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sexta-feira, 25 de fevereiro de 2022

A PANDEMIA E OS POLÍTICOS - Percival Puggina

O "FENÔMENO" MANDETTA
Tudo começou com Luiz Henrique Mandetta. No início da pandemia, o então ministro da Saúde mudou-se do gabinete de trabalho para o auditório do ministério. Diante dos holofotes, das câmeras, dos flashes e dos microfones estava ele em seu melhor ambiente. Ali, diga-se de passagem, tinha um desempenho brilhante. A nação, temerosa, lhe rendia apreço e confiança. Sabe-se, hoje, que mais desorientou do que orientou, mas fez isso com maestria. Sua suposta ciência e muito jeito convenciam qualquer sujeito. Apesar de tão mal no que era importante, foi tão bem no supérfluo que saiu do ministério e entrou na lista dos presidenciáveis de 2022.

OS APRENDIZES

A dita classe política assistia cada apresentação de Mandetta com olhos e ouvidos de aprendiz. Rapidamente, a moda pegou. Por todos os rincões do país, onde houvesse imprensa, o modelo de aproveitamento político da pandemia se foi reproduzindo e, com igual velocidade, a autoridade se desdobrou em autoritarismo. Seu mais esforçado aluno foi João Dória.

PANDEMIA, VACINA E "PAU NO BOLSONARO": JOÃO DÓRIA
O governador de São Paulo percebeu o lugar vago, tomou para seu Butantã a pauta da vacina e rompeu com Bolsonaro. As abelhas do jornalismo brasileiro voaram em enxame para a nova colmeia onde se concentrava o mel de seus noticiários: pandemia, vacina e “pau no Bolsonaro”. João Dória se vislumbrou como futuro presidente.

BOLSONARO E A ANIMOSIDADE COLIGADA

“E o Bolsonaro?”, perguntará o leitor. Pois é, o presidente, sabe-se hoje, estava certo em quase tudo, mas a animosidade estudada e coligada contra ele concentrou-se em alguns erros menores para lhe causar todo dano político possível. O inteiro pacote de factoides da CPI da Covid, ao virar vento e ir para a camada de ozônio, faz prova disso.  
Se há algo de que acusá-lo é de não ter buscado tirar repugnante proveito eleitoral da crise sanitária. 
Manteve e mantém uma retórica teimosa que o prejudicou, mas fez o que tinha que ser feito, forneceu o que tinha que ser fornecido (o Brasil é o 4º país que mais vacinas aplicou) e socorreu as vítimas que os vírus paralelos do “fique em casa” e do “fecha tudo” geraram aos milhões pelo país.

RESUMO E CONCLUSÃO
Mandetta virou presidenciável em abril de 2020, caiu no esquecimento em 2021, tentou voltar ao palco, mas acabou sumindo da lista, por desinteresse dos eleitores. [Mandetta sumiu, por completa e total falta de importância da sua presença, mas continua em atividade nos botecos da vida jogando sinuca.]

O senador José Aníbal, tucano bom de bico, ex-presidente do PSDB, praticamente esfarelou ontem as pretensões eleitorais do saracoteante governador paulista. Numa sucessão de entrevistas, disse que se Dória tivesse um mínimo de bom senso retiraria sua candidatura porque o pré-candidato tucano só tem números grandes em listas que medem rejeição... 
Acrescentou que o eleitor percebeu o uso político do palco para atacar o presidente e tirar proveito eleitoral da pandemia e estava, por tudo isso. perdendo credibilidade. 
São palavras de um derrotado por Dória nas prévias tucanas, mas tudo que ele diz corresponde aos fatos.

Conclusão, também no âmbito da política, a pandemia só fez estragos. Até mesmo para quem, como Bolsonaro, defendeu a liberdade, o direito ao trabalho, ficou rouco e somou inimigos advertindo para a tempestade perfeita que adviria das medidas em execução por estados e municípios (hoje até a OMS admite o erro), já disponibilizou 350 milhões de vacinas e distribuiu centenas de bilhões de reais em auxílios às famílias necessitadas. [o capitão vai se recuperar, com sobras, dos percalços que lhe foram impostos.]

