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sexta-feira, 21 de abril de 2023

Dias de loucura - Augusto Nunes

Revista Oeste

É preciso impedir que supremos superpoderes transformem 2023 no mais infame dos anos

 

O presidente do TSE, Alexandre de Moraes | Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

 Cabelos desgrenhados em veloz processo de extinção, o paletó de quem dorme vestido, a gravata estreita demais para camuflar a curvatura do ventre, a expressão entediada — nada na aparência do homem que empunhava um microfone induziu a pequena plateia a desconfiar que logo testemunharia um momento histórico. “Dados atualizados da invasão do Capitólio, ministro Alexandre de Moraes”, preparou a assistência o orador Dias Toffoli. Assim começou, em 14 de dezembro de 2022, a mais audaciosa ofensiva da dupla de artilheiros em ação no Supremo Tribunal Federal. “Novecentas e sessenta e quatro pessoas já foram detidas. Nos cinquenta Estados. E acusadas de crimes cometidos desde 6 de janeiro de 2021”, foi em frente o orador. “E quatrocentas e sessenta e cinco fizeram acordos se declarando culpadas com o Ministério Público”.  

O impetuoso parceiro subiu ao palanque improvisado pronto para o arremate. “Antes de dizê o que eu ia falar, eu fiquei feliz com a fala do ministro Toffoli”, emocionou-se Moraes em paulistês interiorano. “Porque comparando os números têm muita gente pra prendê”, fez uma pausa e subiu o tom de voz para o fecho glorioso: “E muita multa pra aplicá!”. A plateia formada por gente que ajudou a eleger um governo favorável à “política de desencarceramento” saudou com risos e aplausos a advertência do Supremo Carcereiro. 
Menos de um mês depois, o surto de vandalismo agravado pela invasão dos prédios que abrigam as sedes dos Três Poderes animou Moraes a deixar claro que havia mesmo muita gente implorando por cadeia.
 Em 9 de janeiro, além dos 41 detidos em outras paragens, 1.406 brasileiros foram capturados na capital federal. 
E Moraes se tornou o novo recordista mundial da modalidade não olímpica prisões em massa.  
 
Nenhum exagero, recitaram em coro porta-vozes do governo Lula fantasiados de jornalista. A democracia brasileira seria sepultada em cova rasa se Moraes não tivesse sufocado o que o consórcio da imprensa batizou de Intentona Bolsonarista. A óbvia alusão à Intentona Comunista — uma sequência de insurreições militares que tentou derrubar em novembro de 1935 o governo de Getúlio Vargas — é só um monumento à ignorância histórica.  
A desastrosa quartelada conduzida por tentativa de golpe liderada por Luiz Carlos Prestes provocou pouco mais de 100 mortes. 
Nos distúrbios de 8 de janeiro não morreu ninguém.  
Em 1936, foram julgados 35 integrantes do alto comando da Intentona Comunista
Passados mais de três meses, os presídios da Papuda e da Colmeia continuam atulhados de homens e mulheres aos quais foram negados o devido processo legal e o direito de ampla defesa.  
Os colunistas de picadeiro que resistiram à intentona que não houve acabam de ser baleados pelos vídeos que mostram o assombroso desempenho do general lulista Gonçalves Dias, em 8 de janeiro, durante a invasão do Palácio do Planalto.  
O líder comunista brasileiro Luiz Carlos Prestes, em julgamento pelo Tribunal de Segurança, 1937 | Foto: Wikimedia Commons
Com a placidez de um bebê de colo, o agora ex-chefe do Gabinete de Segurança Institucional contempla a movimentação das tropas inimigas. Gentil como um guia turístico, oferece água aos futuros prisioneiros de guerra e indica-lhes a saída mais segura. 
O presidente da República, os devotos da seita e os ministros do STF fizeram de conta que não viram nada de mais. 
Lula jurou que não sabia de nada, que se houve algo errado a culpa é do velho amigo dele. 
Parlamentares do PT garantem que o chefe foi traído. Moraes deixou claro que não perde tempo com criminosos que votaram no candidato certo. Primeiro, ordenou à Polícia Federal que esperasse 48 horas para ouvir o que tem a dizer o general amigo de Lula. Em seguida, comunicou que vai manter na cadeia Anderson Torres. Ex-ministro de Bolsonaro, Torres era secretário de Segurança Pública do Distrito Federal e estava nos Estados Unidos em 8 de janeiro. Foi preso por omissão. Mas vai continuar preso por outros motivos que o ministro preferiu omitir. 
Os demais superjuízes não deram um pio sobre a troca de gentilezas entre Gonçalves Dias e os depredadores. 

