertência: “Não se ganha uma guerra com retiradas”.
 
Em agosto de 1940, em meio ao bombardeio de Londres que duraria 40 dias, ele frequentemente ordenou que aviadores da Real Air Force esquecessem por algumas horas a assustadora desvantagem numérica, deixassem os céus escurecidos pela Batalha da Inglaterra e quebrassem a moral do inimigo com ataques aéreos a Berlim e outras grandes cidades alemãs. Se estivesse no lugar de Churchill, uma Margaret Thatcher certamente faria a mesma coisa. Ela foi uma estadista e tanto. Mas o que teria acontecido caso o substituto fosse o atual primeiro-ministro, Boris Johnson? 
Pelo que fez e anda fazendo no combate à pandemia, essa flor de mediocridade não surpreenderia ninguém se determinasse a todos os britânicos — incluídos os alistados no Exército, na Marinha e na Aeronáutica, os integrantes do governo e ele próprio — que permanecessem em abrigos subterrâneos até que a guerra acabasse. Com a vitória de Hitler e seu comparsa italiano Benito Mussolini, naturalmente.

Churchill teve de lidar simultaneamente com a maior das guerras até então travada e com conflitos domésticos inevitáveis nas democracias. Para reduzir as colisões entre partidos, montou um ministério de união nacional. Isso não o livrou da feroz bancada oposicionista no Parlamento (que, ao contrário do que ocorreria décadas mais tarde em vários pontos do planeta fustigados pela covid, continuou funcionando normalmente). Entre uma visita ao front e uma viagem aérea de alto risco rumo a outra reunião secreta do alto comando aliado, o primeiro-ministro teve de sobreviver a moções de desconfiança que se seguiam a cada insucesso na guerra — e que não foram poucos. “É preciso coragem para levantar-se e falar, mas também é preciso coragem para sentar-se e ouvir”, aprendeu. Para ele, aliás, a coragem é a maior das qualidade humanas, porque garante as demais.

Os loucos por lockdown
Vista em seu conjunto, a performance dos chefes do combate à pandemia reitera que estadistas são uma espécie aparentemente desaparecida da face da Terra. É perturbador descobrir que o mundo ficou parecido com o Brasil da frase de Oswaldo Aranha. Ainda mais inquietante é constatar que os generais e sargentos que dirigem a guerra contra a pandemia se dividem entre os incapazes, os capazes de tudo e as bestas quadradas que acham possível vencer combates com retiradas sucessivas. 
 
A inquietação dos portadores de cérebros sem avarias é ampliada pela transformação do Supremo Tribunal Federal num Poder Moderador que age imoderadamente em favor dos governadores e prefeitos — e invariavelmente contra o chefe do Poder Executivo. 
Tudo o que faz ou pensa o presidente da República é coisa de genocida negacionista. 
Todas as bobagens produzidas pelos chefetes regionais ou municipais são elogiáveis, por comprovarem o respeito do bando a um oráculo batizado de ciência.
Faz quase dois anos que esses donatários do Brasil esbanjam aquela espécie de arrogância que mal camufla a pusilanimidade. 
 
Uma consulta ao abundante falatório dos loucos por lockdowns prova que a pandemia reformulou as prioridades do repertório vocabular. A discurseira agora é adornada por termos como “precaução”, “prevenção”, “cautela”, “cuidado”, “prudência”, “isolamento” e outras sopas de letras associadas ao medo. A mesma consulta informa que a palavra “coragem” foi expulsa da garganta da turma dofique em casa”. Virou palavrão, coisa de bordel, conversa de cabaré, indigna de salões frequentados por gente que não dá um passo sem ouvir, pela voz dos condutores da guerra, o que dizem a ciência e a saúde. 
Se tivesse nascido na primeira metade do século passado numa fazenda do Reino Unido, essa gente se esconderia no celeiro de 1939 a 1945. E continuaria a afastar-se do mundo sempre que avistasse no horizonte algum avião de carreira.
 
