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quarta-feira, 2 de fevereiro de 2022
Bolsonaro desobedeceu ao STF e não aconteceu nada - O Estado de S. Paulo
J. R. Guzzo
Onde foi parar, à essa altura, a ‘majestade das instituições’? Quer dizer que ordem do Supremo ‘pega’ ou ‘não pega’?
O ministro Alexandre de Moraes,
nas funções que concedeu a si próprio como marechal de campo do
Inquérito Perpétuo Contra o Governo Bolsonaro e Para Salvar a
Democracia,deu uma ordem clara, direta e definitiva para o presidente
da República.
Sua Excelência, ordenou Moraes, estava intimado a
comparecer na sexta-feira, dia 28 de janeiro, às 14 horas, numa
delegacia da Polícia de Brasília, para responder a interrogatório
criminal. Qual é a dúvida que poderia existir nisso tudo? Nenhuma.
Foi
dado dia, hora e local para o cumprimento da ordem; nem o ministro podia
dizer que não foi bem assim, nem Bolsonaro podia
dizer que não entendeu alguma coisa. E o que aconteceu na prática? O
presidente, muito simplesmente, não apareceu para ser interrogado. Houve
um vai e vem de papelório enrolado de um lado para outro, a conversinha
oca de sempre, mas o que interessa mesmo é o seguinte: Bolsonaro
recebeu uma ordem expressa doSupremo Tribunal Federal e não obedeceu.
Adriano Machado/Reuters
O que aconteceu nos cinco minutos seguintes, e continua acontecendo até agora, é o mais interessante da história toda – não aconteceu nada. Como assim, “nada”? Pois é: o STF deu uma ordem por escrito ao presidente da República, ele não cumpriu e ficou tudo exatamente na mesma. Moraes não tinha um plano B;
não tinha, na verdade, a menor noção do que faria num caso desses, e como não tinha o que fazer, não fez nada. É uma piada. É também o resultado inevitável que alguém obtém quando dá um comando sem ter o menor meio material de fazer com que esse comando seja obedecido.
Por que o ministro não pensou nisso antes? Por acaso ele podia, na vida real, mandar prender Bolsonaro – “condução coercitiva, no dialeto que usam"? Não podia. Ia prender com quem?
Chamando uma tropa do Exército, ou de fuzileiros navais, para invadir o Palácio do Planto e meter um par de algemas no presidente da República?
Entregando o serviço à delegada de polícia que convocou ilegalmente para a sua equipe pessoal de investigação? Recorrer à Interpol? À OAB? À ONU?
Se não tinha possibilidades
físicas, em nenhum momento dessa comédia, de obrigar o presidente a
fazer nada, o mais lógico seria pensar numa outra coisa qualquer para
abrilhantar o seu inquérito. Também poderia, perfeitamente, ter dado
antes as explicações marca barbante que deu depois, quando a casa já
tinha caído e foi preciso dizer algo a respeito. Mas não. O ministro,
até o último minuto – na verdade, até onze minutos depois de ter sido
formalmente desobedecido –insistiu que Bolsonaro tinha de responder em
pessoa as perguntas do interrogatório. Resumo da ópera: um desses casos
de “tudo ou nada” que dão “nada”.
E a “majestade das instituições”
– onde foi parar, à essa altura? Quer dizer que ordem do Supremo “pega”
ou “não pega”, como acontece com as leis brasileiras?
Quem é obrigado a
obedecer, porque não tem pai nem mãe, obedece – e quem não precisa
obedecer não obedece, por que não vão lhe fazer nada?
É como está a
coisa hoje, a menos que o STF venha com uma ordem novinha em folha para
Bolsonaro depor outra vez, e ele ache melhor aparecer na delegacia.
De um jeito ou de outro, ficou
combinado rapidamente que ninguém ia ficar perguntando muito, ou
querendo satisfação – não se pode embaraçar o ministro numa hora dessas,
não é mesmo? Melhor deixar quieto; senão atrapalha a democracia. No
fim, ficou todo mundo feliz: Moraes, a delegada de polícia de Moraes, os
colegas de Moraes no STF, os jornalistas e, acima de tudo, o próprio
Bolsonaro. É cômico.
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