Percival Puggina (77), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.

terça-feira, 14 de dezembro de 2021

QUANDO A GRETA ERA GARBO, NÃO THUNBERG - Adriano Marreiros

Linguagem neutra causa dano ambiental

Você comerá menos carne — Carne será um luxo ocasional, e não um item corriqueiro. É para o bem do ambiente. Vídeo assustador do Fórum Econômico Mundial 

Pedro, Márcio e Carelena estavam comigo no Barranco (recomendo muito!), comendo apressadamente uma bela carne antes que proíbam por causa da camada de ozônio, do aquecimento global, das mudanças climáticas ou porque a Greta mandou.  
Como somos de um tempo em que a Greta tinha Garbo, a falta dele nos faz desobedecer.

Hoje o Puggina fez a mesma pergunta que a tal guria –ironizando, claro.  Mas agora, dita com o garbo de um Percival arturiano, merece ser repetida a sério: “How dare you?!”  Como é que vocês – os lacradores que viajam de jatinho para acabar com nosso churrasco – ousam propor a linguagem neutra, tão prejudicial ao meio ambiente?

“Como assim?!”  Ué, você não entendeu?!  Será que vocês não conseguem ver as coisas que realmente causam problemas?  Quando você começa a multiplicar pronomes e variar regências e concordâncias, você escreve mais, você fala mais, você gasta mais tempo... Ao escrever mais, você vai precisar de mais folhas de papel para imprimir.  Mais árvores serão destruídas. 

Mesmo se não imprimir vai gastar mais tempo de computador consumindo mais eletricidade exigindo mais usinas termelétricas que poluem e aquecem, mais hidrelétricas que matam animais e ecossistemas inteiros. Mais tempo de computador também aquece mais o ambiente, diretamente.  E você se esforça mais tempo, gasta mais energia para o cérebro lembrar da lista de pronomes a usar, aumentando o consumo de oxigênio e a produção de CO2.

Se a linguagem neutra for usada oralmente, vai ter tudo isso e você vai ter que falar mais.  Então também mais CO2 emitido. Isso se não contar o esforço e o tempo – mais CO2 – que você vai gastar para entender e explicar o que você está falando – Cá entre nós, o troço não fica só chato: fica confuso... Nem todo mundo vai entender...  E a linguagem ser neutra não vai te ajudar a neutralizar todo o carbono que ela produz...

As pessoas ficam tentando explicar o absurdo da linguagem neutra alegando o bom vernáculo, as redundâncias, o patrimônio nacional que é a língua, os prejuízos para o estilo, a sonoridade esquisita e confusa, a guerra cultural: mas nada supera o dano ambiental resultante.  Nada!!!

Vamos aos fatos, ou melhor, aos flatos: nada que a vaca exale pode superar o dano ambiental que essa linguagem causaria...

Qual a Influência da menstruação da baleia azul
na coloração do mar vermelho?

Grande mistério dos debates escolares nos anos 80.

Crux Sacra Sit Mihi Lux / Non Draco Sit Mihi Dux 
Vade Retro Satana / Nunquam Suade Mihi Vana 
Sunt Mala Quae Libas / Ipse Venena Bibas

(Oração de São Bento cuja proteção eu suplico)

*         O autor declara que comeu carne hoje e neutralizou o carbono usando o bom vernáculo.

Tribuna Diária - Publicado originalmente


segunda-feira, 3 de dezembro de 2018

"Cuidado com dezembro"




Agora é juntar os cacos, abastecer o motor econômico do Rio com o petróleo que restou, e subir de novo a montanha


O indulto de Temer e Pezão na cadeia são dois temas já batidos nesta manhã de segunda. Vejo um elo entre esses dois fatos, próximo de uma teoria conspiratória, mas não há razão para ocultá-lo. Tanto Temer quanto Pezão já trabalham de alguma forma com a ideia de uma passagem pela cadeia. É como se já estivessem pensando numa próxima eleição, xerife da cela, quem sabe.  Temer sabe muito bem que incluir corruptos no seu indulto de Natal vai abrir um abismo maior ainda entre ele e a sociedade, que condenou pelo voto as velhas práticas da política brasileira. Mas, por outro lado, vai aumentar seu crédito junto aos presos, não só os que participavam da aliança no governo, mas também os do seu próprio partido: ex-ministros, parceiros como Eduardo Cunha.

