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terça-feira, 12 de julho de 2022

Os complacentes - Alexandre Garcia

Gazeta do Povo

Crise institucional

O trágico incidente em Foz do Iguaçu mostra o quanto os ânimos estão acirrados por causa da eleição de outubro. Muita gente alerta para o risco de uma ruptura institucional. 
Gente que deve estar em outro país, porque rupturas institucionais estão ocorrendo na cara de todos nós. 
A primeira foi em 31 de agosto de 2016, quando a presidente foi condenada, mas não respeitaram o parágrafo único do artigo 52 da Constituição, pelo qual presidente condenado fica inabilitado de exercer função pública por oito anos. 
Presidia a sessão de julgamento no Senado o próprio presidente do Supremo, tribunal guardião da Constituição.  
Depois disso, infringiram até cláusulas pétreas do artigo 5.º, em que direitos e garantias fundamentais foram cancelados, a despeito de o artigo 60 proibir sua abolição.
Além disso, o artigo 53, sobre a inviolabilidade de senadores e deputados por quaisquer palavras, foi para o lixo, assim como o artigo 220, que trata da liberdade de expressão por qualquer processo e a vedação da censura. E, culminando, veio o “inquérito do fim do mundo”, assim chamado pelo dissidente ministro Marco Aurélio, que deixa perplexo quem pensa que é pedra de toque do direito o devido processo legal. 
No inquérito, quem se sente vítima ou ofendido é quem investiga, denuncia, julga e pune, seja quem for, mesmo sem ter foro no Supremo. 
Tudo isso sem falar nas intromissões em outros poderes, como mandar o Senado abrir CPI ou proibir o chefe de governo de nomear um subordinado.

Muita gente alerta para o risco de uma ruptura institucional. Gente que deve estar em outro país, porque rupturas institucionais já estão ocorrendo na cara de todos nós

Assim, preocupar-se com ruptura futura é passar recibo de alienação da realidade
E quem não fica preocupado com isso age como o personagem do poema de Martin Niemöller: um dia levaram seu vizinho judeu; no outro, seu vizinho comunista; depois, seu vizinho católico, e ele não se importou por não ser judeu, comunista, nem católico. No quarto dia o levaram e já não havia ninguém para reclamar. 
Tem gente que até torceu para levarem seus contrários, mas vejam o que escreveu Eduardo Alves da Costa em “No Caminho, com Maiakovski”: Primeiro roubam nossa flor e nada dizemos; depois, pisam no jardim e matam nosso cão, e não dizemos nada. Depois, o mais frágil deles entra em nossa casa, rouba-nos a luz e, “conhecendo o nosso medo, arranca-nos a voz da garganta e já não podemos dizer nada”.

Enquanto for com os outros, silêncio. Mas esse silêncio cúmplice também é um silêncio do suicídio de nossos direitos e liberdades. 
Está tudo posto na mesa; já aconteceu, já pisaram nas nossas flores, já levaram nosso vizinho. 
Poucas vozes gritam no Senado, onde se ouve o silêncio da omissão
O ativismo judicial se expande ante o passivismo de senadores, nos quais o medo arranca a voz da garganta. 
No crime de estupro, a medicina legal estuda o hímen complacente. No Brasil de hoje, o estupro da Constituição é admitido por mentes complacentes.

Alexandre Garcia, colunista - Gazeta do Povo - VOZES

 

quarta-feira, 4 de novembro de 2020

Juiz terá que se explicar ao CNJ sobre condução do julgamento de Mariana Ferrer

Corregedoria Nacional de Justiça abre procedimento disciplinar para avaliar comportamento de magistrado de Santa Catarina que permitiu ataques verbais do advogado do réu contra a jovem que fez a denúncia. OAB vai investigar possíveis desvios éticos do defensor

A Corregedoria Nacional de Justiça instaurou um expediente, ontem, para apurar a conduta do juiz Rudson Marcos, da 3ª Vara Criminal de Florianópolis, no comando do julgamento de um processo de estupro de vulnerável, em setembro, em que o advogado Cláudio Gastão da Rosa Filho ofendeu a influenciadora digital Mariana Ferrer, 23 anos, autora da denúncia. Acusado do crime, o empresário André Aranha foi absolvido.
[a posição do Blog Prontidão Total, sempre divulgada e conhecida por nossos leitores É, FOI e SEMPRE SERÁ de punição severa para estupradores.
Nossa sugestão por várias vezes divulgada,  é de que no primeiro estupro o réu condenado,  seja punido com pena mínima de 10 anos de reclusão = regime fechado - e castração química, mediante o uso obrigatório de  medicação adequada que o deixe impotente para a prática sexual;
vindo o réu a ser beneficiado com progressão de regime ele deverá comparecer, diariamente, a um hospital público para receber seu 'remédio', devendo comprovar mediante atestado médico o atendimento desta exigência, devendo o atestado ser apresentado a cada 15 dias à VEP.
O não atendimento desta exigência implicará na revogação da progressão.
No caso de reincidentes a pena mínima permanece em10 anos, sendo a castração física, irreversível, realizada em estabelecimento médico penal.] 

