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quarta-feira, 8 de setembro de 2021

Aldo Rebelo: ‘Sem o marco temporal, haverá tempestade de reivindicações’ - Revista Oeste

Fábio Matos

Ex-ministro dos governos Lula e Dilma Rousseff, ele afirma que ONGs usam a questão indígena com o objetivo de atingir o agronegócio brasileiro

                                 Ido Rebelo | Foto: Felipe Barra/MD 

Poucas lideranças políticas no Brasil têm a autoridade do ex-deputado Aldo Rebelo para tratar de um dos assuntos que vêm mobilizando o Supremo Tribunal Federal (STF) nesta semana: o marco temporal sobre as terras indígenas no país. Autor do livro Raposa Serra do Sol: o Índio e a Questão Nacional, coletânea de artigos publicada em 2010, Rebelo vai na contramão da narrativa fomentada por setores da esquerda e difundida por ONGs internacionaisde que os indígenas seriam vítimas de produtores rurais, que supostamente teriam “roubado” terras pertencentes aos chamados “povos originários”. [o ex-deputado não se alinha entre os que gozam da nossa simpatia - além de comunista, serviu aos (des)governos petistas - mas por uma questão de integridade temos que reconhecer que o que nos leva a antipatiza-lo, nos obriga a tornar insuspeita sua opinião sobre o tema.]

Nas discussões em torno do marco temporal, os ministros do STF terão de interpretar o que parece já muito claro na Constituição: que os indígenas têm direito à propriedade dos territórios que ocupavam na data da promulgação do texto constitucional (5 de outubro de 1988), e não antes disso. “Veja que o constituinte pôs o verbo no presente para evitar reivindicações sobre terras ocupadas no passado, o que traria grande confusão e insegurança jurídica para índios e não índios”, afirmou Rebelo. 

Ex-ministro dos governos Lula e Dilma Rousseff, ex-presidente da Câmara e relator do Código Florestal, Rebelo avalia que deveria caber ao Congresso Nacional, e não ao STF, a definição sobre o marco temporal. “Na Câmara dos Deputados todos seriam ouvidos, principalmente os indígenas, geralmente excluídos de qualquer opinião, como foi o caso que testemunhei da demarcação da Reserva Raposa Serra do Sol”, contou. 

Em março de 2009, o STF decidiu pela demarcação contínua da reserva indígena localizada em Roraima (na fronteira do Brasil com a Guiana e a Venezuela), alvo de uma disputa entre indígenas e produtores de arroz, que acabaram expulsos do local. A tese foi apoiada por dez dos 11 ministros da Corte — o único voto contrário foi o de Marco Aurélio Mello. Na época, Rebelo escreveu: “Se prosperar esta doutrina de que os índios têm direito à autodeterminação em seu território, como parece estar prosperando, amplia-se uma vulnerabilidade que expõe larga faixa do território brasileiro à influência de organismos internacionais e ao manejo de organizações estrangeiras”.

Mais de uma década depois, a questão indígena retorna à pauta da mais alta Corte do país — e com direito ao pacote completo: lobby de ONGs, gritaria da esquerda e demonização do agro. A seguir, Aldo Rebelo destrincha o que está por trás desse intrincado tabuleiro geopolítico, econômico e social.

Leia os principais trechos da entrevista.

A derrubada do marco temporal pelo STF poderia trazer insegurança jurídica para o país?
O marco temporal já está na Constituição, no Artigo 231, que determina à União a proteção da organização social das línguas, tradições e direitos dos indígenas às terras que tradicionalmente ocupam. O constituinte pôs o verbo no presente para evitar reivindicações sobre terras ocupadas no passado, o que traria confusão e insegurança jurídica para índios e não índios. 
Houve um caso que acompanhei no Maranhão em que indígenas reivindicaram a demarcação de pequenas propriedades de outros índios e seus descendentes, gerando um processo de litígio e violência entre conhecidos e familiares. 
São Paulo, a maior cidade do Brasil, era, na sua origem, formada por aldeias indígenas cujos nomes permanecem nos bairros da cidade. Morumbi, Ibirapuera, Itaquera, Guaianases, Jabaquara, Tietê e Tucuruvi são denominações dadas a essas localidades pelos contemporâneos do cacique Tibiriçá, cujos descendentes ainda vivem hoje na cidade de São Paulo. Sem o marco temporal, nada impediria, por exemplo, que eles reivindicassem as posses de seus antepassados.

