Blog Prontidão Total NO TWITTER

Blog Prontidão Total NO  TWITTER
SIGA-NOS NO TWITTER
Mostrando postagens com marcador terra estrangeira. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador terra estrangeira. Mostrar todas as postagens

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2021

A ideologia bolsonarista - 2 - Denis Lerrer Rosenfield

O Estado de S. Paulo

Ela orienta as ações de seus militantes, que se comprazem em gritar histericamente: ‘Mito!’

Dando prosseguimento ao artigo anterior (18/1), centrado no conjunto de ideias que estrutura o bolsonarismo, ressaltemos alguns outros aspectos para que tenhamos uma visão mais abrangente desse fenômeno. Por mais que alguns insistam, talvez com certa dose de razão, que essas “ideias” não sejam propriamente ideias dado o seu caráter tosco, são elas que orientam as ações de seus militantes, que se comprazem histericamente em gritar: “Mito!”.

Note-se, preliminarmente, como muito bem observou um leitor, que os aspectos por mim assinalados da ideologia bolsonarista não se restringem à extrema direita, mas são igualmente válidos para a extrema esquerda, configurando um tipo de autoritarismo ou totalitarismo cujas consequências são as mesmas na dominação da sociedade e no controle ou aniquilamento das liberdades. Eis por que autores como Hannah Arendt incluem na análise do totalitarismo tanto o nazismo quanto o comunismo. Se me detive mais no caso da extrema direita, é por ser ela a experiência concreta que o País está vivendo.

Subversão da democracia – Um aspecto importante desse fenômeno reside na subversão da democracia por meios democráticos, as eleições sendo usadas como instrumentos para corroer suas instituições e seus valores. Hitler conquista o poder por meios democráticos visando a destruir as próprias instituições republicanas. Chávez conquista “democraticamente” o poder, para eliminar progressivamente todas as instituições democráticas da Venezuela, hoje destruída e exaurida. O presidente Bolsonaro, por sua vez, está sempre testando os limites das instituições democráticas, erodindo seus valores e princípios, embora se diga o seu defensor. Quando convoca as Forças Armadas para defenderem a democracia, faz jogo duplo: o de defensor das liberdades e o de seu verdugo.

Militares – A convocação dos militares é elemento constitutivo de um discurso que busca criar condições para que eles, junto com as forças policiais, passem a responder a ele, e não à Constituição, com o intuito de estabelecer uma relação direta com eles, e não mais unicamente pela hierarquia militar. Há o menosprezo da representação. O presidente gasta boa parte do seu tempo em comemorações militares dos mais diferentes níveis, que não seriam, em condições normais, afeitas à posição de um presidente. Os comandantes militares seriam as pessoas que naturalmente deveriam presidir tais cerimônias. Uma vez que sempre procura comparecer a tais eventos, tem como objetivo chamar a si as pessoas homenageadas, estabelecendo uma relação direta com elas, independentemente de seus superiores hierárquicos.

Trata-se de um meio de também manter os comandantes sob controle, ao mostrar que pode deles prescindir. É um empreendimento difícil nas Forças Armadas, por serem elas hierárquicas e ordenadas, apesar de um suposto chamamento à tropa embutido em tal comportamento, embora o caso não seja o mesmo em algumas Polícias Militares, cuja cadeia de comando é fraca, além de pouco estruturada em torno de valores. Aí as chances do bolsonarismo germinar são maiores, o que explicaria a atual tentativa de uma reorganização das forças policiais, tirando o poder dos governadores e estabelecendo uma forma de coordenação nacional, à revelia das Forças Armadas.

