Na semana passada, a emissora CNN Brasil demitiu o jornalista Alexandre Garcia, comentarista do quadro Liberdade de Opinião, do programa Novo Dia.
O motivo: Garcia opinou sobre um dos assuntos eleitos pela grande
imprensa como “proibidos” — o uso precoce de medicamentos no tratamento
da covid-19. [percebam: 'Garcia opinou' em um quadro denominado LIBERDADE DE OPINIÃO.] Ao final de seu comentário, a apresentadora do telejornal
emendou: “A CNN ressalta que não existe um tratamento precoce comprovado
cientificamente contra a covid-19″. Poucas horas depois, o jornalista
foi desligado da emissora.
Esta
não foi a primeira vez que Garcia desagradou a colegas no ar, ao
contrariar o pensamento dominante de boa parte da imprensa. Em maio, o
jornalista ameaçou deixar a emissora depois de ser questionado ao vivo
pelo colega Rafael Colombo a respeito das medidas de restrição impostas
por governadores e prefeitos no combate à pandemia. Depois de um longo
silêncio e uma arfada profunda, Garcia respondeu: “Eu não estou sendo
entrevistado”. Colombo disse que os dois voltariam amanhã e o jornalista
rebateu: “Não sei se a gente volta”. Em agosto, o tema “proibido” foi a
vacinação de jovens. Garcia questionou a necessidade de imunizar contra
a covid-19 a faixa etária abaixo de 18 anos. Na sequência, a CNN Brasil
fez a jornalista da bancada do programa ler uma nota contra a fala de
Garcia.
Tratamento precoce virou tabuDesde o início da pandemia, a poli
tização de certos medicamentos afastou a
ciência do centro da discussão. Parte da comunidade científica que
defendeu tratamentos para a covid-19 baseados em estudos e na
experiência de quem está na linha de frente da pandemia foi hostilizada
pela velha imprensa. Durante a fala que causou sua demissão, ele disse
que “os tais remédios sem eficácia comprovada salvaram milhares de vidas
sendo aplicados imediatamente, mesmo antes do resultado do teste. É na
fase 1, na fase 2, às vezes evitam hospitalizações. Na fase 1 sempre
evitam hospitalizações, sempre evitam sofrimento”. A fala pode ser
considerada uma falta de precisão e, sim, afirmar que um remédio é 100%
eficaz não tem lastro na medicina nem na ciência. Mas o jornalista
estava, como o nome do quadro diz, exercendo sua “liberdade de opinião”.
No jornalismo, é fundamental a distinção entre informação e opinião. O
quadro do qual Garcia fazia parte finaliza sempre com o alerta do
apresentador de que “as opiniões emitidas pelos comentaristas não
refletem, necessariamente, a posição da CNN”. Mais
adiante, Garcia afirmou que “essa questão de eficácia comprovada a
gente só vai saber daqui uns três anos, agora tudo é experimental. E,
enquanto tudo é experimental, só o tempo dirá”. Não se pode esquecer que
nesse Fla-Flu medicinal-ideológico, o Conselho Federal de Medicina
(CFM) defendeu a autonomia médica e se posicionou sobre o tema: “Não
apoiamos nem condenamos o tratamento precoce ou qualquer outro cuidado
farmacológico”. O presidente do CFM, o médico Mauro Ribeiro, em
entrevista à rádio Jovem Pan em março deste ano, observou que a ciência
ainda não bateu o martelo sobre a questão. “Infelizmente, certos
assuntos foram proibidos. Essa história de que está estabelecido na
literatura que o tratamento precoce não tem efeito na fase inicial é
mentira.” Além de ser demitido pela emissora, Garcia foi acusado de
divulgar informação falsa por alguns veículos de comunicação e pela
militância digital interessada em assassinar reputações. Como
classificar, então, a posição do órgão máximo da medicina sobre o
assunto?
Outros “cancelados” pela CNN Brasil Alexandre Garcia não foi o primeiro. Quem puxou a fila de demissões na emissora do empresário mineiro
Rubens Menin foi o jornalista Leandro Narloch,
dispensado da CNN Brasil no ano passado por não obedecer ao manual do
politicamente correto. Em pauta, o tema era a permissão para homens gays
doarem sangue. Narloch se manifestou a favor da medida, mas a
comunidade LGBT+ e representantes das minorias reprovaram a maneira como
o jornalista emitiu sua opinião sobre o caso. Ao usar o termo “opção
sexual”, expressão considerada preconceituosa pela militância, e tentar
explicar com base em pesquisas porque havia restrição, até então, para
doação de sangue por homens gays, foi rotulado de homofóbico. Narloch
disse que foi vítima da cultura do cancelamento. “É uma intolerância, um
linchamento virtual, a ideia de linchar qualquer pessoa que discorda de
termos, e acho que, sim, fui um pouco vítima disso na semana passada”,
afirmou, pouco depois da demissão, em entrevista à rádio Jovem Pan.
Narloch contou ainda que a emissora não deu a ele a chance de se
posicionar acerca dos comentários. “A CNN é um bom projeto. Acho que
eles poderiam ter dado a oportunidade para eu me explicar, para eu sair
disso”, afirmou em outra entrevista ao programa Pânico, também da Pan, ao mencionar a pressão de jornalistas e de movimentos LGBT.