Churchill, Roosevelt, o francês Charles de Gaulle e milhões de jovens anônimos foram à guerra para impedir o assassinato da liberdade
Os tiranetes cevados pela pandemia confiscaram direitos fundamentais a cada avanço do exército brancaleônico. A primeira vítima foi o direito de ir e vir, degolado por quarentenas e fechamentos de estradas. Em março de 2020, os humanos descobriram que já não eram livres para sair de casa quando quisessem, conviver com amigos ou familiares, muito menos ir a lojas, bares e restaurantes. Cinemas e teatros estavam interditados. Crianças haviam perdido a permissão para estudar em salas de aula e todos deveriam cobrir o rosto com máscaras.
 
A segunda foi a liberdade de expressão, guilhotinada pela submissão de todas as discordâncias à verdade oficial. Deixou de existir qualquer oportunidade para discutir ou debater as decisões das autoridades. 
O massacre estendeu-se ao direito à vida, suprimido no momento em que os generais decidiram que a economia deveria ficar para depois. 
E agora ameaça de morte a liberdade religiosa, o livre-arbítrio sobre o próprio corpo e o pátrio poder.  
Políticos e juízes tratam como bandidos os cidadãos que não se vacinaram e como criminosos hediondos os pais que se recusam a vacinar um filho.
 
Evandro Pelarin, juiz da Vara da Infância e da Juventude de São José do Rio Preto, por exemplo, resolveu intimidar todos os pais e mães da cidade. “A partir do momento que a Anvisa libera a vacinação de crianças, ela passa a ser obrigatória e os pais que deixarem de imunizar os filhos podem ser multados, processados e até perder a guarda.” Na cabeça do juiz de 44 anos, “a resistência dos pais é um crime, é colocar em risco a saúde alheia”.[o ilustre magistrado conferiu a uma decisão da Anvisa poderes de Lei - esquecendo que uma lei é editada exclusivamente pelo Poder Legislativo (ou deveria ser, se ilustres integrantes do Poder Judiciário obedecessem à Constituição Federal e respeitassem a competência constitucional de cada um dos Três Poderes) formado por 513 deputados e 81 senadores. 
Já a decisão da Anvisa - com força de lei, no entendimento do magistrado Evandro Lelarin - foi adotada por meia dúzia de técnicos que não se dispõem a assumir publicamente o que criaram.]

A covidocracia
Os britânicos buscavam a vida normal entre um bombardeio e outro. Os brasileiros estão proibidos de acreditar que a pandemia está no fim.  Os britânicos ficaram felizes com o fim da guerra. Os governantes destes trêfegos trópicos vibram com o crescimento de uma gripe e lamentam que a nova variante seja tão branda. “Essas proibições são um teatro”, observou o advogado e jornalista americano Michael Fumento. “Por quanto tempo permitiremos que as variantes sejam exploradas para manter uma covidocracia permanente? É hora de acabar. Precisamos dar a essa variante um novo nome de alfabeto grego: Ômega. Que é ‘o último’.”

Quem poderia imaginar que esse enredo kafkaniano se tornaria realidade?

A advogada e escritora Daria Fedotova, baseada na Ucrânia, afirma que está proliferando “uma espécie de Estado babá, que decide que seus cidadãos travessos não sabem o que é bom para eles e, portanto, precisam ser mantidos longe do perigo”. Embora a Ômicron tenha se mostrado nada letal desde sempre, Israel proibiu a entrada de estrangeiros no país. O Japão e o Marrocos fecharam o espaço aéreo. E cerca de 50 países impuseram restrições a viajantes que estiveram no sul da África.

Na contramão da liberdade individual, a Áustria tornará a vacina obrigatória a partir de fevereiro. Quem recusar a imunização será convocado por um tribunal local. Se ignorar a convocação duas vezes, pagará uma multa calculada em € 3.600. Se insistir na rejeição, será punido com multas que podem arruinar financeiramente o autor da infração. A Alemanha impôs um lockdown aos não vacinados. Cresce o número de países que exigem o passaporte de vacinação para entrar em locais fechados. Na Itália, os não vacinados estão impedidos de trabalhar.