Ontem, as gravações da audiência foram tornadas públicas, mostrando momentos de humilhação sofridos por Mariana Ferrer, sem que o juiz ou outras autoridades presentes interferissem. Na denúncia, a influenciadora alegou ter sido dopada e estuprada por André Aranha no camarote VIP de um clube, em Jurerê Internacional, em dezembro de 2018. Ela apresentou áudio, com a fala embaraçada, pedindo ajuda a amigos. Exames realizados pelas autoridades provaram que houve o ato sexual, bem como a ruptura do hímen da vítima, que era virgem.

“Graças a Deus eu não tenho uma filha do teu nível e também peço a Deus que meu filho não encontre uma mulher feito você. (...) Isso é seu ganha pão né, Mariana? É o seu ganha pão a desgraça dos outros. Manipular essa história de virgem. (…) Não adianta vir com esse teu choro dissimulado, falso”
Cláudio Gastão Filho, advogado do acusado

“Excelentíssimo, eu estou implorando por respeito, nem os acusados de assassinato são tratados do jeito que estou sendo tratada. Pelo amor de Deus, gente”
Mariana Ferrer, influenciadora digital

“As provas acerca da autoria delitiva são conflitantes em si, não há como impor ao acusado a responsabilidade penal, pois, repetindo um antigo dito liberal, ‘melhor absolver cem culpados do que condenar um inocente’”
Rudson Marcos, juiz da 3ª Vara Criminal de Florianópolis

Advogado do réu, Cláudio Gastão da Rosa Filho, mostrou fotos de Mariana em “posições ginecológicas” para sustentar que “a história de ser virgem” não passaria de uma manipulação e a acusando de utilizar-se da própria virgindade para promoção nas redes. As imagens pessoais, no entanto, não têm nenhuma relação com o caso.

Mariana tentou interromper o advogado, acusando-o de assédio moral, mas ele continuou: “Graças a Deus eu não tenho uma filha do teu nível e também peço a Deus que meu filho não encontre uma mulher feito você. Não dá pra tu dar o teu showzinho. Teu showzinho você vai lá dar no Instagram depois, pra ganhar mais seguidores. Tu vive disso”, disparou. (…) “Mariana, vamos ser sinceros, fala a verdade. Tu trabalhava no café, perdeu o emprego, está com aluguel atrasado há sete meses, era uma desconhecida. Vive disso. Isso é seu ganha pão né, Mariana? É o seu ganha pão a desgraça dos outros. Manipular essa história de virgem. (…) Não adianta vir com esse teu choro dissimulado, falso, e essa lágrima de crocodilo.”

[Nosso posicionamento favorável a punições rigorosas para o estuprador não impede que tenhamos também o entendimento de que o estupro deve ser provado - por todos os meios válidos em juízo.

No caso em questão, se conclui que o acusado foi denunciado por duas vezes, e na primeira a acusação foi de estupro de vulnerável - considerando o alegado pela vítima de que havia sido dopada, não estando em condições de expressar concordância a prática do ato sexual ou de reagir.

Exames médicos realizados na ocasião comprovaram a realização do ato sexual e o rompimento do hímen. 

Com a troca do promotor - para assumir outra promotoria - o substituto concluiu não haver provas de estar a vítima em condições de vulnerabilidade: "Defesa e MP sustentaram que a jovem estava consciente durante o ato sexual — e não sob forte efeito de drogas —, portanto, não haveria estupro de vulnerável". O juiz concordou que não poderia ser caracterizado como estupro de vulnerável, entendimento também abraçado pela defesa do acusado.

O ato sexual entre dois adultos, capazes, ocorreu. Não foi juntado aos autos nenhuma prova válida de de que a 'estuprada' estava incapaz. O fato da Mariana ser virgem, alegação provada ter sido 'perdida' na ocasião do alegado estupro, não constitui atenuante nem agravante.

Só que não há nos autos nenhuma prova de que houve estupro. 

