Houve outros esquemas de devolução bem engenhosos. Por exemplo: as concessionárias de rodovias no Paraná, Ecorodovias e Rodonorte, devolveram R$ 220 milhões, a primeira, e R$ 350 milhões a segunda, na forma de subsídios (redução) nos pedágios. Outros R$ 416,5 milhões, recolhidos de ladrões diversos, foram entregues aos cofres da União. A 11ª. Vara da Seção Judiciária de Goiás recebeu R$ 59 milhões.
Não acabou ainda. Há nada menos R$ 10 bilhões que estão sendo devolvidos em parcelas. Ou será que acabou? Na verdade, não foi apenas a extinção da Lava Jato. Está em curso no país um amplo processo de extinção de qualquer forma de combate à corrupção praticada pelas grandes empresas e políticos, um desmonte, como chamou o colega Merval Pereira. Isso começou no STF, com o julgamento que considerou o juiz Sérgio Moro parcial no caso envolvendo o triplex do Guarujá – apartamento que a OAS daria ao ex-presidente Lula, reformado ao gosto da família.
Reparem: o desmonte não é para declarar todo mundo inocente, mas para sumir com os processos – arquivando, mudando de foro e mandando começar tudo de novo, deixando prescrever e por aí vai. É exemplar o caso mais recente envolvendo o ex-deputado Eduardo Cunha, condenado em duas instâncias a 14 anos de prisão. Há pouco, a Segunda Turma do STF anulou a ação penal, em julgamento que terminou empatado em dois a dois. Empate favorece o réu, logo Cunha se livrou dessa.
Reparem a manobra, conforme explica o procurador Deltan Dallagnol, que foi o procurador-chefe da Lava Jato: em 2016, o próprio STF recebeu acusação contra Cunha pelos crimes de corrupção passiva, lavagem de dinheiro, evasão de divisas e caixa 2, pelo recebimento de US$ 1,5 milhão na compra de um bloco de exploração de petróleo em Benin, na África, pela Petrobras. Cunha foi cassado, perdeu o foro, e o STF mandou o caso para Curitiba. Cinco anos depois, o STF, por dois votos da Segunda Turma (Gilmar e Lewandowski), diz que a competência não era de Curitiba. E o envia para a Justiça Eleitoral.
Em 2019, o STF havia decidido que casos de corrupção com o dinheiro indo para campanhas deveriam ser julgados na Justiça Eleitoral. Mas a condenação de Cunha havia ocorrido muito antes disso. Como nota Dallagnol, “a aplicação do entendimento pró passado é catastrófica: anulou os casos Pasadena, Mensalão Mineiro, Calvário e Integração. Agora, o caso Cunha. E pode anular todos os outros casos de políticos da Lava Jato”.
As devoluções ocorreram, ocorrem e ocorrerão, sempre por determinação, ou com aval, ou por consequência de decisão, da Justiça.
Por consequência se o Lula, ou qualquer outro ladrão não inocentado, decidir pedir uma escritura do que roubou, devolveu e recebeu de volta, está em seu direito.
O mais grave é que o petista ou qualquer outro da mesma laia, podem até processar o 'estado brasileiro' e receberem milhões a título de indenizações por danos morais, etc, etc.
Nos cabe assistir e cumprir. Eventuais reclamações podem ser consideradas atos antidemocráticos e/ou contrários ao 'estado democrático de direito'.
Coluna publicada em O Globo - Economia 18 de setembro de 2021
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