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segunda-feira, 25 de março de 2019

Imitação do mal: copia, cola, mata

A internet é o princípio, o meio e o fim dos assassinos em massa


Dogolachan, 4chan, 8chan. Não faz ideia do que é? Dylan Klebold e Eric Harris, Adam Lanza, Dylann Roof, Robert Bowers. Anders Breivik, Brenton Tarrant. Ainda está difícil? Vamos ficar mais próximos. Wellington, Guilherme, Luiz Henrique. Sim, são todos autores de massacres infames. Em escolas na maioria, mas também em uma igreja metodista de fiéis negros, uma sinagoga, um acampamento do partido de centro-esquerda da Noruega e, no caso mais recente, em duas mesquitas na Nova Zelândia. Todos frequentadores dos “buracos negros” da internet mencionados logo no começo, autodoutrinados em teorias conspiratórias.

Certos de que se tornaram heróis malditos, celebridades do mundo das sombras da internet, seja na morte, na maioria dos casos, seja na vida numa cela. Numa competição do mal, saúdam os antecessores e tentam superá-­los. Por enquanto, o australiano Brenton Tarrant está no topo: transmitiu ao vivo pelo Facebook os dezessete horripilantes minutos em que massacrou frequentadores das mesquitas — “invasores”, por serem muçulmanos.

Tarrant matou cinquenta pessoas e riu da nossa cara. Na live do terror e no manifesto que deixou para a infâmia, plantou pistas falsas e trolagens, destinadas justamente a causar confusão e desinformação. Um exemplo: disse que Candace Owens foi a pessoa que mais o conduziu ao caminho da radicalização, “embora os atos extremos que ela defende sejam excessivos até para o meu gosto”. É uma espécie de piada cheia de ironia. Candace, também cria da era digital, é jovem, bonita, negra e agressivamente conservadora. O falso elogio a ela, da mesma forma que o dirigido a Donald Trump, faz parte do declarado propósito de Tarrant de apressar uma guerra civil nos EUA.

Como seu maior inspirador, Anders Breivik (77 mortos na Noruega, um recorde difícil de quebrar), Tarrant tem um conceito narcisista da própria importância. Naturalmente, acha que vai mudar o mundo. Embora ambos tenham agido de forma isolada, o uso intensivo das redes sociais, o culto à ultraviolência e as “justificativas” para matar civis inocentes são impressionantemente idênticos aos dos propagandistas do Estado Islâmico. Como os ultrafundamentalistas muçulmanos, Tarrant procurou no passado a explicação para barbaridades no presente.

Suas armas foram pintadas com o nome de comandantes da Batalha de Lepanto, como Marcantonio Colonna e Sebastiano Venier, do governador de Veneza na época da histórica vitória na cidade sitiada e de heróis sérvios da resistência à expansão muçulmana. Usar fatos que aconteceram há 400 ou 500 anos como paradigma do presente equivale a invocar as batalhas do profeta Maomé como exemplo de comportamento para os muçulmanos nos dias atuais.

O fator cópia e o elemento contagioso desses massacres fazem com que aumentem os apelos para que o nome dos desgraçados não seja reproduzido pela imprensa, os “chans” em que se infectam mutuamente sejam policiados e as plataformas abertas que usam para se promover apertem a censura. Todas, infelizmente, soluções falsas para um problema verdadeiro.

Publicado em VEJA de 27 de março de 2019, edição nº 2627

quarta-feira, 11 de janeiro de 2017

Supremacista, Dylann Roof inaugura pena capital federal por crimes de ódio

O autor de um massacre em 2015 que deixou nove mortos em uma igreja negra da Carolina do Sul foi condenado à pena de morte pelo crime. 
O jovem Dylann Roof, autoproclamado supremacista branco, é o primeiro condenado no sistema federal a sofrer pena capital por crimes de ódio. Ele enfrentava 33 acusações e se representou no tribunal, não demonstrando arrependimento e nem pedindo abrandamento de sentença.
Dylann Roof queima a bandeira dos EUA em uma das fotos do site - Reuters
 