"Código Penal

Estupro 

Art. 213.  Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso: 
Pena - reclusão, de 6 (seis) a 10 (dez) anos. 
§ 1o  Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave ou se a vítima é menor de 18 (dezoito) ou maior de 14 (catorze) anos: 
Pena - reclusão, de 8 (oito) a 12 (doze) anos. 
§ 2o  Se da conduta resulta morte: 
Pena - reclusão, de 12 (doze) a 30 (trinta) anos.”
Violação sexual mediante fraude 
Art. 215.  Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com alguém, mediante fraude ou outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação de vontade da vítima: 
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos. 
Parágrafo único.  Se o crime é cometido com o fim de obter vantagem econômica, aplica-se também multa.
” 

DOS CRIMES SEXUAIS CONTRA VULNERÁVEL

Art. 218. Induzir alguém menor de 14 (catorze) anos a satisfazer a lascívia de outrem:

Pena - reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos.

“Ação penal

Art. 225. Nos crimes definidos nos Capítulos I e II deste Título, procede-se mediante ação penal pública condicionada à representação.

Parágrafo único. Procede-se, entretanto, mediante ação penal pública incondicionada se a vítima é menor de 18 (dezoito) anos ou pessoa vulnerável.”
Não tendo ocorrido o estupro, não ocorreu crime. A citação do 'estupro culposo' deve-se ao jornal 'the intercept', nos parece  que buscando uma manchete chamativa.
A conduta do juiz, que é o responsável pela ordem durante a sessão foi lamentável e cabe ao TJSC e/ou ao CNJ adotar as medidas cabíveis. O advogado tem uma conduta péssima, mas não consta que tenha desobedecido ao juiz.
Não consta que o promotor tenha protestado junto ao juiz  contra a incontinência verbal do advogado. Eventual manipulação das fotos íntimas, também vexatórias,  da influenciadora digital nos parece que não foi provada] 

Enquanto isso, o promotor do caso, Thiago Carriço de Oliveira, e o juiz Rudson Marcos acompanharam calados os ataques. A única intervenção do magistrado foi ao dizer para a vítima se recompor e tomar água e pediu ao advogado para manter “o bom nível” da audiência. Mariana respondeu: “Excelentíssimo, eu tô implorando por respeito, nem os acusados de assassinato são tratados do jeito que estou sendo tratada, pelo amor de Deus, gente. O que é isso?”

Além de o juiz estar na mira da Corregedoria, Cláudio Gastão é alvo de apuração disciplinar interna pela secção de Santa Catarina da Ordem dos Advogados do Brasil. “A OAB/SC, por intermédio de seu Tribunal de Ética e Disciplina, atua no sentido de coibir os desvios éticos. Estamos dando sequência aos trâmites internos que consistem em oficiar ao advogado para que preste os esclarecimentos preliminares necessários para o deslinde da questão”, informou, em nota oficial.

Já o Senado aprovou, por unanimidade, voto de repúdio a Cláudio Gastão, ao juiz Rudson Marcos e ao promotor Thiago Carriço de Oliveira “por deturparem fatos de um crime de estupro com base em acusações misóginas”. Na mesma direção, o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) recorreu ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Ele protocolou uma reclamação disciplinar para analisar a atuação do juiz do caso. Na visão do parlamentar, houve omissão por parte do juiz “ao permitir que o advogado de defesa dirigisse ofensas à honra e a dignidade da vítima”.

“Equivocadas”
Em nota, a assessoria de imprensa do MP informou que o promotor Thiago Carriço de Oliveira se manifestou sobre os excessos cometidos pela defesa, mas em uma parte da audiência que não foi revelada. O órgão declarou, ainda, que a absolvição do empresário se deu por falta de provas. “Não é verdadeira a informação de que o promotor de Justiça manifestou-se pela absolvição de réu por ter cometido estupro culposo, tipo penal que não existe no ordenamento jurídico brasileiro. Salienta-se, ainda, que o promotor de Justiça interveio em favor da vítima em outras ocasiões ao longo do ato processual, como forma de cessar a conduta do advogado, o que não consta do trecho publicizado do vídeo”, diz o comunicado.

O MP definiu a difusão de informações como equivocadas, “com erros jurídicos graves, que induzem a sociedade a acreditar que em algum momento fosse possível defender a inocência de um réu com base num tipo penal inexistente”. Por fim, criticou a postura do advogado, não condizente “com a conduta que se espera dos profissionais do direito”.

