Político profissional, Renan foi deputado federal. Está no Senado desde 1995, Casa que presidiu três vezes. Nesse período, serviu a todos os governos, de José Sarney ao PSDB de Fernando Henrique Cardoso, passando pelos 13 anos dos petistas Lula e Dilma Rousseff, até esbarrar em Jair Bolsonaro.
A resiliência no alto escalão de Brasília permitiu que ele montasse uma verdadeira oligarquia em seu Estado. Dois de seus irmãos se elegeram deputados (Renildo e Olavo). Renan manteve o controle da máquina municipal de várias cidades e fez do filho, que leva o seu nome, duas vezes governador de Alagoas. A linha sucessória é impressionante: por exemplo, Renan Filho foi eleito prefeito de Murici aos 25 anos, renovou o mandato e foi sucedido pelo tio, Remi.
No tapete azul do Senado, Renan é conhecido há décadas por duas características marcantes: os métodos de chantagem colocados sempre à mesa (os relatos seguem abaixo) e a velocidade com a qual faz acordos pela sobrevivência política. Em 2015, quando o Congresso o reelegeu para chefiar o Senado e o deputado Eduardo Cunha (RJ) para controlar a Câmara, uma frase dita durante reunião do MDB sobre as desavenças com o PT de Dilma Rousseff ficou famosa nos bastidores: “A diferença entre Cunha e Renan é que o primeiro reage com o fígado. O segundo não tem fígado”. Deu no que deu: a então presidente caiu, Cunha foi preso. E Renan continua aí.
No establishment de Brasília, Renan sempre teve dois esteios: o ex-presidente José Sarney (de quem herdou o espólio das gavetas secretas do Senado) e Romero Jucá (RR), que liderou quatro governos (FHC, Lula, Dilma e Temer) até perder a reeleição por 400 votos. Na época, Jucá culpou Temer por se recusar a fechar a fronteira com a Venezuela diante da onda de imigrantes que provocou o caos nas ruas de Boa Vista. Pagou o preço nas urnas.
Inferno pessoalSem os aliados por perto e diante de um PT enfraquecido nas eleições de 2018, Renan tentou retornar à cadeira da presidência do Senado para se opor a Bolsonaro. A estratégia era a mesma de governos anteriores. Como presidente do Congresso e com a permanência de Rodrigo Maia (DEM-RJ) no comando da Câmara, travaria a agenda do Palácio do Planalto no Legislativo em troca de dois trunfos: um naco ministerial com volume de verbas no Nordeste e uma campanha aberta pelo fim das investigações da Polícia Federal na Lava Jato.
A oportunidade de dar o troco no presidente Bolsonaro ocorreu no auge da pandemia
Àquela altura, Renan respondia a 26 investigações e já era réu da Lava Jato. Até hoje está às voltas com sete processos sobre lavagem de dinheiro, recebimento de propina desviada do caixa da Transpetro (subsidiária da Petrobras), do Postalis (fundo de pensão dos Correios) e na construção de estaleiros.
Jair Bolsonaro não se mostrou disposto a ceder. Queria manter o compromisso de não lotear a Esplanada dos Ministérios para os inquilinos de sempre. Além disso, havia dado autonomia para Sergio Moro conduzir a área da Justiça e Segurança Pública. O presidente apoiou David Alcolumbre (DEM-AP), que venceu a disputa no Senado. Renan Calheiros não engoliu.
Como ele mesmo já admitiu, Renan viveu seu inferno pessoal em 2007. Em maio daquele ano, a revista Veja publicou uma reportagem de capa na qual a jornalista Mônica Veloso afirmava que quem pagava a pensão de R$ 12 mil mensais da filha que teve com o senador era a empreiteira Mendes Júnior — às vezes, em dinheiro vivo.
“Não arredarei o pé”
Colocado contra as cordas num terreno em que mandava e desmandava, Renan resolveu usar a tática peculiar da intimidação. Produziu dossiês contra os adversários. Um grupo foi escolhido como alvo preferencial para tentar atingir diferentes bancadas e grupos na Casa: Jefferson Péres, Pedro Simon, Jarbas Vasconcellos, Arthur Virgílio, Tasso Jereissati, Demóstenes Torres e Marconi Perillo. No caso dos então colegas de MDB, Simon e Jarbas, conseguiu derrubá-los da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ).
Para tentar silenciar a dupla goiana Perillo e Demóstenes, Renan incumbiu o assessor Francisco Escórcio para instalar câmeras secretas num hangar de Brasília. Chiquinho, como era chamado, trabalhava como uma espécie de araponga desde os tempos que Sarney presidiu o Senado. Outro trunfo pouco republicano utilizado contra os opositores foi encomendar ao ex-diretor-geral do Senado Agaciel Maia um catatau com todas as despesas dos 80 senadores com verbas de gabinete: gasolina, restaurantes, aluguel de escritório, passagens aéreas, etc. Desse levantamento, surgiu uma briga histórica com Tasso Jereissati sobre o reembolso de combustível do seu jato particular.
Em sua mais recente aparição, escolheu nesta semana o presidente da Câmara, seu conterrâneo Arthur Lira (PP), como o desafeto da vez — o deputado havia criticado o relator por incluir parlamentares na lista de possíveis indiciados. “Acho que o presidente da Câmara tem muita preocupação com o que pode vir de investigação, sobretudo em relação ao RP9, que são emendas secretas que ele coordena e isso vai causar, talvez, o maior escândalo do Brasil”, ameaçou.
Renan está no quarto mandato no Senado. Num ranking com os mais longevos da história, só é superado por Rui Barbosa e José Sarney (cinco mandatos cada um). Como ele mesmo profetizou em julho de 2007, quando estava no auge do furacão: “Não arredarei o pé”. Lá se vão 14 anos.
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Silvio Navarro, colunista - Revista Oeste
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