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sexta-feira, 7 de julho de 2023

8 de Janeiro: autoridades revelam bastidores dos ataques, 6 meses depois

VEJA publica relatos exclusivos de um representante de cada Poder sobre os momentos marcantes do epicentro de um dia triste que não pode ser esquecido

Dependendo do observador, os acontecimentos de 8 de janeiro de 2023 podem ser vistos, interpretados e mensurados de ângulos e maneiras diferentes
Uma constatação, porém, é inegável à luz dos fatos: a invasão e a depredação das sedes dos Três Poderes passaram para a história como o dia em que a democracia brasileira foi insultada e afrontada em sua essência por bárbaros agindo sob o impulso de mentes perturbadas que se escondiam — e ainda se escondem — nas sombras. 
Foi um domingo em que milhões de brasileiros acompanharam, atônitos, cenas execráveis dentro do Palácio do Planalto, do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal (STF). 
Seis meses depois, as autoridades ainda divergem sobre o que exatamente teria motivado os ataques. 
Para uns, foi o primeiro ato de um golpe de Estado que não se concretizou. Para outros, uma baderna derivada do extremismo político. [OPINIÃO: para nós, no campo da conjectura e com fundamento na conduta criminosa que caracteriza  a militância da esquerda, foram atos realizados por infiltrados petistas e outros da mesma laia, buscando fornecer elementos para um endurecimento da repressão do atual governo - algo tipo o incêndio do Reichstag.]
 
Era um fim de semana como outro qualquer em Brasília. O presidente Lula visitava bairros atingidos por uma enchente em Araraquara (SP). Com o recesso parlamentar, o senador Rodrigo Pacheco, presidente do Congresso, passeava em Paris. O presidente da Câmara, Arthur Lira, descansava numa praia em Maceió. Rosa Weber, presidente do STF, era uma das poucas autoridades que estavam na cidade, quando milhares de apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro deixaram um acampamento montado no QG do Exército em direção à Esplanada. No dia anterior, a Polícia Federal havia advertido sobre a possibilidade de a manifestação descambar para atos de violência. Não houve, porém, reforço algum na segurança. [segurança da responsabilidade do atual governo e sob seu comando .]

O Congresso foi o primeiro prédio a ser atacado. Os vândalos quebraram os vidros, destruíram equipamentos, depredaram obras de arte e, de lá, seguiram em direção ao Planalto. Sem resistência, subiram a rampa do palácio e foram arrebentando tudo que encontravam pela frente, até chegar ao gabinete do Presidente da República. A terceira e última escalada foi a que deixou o maior rastro de devastação. Os criminosos atearam fogo no plenário do Supremo, picharam as paredes e simularam defecar sobre os móveis. Foram quatro horas de barbárie. Vencida a perplexidade, as instituições reagiram com vigor. 
Mais de 1 200 pessoas respondem hoje a processos, cerca de 250 estão presas desde então e uma Comissão Parlamentar de Inquérito foi criada para apurar o caso.  
VEJA publica relatos exclusivos de um representante de cada Poder sobre os momentos marcantes que ficaram na memória de quem esteve no epicentro de um dia triste que não pode ser esquecido.

FLÁVIO DINO: “TEVE DEDOS EM RISTE DE LADO A LADO”
Nervoso, o ministro da Justiça discutiu com generais, diz ter certeza de que houve uma tentativa de golpe contra o presidente Lula [Entendemos ser indispensável destacar que o golpe que iria ocorrer, "tentado", se concretizado, seria o primeiro GOLPE DE ESTADO, em toda a História Mundial, realizado por pessoas desarmadas, em sua maioria sexagenários e,  completando o modelo inusitado  de golpe, o seu natural beneficiário estava há mais de 10 dias fora do Brasil - nos Estados Unidos - o cargo havia sido transmitido normalmente e a posse do novo presidente ocorrido na data aprazada - 1º jan 2023 - tudo conforme a Constituição.]efetuada  e afirma que os militares estavam torcendo por uma virada de mesa. 

(...)

