Confesso que acho bastante heterodoxo haver uma frente que junte entidades do Ministério Público, que investiga e denuncia, com as de juízes, que julgam. Não dá!
Ai, ai…
Vamos lá.
Está em
curso uma estupefaciente e, entendo, nefasta reação corporativista
contra o ministro Gilmar Mendes, membro do STF e presidente do TSE
(Tribunal Superior Eleitoral). Uma tal “Frentas” (Frente Associativa da
Magistratura e do Ministério Público) protocolou, nesta quinta, junto à
Procuradoria-Geral da República, uma representação contra Mendes. Por
quê?
Os
presidentes das associações que compõem a dita-cuja pedem que Janot abra
uma investigação para apurar se Mendes cometeu crime de
responsabilidade por ter declarado, na última terça, durante julgamento
no TSE, que alguns juízes e promotores, Brasil afora, estariam usando a
Lei da Ficha Limpa para ameaçar parlamentares e políticos que respondem
por processos de improbidade. Para João
Ricardo Costa, presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros e
coordenador da Frentas, “as acusações de Mendes servem somente para
desacreditar as instituições”. Ainda segundo ele, fazendo isso, o
ministro “abala a imagem do Judiciário e do Ministério Público”.
Sei, sei…
A declaração
de Mendes foi dada na terça-feira, durante julgamento do caso
envolvendo o prefeito eleito de Quatá, no interior de São Paulo.
Condenado em segunda instância por improbidade administrativa, o
Tribunal Regional Eleitoral indeferiu o registro de sua candidatura. Ele
recorreu ao TSE e pôde concorrer. Venceu a disputa. Por unanimidade, os
ministros do tribunal superior aprovaram o registro. E ele vai tomar
posse. Por quê? Porque os juízes entenderam que a condenação por
improbidade só torna alguém inelegível se casada com o enriquecimento
ilícito.
Estranhezas
Bem, a minha primeira estranheza se volta
para a tal “Frentas”. Confesso que acho bastante heterodoxo haver uma
frente que junte entidades do Ministério Público, que investiga e
denuncia, com as de juízes, que julgam. Não dá! É mistura de carne com
leite, não é mesmo? Não se cozinha o filho no leite da mãe. Uma coisa é
uma coisa, e outra coisa, outra coisa.
Já escrevi
aqui quão exótico acho haver associações de juízes com caráter sindical.
Dadas a independência, as garantias e a autonomia que tem um juiz,
parece-me que uma associação de caráter corporativo macula o sacerdócio.
Se, a esses entes sindicais, se juntam outros tantos, aí do Ministério
Público, a mistura, então, não me parece lustrar o corporativismo, mas
arranhar o estado de direito. Sigamos.
Governadores
tiram a calça pela cabeça para pagar as contas. Para muitos deles, o
teto de gastos já existe há muito tempo. Mas não conseguem, em seus
respectivos Estados, a colaboração de Justiça e Ministério Público no
controle de gastos, ainda que tenham maioria nas Assembleias
Legislativas. Sim, senhores! Políticos se pelam de medo de uma ação de…
improbidade administrativa. Mendes se referia a isso. “Ah, mas ele
falou de forma genérica, não especificou…” Pode-se fazer tal crítica?
Vá lá. Mas os doutores da tal “Frentas”, ora vejam, querem pegar a fala
que compõe a exposição de um voto para acusar seu autor de crime. Aí não
dá!
Fico cá me
perguntando se essa reação a Mendes não está contaminada por outras
questões, como a sua oposição, por exemplo, ao reajuste de salários
dessas categorias. O ministro não acusou a categoria dos juízes e a
categoria dos procuradores de chantagear políticos. De resto, essas
associações não podem se colocar como censoras da fala de um juiz do
TSE. Para
encerrar: não faz tempo, vimos o ministro Ricardo Lewandowski fatiar a
Constituição a céu aberto. Pensei: “Agora os juízes e procuradores
reagem!”.
Não se ouviu palavra. Lewandowski é sempre muito receptivo às demandas dessas categorias.
Fonte: Blog do Reinaldo Azevedo - VEJA
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