De acordo com o MP, a 23ª Promotoria de Justiça da Capital, que atuou no caso, reafirma que “combate de forma rigorosa a prática de atos de violência ou abuso sexual” e que, por isso, ofereceu a denúncia. “Todavia, no caso concreto, após a produção de inúmeras provas, não foi possível a comprovação da prática de crime por parte do acusado.”

Já o advogado Cláudio Gastão da Rosa Filho afirmou, em comunicado à reportagem, que o “posicionamento adotado foi para elucidar os fatos e mostrar a verdade perante a falsa acusação”, mas que não ia comentar os trechos “fora de contexto” de um “processo que correu em segredo de Justiça”. O juiz Rudson Marcos não se pronunciou sobre o caso.

(.........)

O MP catarinense disse, porém, que a absolvição não foi baseada no argumento de “estupro culposo” (sem intenção), como afirmou o The Intercept, mas “por falta de provas de estupro de vulnerável”.

Correio Braziliense - MATÉRIA COMPLETA


quinta-feira, 7 de junho de 2018

Encurralados

A cada dia, descobrimos que não conhecemos a verdadeira extensão da nossa desgraça nacional


Foram dias intensos. Estradas tensas, postos sem combustíveis, mercadorias estocadas e até apodrecendo em carrocerias de caminhões, desabastecimento, oportunistas aumentando preços, prejuízos enormes, controvérsias, chantagens dos viciados por subsídios, (des)governo para variar…  O movimento dos caminhoneiros jogou muita coisa à mesa. Contou com a simpatia e o apoio de parte significativa da população. Essa identificação é natural, porque a gente brasileira trabalha de sol a sol para ganhar cada vez menos, sacolejando o dia todo como se trilhasse a buraqueira do solo lunar. E há ainda um ponto intrínseco que une o país de fora a fora: ninguém suporta mais tanta corrupção e a cara deslavada dos políticos que vivem no mundo da lua.

Temos uma sociedade digna condenada por um dos piores sistemas educacionais do planeta, arrasado pelo recente aviltamento da grade curricular e pela ideologização das salas de aula, com todas as consequências nefastas que isso acarreta. Como a incapacidade gritante de formar cidadãos que compreendam direitos e deveres, elaborem um pensamento estruturado, adquiram senso crítico mínimo e sentimento de nacionalidade.
Não surpreende a multidão de excluídos intelectuais que se tornou presa fácil para toda sorte de discursos surrados e assistencialismos cruéis. Uma massa de manobra sempre pronta a trocar direitos por esmolas retóricas e econômicas, e acreditar, quando vítimas da falta de tudo, que programas sociais que beiram a má-fé trazem solução para alguma coisa. Em suma, a mais perfeita tradução da ignorância ideológica ou dependente. Ou a soma delas.

Fico impressionada porque, a cada dia, descobrimos que não conhecemos a verdadeira extensão da nossa desgraça nacional. Sim, chegamos ao fim de uma linha que nunca termina, passa do ponto final e segue avançando sob o nevoeiro, como se fosse a estrada para o infinito. Como se o país viajasse num eterno trem fantasma.  O movimento dos caminhoneiros atingiu quase todos os setores da economia. Ainda não estão claras as consequências políticas e sociais desta paralisação de uma categoria invisível em tempos normais, mas capaz de virar qualquer país pelo avesso quando resolve encrespar. O episódio exige análise por diversos ângulos. Locaute? Paralisação espontânea? Manipulação de pelegos infiltrados? Perguntas de múltiplas repostas.

Ninguém sabe ao certo os prejuízos imediatos e a extensão do desabastecimento, bem como as consequências, no sistema econômico, da variação de preços das mercadorias. Muito provavelmente manterão valores residuais dos aumentos ocorridos no período, como já se observa nos segmentos de verduras e carnes, algo ao redor de 15%. Há quem garanta que a conta espetada nas costas do contribuinte  vai oscilar entre R$ 80 e R$ 90 bilhões.  Também é importante analisar o financiamento tresloucado de caminhões patrocinado pelo BNDES na era petista (algo como “Meu Caminhão, Minha Vida”, que despejou cerca de R$ 227 bilhões entre 2009 e 2012), por pressão das montadoras, inundou o mercado com novos caminhoneiros autônomos e ampliou a frota das transportadoras, implodindo a lei da oferta e da procura e jogando o valor do frete no chão.

