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sábado, 29 de julho de 2017

Contra o feiticeiro

Agentes da Polícia do Senado denunciaram que a instituição desativou escutas legais em residências de senadores investigados na Lava Jato. Agora são perseguidos

No Brasil, quem se dispõe a seguir a vida corretamente enfrenta todo tipo de dissabor. Quem decide  denunciar coisas erradas, então, acaba sendo punido. É o que acontece no Senado, onde o feitiço se volta contra os feiticeiros. Dois agentes da Polícia do Senado denunciaram, em outubro do ano passado, que a organização utilizava maletas antigrampo para localizar e retirar escutas ambientais instaladas pela Polícia Federal sob ordens do Judiciário em gabinetes e residências de senadores. Ou seja, a Polícia do Senado estava obstruindo a Justiça, uma vez que essas escutas objetivavam flagrar senadores encrencados na Lava Jato. As maletas foram apreendidas pela PF, mas, ao invés de penalizar quem obstruía a Justiça, os agentes é que estão sendo perseguidos: não conseguem promoções e respondem a inquérito na Polícia do Senado.
FALA QUE EU TE ESCUTO A PF apreendeu maletas antigrampo usadas no Senado para desativar escutas determinadas pela Justiça (Crédito: Pedro Ladeira/Folhapress)
 
Enquanto a investigação para saber se servidores do Senado agiam para obstruir a Lava Jato está parada, continuam correndo as apurações contra os funcionários da Casa que decidiram ser informantes da PF e revelaram a existência das maletas. Um inquérito da Polícia do Senado foi aberto contra os dois delatores – Paulo Igor Silva e Carlos Alfama – , acusados de “subtração de documentos”. Quais documentos? Os que foram usados “a fim de subsidiar informações sobre o crime de obstrução que estava sendo cometido”. “Ressalte-se que nos documentos subtraídos de forma ilícita constam informações sensíveis de senadores da República”, afirma o boletim de ocorrência do inquérito da Polícia do Senado.

Maletas antigrampo
As maletas antigrampo foram apreendidas pela PF e eram usadas sempre que os parlamentares desconfiavam serem alvos de escutas instaladas em seus gabinetes ou em suas residências, algumas após ações de busca e apreensão da Lava Jato.  


Coincidentemente, no 19 de maio de 2017, um dia depois da busca e apreensão da PF nos endereços do senador Aécio Neves (PSDB-MG), o presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), pediu que o STF devolvesse as maletas. Mas Eunício disse à ISTOÉ que a data do ofício foi apenas “coincidência”.

Fato é que, passados cerca de nove meses desde a deflagração da investigação, o STF continua com a apuração suspensa até decidir se a ação contra agentes da Polícia do Senado também atinge senadores, que têm direito ao benefício do foro privilegiado. As maletas antigrampo estão lacradas no STF e ainda não foram periciadas.

Enquanto isso, os denunciantes do esquema só enfrentam reveses. A Polícia do Senado chegou a pedir a quebra de sigilo telefônico de Alfama e Paulo Igor para descobrir se foram eles que fizeram cópias dos documentos entregues à PF. O juiz Jaime Travassos, da 10ª Vara Federal de Brasília, negou a medida, considerada “desproporcional”. Ele concordou com o procurador Frederico Paiva, que afirmou à Justiça ser claro que os documentos “subtraídos” foram usados pela PF e que não seria preciso quebrar sigilo para descobrir isso. E indicou que há “retaliação” contra os agentes denunciantes.

Fonte: Isto É

 

sábado, 29 de outubro de 2016

A milícia de Calheiros e o abuso de poder

Nenhum outro corpo policial pode existir na República. Se não fosse assim, cada órgão de poder criaria a sua “polícia” própria, como a que existe no Senado

A prisão, no recinto do Senado Federal, do chefe da sua milícia – o Pedrão – e três de seus companheiros põe à mostra até que ponto os donos daquela Casa, nas últimas décadas, a tornaram um feudo para a prática de grandes crimes e de refúgio de notórios corruptos. Para tanto os sucessivos presidentes do outrora respeitável Senado da República formaram uma milícia, totalmente à margem do sistema constitucional, a que, pomposamente, denominaram “Polícia Legislativa”, também alcunhada de “Polícia do Senado”.