Milícias – Se o bolsonarismo conseguiu com êxito criar uma milícia digital, não se pode dizer o mesmo da criação de um partido, cuja tarefa seria a de estruturar seus adeptos em grupos organizados, que responderiam a vozes de comando paramilitares. Nota-se uma desorientação do bolsonarismo nesse sentido, visto que, no afã da família Bolsonaro de tudo controlar, dividiu e fragmentou um partido eleitoralmente vitorioso, o PSL. Saindo vencedor das últimas eleições, foi vítima da tentativa bolsonarista de tudo dominar, nem aceitando o compartilhamento do poder. Sua orientação de extrema direita, sem uma estratégia correspondente, conseguiu minar a si mesma. O que teria sido um instrumento seu de poder, terminou sendo seu óbice, com as desorientações partidárias daí derivadas. Até hoje não sabe o presidente por qual partido se candidatar em 2022, seu maior, se não o único, objetivo.

Idiotas – O vídeo de ampla repercussão em que o presidente da República, numa tirada sua característica, totalmente imprópria para uma figura presidencial, manda a imprensa pôr uma lata de leite condensado “naquele lugar”, de eliminação fisiológica do corpo, com odor fétido, exibe em toda a sua “pureza” o desprezo pela liberdade de imprensa, sua profunda aversão à crítica e ao outro em geral. Mais surpreendente ainda, contudo, é que, ladeado pelo ministro das Relações Exteriores, a sua plateia, em delírio, grite: “Mito! Mito!, Mito!”. [o nosso presidente tem como uma de suas características um estilo espontâneo, as vezes usa um linguajar não refinado - especialmente quando devido o fogo cerrado sob o qual vive, explode, usando as vezes termos chulos inadequados ao cargo que ocupa.
Mas analisando com isenção se conclui que é dificil para qualquer ser humano,  com sangue nas veias,  suportar as calúnias, as interpretações deturpadas dos fatos, sempre contra ele. 
O ilustre articulista no parágrafo terceiro desta matéria, título subversão da democracia,  omite que o STF já tomou decisões, quase sempre monocráticas, em que usou a defesa da Democracia e da Constituição Federal, para cassar de apoiadores do  presidente Bolsonaro o direito de exercerem  direitos assegurados pela Democracia e Constituição que dizem defender.
Usar a democracia e a Constituição para sufocar direitos que elas garantem, não é democrático nem constitucional.]

Enseja pensar por que um discurso tão tosco e grosseiro ainda encontra quem o acolha, pois quem assim o faz age como idiota, como se habitasse outro mundo. Talvez isso explique o comparecimento do chanceler, pois é como se ele estivesse numa terra estrangeira.

Denis Lerrer Rosenfield, filósofo e professor UFRGS E-mail:Denisrosenfield@terra.com.br
Coluna no jornal O Estado de S. Paulo


sábado, 14 de dezembro de 2019

Inimigos da polícia - Folha de S. Paulo

 Demétrio Magnoli 


Policiais bandidos sempre existirão, mas a polícia bandida é fruto de seus superiores

Há, e são muitos, policiais profissionais que cumprem a sua missão de proteger a ordem pública e a segurança dos cidadãos respeitando estritamente a lei. Existem, e não poucos, policiais que vão muito além de seu dever. Eles apartam brigas de casais, assumem riscos pessoais excessivos para salvar indivíduos em perigo, fazem partos em situações de emergência, amparam famílias durante os dias traumáticos do sequestro de um dos seus. Por culpa dos inimigos da polícia, geralmente esquecemos disso.

Um inimigo da polícia é o policial que usa sua arma como ferramenta para violar a lei. Aquele que chantageia pessoas vulneráveis para obter propina, cobra tributos informais de atividades irregulares, engaja-se na intermediação de negócios ilegais, associa-se a máfias políticas ou empresariais. Ou, ainda, aquele que pratica pequenos gestos cotidianos de arbítrio, recorre à brutalidade gratuita, envolve-se em operações de vingança homicida, forma milícias. Esse tipo de policial degrada sua profissão: a substância pegajosa que dele emana suja o uniforme de seus colegas honestos e mancha até mesmo os distintivos dos colegas heroicos.