Quem poderia imaginar que esse enredo kafkaniano se tornaria realidade? Em menos de dois anos, a civilização ocidental abriu mão com estarrecedora passividade de direitos fundamentais que levou séculos para conquistar. “Suspeito que muitos valorizam a liberdade menos do que gostamos de pensar”, afirmou o psiquiatra inglês Theodore Dalrymple, em entrevista a Oeste. “Se a liberdade acarreta um custo, eles estão dispostos a renunciar a ela. Alguns até acham a liberdade desconfortável, especialmente quando traz responsabilidades. Preferem que alguém cuide de seu conforto.”

Derrotado na primeira eleição depois da vitória sobre o nazismo, Churchill reagiu com a naturalidade dos estadistas: “Os eleitores acharam que sou melhor durante a guerra do que em tempos de paz”. Os sacerdotes do autoritarismo à brasileira acreditam que vacina é cabo eleitoral. O primeiro-ministro que venceu a Alemanha é imortal
Daqui a 75 anos, quando alguém lembrar que houve nos anos 20 uma pandemia homicida, os rufiões do coronavírus serão, na mais favorável das hipóteses, nomes de rua. 
São medíocres demais para descansarem em placas nas esquinas de alguma avenida.

Leia também “Os imoderados no poder”

Augusto Nunes  Branca Nunes, colunistas - Revista Oeste


segunda-feira, 17 de junho de 2019

Às armas, cidadãos!

Sem máscara. Sem carta



Faça de conta que estamos em meados de 2003. O presidente da República empossado há menos de seis meses chama-se Luiz Inácio Lula da Silva. Neste momento, em um quartel no interior do Rio Grande do Sul, cercado por generais que o apoiam com entusiasmo, ele fala para uma grande plateia de militares e civis.

Celebra-se a passagem de mais um aniversário de Émile Louis Mallet, conhecido como Marechal Emílio Mallet, o Patrono da Artilharia do Brasil, embora tenha nascido em Dunquerque, na França, e aqui chegado com 17 anos de idade. Então, depois de exaltar as façanhas de Mallet, Lula desata a falar sobre outros assuntos.
Diz, por exemplo: “A nossa vida tem valor. Mas tem algo muito mais valoroso que nossa vida, que é nossa liberdade. Além das Forças Armadas, defendo o armamento individual para nosso povo para que tentações não passem na cabeça de governantes para assumir o poder de forma absoluta” (aplausos!).

Em seguida, Lula defende a ditadura militar instalada no país em 1964 e só revogada 21 anos depois. Durante esse período, foram torturados e mortos centenas de opositores do regime. Lula afirma que os “homens e mulheres de farda já provaram seu valor nos anos de 1960” (aplausos mais fortes!). E animado com aprovação dos que o ouvem, provoca:
– Precisamos, mais que do Parlamento, do povo ao nosso lado para que possamos impor uma política que reflita em paz e alegria para todos nós. (aplausos. Ouvem-se gritos de “Lula, Lula, Lula”.)

Entre o aeroporto local e o quartel, Lula havia sido aclamado nas ruas por pessoas que portavam bandeiras e cartazes. Ele fez questão de apertar mãos e de abraçar crianças. Um homem entregou-lhe um boneco com a cara de José Serra, o candidato derrotado por Lula na eleição recente. Lula estapeou o boneco e arremessou-o longe.  Lula não explicou a associação que fez entre o porte ou posse de armas por civis e uma eventual resistência a governos autoritários. O que ele mesmo quis dizer com aquilo? Uma vez armados, civis deveriam se organizar para resistir a governantes que ousassem assumir o poder “de forma absoluta”? Foi este o sonho da esquerda nos anos 60.

Quanto ao que disse sobre apoio do povo e apoio do Congresso: Lula gostaria de governar dirigindo-se diretamente às massas, contando com sua adesão, se necessário dispensado o Congresso da tarefa de representá-las. Ele e as massas certamente saberiam impor uma política que resultasse “em paz e alegria para todos”.
De Lula, estivéssemos em 2003 e fosse ele o presidente, certamente diríamos que tirara a máscara do Lulinha Paz e Amor, rasgara a Carta aos Brasileiros onde prometera governar como um liberal, e se revelara o que de fato é – um extremista de esquerda, sem compromisso com a democracia, e disposto, se for o caso, a torpedeá-la.
Como estamos em 2019, o presidente se chama Jair Messias Bolsonaro, e ele não precisou de máscara e de carta para se eleger, não poderemos dizer que fomos enganados. [Bolsonaro NUNCA se apresentou como PAZ e AMOR, sua manifestação appós ser vencedor o primeiro turno deixou bem claro suas posições e sempre se declarou  de direita.