A multidão de prisioneiros sem julgamento, formada exclusivamente por eleitores que não votaram em Lula, é a vitória da perversidade sobre a compaixão 

Como o caso do general pode esperar, os 11 Doutores enfim começaram a decidir o destino do primeiro grupo de acusados sabe Deus do quê, formado por 100 seres humanos. Exatamente 100; nem mais, nem menos. 
Como o Supremo mandou às favas a obrigatória individualização de conduta, a multidão encarcerada foi dividida em grupos (“lotes”, preferem os semideuses togados). 
A inovação pode juntar num mesmo balaio depredadores compulsivos e manifestantes que lastimavam a volta de Lula longe da Praça dos Três Poderes. 
Como o julgamento é virtual, as vítimas do arbítrio ficam nas celas, os doutores deliberam em casa e advogados sem acesso aos autos fazem a defesa oral à distância. 
Também os que saíram da cadeia não recuperaram a liberdade. 
São prisioneiros do medo, alimentado o tempo todo pelo uso da tornozeleira e por outras restrições ultrajantes. 
 
Foto: Cristyan Costa
O ministro que acredita ter sufocado a Intentona Bolsonarista talvez ignore que em 1936, ao aprovar a deportação de Olga Benario Prestes para a Alemanha nazista, o Supremo Tribunal Federal conheceu sua hora mais escura. Alheia à Constituição, aos códigos legais, à ascendência judia e à gravidez da ré, a Corte condenou à morte a mulher de Luiz Carlos Prestes
Em tese, aplicou-se a pena de expulsão a uma estrangeira presa meses antes por ter participado da Intentona Comunista. Olga foi assassinada num campo de concentração. A criança que sobrevivera à escala no inferno foi resgatada por uma campanha internacional liderada pela avó. A decisão do STF inscreveu em sua história o dia da infâmia.
 
Olga Benário Prestes | Foto: Wikimedia Commons

Em 2019, quando Dias Toffoli atropelou o sistema acusatório brasileiro, confiscou atribuições do Ministério Público, abriu o inquérito das fake news e entregou sua condução a Alexandre de Moraes, poucos juristas enxergaram um vigoroso pontapé na Constituição. 
Quatro anos, nove inquéritos abusivos e incontáveis ilegalidades depois, a democracia brasileira é deformada pela existência de exilados perseguidos pelo Judiciário, presos políticos, indultos presidenciais atirados ao lixo, jornalistas proibidos de opinar, empresários sitiados por multas multimilionárias, contas bancárias e redes sociais bloqueadas, normas constitucionais em frangalhos, cidadãos sem passaporte além do medo epidêmico infundido por ditaduras disfarçadas
A multidão de prisioneiros sem julgamento, formada exclusivamente por eleitores que não votaram em Lula, é a vitória da perversidade sobre a Justiça. O Brasil que pensa vem colecionando dias de loucura. É preciso impedir que supremos superpoderes transformem 2023 no mais infame dos anos.

Leia também “O que aconteceu no 8 de janeiro”

Augusto Nunes, colunista - Revista  Oeste


sexta-feira, 27 de janeiro de 2023

A seita lulista só anistia culpados - Augusto Nunes

Revista Oeste

Terroristas libertados em 1979 sonham com a prisão perpétua dos manifestantes antipetistas 

Manifestação da esquerda em São Paulo, no dia 9 de janeiro de 2023 | Foto: Wagner Vilas/Shutterstock

Manifestação da esquerda em São Paulo, no dia 9 de janeiro de 2023 | Foto: Wagner Vilas/Shutterstock 

 A anistia decretada em agosto de 1979 por João Figueiredo permitiu a imediata volta ao Brasil de inimigos do regime militar — Leonel Brizola e Luiz Carlos Prestes, por exemplo — que já aceitavam com resignação a ideia da morte no exílio.
Indultos concedidos pelo último dos generais-presidentes ampliaram a abrangência do texto original e livraram da cadeia ou da clandestinidade também os que haviam tentado abreviar à bala o ciclo dos generais-presidentes — não para modernizar o país com uma genuína democracia, mas para assassinar de vez a liberdade com a implantação da ditadura do proletariado.  
A subespécie extremista a que pertencem os dirceus e as dilmas caminhava para a extinção no mundo civilizado quando essas esquisitices forjadas nas catacumbas do extremismo passaram a ornamentar os palanques do PT.
 
