Dilma desperdiça o seu vernáculo
embolado e incompreensível numa carta onde tenta construir uma narrativa
de saída que a transforme em vítima.
Missão impossível. Contrariando os próprios aliados, insiste em falar de golpe e
assim ataca e desqualifica a Casa que vai julgá-la. Desatino. Na
contramão do que pensa a sua base política, o partido que a inventou e os
movimentos sociais teoricamente favoráveis a ela, defende um plebiscito estapafúrdio.
Na essência sugere voltar ao cargo para logo
depois sair. Lorota sem tamanho. Por linhas tortas, promulgaria
uma espécie de autogolpe, sem amparo constitucional. Como definiu o
ministro do Supremo, Gilmar Mendes, a ideia é “brincadeira de criança”. Parlamentares,
governadores, além do interino, Temer – que finalmente botou para andar o governo e procura consertar
as barbeiragens da antecessora –, renunciariam solidariamente, ao seu lado,
para que um projeto de lei, a ser enviado ao Congresso, desabroche com o
buquê das eleições antecipadas. Dilma almeja com o assunto inebriar o
discernimento dos incautos. Dois terços do Senado e da
Câmara teriam de dar aval à ideia em arrastadas votações de dois turnos (em cada plenário) que, na prática, caso evoluísse, estenderia a discussão até o
prazo final do mandato em 2018. Artimanha rasteira. Ela mesma não
acredita, nem deseja, nem irá mover uma palha nessa direção de plebiscito.
Quer apenas, como faz sempre, incitar a
bagunça generalizada.
“Testamento para a posteridade”, deve
imaginar a autora – nos moldes da célebre mensagem deixada nos idos de 50 pelo
memorável Getúlio Vargas. Mas longe disso, o
documento de Dilma a empurra para o ostracismo político puro e simples. No
todo e em partes, a carta dela nada mais é que a demonstração
exaustiva de sua inapetência e inabilidade para o poder. Por inúmeras
vezes a mandatária afastada prometeu o que não queria e não iria cumprir. Falou
em pacto (como repete agora de novo)
ainda em meio às convulsões sociais de 2013, quando o povo tomou às ruas em
protesto contra ela. Logo a seguir, com a temporária trégua, engavetou o tema.
Dilma que prometeu luz barata para todos em plena campanha aplicou, ao reassumir, remarcações cavalares nas
tarifas. Quebrou o setor. Quebrou, em suma,
uma nação inteira. Praticou estelionato eleitoral para chegar lá. E não
obstante o crescente número de provas e evidências de seus malfeitos, ainda se
diz traída e perseguida. Por aliados, opositores, pela sociedade em geral que
lhe deu, segundo as pesquisas, o mais alto índice de rejeição da história.
Dilma não enxerga os fatos como eles são. Parece fugir da realidade. Está sendo demitida por justa causa. E não
deixará saudades.
A sua missiva trata na verdade de uma fala de despedida do posto
ocupado por intermináveis 5,5 anos; durante
os quais a petista gerou uma recessão histórica, manipulando contas, sabotando estatais e promovendo
desemprego em massa.
Como alguém pode ser capaz de escrever que “o
Brasil vive um dos mais dramáticos momentos de sua história” sem reconhecer
que foi dela a maior parcela de responsabilidade por isso? Dilma fala de
reformas que ao longo de sua temporada brasiliense nunca mostrou qualquer
interesse em fazer. No balanço de gestão –
se é que pode ser entendido assim –, diz inverdades contra o Congresso,
tratando de bloqueios de pauta adotados pelo seu próprio partido e alega, sem
lastro, que antecessores na presidência também pedalaram.
Esquece, propositalmente, que foi de Fernando
Henrique a concepção da Lei de Responsabilidade Fiscal. De uma maneira ou
de outra, expedientes tardios já não adiantam mais. Não
mudarão a seu favor um único voto. Ela segue os passos derradeiros de uma
desastrosa passagem pelo Planalto. Arrependimentos estão fora de
cogitação na sua cartilha. Ela chegou a
culpar até o PT pelo pagamento ilegal do marqueteiro nas campanhas de 2010
e 2014. Nada fez, diz, mas acaba de entrar como investigada na Operação Lava
Jato por obstrução de Justiça. Como ofensiva, na última trincheira, ainda vai
repetir a dose de frágeis argumentos e platitudes em um testemunho presencial
no Senado, nesta semana. Algo contraproducente. Para a esmagadora maioria dos brasileiros e pelo bem geral de todos,
Dilma tem que ser página virada.
Fonte: Editorial – Isto É - Carlos José Marques é diretor
editorial da Editora Três
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