"Percebi que a coisa poderia sair do controle e rumei para o ministério. Era apenas o início de um dia que ainda não acabou. A invasão do Congresso aconteceu diante dos meus olhos. Da janela do meu gabinete, vi quando a multidão derrubou as grades, jogou uma viatura no espelho d’água e escalou o prédio. Havia uns poucos policiais tentando conter os criminosos. Entrei em pânico. Era preciso falar com o presidente. Aquela invasão poderia incentivar protestos similares em todo o Brasil. Lula estava vendo pela TV. Ficamos com medo de perder o controle do país. Se aquilo se multiplicasse, não teríamos força para superar. O golpe seria consumado. Nervoso, xinguei o Bolsonaro, o bolsonarismo, xinguei quem havia tramado aquilo e as forças de segurança [imperioso destacar que as forças de segurança estavam sob o comando do novo governo] que permitiram aquele caos." Invadiram o Planalto e estavam quebrando tudo. Da minha janela vi uma fumacinha preta subindo do prédio do Supremo. Estavam tocando fogo no STF. O caos havia se espalhado. Era preciso agir rápido. Minha ordem era prender todo mundo. Mas nem isso foi possível de imediato.

Depois da destruição, deu-se um embate com os militares. Fui ao Quartel do Exército e disse que a gente ia prender todo mundo que estava no acampamento. Foi quando vi tanques saindo de uma ruazinha. Se alguém ainda tinha alguma dúvida de que um golpe estava em andamento, ela se dissipou naquele momento. A maioria do Alto-Comando torcia — e friso este verbo, torcia — para que o levante tivesse dado certo. Repeti sem parar para o comandante do Exército: ‘General, nós vamos pegar todos, sem exceção. É a minha ordem’. Ele tentou crescer para cima de mim. Teve dedos em riste de lado a lado. A adrenalina estava a mil. Eu repetia: ‘Estão todos presos, estão todos presos’. Ele dizia: ‘Não, não, não’. No meio dessa discussão, outro general interveio e disse que a polícia nunca tinha entrado no quartel para prender pessoas. Essa é uma evidência acima de qualquer dúvida razoável de que havia a simpatia nas Forças por uma virada de mesa. O Exército estava dividido entre bolsonaristas golpistas e bolsonaristas legalistas, mas sempre bolsonaristas.

Diante de um confronto iminente, concordamos em efetuar as prisões dos golpistas apenas no dia seguinte. Vendo hoje, seis meses depois, acho que foi o certo a fazer. Se fosse diferente, seria perigoso para as pessoas e talvez pior ainda para a democracia. Imagina a PM de um lado e o Exército do outro"

(...)

GILMAR MENDES: “FELIZMENTE ISSO ACONTECEU EM JANEIRO”
Decano do Supremo Tribunal Federal, que chorou ao ver os escombros, destaca a forte reação das instituições e diz que o ataque teria desfecho imprevisível caso tivesse ocorrido durante o governo de Jair Bolsonaro

"Almoçava com um amigo juiz em Portugal e, por coincidência, falávamos sobre como havia sido relativamente pacífica a transição de governo no Brasil quando recebi pelo celular as primeiras imagens da confusão. Fiquei em choque. Logo lembrei que tinha feito um prognóstico caso Bolsonaro ganhasse as eleições: o conflito com o Supremo Tribunal aumentaria. Pessoas próximas afirmavam que, se ele vencesse, teríamos de deixar o país. Tudo que eu estava falando sobre o sucesso da passagem de poder tinha acabado de ser revogado. Desde as comemorações do Sete de Setembro de 2021 eu temia que algo como aquilo ocorresse. Liguei de imediato para os ministros Flávio Dino, Alexandre de Moraes, e para a presidente Rosa Weber. Todos estavam tentando entender o que estava acontecendo. Flávio me descreveu pari passu a invasão dos prédios, a omissão da polícia e discutimos o que poderia ser feito de imediato.

(...)