Roof abriu fogo na histórica igreja metodista episcopal africana Madre Emanuel, em Charleston, na Carolina do Sul, na noite de 17 de junho de 2015. Nove pessoas morreram, incluindo o pastor da igreja, na ação que foi considerada um crime de ódio contra negros. O suspeito foi preso no dia seguinte, na Carolina do Norte.
Durante a fase final do julgamento, Roof teve aval para representar a si mesmo como advogado. No encerramento do julgamento, nesta terça-feira, disse que não se arrepende de nada que fez, após ser considerado culpado em dezembro pelas 33 acusações que pesavam sobre ele, entre elas crime de ódio.

— Ninguém me obrigou — afirmou ele.
Em sua defesa, Roof disse que o ódio sentido contra ele pelas famílias das vítimas, pessoas em geral, e pelo procurador é similar ao sentimento que ele teve para com os fiéis. E acrescentou, em um discurso pouco coerente, que sua atitude foi um impulso natural. — Acredito que possamos dizer que ninguém em sã consciência quer ir a uma igreja matar pessoas. O que digo é que ninguém que odeie alguém tem uma boa razão para fazer isso — afirmou. — Tenho o direito de pedir a vocês prisão perpétua, porém não sei de que forma isso serviria. Só um de vocês precisa estar em desacordo com o resto do júri.

Pessoas visitam a igreja metodista de Charleston, na Carolina do Sul, onde nove pessoas foram assassinadas em um massacre - John Moore / AFP / 15/07/2015

TENTATIVA DE JUSTIFICAR RACISMO
O réu disse, em confissão gravada após sua detenção, que o ataque foi uma represália pelos supostos crimes cometidos pelos negros contra os brancos. "Alguém tinha que fazê-lo porque, sabe, os negros estão matando os brancos toda hora na rua e estão violentando as mulheres brancas", disse Roof, calmo e sem demonstrar emoções, ao oficial do FBI que o interrogou.
Três pessoas sobreviveram ao massacre na igreja que era símbolo da luta dos negros contra a escravidão. "Ele os executou porque acreditava que não eram mais que animais", disse o assistente da promotoria, Nathan Williams, em suas alegações finais, esta quinta-feira, em um tribunal federal de Charleston. "Suas ações na igreja são o reflexo da imensidão do seu ódio".
Dylann Storm Roof foi após matar nove pessoas em uma igreja da comunidade negra de Charleston, na Carolina do Sul - REUTERS
O agente do FBI Joseph Hamski testemunhou que Roof tinha visitado meia dúzia de vezes a igreja nos meses que antecederam o ataque, antes de fazer o download de um livro da organização racista Ku Klux Klan. Roof documentou estas viagens com fotos, nas quais posou em locais históricos vinculados à época da escravidão. O jovem publicou muitas imagens em sua página na internet, que continha um manifesto racista contra negros e minorias. "A segregação não era ruim", escreveu. "Era uma medida defensiva. Não só nos protegia de interagir com eles e sermos feridos, mas também nos protegia de cair ao seu nível".
 [a legislação penal dos EUA permite inúmeros recursos e pedidos de clemência dos condenados à pena de morte.
Com tal prática é comum condenados permanecerem por dezenas de anos no 'corredor da morte'.]

Fonte: O Globo
 

quinta-feira, 18 de junho de 2015

Atirador que matou nove em Charleston fazia comentários racistas e 'planejava guerra civil'

Obama mostra preocupação com episódio; jovem branco matou nove pessoas em igreja frequentada por negros

O ataque de um jovem branco que matou nove pessoas em uma igreja da comunidade negra em Charleston, na Carolina do Sul, reabriu a discussão sobre crimes sobre crimes de ódio no país. O presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, reconheceu que esse tipo de violência "não acontece em outros países desenvolvidos". O jovem Dylann Roof fazia comentários racistas e "planejava uma guerra civil" com tendências supremacistas há seis meses, segundo seu colega de quarto.