Portanto, o único reparo a fazer ao senhor presidente JAIR BOLSONARO -  sobre aspectos não falados na campanha eleitoral - é o de permitir que os filhos e o aiatolá de Virginia dêem palpites desnecessários e inúteis  em seu governo.]

domingo, 30 de julho de 2017

Dunquerque, a vitória da civilização

‘Dunkirk' é um grande filme e conta o resgate do exército inglês, encurralado na praia francesa de Dunquerque em maio de 1940

“Dunkirk” é um grande filme e conta o resgate do exército inglês, encurralado na praia francesa de Dunquerque em maio de 1940. Barra pesada, mostra com maestria a angustia da operação.  O filme restringe sua narrativa ao que acontecia na praia, no ar e no mar. Vale a pena por si, mas está nas livrarias “Cinco Dias em Londres", do historiador John Lukacs, publicado em 2001. Juntos, são um presente para a alma. Naqueles dias, tudo parecia perdido. Hitler dobrara a França e era senhor da Europa. O povo inglês ainda não sabia, mas 250 mil soldados estavam cercados na praia de Dunquerque. O colapso dessa tropa seria o prelúdio de uma invasão da ilha.

Winston Churchill ainda não completara duas semanas como primeiro-ministro. Era um político mal visto, falastrão e pouco confiável. Seu rival no partido conservador era o ministro das relações exteriores, Lord Halifax, um inglês de anúncio de roupa, amigo do rei. Halifax queria explorar o caminho de uma paz com Hitler, usando os bons ofícios do embaixador italiano em Londres.  “Cinco Dias em Londres" conta o embate desses dois patriotas. Churchill não queria ceder e costurou sua posição no ministério, até que prevaleceu, depois de uma conversa no jardim com Halifax. (Nenhum dos dois escreveu uma só linha a respeito desse passeio.) Churchill achava que só tiraria 50 mil soldados de Dunquerque. No dia 6 de junho, a Marinha e os pequenos barcos ingleses que atravessaram o canal da Mancha resgataram 338 mil soldados, inclusive 125 mil franceses.

Christopher Nolan fez seu serviço de cineasta e é o vermute. John Lukacs, como historiador, é o gin. Quem junta os dois faz o martini e revisita uma semana que ajudou a salvar a civilização. No dia 6 de junho, Churchill, terminado o resgate, fez seu famoso discurso do “nós nunca nos renderemos". Cinco anos depois, a Alemanha rendeu-se.
Lukacs sustenta que o nazismo foi vencido em Stalingrado e no Dia-D, com o desembarque dos Aliados, mas foi em Dunquerque que Hitler perdeu a sua guerra. Ele, e muita gente boa, inclusive no Brasil, achavam que os ingleses negociariam uma paz, nos termos de Berlim.

No dia 21 de maio, Getúlio Vargas escreveu em seu diário:
“As notícias da guerra são de uma verdadeira derrocada para os Aliados. O povo, por instinto, teme a vitória alemã; os germanófilos exaltam-se. Mas o que ressalta evidente é a imprevidência das chamadas democracias liberais...”

Entre os patos de 1972 estavam os militares
Um documentário de Stefanie Dodt e Thomas Aders mostrou ao público alemão as relações promíscuas da Volkswagen com o aparelho repressivo da ditadura brasileira. A Volks não foi a única empresa a denunciar trabalhadores, mas é a única que está sendo cobrada no seu país. O problema da Volks era pedir desculpas. Agora surgiu outro: ter que se desculpar por não ter se desculpado.

Essa questão mostra a saudável relação da sociedade alemã com suas grandes empresas. Nada parecido acontece em Pindorama. A Federação das Indústrias de São Paulo, a Fiesp do pato amarelo, jamais pediu desculpas por ter organizado o caixa dois da guarnição militar de São Paulo. [não é necessário, sequer conveniente, pedir desculpas por ter sido PATRIOTA.
Vale o mesmo entendimento em relação a Volkswagen que colaborou, dentro das suas possibilidades, apoiando o combate aos porcos traidores comunistas que pretendiam fazer do Brasil uma outra Cuba.]