Ainda existem detalhes obscuros nessa história. Tenho a impressão de que a maioria do Alto-Comando das Forças Armadas é legalista, mas não foi por acaso que a polícia de Brasília não fez nada naquele dia. 
 É preciso investigar a fundo e punir quem cometeu crimes. 
Percebi também que a canalização do ódio contra o tribunal foi muito maior do que com o Planalto e o Congresso. Acho até elogioso porque, pelo menos na cabeça das pessoas que destruíram tudo, isso mostra que fomos o órgão que mais guerreou, mais enfrentou, mais tentou colocar limites a esse poder inabalável. Enquanto caminhava pelos escombros, procurei respostas para duas perguntas: o que fizemos para chegar a esse ponto e o que devemos fazer para evitar que isso não se repita. Nenhum avião cai por causa de um erro só e tivemos uma sucessão consorciada de equívocos. Aliás, cometemos uma série deles desde que deixamos o populismo avançar, o que resultou na eleição de Bolsonaro. Repito: não acreditava e continuo não acreditando que houvesse condições para um golpe. Havia pessoas que alimentavam essa ideia maluca. Felizmente tudo ocorreu em janeiro. Se tivesse sido antes, durante o governo anterior, muito provavelmente teríamos a decretação da Garantia da Lei e da Ordem e, a partir daí, só Deus pode responder." 

ARTHUR LIRA: “A DIREITA E O BOLSONARISMO PERDERAM”
O presidente da Câmara avalia que os ataques foram consequência da polarização política que ainda divide o país e defende o aprofundamento das investigações para evitar a consolidação de narrativas falsas
 
 "Estava descansando na minha casa de praia, na Barra de São Miguel (AL), naquela tarde de domingo. O telefone, de repente, começou a tocar sem parar. Meus assessores e o pessoal da Polícia Legislativa estavam preocupados com a manifestação, que começava a se deslocar em direção ao Congresso. Telefonei para o governador Ibaneis Rocha, que me garantiu que estava tudo sob controle. ‘Governador, eu não estou vendo a polícia na televisão. Não sei onde ela está’, insisti. Ele reafirmou que estava tudo normal. Minutos depois, entraram no Congresso. A segurança começou a me enviar áudios terríveis: ‘Bum!’, bombas, muito barulho, gente gritando. Não houve como conter a invasão. O Congresso é um prédio todo de vidro. Sem a proteção externa, torna-se totalmente vulnerável.
 
(...)
 
O problema naquele momento era outro. O presidente culpava o Exército por não ter desmontado o acampamento de onde partiram os manifestantes. Queria que todos fossem imediatamente presos, mas os militares resistiam a cumprir a ordem. Minha percepção é que o governo não tinha o apoio das Forças Armadas nem das Polícias Militares. O clima era tenso. Lula estava revoltado e preocupado com a situação, como todos.
 
 

Outros afirmam que foi uma tentativa de golpe. As narrativas reproduzem a polarização política no país. O que a gente pode afirmar é que houve um movimento organizado de desrespeito à ordem, uma agressão inominável às instituições, uma tentativa de criação de um Estado anárquico. Para um golpe, era preciso apoio bélico, militar, e não acredito que se chegou a esse ponto. Torço e trabalho para que esse episódio seja completamente esclarecido, que passe para a história sem versões de conveniência, com os responsáveis devidamente punidos, para que isso nunca mais se repita.

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Publicado em VEJA, edição nº 2849 de 12 de julho de 2023


sábado, 5 de dezembro de 2020

STF acima da lei - Merval Pereira

O Globo

[DESTAQUE: Da Constituição Federal da qual se intitulam guardião - o título, ou encargo, de guardião não significa ser o dono e sim o responsável pela preservação do que está sob sua guarda.] 

É difícil compreender a atuação do Supremo Tribunal Federal (STF) nesse caso da permissão de reeleição dos presidentes da Câmara e do Senado na mesma legislatura. Seria fácil se partíssemos da aparência de posição política dos votos dados até agora. Apenas o ministro Marco Aurélio ateve-se à única questão que importa: “Indaga-se: o § 4º do artigo 57 da Lei Maior enseja interpretações diversas? Não. É categórico”. [o ministro Marco Aurélio vez ou outra arruma encrencas por questões menores - é o presidente Bolsonaro se expressando no 'juridiquês' - mas resume de forma correta, incontestável, a questão = a primeira interpretação que o Supremo deveria fazer da Constituirão deveria começar com a pergunta: qual o inteiro teor do dispositivo contestado, questionado?] 

