Executivos
da Andrade Gutierrez afirmaram, em delação premiada, que a empreiteira pagou
ilegalmente dívidas da campanha de Dilma Rousseff em 2010.
Segundo a
confissão, celebrou-se um contrato fictício com a agência Pepper — que
trabalhava para a candidatura —, e, por esse expediente, mais de R$ 5 milhões
foram parar nos cofres da companheirada
A metáfora e a comparação são matéria prima essencial da literatura. Ou,
mais amplamente, do texto narrativo. Se o autor quer deixar ainda claro ao
leitor a natureza daquilo que diz ou revela, costuma recorrer a tais
expedientes. Eles abrem a percepção de quem lê. Farei isso agora. Pensem no PCC, a mais famosa organização criminosa
do Brasil, embora, eu desconfio, possa não
ser a maior e esteja longe de ser a mais rica.
Imaginem agora que
Marcos Willians Herbas Camacho, o Marcola, o chefão da organização, decida que
chegou a hora de participar ativamente da política. Todos conhecem as fontes de
financiamento do PCC: tráfico de drogas, roubo de carga, transporte público
alternativo etc.
Agora pegue-se esse dinheiro de origem
criminosa para financiar candidaturas. Atenção: vou introduzir na narrativa o
que chamarei de “chave para o dilema
ético”. Não! Marcola não quer candidatos bandidos. Acredita que o PCC deva
eleger apenas freiras dos pés descalços, beatos que defendem os direitos
humanos, homens e mulheres acima de qualquer suspeita.
Pergunta-se: essa
eleição está ou não está contaminada?
Agora voltemos ao
dia. Executivos da Andrade Gutierrez
confessaram, em delação premiada, que
a empreiteira pagou ilegalmente dívidas da campanha de Dilma Rousseff em 2010.
Segundo a confissão, celebrou-se um contrato fictício com a agência Pepper — que trabalhava para a candidatura —, e,
por esse expediente, mais de R$ 5 milhões
foram parar nos cofres da companheirada. Notem: mesmíssimo método do mensalão!
Notas para compor o
quadro: 1) a Andrade Gutierrez é a
principal acionista da Oi, aquela que pôs a antena perto do sítio que Lula diz ter ganhado “de presente” de um
sindicalista. E a Oi é a sucedânea da
Telemar, aquela que se tornou sócia de Lulinha na Gamecorp. 2) Em 2010, a
campanha de Dilma foi comandada pelo trio Antonio Palocci, José Eduardo Dutra (já morto)
e José Eduardo Cardozo, o novo Advogado-Geral da União. Sigamos na
comparação que instrui moralmente.
Venham cá: faz assim tanta diferença se quem financia as
campanhas eleitorais é o PCC ou um partido especializado em arrecadar dinheiro
ilegal
junto a empresas que operam serviços
públicos? Digam-me: as
freirinhas que fossem eleitas com dinheiro do PCC seriam diferentes de Dilma, que teve a campanha financiada por dinheiro ilegal
amealhado pelo PT? Vocês acham o quê?
E, ora vejam, esse dinheiro de campanha
é apenas expressão mínima de um método, não? A Andrade Gutierrez fez um acordo de delação premida com multa de R$ 1
bilhão. Os executivos delatores
relataram irregularidades nas obras da Hidrelétrica de Belo Monte, na usina nuclear de Angra
3, na Petrobras
e em três estádios da Copa do Mundo: Arena
Amazonas, Maracanã e Mané Garrincha, em Brasília.
Do ponto de vista eleitoral, nada mais
pode ser feito no que diz respeito àqueles R$ 5 milhões. Não é possível cassar
um mandato de Dilma que já expirou. No caso das demais obras, o sobrepreço e o
pagamento de propina se deram também no curso do primeiro e do segundo mandatos
de Dilma.
A interpretação obtusa do Parágrafo 4º
do Artigo 86 da Constituição tem permitido que o dispositivo constitucional se
torne um valhacouto. Lá está escrito:
“§ 4º O Presidente da República, na vigência de seu mandato, não pode ser responsabilizado por atos estranhos ao exercício de suas funções.”
“§ 4º O Presidente da República, na vigência de seu mandato, não pode ser responsabilizado por atos estranhos ao exercício de suas funções.”
O texto integra a Constituição de 1988.
A reeleição foi aprovada no país em 1997. É evidente que o que vai acima não dá
ao governante de turno o direito de delinquir à vontade, bastando, para que
fique impune por pelo menos mais quatro anos, que consiga se reeleger. Essa
interpretação é uma piada grotesca. Até porque o indivíduo pode, como fez
Dilma, cometer crimes com o intuito de se reeleger mesmo. Ou a pedalada fiscal
não foi precisamente isso?
Mas voltemos
Mas volto ao ponto, caras e caros! Trata-se de saber se um país pode ou
não pode ser governado por uma organização criminosa, que se move nas sombras
para arrecadar dinheiro, usando para isso os instrumentos da ameaça e da
chantagem.
Se pode, fiquemos à espera das freirinhas de
Marcola. Já que, segundo este particular ponto de vista, não há mesmo diferença entre PCC e PT. Um trafica drogas. O outro trafica as dificuldades e os sonhos do povo
brasileiro.
Fonte: Blog do Reinaldo Azevedo
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