Para completar o trio, Caio
Coppola é outra ausência sentida por parte da audiência que acompanha a
CNN Brasil. O sumiço repentino do comentarista não foi explicado até
agora. Curiosamente, Coppola defende ideias sobre o conservadorismo, o
liberalismo econômico e o livre mercado. Durante a pandemia,
aventurou-se a questionar as teses de lockdown e as medidas de restrição impostas pelas autoridades públicas. Desde então, está no “freezer” da CNN, de onde só deve sair no fim de outubro deste ano, quando se encerra o contrato de exclusividade. A Oeste, Coppolla
confirmou que continua a fazer parte do quadro de colaboradores da
emissora, mas, “por questões éticas e, principalmente, jurídicas”,
preferiu não comentar os acontecimentos.
Vítimas da nova censura Em junho de 2020, u
m ano depois de estrear o programa Aqui na Band,
o jornalista Luís Ernesto Lacombe sofreu intervenções da direção da
emissora por supostas pautas bolsonaristas. As mudanças levaram o
jornalista a ser afastado e, na sequência, a pedir demissão. A gota
d’água foi uma entrevista sobre conservadorismo com o jornalista Allan
dos Santos, tachado pela grande mídia como “blogueiro bolsonarista”.
“Fiquei um pouco perdido de imediato, até um pouco traumatizado com
tudo”, desabafou Lacombe, em entrevista ao canal do YouTube 1 Bilhão
Educação Financeira. “Demorei um tempo para digerir o que estava
acontecendo. Foi uma espécie de censura que a gente sofreu.” Cinco meses depois, a bola da vez foi Rodrigo Constantino, colunista da Revista Oeste, demitido
da rádio Jovem Pan por suposta apologia do estupro e comentários
considerados machistas sobre o caso Mariana Ferrer [O caso do estupro culposo] — quando um juiz do
Tribunal de Santa Catarina absolveu o homem acusado de tê-la violentado.
Na época, Constantino disse que dava “boa educação para que isso não
aconteça” com sua filha. “Mas, se ela chegar em casa e disser ‘Fui
estuprada’, vou pedir para ela me dar as circunstâncias”, afirmou, em
alusão à festa da qual Mariana participara. Ao ser demitido, escreveu
nas redes sociais: “Vocês venceram uma batalha, parabéns! A pressão foi
tão grande sobre a Jovem Pan, distorcendo claramente a minha fala, que
não resistiram. Não os culpo. É do jogo”, afirmou. “Quem me conhece e
quem viu de fato sabe que eu jamais faria apologia do estupro.”
O
empresário Paulo Figueiredo também vivenciou um drama pessoal quando
trabalhou na Jovem Pan. Segundo ele, o conflito que teve foi
exclusivamente com o atual diretor de redação da empresa, Humberto
Candil. “Desde que ele entrou, o viés do jornalismo da rádio começou a
ficar antibolsonarista e pró-Doria”, afirmou. “Entramos em um embate,
não aceitei e optei por sair. Minha crítica é especificamente à área de
jornalismo. A rádio em si é espetacular.” Figueiredo criticou a falta de
personalidade da mídia brasileira, que, para ele, é uma cópia da dos
EUA. “A imprensa brasileira passou a ser pautada por apenas um assunto:
Bolsonaro, como a dos EUA era com o Trump.” Para ele, os veículos
tradicionais abandonaram a descrição dos fatos, caíram na militância e
flertaram com a censura.
Jornalistas a favor da censura estão se sentindo cada vez mais à vontade no Brasil da intolerância
Por falar na imprensa americana, no ano passado, a ex-editora do The New York Times (NYT) Bari Weiss não aguentou a pressão e pediu as contas do jornal. “O NYT
parece cada dia mais cobrir uma galáxia distante, cujas preocupações
são profundamente removidas da vida da maioria das pessoas”, escreveu
Weiss em sua carta de demissão. Ela criticou as reportagens enviesadas
do jornal. E que objetivam atender a apenas uma parte da sociedade: a
das causas ditas “progressistas”. “Minhas incursões no mundo real fora
da narrativa predominante me tornaram objeto de constante bullying.”
Outro caso envolvendo o NYT foi o do repórter Donald McNeil Jr., demitido do jornal
por falas consideradas racistas. O jornalista chegou a se desculpar,
mas não bastou — 150 funcionários do jornal pediram sua cabeça e ele foi
demitido, depois de 45 anos de serviços prestados ao Times.
No Brasil, a coisa não é diferente. O comediante
Gregório Duvivier, por exemplo passou os quase 30 minutos do programa Greg News,
da HBO, fazendo acusações infundadas e levantando suposições sobre uma
possível ligação entre o governo Bolsonaro e a rádio Jovem Pan para
sugerir que a emissora seja investigada.
“Tentar descobrir se existem mutretas nesse veículo pode ser no fundo
uma forma de proteger o jornalismo brasileiro e restaurar a saúde mental
deste país”, delirou. É a invenção da censura do bem.
Ou,
como diria Lula, um dos ídolos de Duvivier, da “regulação dos meios de
comunicação”. “Ainda não decidi se sou candidato. Estou conversando com
muita gente, ouvindo muito desaforo, leio muito a imprensa e há setores
da imprensa que não querem que eu volte a ser candidato, porque, se eu
voltar, eu vou regular os meios de comunicação neste país”, afirmou o
ex-presidente em entrevista à Rádio Metrópole no fim de agosto. “A gente
não pode ficar com a regulamentação de 1962, não é possível. Eu penso
que a gente vai fazer uma coisa muito nova.”