Pezão declarou que tinha saudades de Sérgio Cabral e gostaria de abraçá-lo na cadeia. Disse também que gostaria de encontrar Lula. Nunca se sabe para onde vão te levar após a prisão.  Não é correta, se essa ideia for verdadeira, a tese de que os políticos brasileiros não veem um palmo diante do nariz. Quando houver tempo, poderemos até investigar os reflexos da passagem de tantos dirigentes pelas cadeias que alguns até ignoravam como funcionam.  Por enquanto, ainda temos que lidar com os seus rastros em liberdade. O indulto é um deles. É possível indultar presos por corrupção? A maioria dos ministros disse sim, afirmando que não há restrições a esse crime. Tratam de um presidente abstrato. Temer é investigado, duas vezes a Câmara lhe forneceu uma blindagem. Ele vai libertar presos da Lava-Jato, a mesma operação que desmantelou toda a quadrilha da qual é um dos principais remanescentes em liberdade.

Nessas circunstâncias, só resta o protesto nas ruas. Mas, ainda assim, o tema nos colhe num mês ingrato para protestos. Há 50 anos, o regime militar lançou o AI-5, endurecendo sua política e realizando a censura nos jornais com a presença de seus agentes no interior das redações.  O aniversário de meio século do AI-5 será no dia 13. Uma das lembranças mais nítidas que tenho do período foi, precisamente, a dificuldade de protestar. Não nos prendiam por isso, mas era um período de Natal: o “blim balão” dos sinos, o farfalhar de papéis enrolando presentes, o panetone em promoção. Ninguém queria saber de AI-5. Ainda bem que dezembro de 68 está longe, tanto o país quanto o Natal devem ter mudado nesse período. De qualquer forma, cuidado com dezembro.

Mais próximo de minha memória está a aventura de ter feito política no Rio de Janeiro e tentar, de alguma, forma derrubar a máfia bilionária que acabou arruinando o estado.  Em 2010, por exemplo, Cabral já gastava fortuna com robôs na internet. Chegamos a reunir documentos para oferecer à imprensa. Os robôs não falavam inglês, mas tinham um forte sotaque, escreviam frases grosseiramente traduzidas. Ninguém se interessou. O tema era era muito abstrato naquela época. Era o mesmo que falar do rombo na camada de ozônio: ninguém o notava a olho nu.

Apesar de tudo, não restou ressentimento. Sobretudo no caso de Pezão. Em muitos desastres, o encontrei trabalhando. Sérgio Cabral não visitava os locais de tragédia. Como jornalista, entretanto, não pude deixar de comentar um tema, naquela época do escândalo dos guardanapos. O apartamento de Pezão tinha sido assaltado no Leblon e, segundo a notícia, foram levadas muitas jóias. Soou estranho para mim que um homem aparentemente simples tivesse muitas joias em casa. O tempo passou, eles foram sendo presos aos poucos, hoje quase todo o governo está na cadeia, inclusive sua base parlamentar.

O Rio quebrou, foi preciso uma intervenção federal na segurança pública, o estado elegeu um homem desconhecido do grande publico até as vésperas da eleição. Às vezes tento esquecer todo esse período sinistro. Os principais atores estão presos. Isso conforta parcialmente a opinião pública. Mas o legado ainda vai nos assombrar durante muitos anos. Foi uma calamidade que passou em nossa vidas e algumas consciências se deixaram levar. Agora é juntar os cacos, abastecer o motor econômico do Rio com o petróleo que restou, e subir de novo a montanha. Pra cima, é preciso fôlego. Pezão entrou, outros serão soltos por Temer, que um dia será preso também. Não é um caminho linear. Murilo Mendes tem um verso em que diz: “Ainda não estamos habituados com o mundo/ Nascer é muito comprido.”

 
No caso do Brasil, então, o parto é muito prolongado.