 Foto de Roof sendo fichado pela polícia na Carolina do Sul - Reprodução

Expressando tristeza e revolta, Obama criticou o fácil acesso a armas e recordou que não é a primeira vez que um templo frequentado por negros é atingido nos EUA.  — O fato de que o tiroteio de Charleston ocorreu em uma igreja negra levanta questões sobre uma parte sombria da nossa História. Esse tipo de violência em massa não acontece em outros países desenvolvidos. Eu tive que fazer declarações como esta muitas vezes. Comunidades tiveram de suportar tragédias como esta muitas vezes — afirmou Obama, em seu 11º pronunciamento sobre assassinatos coletivos nos EUA durante os seus mandatos.

O presidente disse ainda que ele e sua mulher, Michelle, conheciam o pastor da igreja morto no ataque, o senador estadual Clementa Pinckney. Obama chamou atenção para a violência causada por armas de fogo. — Qualquer morte deste tipo é uma tragédia, qualquer tiroteio envolvendo múltiplas vítimas é uma tragédia — acrescentou Obama. — Existe algo particularmente trágico em mortes que acontecem em um lugar onde procuramos consolo e buscamos a paz. Mais uma vez, pessoas inocentes foram mortas em parte porque alguém que queria feri-las não teve problemas para colocar suas mãos em uma arma.

Em uma entrevista coletiva, a chefe do Instituto Médico Legal de Charleston, Rae Wooten, relatou que as vítimas variavam de idade entre 26 e 87 anos. Entre elas, estavam também um reverendo, pastores e duas idosas de 70 e 87 anos. — As vítimas aparentavam saber que ele queria se juntar para saber mais sobre os estudos da Bíblia. Também somos humanos, e somos tocados pelo terror — disse, com a voz embargada.

De acordo com o "Mashable", Tywanza Sanders, mais jovem das vítimas fatais, compartilhou com amigos um vídeo no aplicativo Snapchat que mostrava Roof como um novo integrantes da sessão de estudos onde os nove foram mortos. Segundo testemunhas, ele aguardou por uma hora, fingindo se integrar ao grupo, antes de começar o massacre.

Segundo relatos, o atirador disse que "vocês estão tomando nosso país". Não se sabe se ele se referia à população negra ou os religiosos. Testemunhas ouvidas pela corte disseram que Dylann Storm Roof havia feito vários comentários racistas recentemente. Seu suposto colega de quarto já havia postado fotos com a bandeira confederada, comumente apropriada por ativistas a favor da segregação racial. Ele era muito interessado em segregação, essas coisas. Disse que queria começar uma guerra civil e depois se matar. Planejou isso por uns seis meses — disse Dalton Tyler.

CAÇADA
Depois de uma intensa caçada policial, o suspeito foi capturado nesta quinta-feira em Shelby, na Carolina do Norte. Roof, de 21 anos, estava armado ao ser preso em um carro, mas não ofereceu resistência, segundo o chefe da polícia local, Gregory Mullen. Ainda de acordo com a polícia, não há motivos para acreditar que há outras pessoas envolvidas no massacre.
Ao confirmar a prisão, o prefeito de Charleston, Joe Riley, chamou Roof de um “ser humano terrível” e agradeceu as autoridades federais pela ajuda na investigação. O jovem foi levado de volta para a Carolina do Sul. — Nos EUA, nós não permitimos que pessoas más como essa escapem de seus atos covardes — disse Riley em uma coletiva de imprensa.

O ataque aconteceu na noite de quarta-feira na Igreja Metodista Episcopal Africana Emanuel, uma das mais antigas da comunidade negra de Charleston. A polícia contou que o atirador passou uma hora no local antes de começar os disparos. Uma das sobreviventes relatou ter sido poupada pelo assassino para “viver e contar o que aconteceu”. Segundo outras testemunhas, o jovem disse que estava no templo para atirar em negros.

A procuradora-geral dos Estados Unidos, Loretta Lynch, lamentou o massacre e enviou suas condolências às famílias das vítimas. — Atos como esse não têm lugar no nosso país nem na nossa sociedade civilizada.