[apenas para registro - a grande mídia não está repercutindo muito o laudo pericial, oficial, que comprova que os jovens mortos na favela de Paraisópolis  haviam feito uso de drogas naquela madrugada,seja álcool e/ou drogas mais pesadas.
(como estará  a consciência de um pai e/ou de uma mãe que deixaram uma criança de 14 anos estar de madrugada em um bali funk bem longe de casa?) ]
O policial contaminado pelo preconceito é um inimigo da polícia. Ele enxerga o bairro de periferia ou a favela como terra estrangeira — e seus habitantes, especialmente quando jovens e negros, como delinquentes naturais. Sob a lente de seus óculos, o baile funk dos pobres é orgia criminosa. Nesse olhar fraturado começa o trajeto que se conclui em tragédias como a de Paraisópolis, em São Paulo. Entretanto, quase invariavelmente, a consumação da barbárie depende de uma palavra que vem de cima.

A polícia é o que seus comandos querem que seja. A cultura policial nasce nos escalões superiores —isto é, nos comandantes e nas autoridades políticas que os selecionam. Policiais bandidos sempre existirão, mas a polícia bandida é o fruto do presidente que elogia o arbítrio e a truculência, do filho do presidente que homenageia milicianos, do governador que pede tiros “bem na cabecinha” ou do que nada vê de condenável na alta letalidade das operações de sua polícia. Os principais inimigos da polícia têm nome e sobrenome: chamam-se Jair Bolsonaro, Wilson Witzel, João Doria. [um pequeno esclarecimento: achamos haver um certo exagêro, em considerar autoridades que tem responsabilidade sobre a segurança pública como policiais bandidos.
O policial bandido está adequadamente definido, ao nosso ver, no segundo parágrafo da matéria.
Considerar  policial bandido autoridades, estaduais ou federais, que desejam combater o crime, que desejam a vitória do policial profissional, é um absurdo que só depõe contra o esforço de aprimorar a polícia.]

O policial profissional sabe que o policial bandido é seu inimigo —e, por isso, espera que sistemas de controle o identifiquem e excluam da corporação. Entre os maiores inimigos da polícia encontra-se Sergio Moro, o ministro que, por meio de seu “excludente de ilicitude”, almeja impedir a punição de criminosos uniformizados. O dispositivo, se aprovado, representaria o triunfo jurídico da polícia bandida —ou, dito de outro modo, o enterro definitivo da polícia profissional. Atrás da proposta legislativa, espreita a sombra do esquadrão da morte.

A Lei de Drogas, envelope jurídico do preconceito social, é o pátio de encontro dos inimigos da polícia. Seus holofotes comprimem, numa tábua única, a alta criminalidade do narcotráfico, o pequeno crime da “mula” ou do “aviãozinho” e o consumo de entorpecentes no pancadão da periferia (esqueça a rave de Pratigi, na Bahia: nas festas da classe média não circulam drogas!). Os adolescentes mortos em Paraisópolis são “danos colaterais” da Lei de Drogas, como o são as crianças alvejadas no Rio e a multidão de presos sem nome das penitenciárias convertidas em escolas do crime.

Os inimigos da polícia fazem com que, no lugar de respeito, a polícia se torne objeto de temor, aversão e ódio. Não há nada mais perigoso do que isso para os policiais. Eles têm que cumprir sua missão em territórios hostis, entre pessoas que os enxergam como as ameaças mais letais. Devem, portanto, operar em comunidades que preferem o silêncio à cooperação ou, em casos extremos, escolhem cooperar com os criminosos. [opção  que sempre resulta em acusações falsas contra os policiais - é tal opção que faz com que as balas perdidas sempre tenham saído das armas de policiais, que sempre acusam os policiais de violência e outras coisas mais e que complicam o trabalho da polícia no combate ao crime.]  O partido do “excludente de ilicitude” também mata policiais.

Demétrio Magnoli, coluna Folha de S. Paulo