Passados 43 anos, os anistiados de 1979 resolveram deixar claro que não esqueceram nada e nada aprenderam: são essencialmente os mesmos. O tempo obrigou-os a aposentar os blusões e calças jeans do uniforme de Guevara mirim, muitos até se renderam ao terno e gravata. 
Mas o cérebro avariado segue zanzando por sierras maestras, matas congolesas e selvas bolivianas. 
Só cabeças com defeito de fabricação conseguem armazenar tanto ressentimento por tantos anos. Só rancorosos vocacionais poderiam conceber a palavra de ordem ANISTIA NÃO!, parida minutos depois da prisão de centenas de manifestantes antipetistas que estavam em Brasília no domingo em que delinquentes ainda não identificados depredaram o Palácio do Planalto, o prédio do Congresso e a sede do Judiciário.

Para os devotos da intolerância, todo brasileiro que não viva fazendo o L é um bolsonarista, todo bolsonarista é golpista e todo golpista acorda, passa o dia e tenta dormir planejando atos antidemocráticos

Manifestação pedindo a aprovação da lei da anistia - 
 Foto: Reprodução

Desde 2019, quando se consumou o parto súbito do inquérito das fake news, o STF vem ensinando que certos delitos são tão hediondos que nem precisam existir oficialmente para que seja duramente castigado quem se atrever a praticá-los

ANISTIA NÃO!, berram em coro tanto os que nem haviam nascido em 1979 quanto setentões que hoje recordam sem sustos, em conversas com velhos comparsas, os assaltos, homicídios e atentados à bomba em que se meteram. 
Para os guerrilheiros agora entrincheirados em botequins, não merece perdão nenhum dos integrantes da multidão trancafiada na cadeia desde 9 de janeiro — e não merecem por terem cometido atos antidemocráticos. “Não há crime nem pena sem lei anterior que o defina”, recita já na primeira semana de aula o pior aluno da mais desqualificada faculdade de Direito. 
A expressão “ato antidemocrático” nunca deu as caras na floresta de artigos, parágrafos e incisos que se espalha pelos códigos legais e pela Constituição.
 
Da mesma forma que o coronavírus, o ato antidemocrático se desdobra em variantes que exigem mais doses de imunizantes. 
Num primeiro momento, o inimigo concentrou-se no ataque a alicerces do Estado de Direito, valendo-se de insultos a ministros do STF e de incontáveis fake news concebidas para desmoralizar urnas eletrônicas.  
A segunda onda só foi contida com a revogação da imunidade parlamentar e amputações da liberdade de expressão.  
O pico da pandemia de desinformação foi registrado no clímax da campanha presidencial. 
Para sufocar o golpe tramado por bolsonaristas, o TSE conjugou com extraordinária fluência os verbos censurar, suspender, remover, derrubar, prender e arrebentar.  
A disputa pela Presidência terminou. O Tribunal Superior Eleitoral segue usando máscaras. As liberdades democráticas não foram liberadas do uso de respiradores.
 
Se depender da seita que tem em Lula seu único deus, logo serão devolvidos à UTI. 
Para os devotos da intolerância, todo brasileiro que não viva fazendo o L é um bolsonarista, todo bolsonarista é golpista e todo golpista acorda, passa o dia e tenta dormir planejando atos antidemocráticos. 
É pouco negar apenas a anistia a criminosos desse calibre.  
Antes precisam ser negados o direito de ampla defesa, o devido processo legal, o acesso a qualquer palavrório que permita ao prisioneiro ao menos saber o que fez para ser encarcerado
Terroristas não devem achar que prisão seja colônia de férias, advertiu o Supremo Carcereiro ao saber da comparação inevitável: 
- as imagens do ajuntamento de presos sem julgamento evocavam campos de concentração. 
Pero Vaz de Caminha estava certo: aqui, em se plantando, tudo dá.
Manifestantes na Praça da Cinelândia, após atos em Brasília - 
Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil
Dá até o que se colheu nas urnas de 2002: um presidente que nunca leu um livro é promovido a doutor honoris causa por eruditos que soletram mesóclises no banheiro, um falastrão que não aprendeu a ler por preguiça vive assinando prefácios que outros escrevem
um presunçoso sem cura retribui com grosserias a sabujice da plateia que ri da piada antes que o reizinho nu acabe de contá-la. 
Não é mesmo para principiantes descobrir o que leva um país a reprisar o faroeste que termina com o triunfo do bandido
Desde a primeira festa de posse em Brasília, naquele longínquo janeiro de 2003, o PT não perdeu uma única chance de mostrar que o que poderia ter sido um partido acabou reduzido a um bando que se divide em duas categorias: os incapazes e os capazes de tudo.  
Nada disso impediu a volta ao comando de Lula e seus parceiros.
 