O próprio Gilmar Mendes, relator que deu origem aos votos favoráveis à reeleição de Rodrigo Maia e David Alcolumbre, disse em seu voto que essa é uma questão política, e como tal deveria ser tratada pelo Congresso. Imaginei que os ministros pudessem avaliar como uma decisão interna do Congresso, o que já era uma interpretação distorcida, pois a Constituição proíbe expressamente, e o STF tem a obrigação de resguardá-la.

Mas os ministros partiram para interpretações que revelam posições pessoais, como, por exemplo, o relator dizer que a regra de proibição de reeleição só vale a partir do ano que vem. Como explicar que a Constituição vale num ano e não vale no outro? Deixar passar essa mudança apenas com uma autorização do Congresso, sem alterar a Constituição, é mesmo incompreensível.

A indefinição desta eleição está atrasando as votações no Congresso há meses. O presidente do Senado, David Alcolumbre também faz um papel muito feio, parou tudo no Senado para negociar sua reeleição, e a eleição de seu irmão à prefeitura de Macapá. Feio é perder, poderá responder, típica atitude de quem, como ele, procurou a reeleição sem nem mesmo tentar mudar a Constituição.

Já a posição de Rodrigo Maia é inteligente politicamente. Diz que não vai se candidatar e quer aprovar as reformas. [Ressalva: Segundo o jornal "O Globo", Edição de hoje,  "Maia após passar meses negando a candidatura, agora diz não poder descartar nem pretender novo mandato na Câmara". 

A postura do deputado Maia, deixa bem claro a falta de credibilidade do que declara e o senador do Amapá,vai pelo mesmo caminho.] Pode até sair candidato mais tarde - e parece que nos bastidores está trabalhando para isso - , alegando pedidos. Se pensar a longo prazo, não fará isso. Mas é tentador não deixar que o presidente Bolsonaro tome conta da Câmara.

O ministro Gilmar Mendes alegou, entre tantas outras interpretações criativas, que a proibição de reeleição foi baseada na legislação da ditadura militar, que queria dificultar a vida dos políticos de oposição. Esqueceu-se de que a os constituintes de 1988 mantiveram a proibição, com o fim específico de que ela impedisse a reeleição da mesma direção da Câmara no mandato subsequente ao que exerceu na Mesa Diretora.

Gilmar considerou “desinfluente”, para o estabelecimento desse limite, que a reeleição ou recondução ocorra dentro da mesma legislatura, ou por ocasião da passagem de uma para outra. Nada mais longe da intenção dos legisladores da Constituinte. Bastava uma pesquisa rápida, se realmente não tinha essa informação, para saber que dias antes da aprovação da Constituição, o senador Jarbas Passarinho, ex-ministro de governos militares, propôs que o artigo 57 fosse mais explícito incluindo a expressão "por dois anos", a duração dos mandatos dos presidentes das Casas.

O então deputado Nelson Jobim, que trabalhou na redação da Constituição, explicou que o que se queria evitar é que a Mesa eleita no primeiro ano da legislatura fosse reeleita para o terceiro e o quarto ano da legislatura. O deputado ressaltou que não haveria proibição de que "a mesa eleita no terceiro ano da legislatura pudesse ser reeleita no primeiro ano da legislatura seguinte".

Mesmo assim, a rigidez era tamanha que a reeleição em legislaturas diferentes só foi permitida em 1999, quando Antonio Carlos Magalhães e Michel Temer conseguiram um segundo mandato consecutivo para comandar o Senado e a Câmara. Jobim está vivo e poderia esclarecer a intenção dos constituintes se o ministro Gilmar Mendes tivesse alguma dúvida.

O preocupante é que a Justiça está assumindo posições políticas em suas decisões. O ministro Nunes Marques, bolsonarista convicto, votou a favor da reeleição, mas apenas do Senado, favorecendo o afastamento de Rodrigo Maia, desafeto do Palácio do Planalto. [Cabe um registro: a representatividade do deputado Maia e o senador Alcolumbre é ínfima, considerando o principal para um políticos =  votos.