A entrada de novos caminhões resultante dessa benesse oficial aumentou em 40% a frota nacional e nem mesmo diesel gratuito resolveria a questão pois, hoje, para cada mil caminhoneiros disponíveis, há apenas setecentos fretes no estoque. Por isso, a ociosidade impôs uma concorrência feroz e o sistema adernou mirando o colapso. Ou seja, hora de bater à porta da Viúva generosa. Vimos um governo humilhado, obrigado a ceder tudo. E mais uma desmoralização da Petrobras, que vinha experimentando processo de recuperação financeira, do valor de mercado e da imagem internacional pós-petrolão ─ um pecado cometido pelo executivo que recuperou a empresa, impediu ingerência política, mas terminou obrigado a cair fora.

O governo escolheu os caminhos costumeiros, o remédio amargo que apenas irrita o sistema digestivo de quem é obrigado a engolir à força, ignorando a panaceia eficaz que exige longo prazo: crescimento econômico.  Mas, para sistemas políticos vadios como o nosso, crescimento econômico é um veneno, pois requer credibilidade e medidas inadiáveis como reforma da Previdência, privatizações, ajuste das contas públicas, Estado menor e ausência de ingerência política. Também sofremos do mal crônico de andar à deriva do bom senso e ainda desviar para rotas perigosas, como buscaram os oportunistas de sempre. Loucos para surfar no sucesso popular da paralisação dos caminhoneiros, tentaram engatar algumas carretas fora de padrão (“Fora Temer”, “Lula Livre” e intervenção militar) nos cavalos mecânicos estacionados nas rodovias. Deram com os burros n’água.

Michel Temer, ambientado no século 19, é um moribundo político sofrendo sua taxidermia em vida. Derrubado a poucos meses do fim do mandato, daria lugar a Rodrigo Maia, com possível suíte de Eunício Oliveira e solos de Cármen Lúcia fora da partitura. Uma piada de mau gosto!  Temer tem poucas alternativas antes de ficar empalhado. Quem sabe, retirar todos os impostos dos discos de Sula Miranda, a eterna rainha dos caminhoneiros? Ela anda meio sumida, mas, nesse jogo de tentativas e erros certos do seu governo…  O desespero para libertar Lula a qualquer custo só comprova que ele desmilinguiu-se na própria amoralidade, a ponto de arquitetar o estratagema derradeiro de um indulto presidencial indecente, que poderá vir de gente como Ciro Gomes, caso eleito. Afinal, seus incontáveis recursos jurídicos já foram solenemente ignorados pelas quatro instâncias do Judiciário e até pela ONU! Ou seja, “O Cara” chegou ao ponto de carecer de um expediente vexatório, uma espécie de reconstituição de hímen.

E o bando sem noção que bateu à porta dos quartéis em busca de paternidade para enfrentar a vida, clamando por intervenção militar, ouviu do general comandante do Exército o bom conselho de procurar respostas no artigo 142 da Constituição. É o que dá sair por aí, zanzando pelas ruas, ridículos naqueles trajes camuflados, como se estivessem de prontidão para alguma guerra de travesseiros da Sessão da Tarde.  Algum subalterno poderia ter mandado a turma acampar na frente do Camp Swampy e pedir ajuda ao Recruta Zero, Sargento Tainha e seu totó Otto, Tenente Escovinha e General Dureza. Pelo menos, teriam a máxima do recruta para refletir: “Nunca deixe para amanhã o que você pode fazer depois de amanhã”. Um chiste bem mais inteligente do que a ideia de jerico de jogar o país, fardado, num isolamento internacional destinado à escória.

O horizonte seguirá carregado. Os caminhoneiros autônomos deverão continuar com os velhos problemas, ante a ociosidade que roda ali pelos 30% no setor. E diversos segmentos produtivos de grande porte pressionam o governo para acionar os líderes do movimento, em busca da reparação financeira pelos prejuízos que tiveram durante a paralisação.  Tempos cansativos estes, que esgotam nossa paciência cidadã. Nem a Copa do Mundo batendo à porta parece interessar. Eu mesma fiquei arrasada quando vi os jogadores vestidos naqueles ternos, digamos, difíceis! A ressaca pós-Lula de Ricardo Almeida fez Neymar viralizar em zombaria nas redes sociais. Tadinho, foi comparado até ao tradicional espalhafato do saudoso Clodovil, gente!

Não me causam estranheza as palavras recentes do jornalista Clóvis Rossi, que parecem traduzir tudo isso que nos afeta: “Desisto. Jamais chegaremos à civilização, pelo menos no que me resta da vida”.
“Assim é (se lhe parece)”. Pirandello vive!

 Emma Thomas