Otimistas sem remédio podem argumentar que os últimos 20 anos conferiram o status de Verdade Irrevogável ao que só parecia uma mentira piedosa: o Brasil resiste a tudo. Sobreviver a oito anos de Lula e cinco de Dilma, admita-se, não é façanha para qualquer um
Mas o que os persistentes patifes fizeram ou deixaram de fazer neste primeiro mês de governo adverte: o candidato age como se a aliança que o apoiou tivesse sido dissolvida no fim da festa de posse. 
O centralizador patológico talvez pretenda, em seu derradeiro mandato, ser mais Lula do que nunca.  
E está cruzando o verão rodeado por discípulos que adivinham o que o Mestre quer e o que rejeita. Censura, sim, por exemplo. Anistia, não a menos que o anistiado esteja na gaiola por crimes praticados a serviço da seita.

Leia também “Lula inocentou um assassino patológico”

Augusto Nunes, colunista - Revista Oeste
 

sexta-feira, 16 de dezembro de 2022

O supremo carcereiro só prende inocentes - Augusto Nunes

Revista Oeste

Para Moraes, nada é mais excitante que o estupro da Constituição e das normas legais 

A história se repetia todo sábado, sempre perto das 10 da noite. Só mudava a identidade da mulher que viera a pé de alguma vila habitada por famílias pobres para apertar a campainha da casa na Rua General Glicério. Ali morava o prefeito de Taquaritinga, e as visitantes sabiam que Adail Nunes da Silva, viciado em multidão, não estaria por lá, e sim no cinema, numa festa ou a caminho de outro baile. Mas não era ele o procurado. O nó a desatar requeria uma conversa com minha mãe, certamente entrincheirada na sala de estar. “Quero falar com dona Biloca”, ouvia um dos cinco filhos que se revezavam na ida ao portão. Eram raríssimos os que chamavam pelo prenome do cartório a professora Emilia Menino Nunes da Silva. Desde a infância ela foi Biloca, precedido por um “dona” só depois do casamento.

Marcel van Hattem, deputado federal | Foto: Reprodução/Redes Sociais

Marcel van Hattem, deputado federal -  Foto: Reprodução/Redes Sociais  

Um minuto mais tarde, a mulher já estava no meio do mesmíssimo enredo. Só eram diferentes os dois personagens. “Meu filho é um moço bom”, começava a mãe. “O problema é que ele conheceu faz pouco tempo uma gente ruim, deu de beber e agora anda se metendo em arruaça. Foi preso hoje porque um policial achou que é desordeiro. A senhora pode dar um jeito de soltar o menino?”. Dona Biloca acomodava a mãe aflita numa das cadeiras da varanda, empunhava o telefone de parede no canto da sala de jantar e ligava para a delegacia. Como o prefeito, também o delegado estava fora. Atendia um dos três policiais. Minha mãe reproduzia o que ouvira da mãe e pedia a restituição do direito de ir e vir. O policial explicava que só o chefe podia soltar ou prender alguém.

“Esse que foi preso é rapaz direito, pode acreditar na minha palavra”, insistia a mulher do prefeito. O homem da lei acabava cedendo. Em menos de dez minutos, um jovem devastado pela ressaca aparecia no portão da minha casa. Filho e mãe se abraçavam, diziam que Deus haveria de abençoar a responsável pela libertação e lá se iam de volta ao lar. A cada soltura irregular, dona Biloca ordenava aos filhos que não comentassem a ocorrência. “Com ninguém”, advertia. Preferia que o marido de nada soubesse apenas para evitar que o prefeito se considerasse devedor do delegado. Nunca se arrependeu de nenhuma intervenção no sistema carcerário. “Bêbado e arruaceiro não precisam ficar presos”, ensinava. “Cadeia é coisa para assassino, ladrão, bandido, gente perigosa.” Encerrava o assunto tentando conter, sem sucesso, o riso moleque de quem protagonizara alguma travessura.

