"Se eu soubesse, naquele dia o que
sei agora, eu não seria este ser que chora..." (Dolores Duran, em Castigo)
Nossa, como encontro eleitores arrependidos! É um tipo peculiar de remorso,
que se liga à decepção causada por algo ou alguém, partido ou candidato, e se
converte em sentimento na consciência do eleitor - "Ah, se eu
soubesse!". Muitos que me externam esse estado de espírito sinalizam
opção por outro equívoco. Largaram o jogo. Rasgaram o tíquete. Desistiram de
votar.
A memória alcançou, fui atrás das minhas próprias
decepções, elaborando uma longa lista dos votos que dei em eleições
parlamentares proporcionais. Dela constam eleitos e não eleitos,
candidatos a vereador, deputados estaduais e federais. Curiosamente, com
nenhum me frustrei. Todos os que cumprem ou cumpriram mandatos integram um
grupo infelizmente bastante restrito, formado por gente da melhor qualidade
pessoal. Essa constatação levou-me a investigar suas causas e fui encontrá-la
numa conversa de décadas atrás, com o querido amigo, o prof. Cézar Saldanha
Souza Júnior.
Explicou-me ele que, pelo motivo adiante apontado, o
parlamentar precisa ser escolhido como um representante de opinião. Deveria
o eleitor, portanto, designar seu voto a alguém com cujos princípios, valores,
ideias e ideais sintonizasse. Trata-se como se percebe, de um critério muito
exigente: o eleitor precisa conhecer o candidato, certificar-se desse
alinhamento e assegurar-se de que, na rua esburacada da política, seu deputado
ou vereador não resvalará para a sarjeta. Minha dificuldade sempre consistiu em
escolher apenas um dentre vários bons. E muitos não alcançaram sucesso.
Observemos o corruptódromo que se formou
entre parcela expressiva do Congresso Nacional. Esse grupo criminoso foi eleito por pessoas que
votam de qualquer jeito, em qualquer sujeito, por reprováveis motivos. Muitos,
também, foram ungidos por eleitores para os quais deputado (ou vereador) deve
ser um "representante de interesses". Estribado em tal
critério, o eleitor escolhe alguém para cuidar de si. É sua montaria da vez, o
parelheiro escolhido para a eleição. Na vida real, o parlamentar selecionado
para cuidar dos interesses desse eleitor e do grupo com o qual ele se
identifica vai deliberar apenas ocasionalmente sobre esses específicos temas.
Mas decidirá sobre tudo mais o tempo todo! E é aí
que o remédio vira veneno. Na maior parte do mandato, o representante do
eleitor interesseiro estará cuidando dos próprios interesses, e eles
conflitarão com os do eleitor. Estará fazendo para si mesmo e para
outros aquilo que o eleitor queria que ele fizesse para si contra os outros:
distribuindo benefícios com dinheiro de todos.
E vem a decepção, arrastando o arrependimento. Posta a questão em palavras
duras: um eleitor que leva aos parlamentos pessoas que
zelem por seus interesses pessoais, não raro egoísticos, tem direito de se
decepcionar quando seus escolhidos - no município, no Estado e em
Brasília - passam a fazer exatamente a mesma coisa
por si mesmos? Quem já acompanhou o que acontece nos plenários quando as
galerias estão lotadas ululando reivindicações sabe o quanto é raro que ali se
reivindique a favor do interesse público.
Fonte: Percival Puggina
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