Não se podem negar a esse agora notório exército particular relevantes trabalhos de inteligência do tipo CIA, KGB –, como a célebre violação do painel de votações daquele augusto cenáculo, ao tempo do saudoso Antônio Carlos Magalhães e do lendário José Roberto Arruda, então senador e depois impoluto governador do Distrito Federal. E nessa mesma linha de sofisticação tecnológica a serviço do crime – agora de obstrução de Justiça – a milícia daquela Casa de Leis promove “varreduras”, nos gabinetes e nos solares e magníficos apartamentos onde vivem esses varões da República, a fim de destruir qualquer prova de áudio que porventura possa a Polícia Federal obter no âmbito das investigações instauradas pelo STF.

Acontece que o poder de polícia só pode ser exercido pelos órgãos instituídos na Carta de 1988, no seu artigo 144, e refletidos nos artigos 21, 22 e 42, dentro do princípio constitucional de assegurar as liberdades públicas. Assim, somente podem compor o organograma da segurança pública constitucional a Polícia Federal (incluindo a Rodoviária e a Ferroviária) e as Polícias Civis e Militares dos Estados (incluindo o Corpo de Bombeiros).

Nenhum outro corpo policial pode existir na República. Se não fosse assim, cada órgão de poder criaria a sua “polícia” própria, como a que existe no Senado. Também seriam criadas tais forças marginais nos tribunais superiores e nos Tribunais de Justiça dos Estados, nas Assembleias Legislativas, nos Tribunais de Contas, nas Câmaras Municipais, cada um com seu exército particular voltado para contrastar e a se opor aos órgãos policiais que compõem o estrito e limitado quadro de segurança pública estabelecido na Constituição.

Cabe, a propósito, ressaltar que todos os órgãos policiais criados na Carta Magna de 1988 estão submetidos à severa jurisdição administrativa do Poder Executivo, da União e dos Estados, sob o fundamento crucial de que nenhum ente público armado pode ser autônomo, sob pena de se tornar uma milícia. Nem as Forças Armadas – Exército, Marinha e Aeronáutica – fogem a essa regra de submissão absoluta ao Ministério da Defesa, pelo mesmo fundamento. [submissão absoluta das Forças Armadas ao Ministério da Defesa ou a qualquer outro ente só pode ser uma nova piada; é público e notório que as FF AA só se subordinam a elas próprias, aceitando uma hipotética subordinação enquanto for possível e conveniente aos superiores interesses da Segurança Nacional e da Soberania da nossa Pátria Amada BRASIL.]

E não é que vem agora o atual chefe da nossa Câmara Alta declarar textualmente que a “polícia legislativa exerce atividades dentro do que preceitua a Constituição, as normas legais e o regulamento do Senado”? Vai mais longe o ousado presidente do Congresso Nacional, ao afirmar que o Poder Legislativo foi “ultrajado” pela presença, naquele templo sagrado, da Polícia Federal, autorizada pelo Poder Judiciário. Afinal, para o senhor Renan, o território do Senado é defendido pela chamada polícia legislativa. Ali não pode entrar a Polícia Federal, ainda mais para prender o próprio chefe da milícia – o Pedrão.  E com esse gesto heroico o preclaro chefe do Congresso Nacional proclama mais uma aberração: o da extraterritorialidade interna.

Como se sabe, a extraterritorialidade é concedida às embaixadas estrangeiras que se credenciam num país e ali têm instalada a sua representação diplomática. Trata-se, no caso, da extraterritorialidade externa, que garante a inviolabilidade da embaixada e a imunidade de jurisdição de seus membros, em tempos de paz e de guerra.  Mas não para aí a extraterritorialidade interna proclamada pelo grande caudilho do Senado. As palacianas residências e os apartamentos dos senadores e senadoras tampouco podem ser violadas pela Polícia Federal. Trata-se de um novo conceito de Direito Internacional Público inventado pelo grande estadista pátrio: a noção de extraterritorialidade estendida. Ou seja, o domicílio de um representante do povo é incólume às incursões da Polícia Federal autorizadas pelo Poder Judiciário.

