A opinião do GLOBO - 12 setembro 2023
Crime contra a democracia foi vil, mas o rigor das penas precisa refletir com fidelidade as provas
A Procuradoria-Geral da República (PGR) pede, nesta primeira fase, a condenação de quatro presos em Brasília, acusados dos seguintes crimes: abolição violenta do Estado Democrático de Direito, associação criminosa armada, golpe de Estado e deterioração de patrimônio tombado. A PGR apresenta fartas provas para justificar as acusações, muitas produzidas pelos próprios réus — Aécio Lúcio Costa Pereira, Thiago de Assis Mathar, Moacir José dos Santos e Matheus Lima de Carvalho — com seus telefones celulares.
Os quatro afirmam ter ido a Brasília para uma “marcha pacífica”. Mathar diz ter entrado no Palácio do Planalto só para se proteger do conflito violento nas imediações. Versões semelhantes deverão surgir no julgamento. A defesa também alega que não há provas capazes de vinculá-los a danos específicos, como janela quebrada, obra de arte vandalizada ou arrombamento (mas há inúmeros casos em que imagens ligam criminosos a ações específicas; num caso que não será julgado nesta fase, o acusado foi flagrado por uma câmera do Planalto destruindo um relógio trazido ao Brasil por Dom João VI).
O argumento da defesa é falho, pois não se trata apenas de vandalismo. A conspiração para atacar as sedes dos Três Poderes, a incitação à violência e a mobilização antidemocrática configuram crimes tão graves quanto os ataques em si. Ninguém ficou semanas acampado em quartéis bradando em favor de um golpe de Estado, à espera de um sinal para agir, sem saber o que fazia. É incontestável que houve um movimento golpista coletivo, e a mera participação nele é crime.
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É certo que nem todos tiveram o mesmo grau de envolvimento na conspiração e na violência, portanto nem todos têm a mesma parcela de culpa. Justamente por isso, caberá aos ministros do Supremo analisar as provas com serenidade e afinco para estabelecer punições proporcionais à gravidade dos crimes cometidos.
Os magistrados podem se inspirar nos julgamentos que têm condenado os responsáveis pela invasão do Capitólio, o Congresso dos Estados Unidos, em 6 de janeiro de 2021. Os expoentes das cenas de selvageria para tentar manter Donald Trump no poder têm sido levados para trás das grades depois de processos exaustivos, em que têm exercido na plenitude seu direito de defesa (o último foi Enrique Tarrio, líder do grupo de ultradireita Proud Boys, condenado a 22 anos neste mês).
Editorial - Jornal O Globo
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