Preparemos nossos olhos e ouvidos para notícias falsas, sofismas, boatos, fofocas, factoides, suposições, insinuações, invenções
O ano eleitoral recém começou, e ministros da Suprema Corte, juízes do Tribunal Superior Eleitoral já abandonaram a discrição de magistrados e desceram para a campanha eleitoral para criticar um dos candidatos, deixando aflorar sua natureza de advogados. Como se sabe, a vocação do advogado é trabalhar a favor de alguém e contra alguém ou algo. Advogado é sempre parcial, a favor de seu representado; já o juiz tem de ser sempre imparcial, ao lado da lei e da justiça.
Fiquei pensando se não deveria ser alterada a composição do Supremo, para evitar que ministros da Corte, sendo advogados profissionais, se manifestassem como advogados. Que o tribunal fosse composto só por juízes de carreira, depois de passarem por todas as instâncias e, então, no Superior Tribunal de Justiça, ser escolhido o mais brilhante, indicado ao Senado como juiz supremo. Estudantes de direito certamente estranham, quando não se escandalizam, que juízes do Supremo emitam opiniões, suposições e pré-julgamentos, justo no ano em que terão de ser juízes e administradores de uma eleição. Isso também faz parte das emoções de 2022.
Enfim, preparemos nossos olhos e ouvidos para notícias falsas, sofismas, boatos, fofocas, factoides, suposições, insinuações, invenções — escritas, faladas, desenhadas, filmadas, fotografadas, editadas e até carimbadas como checadas e desmentidas. Eleição sempre teve isso, mas era no mundo oral, impresso, de mão única; agora, no mundo digital, são infinitos níveis, direções e vias, na velocidade do instante. Preparemo-nos para não comprar a verdade já embrulhada. Aceitar sem desembrulhar é como um ato de fé, mas isso é para as questões espirituais, não para decidir o futuro dos nossos filhos, nossos empregos, nossos empreendimentos, nosso país. Desembrulhemos o que oferecem para nossos olhos e ouvidos, com o ceticismo da razão, sem a emoção ingênua. Desembrulhe, para não ser embrulhado.
Alexandre Garcia, colunista - Correio Braziliense
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