Alcolumbre foi eleito em 2014 com pouco mais de 130.000 votos - valor que não se destaca como indicador de aceitação, apesar do Amapá ter pouco mais de 500.000 votos. Já em 2018 não conseguiu se eleger  governador do Amapá, obtendo menos de 100.000 votos - caiu em relação a 2014.

O deputado Maia obteve em 2018 pouco mais de 70.000 votos = menos que Carlos Bolsonaro recebeu para vereador.

Um ponto que apontamos - por ser fato apesar de pouco noticiado - é que o senador Alcolumbre, presidente do Senado, é a única autoridade no Brasil que pode dar andamento a vários pedidos de impeachment que estão em sua gaveta apresentados contra ministros do STF. Caso o Supremo decida cumprir a Constituição e negue a reeleição para o senador do Amapá, seu mandato de presidente do Senado irá até fevereiro 2021.]

E o juiz da Terceira Vara Criminal de Maceió, Carlos Henrique Pita Duarte, anulou as investigações e arquivou o inquérito que acusava o deputado Arthur Lira, candidato do presidente Bolsonaro à presidência da Câmara, de ter enriquecido com base em “rachadinhas” quando era deputado estadual. Há uma frase famosa de Rui Barbosa que diz que o Supremo tem direito a errar por último. Parece ser [mais um] o caso.

Merval Pereira, colunista - O Globo


 

sábado, 20 de outubro de 2018

Que fim levará o Nordeste? Bolsonaro começa a avançar sobre Haddad no Nordeste, reduto histórico do lulopetismo

Bolsonaro começa a avançar sobre Haddad no Nordeste, reduto histórico do lulopetismo. 

Como num jogo de war, conquista principalmente as capitais. Cai, assim, a última cidadela petista. Nas outras regiões, o ex-capitão massacra o PT

No começo, o PT era um partido da classe média intelectualizada e dos operários das indústrias dos grandes centros. Em 2002, quando Lula foi eleito presidente pela primeira vez, o perfil era o mesmo. As políticas assistencialistas da era petista, como o Bolsa Família, provocaram uma mudança radical no quadro. As vitórias passaram a vir dos grotões nordestinos, onde vive a população de mais baixa renda e mais dependente desses projetos sociais. No primeiro turno das eleições deste ano, no entanto, começou a virada no curral eleitoral petista. Bolsonaro ganhou em 23 das 27 capitais brasileiras, entre as quais cinco capitais do Nordeste. Haddad só prevaleceu em três capitais nordestinas. Mesmo no Ceará, um Estado governado pelo PT, Bolsonaro ficou em segundo lugar, atrás de Ciro Gomes, ex-governador do Estado, mas bem à frente de Haddad. Também nas pesquisas feitas neste segundo turno, o candidato do PSL já subiu 7 pontos percentuais do que obteve no primeiro turno na região. A constatação é óbvia: o PT vem perdendo dia após dia seu feudo eleitoral.

Em 2014, a vantagem expressiva obtida por Dilma Rousseff no Nordeste foi fundamental para evitar que o senador Aécio Neves (PSDB-MG) triunfasse na apertada disputa. Dilma conseguiu na região, no segundo turno, 20 milhões de votos, contra 7,9 milhões dados a Aécio. Desta vez, o PT, sob orientação de Lula na cadeia, tentou manter a hegemonia do partido na região, às custas de um plano maquiavélico de tirar o apoio do PSB a Ciro Gomes, com o objetivo claro de carrear votos para o PT no Nordeste. Embora Haddad tenha vencido na região, Bolsonaro obteve no primeiro turno a maior quantidade de votos nordestinos dada a um opositor do PT desde o pleito de 2002: 7,7 milhões de votos. O desempenho de Bolsonaro foi melhor nas capitais que no interior. Das nove capitais nordestinas, Bolsonaro venceu em cinco delas: Recife, Maceió, Natal, João Pessoa e Aracaju. Haddad figurou em primeiro somente em três capitais: Salvador, São Luís e Teresina. Ao todo, o capitão reformado do Exército conseguiu, no primeiro turno, sagrar-se vitorioso em 42 cidades do Nordeste.