Há entidades nacionais e internacionais atuando pela derrubada do marco temporal. Qual é o papel das ONGs nesse processo? Há uma ameaça à soberania nacional?
O Brasil sofre do que os especialistas chamam de “guerra híbrida”, e o alvo, além do pré-sal, é o nosso próspero agronegócio, que retira mercado dos concorrentes europeus e norte-americanos. 
Além disso, o agro reduz o lucro da concorrência pela queda do preço internacional dos produtos e obriga o Tesouro dos Estados Unidos e dos países europeus a subsidiar cada vez mais sua agricultura quase estatal e de produtores que são praticamente funcionários públicos, pelo volume de dinheiro do Estado que recebem. 
É claro que eles financiam essas ONGs para criar uma espécie de barreira não tarifária para os agricultores brasileiros. Se isso constitui uma ameaça à nossa soberania? Talvez seja um exagero afirmar que sim, a não ser no caso da Amazônia, onde há o objetivo de bloqueio das ações da sociedade brasileira e do Estado nacional na região.

O senhor entende, então, que há grupos econômicos ou mesmo governos estrangeiros interessados em atingir o agronegócio brasileiro?
Quem tiver dúvida sobre os interesses internacionais na agricultura brasileira que vá à internet e consulte o documento “Farms here, forests there” (“Fazendas aqui, florestas lá”, em tradução livre), sobre fazendeiros norte-americanos. Ali se comprova que, se há uma teoria da conspiração sobre esse assunto, ela não surgiu por acaso. 
Todas as negociações nos organismos multilaterais envolvendo o Brasil e a União Europeia encontram o seu ponto máximo de tensão na agenda da agricultura. 
Partiu dos agricultores europeus a pressão para inviabilizar o acordo celebrado entre a União Europeia e o Mercosul exatamente pelo temor da competitividade dos agricultores e criadores brasileiros e argentinos. Lembremos que, na Segunda Guerra Mundial, a primeira grande batalha naval ocorreu entre as Marinhas da Inglaterra e da Alemanha no Atlântico Sul, quando os alemães tentavam evitar que navios mercantes ingleses abastecessem Londres com carne e trigo da Argentina e do Uruguai. (.........)

O STF é o foro adequado para definir a questão do marco temporal?
A solução mais adequada seria o Supremo Tribunal Federal deixar a decisão da matéria controversa para o Congresso Nacional. Na Câmara dos Deputados todos seriam ouvidos, principalmente os indígenas, geralmente excluídos de qualquer opinião, como foi o caso que testemunhei da demarcação da Reserva Raposa Serra do Sol.

Leia também “Soberania ameaçada”

Revista Oeste, MATÉRIA COMPLETA 


quarta-feira, 21 de agosto de 2019

Sem apresentar qualquer prova, Bolsonaro tenta ligar ONGs a queimadas (Estadão Conteúdo)

 Transcrito de Veja

Presidente atribui insinuação ao seu "sentimento", mas pesquisa científica relaciona aumento dos incêndios na floresta amazônica ao avanço no desmatamento

[algumas ONGs, sem os recursos dos 'defensores'  estrangeiros do meio ambiente, vão ficar na penúria, igual estão os sindicatos sem o imposto sindical.]