Uma carta do embaixador americano William Rountree ao Departamento de Estado mostra que, no início de 1972, os empresários que vinham sendo arrebanhados pela Fiesp tiveram medo de abandonar o esquema. Eles fizeram saber ao embaixador que “tinham ido muito longe para poderem recuar e achavam que se o fizessem prejudicariam seriamente suas relações com a Federação das Indústrias". Afinal era ela quem coletava o dinheiro.
A Fiesp financiou a repressão e bajulou os militares até que os ventos mudaram e criaram-se outras caixas, umas coletivas, outras individuais.

Números e grifes
O repórter Filipe Coutinho revelou que, entre 2015 e 2016, a empresa de consultoria do ministro Henrique Meirelles faturou R$ 217 milhões, ou cerca de US$ 60 milhões. Em nota, o ministro informou que nesses ganhos estavam incluídos serviços prestados ao longo de quatro anos.  Em 2011, o mundo veio abaixo quando revelou-se que Antonio Palocci faturara R$ 20 milhões com sua empresa de consultoria, num só ano. [o parágrafo abaixo destacado explica as razões do sucesso da firma do ministro Henrique Meirelles - seu sucesso no Bank of Boston, é apenas um dos fatores.
Já o presidiário Palocci um médico incompetente, um ex-prefeito medíocre, não tinha, e continua não tendo, nada que justifique o seu sucesso como consultor, sendo sua situação exatamente igual a do sentenciado Lula da Silva, um incompetente, falastrão e analfabeto.]

No vida pública, Palocci fora ministro da Fazenda de 2003 a 2006. Sua experiência anterior era a de prefeito de Ribeirão Preto.

Meirelles foi presidente do Banco Central de 2003 a 2011. Ao contrário de Palocci, fez invejável carreira na iniciativa privada, tendo presidido o Banco de Boston.

Uma das mais famosas firmas de consultoria de grife do mundo, a do ex-secretário de Estado americano Henry Kissinger, não revela seus números. Em 1986, quando ele ainda estava no auge da forma e da fama, soube-se que ela faturou US$ 5 milhões.  A empresa de Kissinger tem a sua grife, mas nela estiveram craques como Timothy Geithner, o celebrado secretário do Tesouro de Obama durante a crise financeira mundial.

Cargo vago
Estão no mercado dois dos empregos mais prestigiosos do mundo, a presidência da Universidade Harvard e a diretoria do Museu Metropolitan de Nova York.  A escolha do museu é feita num mercado restrito, mas Harvard circulou um pedido de indicações. Não é nada, não é nada, o chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, poderia se oferecer para indicar os nomes de alguns deputados da base governista.

Barco fujão
O beato Joesley Batista tem toda razão quando reclama das calúnias que são lançadas sobre sua imaculada pessoa. Ele diz que “mentiram que eu teria fugido com meu barco".
Tem toda razão. O iate Leonardo 100 fugiu sozinho, enquanto ele negociava o seu perdão com o doutor Rodrigo Janot. O barco saiu de uma marina em Itajaí e foi para Miami. A peça está avaliada em US$ 100 milhões.

(...)


Cármen Lúcia
A ministra Cármen Lúcia, presidente do Supremo Tribunal Federal, não tem simpatia pelo aumento de 16,74% pleiteado pelos procuradores.
O pessoal do Ministério Público acha que pode tudo, mas deve se respeitar as leis da aritmética.
Se a ministra endossar o aumento, entrega a biografia.

Gleisi de Calcutá
A presidente do PT, Gleisi Hoffmann, solidarizou-se com o golpe bolivariano de Nicolás Maduro.
Se o seu discurso em defesa dos pobres e dos oprimidos fosse sério, a comissária faria alguma coisa em favor dos vinte mil refugiados venezuelanos que refugiaram-se em Roraima e vivem em condições precárias de moradia e alimentação.
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Fonte: Elio Gaspari, jornalista - O Globo