Integrantes do PT e da bancada nordestina no Congresso admitem nos bastidores que a falta da figura do ex-presidente Lula tem prejudicado a campanha do Haddad na região. Depois da primeira fase de “transferência de votos”, ocorrida após o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) ter negado o registro de candidatura de Lula, Haddad tem perdido terreno pela falta de propostas concretas para a região. Em contrapartida, Bolsonaro avança especialmente nos grandes centros nordestinos, como consequência da sua pauta voltada para a segurança pública. O Rio Grande do Norte é atualmente o estado mais violento do país, com uma taxa de 14,9 assassinatos para cada 100 mil habitantes, um aumento de 257% nos últimos dez anos. Sergipe e Maranhão também tiveram aumento em mais de 100% nas suas taxas de assassinatos no mesmo período. Cinco das dez cidades brasileiras mais violentas do País estão no Nordeste, todas na Bahia: Eunápolis, Simões Filho, Porto Seguro, Lauro de Freitas, Maracanaú e Camaçari.

É como se o petismo, mesmo no Nordeste, esteja ficando relegado às menores cidades e às pessoas mais humildes, admitem fontes ligadas ao próprio PT. Muitas delas dependentes de programas sociais do governo federal implantados durante o período Lula. Durante a fase inicial do segundo turno, o PT tentou até disseminar as informações de que Bolsonaro cortaria o programa “Bolsa Família”. O problema é que nem isso chegou, de fato, a ter resultado efetivo contra o eleitor de Bolsonaro na região. O candidato do PSL negou essa intenção. Foi além: disse que será mais rigoroso com as possibilidades de fraudes, e que, se for eleito, beneficiará quem mais precisa do programa. Uma de suas promessas é a concessão do 13º para beneficiários do Bolsa Família.

Além disso, existe um outro componente que tem complicado a vida do PT nesta reta final de campanha no Nordeste: seis dos seus aliados já venceram as eleições no primeiro turno – Camilo Santana (PT) no Ceará; Flávio Dino (PCdoB) no Maranhão; Paulo Câmara em Pernambuco; Rui Costa (PT) na Bahia; Wellington Dias (PT) no Piauí, e Renan Filho em Alagoas. Preocupados já com o início do próximo mandato, esses governadores têm rareado a produção de eventos em prol da candidatura de Haddad. Entre erros do PT e acertos do PSL, a região Nordeste, que era vermelha, vai mudando de cor.

Bolsonaro conquista o Nordeste.

No primeiro turno, Bolsonaro ganhou em 23 das 27 capitais, cinco das quais no Nordeste, até então território petista. Haddad só ganhou em três e vem perdendo terreno para o PSL na região.
> Bolsonaro ganhou de Haddad em Aracajú por 39,9% a 28,4%
> Venceu o petista em João Pessoa por 49,8% a 24,3%
> Bolsonaro derrotou Haddad no Recife por 43,1% a 30%
> O candidato do PSL venceu o petista em Natal por 44,4% a 23,5%
> E massacrou o petista em Maceió por 52,3% a 19,6%
> Em Fortaleza, Ciro Gomes ganhou com 41%, mas Bolsonaro foi o segundo com 34%, à frente de Haddad
> Bolsonaro venceu até mesmo Ciro em 12 dos 104 bairros de Fortaleza, como Aldeota e Meirelles, enquanto que Haddad não venceu em nenhum bairro da capital cearense
> Em pesquisa de intenção de voto divulgada pelo Ibope na segunda-feira 15, Bolsonaro cresceu 7 pontos no Nordeste neste segundo turno, subindo de 26% de votos obtidos no primeiro turno na região para 33% agora. Nas demais regiões (Sul, Sudeste, Norte e Centro-Oeste), a vitória de Bolsonaro é esmagadora, como os 62% a 28% no Sul


Wilson Lima - IstoÉ