Foi o que ocorreu em agosto, quando o ilustre marido de uma senadora do Paraná foi preso na residência do casal e dali foram retirados documentos comprometedores. A reação foi imediata: marido de senadora, estando na casa onde com ela coabita, não pode ser ali preso, pois se trata de espaço extraterritorial interno estendido!  E assim vai o nosso país, que não para de andar de lado em matéria de instituições republicanas. E o fenômeno é impressionante. Basta o sr. Calheiros declarar que o território do Senado é inviolável para que a tese seja acolhida por um ministro do Supremo, numa desmoralização do próprio Poder Judiciário, que se autodesautoriza, na pessoa do ilustre magistrado de primeiro grau que acolheu as providências da Polícia Federal no território livre do Senado Federal.

E, last but not least, o senhor das Alagoas, não contente com o reconhecimento da legitimidade de sua milícia e da extraterritorialidade interna, por força do despacho do ministro Teori Zavascki, propõe-se, com o maior rompante, próprio dos destemidos senhores medievais, a cercear as atividades da Polícia Federal, do Ministério Público e do Poder Judiciário, sob a égide do abuso do poder, para, assim, livrar-se, ele próprio, e liberar dezenas de representantes do povo no Congresso do vexame das “perseguições políticas” que se escondem nos processos por crime de corrupção, que nunca praticaram, imagine!

E vivam o foro privilegiado, a futura Lei de Abuso de Autoridade e os demais instrumentos e interpretações, omissões e postergações do STF, que, cada vez mais, garante a impunidade desses monstros que dominam o nosso Congresso Nacional, sob o manto de lídimos representantes do povo brasileiro.

Que vexame, que vergonha!

 Fonte: Modesto Carvalhosa - Publicano no Estadão - Coluna do Augusto Nunes - VEJA

sábado, 22 de outubro de 2016

Mas a PF pode investigar e prender o chefe da Polícia do Senado? Pode. A questão é saber com ordem de quem

A ditadura cercou e até fechou o Congresso por um tempo. Mas não o invadiu! Mais respeito!

Digamos que o comando da Polícia do Senado estivesse mesmo cometendo crime — não acho que tenha no caso em questão —, quem, afinal de contas, deveria atuar, uma vez que, então, o chefe da dita-cuja não iria prender a si mesmo em caso de ordem judicial? A resposta é simples: a Polícia Federal, a mesma que baixou lá nesta sexta.


Então onde está o problema?
Para quem ainda não entendeu: a: nos motivos alegados, que são, entendo, falaciosos, já disse por quê; b: no fato de a determinação ter partido de um juiz de primeira instância.

Ainda que as transgressões atribuídas aos policiais do Senado não tivessem nenhuma relação com os senadores investigados (O QUE, POR SI, JÁ DESLOCAVA A QUESTÃO PARA O SUPREMO) e estivessem relacionados a crime comuns, ainda assim, entendo, por coerência, o pedido deveria ter sido apresentado ao STF. Afinal, o departamento está diretamente subordinado à Mesa Diretora da Casa. “Ah, mas o presidente é Renan Calheiros!!!” E daí? Enquanto ele for o presidente, presidente será. Eu estou me lixando pra ele. O que me interessa é a Presidência do Senado e do Congresso Nacional.

Que é que há? Um juiz de primeira instância não manda a Polícia Federal entrar no coração do Poder Legislativo com essa ligeireza. Sim, a PF vasculhou o gabinete de Eduardo Cunha quando era presidente da Câmara: com autorização de Teori Zavascki.  Dizer o quê? A ditadura cercou o Congresso.

Mas a ditadura não invadiu o Congresso. Não, nós não estamos numa ditadura. Vivemos uma democracia.  Então que os entes todos se comportem nos limites da lei.

Fonte: Blog do Reinaldo Azevedo