Depois de um levantamento indicar aumento no número de focos de queimadas na Amazônia em 2019, o presidente Jair Bolsonaro (PSL) insinuou que esse tipo de ação tem sido provocada por ONGs com o intuito de prejudicá-lo. “Pode estar havendo, não estou afirmando, ação criminosa desses ‘ongueiros’ para exatamente chamar a atenção contra a minha pessoa”, afirmou, ao sair do Palácio do Planalto, nesta quarta-feira, 21. O presidente, entretanto, não apresentou qualquer prova dessa sua hipótese, baseada apenas em seu “sentimento”. “O pessoal foi para lá filmar e tacaram fogo. Esse é o meu sentimento”. À parte disso, uma análise técnica do Instituto de Pesquisas Ambiental da Amazônia (Ipam) relaciona o aumento dos incêndios na floresta, que já é 60% superior à média dos últimos três anos, ao avanço do desmatamento na região.

O aumento no desmatamento durante o governo Bolsonaro já provocou a suspensão de recursos dos governos da Noruega e da Alemanha para o Fundo Amazônia, que serviam para financiar atividades de preservação. Reportagem de capa de VEJA em sua edição 2648 mostra que, além de arranharem a imagem do país no exterior, as ações e o discurso do presidente contra o meio ambiente podem trazer enormes prejuízos à economia brasileira.

[antes de esculachar a política ambiental do governo do presidente Bolsonaro, ou o presidente, conheça as verdadeiras razões da Noruega, da Alemanha e da política “Farms Here, Forests There”,, clicando aqui.]

 

Do começo do ano até esta terça-feira 20 foram registrados 39.033 focos no bioma Amazônico, contra 22.165 no ano passado até o final de agosto, segundo dados do Programa Queimadas, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). O número também já supera os dados dos oito primeiros meses de 2016, que tinha sido particularmente seco no início do ano e registrado 36.333 focos até 31 de agosto.
Questionado se o bloqueio de recursos do Fundo Amazônia pode prejudicar ações de combate ao fogo, Bolsonaro afirmou que 40% dos recursos serviam para “bancar ONGs”. O presidente também culpou os governadores dos estados da região pela situação. “Não quero citar nome, que está conivente com o que está acontecendo e bota a culpa no governo federal”, disse.

O presidente disse que o governo discute maneiras de combater os incêndios. “A Justiça pode mandar, acredite, quarenta homens da Força Nacional para lá. É uma gota d’água no meio do oceano. As Forças Armadas, devemos usar, talvez a partir de amanhã, unidades ali da região, porque não tem como deslocar daqui para lá. Vai faltar comida para o Exército a partir de setembro. É a situação em que nós nos encontramos.”

Epidemia de incêndios
O número de focos de incêndios, para maioria dos estados da região, já é o maior dos últimos quatro anos. O Mato Grosso lidera, com 13.682 focos até segunda-feira, alta de 87% em relação ao ano passado. E já supera também o ano de 2016, que tinha sido o recorde para o estado, com 12.896 focos. No Brasil como um todo, este já é o ano com maior número de focos de calor desde 2013. Uma das justificativas para a alta é que este ano a Amazônia novamente está enfrentando uma estiagem mais prolongada, como ocorreu em 2016, mas de acordo com os pesquisadores do Ipam, só a seca não explica a alta nas queimadas. Avaliando o cenário local de seca até o último dia 14, o grupo liderado por Divino Silvério observou que a estiagem atual está mais branda do que nos últimos anos.

Os pesquisadores compararam os focos de incêndio registrados pelo Inpe com indicadores de alertas de desmatamento feitos pelo sistema de monitoramento por satélites SAD, do Imazon, e observaram uma correlação forte, indicando que “o desmatamento possa ser um fator de impulsionamento”, escrevem em nota técnica divulgada nesta terça-feira 20.
“Os dez municípios amazônicos que mais registraram focos de incêndios foram também os que tiveram maiores taxas de desmatamento”, comparam os autores. Segundo eles, esses municípios são os responsáveis por 37% dos focos de calor em 2019 e por 43% do desmatamento registrado até o mês de julho na região. “Essa concentração de incêndios florestais em áreas recém-desmatadas e com estiagem branda representa um forte indicativo do caráter intencional dos incêndios: limpeza de áreas recém-desmatadas”, apontam.

Veja - Fonte - Estadão Conteúdo