Professora Emília Menon Nunes da Silva (dona Biloca) - 
Foto: Arquivo pessoal
Nesta quarta-feira, numa reunião em Brasília, Alexandre de Moraes quase conseguiu substituir a carranca exibida em aparições públicas por algo parecido com um sorriso. O que se viu foi um esgar, mas o tom de voz informou que Moraes estava eufórico. “Fiquei feliz com a fala do ministro Toffoli”, começou o especialista em atropelamentos da Constituição. (Dias Toffoli dissera que desde 6 de janeiro, quando ocorreu em Washington a invasão do Capitólio, foram detidos, em 50 Estados, 964 suspeitos de envolvimento no episódio.) Moraes entusiasmou-se: “Comparando os números, tem muita gente pra prender, e muita multa pra aplicar!”. 
A professora primária de Taquaritinga gostava de devolver o direito à liberdade a gente que incorrera em pecados veniais. 
O mais truculento ministro do Supremo Tribunal Federal parece flutuar sobre nuvens profundamente azuis quando pensa nas perversidades que praticou ou está prestes a consumar.
Na quarta-feira, com o país que pensa e presta ainda perplexo com a prisão de um líder indígena, Moraes se excitava com as iniquidades decorrentes de outro surto de autoritarismo patológico programado para 15 de dezembro. Entre o início da manhã e o fim da noite, por ordem do supremo carcereiro, a Polícia Federal cumpriu mais de 100 mandados de prisão, busca e apreensão em sete Estados e no Distrito Federal. 
 As alegações do ministro, redigidas em português indigente, sugerem que os alvos estão envolvidos de alguma forma em manifestações que contestaram os resultados da eleição presidencial, bloqueio de rodovias, atos antidemocráticos nas imediações de quartéis e outros sintomas de simpatia pelo presidente Jair Bolsonaro. Para o tirano togado, todas essas atrocidades figuram na categoria dos crimes hediondos.

Confiantes na onipotência da toga, resolveram mandar às favas os eleitos para o Executivo e para o Legislativo, e agora vêm ocupando sem resistência territórios proibidos

A selvagem sessão de torturas a que foram submetidos o Estado de Direito e a Constituição incluiu a censura de 168 perfis nas redes sociais, quebra de sigilo bancário, confisco de bens e a detenção de deputados estaduais, além da obrigação de usar tornozeleiras eletrônicas imposta a parlamentares proibidos até de descobrir quais delinquências lhes são atribuídas. 
 Nenhuma das numerosas ofensivas fora da lei lideradas por Moraes foi tão abrangente e atrevida. 
Nenhuma mostrou com tão chocante nitidez a ditadura da toga, a insolência do marechal sem farda, a sordidez dos cúmplices e a covardia dos incumbidos de reerguer instituições que contemplam de joelhos o triunfo da arrogância. 
No mundo da magistratura, por exemplo, até agora só o desembargador aposentado Sebastião Coelho parece ver as coisas como as coisas são. “Alexandre de Moraes deveria ser preso”, reiterou nesta semana.

A mudez dos líderes do Ministério Público foi rompida no começo da semana por Darcy de Sousa Filho, procurador-geral de Justiça de Minas Gerais. Ao discursar na cerimônia de entrega do cargo, Sousa propôs “o resgate do império da lei e da ordem democrática vilipendiada e atropelada pelo ditador de Brasília”. Dado o recado, dirigiu-se ao sucessor no cargo: “Que Vossa Excelência restabeleça o orgulho de ser promotor de Justiça e faça prevalecer as nobres e fundamentais prerrogativas do Ministério Público no processo acusatório, usurpadas pela autoridade apontada”. A salva de palmas da plateia avisa que a tropa formada por promotores e procuradores está pronta para o combate. A cara de paisagem das autoridades no palco reforçou a suspeita de que os generais flertam com a rendição sem luta.

Durante a sessão do Congresso desta quinta-feira, voltou a ecoar a voz solitária do deputado gaúcho Marcel van Hattem. “Esta situação de ruptura institucional não pode perdurar!”, afirmou o parlamentar do Partido Novo com os olhos postos no presidente do Senado, Rodrigo Pacheco. “Um ministro e uma Corte não podem seguir atuando fora da lei e da Constituição. É papel do Congresso pôr fim ao arbítrio!”  Segundo o artigo 1º da Constituição, “todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente”. 
 Os ministros do STF só precisaram do apoio de um presidente da República e do amparo de senadores escalados para uma sabatina tão temível quanto um chá de senhoras. 
 Confiantes na onipotência da toga, resolveram mandar às favas os eleitos para o Executivo e o para o Legislativo, e agora vêm ocupando sem resistência territórios proibidos. Resta ao povo brasileiro reagir com armas próprias. Grandes manifestações de rua, por exemplo, fazem milagres.

Em 2013, portentosas passeatas obrigaram o Congresso a funcionar com mais agilidade e juízo. Nesta virada de ano, poderão apressar a retomada do poder usurpado por gente que se instalou na sala do trono sem ter obtido um único e escasso voto popular.

Leia também “Um AI-5 de toga”'desequilíbrio entre os Poderes' fere a separação da União. 

Augusto Nunes, colunista - Revista Oeste